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O ARCO-ÍRIS CHILENO DEPOIS DE 15 ANOS DE TEMPESTADE: ditadura, transição para a democracia e desafios das Comissões da Verdade

1.4 A RADICALIZAÇÃO DA DIFERENÇA: O GOLPE MILITAR DE 1973 Para entender as razões do golpe é necessário refletir sobre o que era a coalização

1.5 OS 15 ANOS DE PINOCHET: ENTRE A BARBÁRIE E O SUCESSO ECONÔMICO

O assalto ao Palácio de La Moneda, sede do governo chileno, por si só já demonstrava a atrocidade e a violência com que os militares pretendiam lidar com o país dali em diante. Em seu último discurso transmitido via rádio, Allende pede que seus apoiadores não se rebelem contra o golpe, para não haver mais vítimas. Além. Além disso, sua morte – anos depois foifoi constatado tratar-se de um suicídio – visava também evitar de elevarelevar sua figura a mártir, resultando assim na própria menção de seu nome sendo mais poderosa do que sua vida, de fato10.

O golpe de 11 de setembro de 1973 foi um dos mais atrozes do Cone Sul, principalmente dado o contexto da via chilena para o socialismo. Liliana de Riz o caracteriza como um golpe fascista, recorrendo a Gramsci para justificar seu entendimento:

Quando Gramsci pergunta o que é fascismo, ele responde: “O fascismo é a fase preparatória da restauração do Estado; isto é, um ressurgimento da reação capitalista, uma exasperação da luta capitalista contra as demandas mais vitais da classe proletária. O fascismo é a ilegalidade da violência capitalista: a restauração e a legalização dessa violência. De fato, o Estado - observa Gramsci - significa concentração de direção e ação. No Chile, em 1973, o governo já não governava. Os diferentes poderes do Estado agiram por conta própria. O Parlamento e a Controladoria paralisaram a administração do executivo; o judiciário deixou os grupos terroristas impunes; os militares reprimiram os trabalhadores e camponeses aplicando a Lei de Controle de Armas. A sociedade civil havia devastado o Estado. A desintegração das instituições políticas chegou ao seu ponto extremo. O golpe militar de setembro foi um golpe “fascista” neste sentido gramsciano do termo: veio preparar a restauração do Estado chileno. [...] Os militares invadiram o poder convencidos de que as forças armadas eram a única instituição com recursos para acabar com a crise (ou seja, resolver a contradição que o projeto freiista havia gerado na década de 1960 sem poder responder, e que a Unidade Popular também não conseguiu resolver). [...] Em 1973 os militares tiveram a última palavra. Essa percepção não era apenas da direita, mas também da maioria dos setores da esquerda. No entanto, poucos conseguiram prever a natureza do golpe militar de setembro. (RIZ, 1979, pp. 181-182 – tradução nossa)

10 Apesar de ter sido feita a autópsia de seu corpo em 1990, como um dos procedimentos da Comissão

Nacional de Verdade e Reconciliação e do testemunho do então médico pessoal de Allende que confirmam a versão do suicídio de Allende, há várias pessoas no Chile que ainda acreditam e defendem que Allende foi executado pelas forças militares que invadiram o Palácio de La Moneda por volta das 14h no dia 11/09/1973. Para mais informações, cf.: “La Corte Suprema de Chile determinó que Allende se suicidó” – disponível em: https://bit.ly/2VGumww; “Salvador Allende falló al intentar suicidarse y un escolta le dio el tiro de gracia” – disponível em: https://bit.ly/2DMEzNI; acesso em 03/05/19.

Entre 18 de setembro de 1973 ee 4 de abril de 1981, foram publicados 3.579 decretos-leis (D.L) no Diário Oficial chileno, dos quais 3.660 foram redigidos pela Junta Militar que assumiu o governo do país, sob a figura central de Pinochet. Os demais possuem ou caráter reservado ou secreto, além de cinco que não chegaram a ser publicados.

Após 1980 e a nova constituição chilena, são aprovadas 1.019 leis, das quais 962 são publicadas, havendo 4 reservadas, 44 de caráter secreto11 e 9 não publicadas. Além

disso, durante todo o período ditatorial foram lançados diversos decretos com força de lei. Sobre isso, a Divisão de Projetos Editoriais aponta:

Os decretos-leis não apenas modificaram ou revogaram as leis anteriores, mas, além disso, logo começaram a complementar, modificar e revogar as anteriores, com velocidade cada vez maior. O fenômeno continuou com a aprovação de leis e decretos com força de lei, de modo que hoje o conhecimento e a consulta de toda essa legislação se tornam lentos, difíceis e inseguros. (DIVISIÓN DE PROYECTOS EDITORALES, 1990 – tradução nossa)

Assim, esses instrumentos jurídicos possuíam diversas finalidades, desde questões burocráticas para o funcionamento do Estado e de suas relações internacionais, até questões como a organização de uma comissão desportiva para os jogos Pan-Americanos.

No entanto, alguns desses, ainda que de forma obscuratêmobscura, têm como pano de fundo a sistematização da violação dos Direitos Humanos que pode ocorrer de diferentes formas. É possível encontrar no quadro a seguir os decretos que se enquadram nesse contexto:

Quadro 5: Decretos-lei publicados no Diário Oficial no Chile de 1973 a 1980

Número Matéria Data

1 Ata de constituição da Junta de Governo 18/09/1973

2 Declara estado de sítio 18/09/1973

4 Declara enestado de emergência as províncias e departamentos que indica 18/09/1973

11 As leis secretas são um dispositivo da constituição de 1980 que permite ao presidente da república do

país manter o sigilo sobre várias disposições (que seguem válidas até os dias de hoje), que são: “i) sigilo no exercício do direito de voto, como garantia de direitos políticos (artigo 14); ii) A reserva da lista de militantes de um partido político, como obrigação do serviço eleitoral do Estado (artigo 19, nº 15); iii) Quanto à condução das relações internacionais do Estado, como atribuição do Presidente da República (artigo 32, nº 15); iv) Na votação do Supremo Tribunal para nomear os Ministros do Tribunal Constitucional (artigo 92); v) Em relação à ata do Conselho de Segurança Nacional (artigo 107); vi) Em questões de perdão específico, referentes a crimes terroristas cometidos antes de 11 de março de 1990, nos quais o Executivo deve enviar uma cópia reservada ao Senado (Disposição Temporária 7). Essas disposições expressas sobre sigilo reafirmam a lógica padrão sob a qual as normas constitucionais operam: publicidade e transparência são a regra e sigilo é a exceção. Isso implica que o sigilo é sempre uma questão de lei estrita e, consequentemente, precisa ser estabelecido por meio de uma norma expressa, sua interpretação deve ser restrita e a analogia como mecanismo de integração de normas em caso de lacunas no sigilo não prossegue”. (CONTRERAS, 2010, p. 87) – Essa questão é amplamente debatida pelo direito chileno, uma vez que vai contra os princípios de transparência e publicidade das leis.

5

Declara que o estado de sítio decretado por comoção interna ennas circunstâncias em que vive o país, devem entender-se como “estado de tempo de guerra”, para os efeitos dispostos nos casos pelo Código da Justiça Militar, a lei 17.798 sobre controle de armas.

22/09/1973

10 Suspende a visita semestral à prisão correspondente ao segundo semestre de 1973. 20/09/1973 12 Cancela a personalidade jurídica da Central Única de Trabalhadores (CUT). 24/12/19 77 Declara os partidos políticos que indica ilegais e dissolvidos. 13/10/1973 78

Declara em recesso todos os partidos e entidades políticas, grupos ou movimentos políticos não incluídos no enDecreto 77

de 1973. 17/10/1973

81

Estabelece penalidades para aqueles que desobedecem à chamada pública de comparecer perante as autoridades que, por razões de segurança do Estado, fazem o governo e para aqueles que retornam ao país., violando as disposições indicadas.

06/11/1973

119 Dissolve o Tribunal Constitucional. 10/11/1973

128 Complementa e esclarece o decreto-lei 1 de 1973. 16/11/1973 198 Estabelece normas transitórias destinadas a regularizar a

atividade sindical. 29/12/1973

384 Declara a exclusiva confiança da Junta de Governo ao cargo de Diretor Geral de Investigações. 28/03/1974

425

Decreto-lei (secreto) ordenado a publicar na parte inserida pelo decreto-lei (secreto). Capítulo VII sobre criminalidade e procedimentos judiciais aplicáveis à violação das regras de mobilização nacional que estabelece.

22/07/1977

521 Cria a Direção de Inteligência Nacional. 18/06/1974 922 Declara o território nacional no estado de sítio em grau de defesa interna. 11/03/1975

1009

Sistematiza as regras de criminalização de crimes contra a segurança do Estado e a proteção legal dos direitos processuais dos detidos por crimes contra a segurança nacional; modifica as disposições legais que indica.

08/05/1975

1094

Estabelece regras para entrada no país, residência, permanência permanente, retorno, reentrada, expulsão e controle de

estrangeiros 19/07/1975

1240 Faculta aos comandantes em chefe da Defesa Nacional para

dispensar o pessoal desta aos requisitos de promoção. 05/11/1975 1593 Aprova a Convenção sobre prevenção e punição de crimes contra pessoas protegidas internacionalmente. 10/12/1976 2191 Concede anistia geral, nas circunstâncias indicadas, pelos crimes indicados. 19/04/1978 2544 Estabelece normas para a realização de sindicatos e reuniões sindicais. 09/02/1979

2621 Modifica o Código Penal e o Código de Processo Penal, em assuntos e associações ilícitas, e complementa nesse assunto a Lei de Segurança Interna do Estado.

28/04/1979 Fonte: Divisão de Projetos Editoriais, 1990 – tradução nossa

Com esses decretos-leis, é possível perceber o panorama da realidade jurídica do golpe. Por. Por exemplo:: uma das principais e primeiras ações da Junta Militar é declarar o Estado de Sítio, através do D.L. 2, o Estado de Emergência no interior do país (D.L. 4) e através do D.L. 5, o entendimento de que o Estado de Sítio na verdade deveria ser tratado como Estado de Guerra devido àà comoção interna que marcava o país, sendo que esse só foi revogado em 16 de março de 1974.

Assim, o que vemos no Chile após o golpe de Estado é um período de atroz repressão e supressão de direitos.Grandes símbolos do país, como o Estádio Nacional, foram transformados em bases para as operações militares que visavam o extermínio de todas as pessoas a favor do governo de Allende ou que poderiam ser amplamente contráriascontrárias ao novo regime que se instalava, – característica que marcou a política do Estado chileno por mais de 15 anos.

Ainda sobre o tema, Francisco Fuentes e Sepúlveda afirmam que a implementação dessa verdadeira indústria de tortura, desaparecimento forçado e extermínio, constitui uma das faces representativas e ferozes das políticas estaduais de terrorismo no Chile” (SAN FRANCISCO, FUENTES e SEPÚLVEDA, 2010, p. 93). Ainda, os autores revelam que esses espaços de tortura eram essenciais para criar no imaginário social o estigma da tortura:

Os diferentes recintos e estabelecimentos ocupados pela Ditadura Militar, sem dúvida, não foram projetados para reprimir, no entanto, uma vez desencadeado “o Golpe”, espaços como o Estádio Víctor Jara se tornaram indispensáveis para torturar e aniquilar cidadãos contrários ao regime. Assim, o estádio foi interposto, reapropriado e ressignificado para fins de violência política, transformando suas configurações espaciais e tornando-se um lugar onde diferentes fenomenologias da morte, tortura e repressão política tomaram forma. (SAN FRANCISCO, FUENTES e SEPÚLVEDA, 2010, p. 94 – tradução nossa)

A violência política é relevante relevante, assim como a representação da morte, da tortura e da repressão política pois, como bem analisa Naomi Klein em seu livro “A Doutrina do Choque” (2007), a tortura nesses casos deixa de ser uma experiência vivenciada por apenas um indivíduo de forma pessoal: ela reprime todo o corpo coletivo, que passa a ser violentado de forma sistemática.

O General Augusto Pinochet comandou o país durante os 15 anos seguintes. A partir da categorização de Marcelo Raffin, podemos ver que não foi um período homogêneo, com particularidades essenciais para compreender o que permitiu o regime durar esse tempo e o que desencadeou seu final e a transição para a Democracia:

A ditadura chilena pode ser dividida em quatro etapas, a fim de entender melhor um processo histórico que, caso contrário, poderia parecer muito

confuso: o período de repressão e gestação do regime (1973-1978), o período de consolidação do regime individual (1978-1980), o período dos primeiros sinais de crise (1981-1985) e o período de preparação para a transição (1986- 1989); (RAFFIN, 2006, p. 137 – tradução nossa)

Além da mudança política, o novo governo liderado por Pinochet necessitava de um plano econômico que desse resultados muito positivos e que se distinguisse totalmente da política adotada por Allende, aa qual vinha sendo boicotada nos últimos meses e gerando a hiperinflação e descontentamento de setores sociais. Considerando isso, o Chile se tornou um laboratório das visões econômicas da Escola de Chicago, que tinha em Thomas Friedman seu principal líder.

É preciso ressaltar que a parceria intelectual que resultaria também nas bases do pensamento econômico vigente no Chile nas décadas de 1970 e 1980 tinha suas raízes em anos anteriores, como bem aponta Fredrigo: foi em 1956 que se firmou um convênio de Cooperação Internacional entre a Universidade de Chicago nos Estados Unidos e a Universidade Católica do Chile, como aponta a autora:

Havia interesses de ambos os países envolvidos neste pacto. No caso da instituição chilena, o intercâmbio respondia à busca de modernização acadêmica. A atração por novos paradigmas, que estivessem distantes da perspectiva marxista ou desenvolvimentista, contribuía para que se visse o acordo como indispensável para a reformulação universitária. Os Estados Unidos, por sua vez, consideravam a situação como ideal para difundir os preceitos neoliberais na América Latina. Além do mais, se este último objetivo fosse alcançado, ele acabaria neutralizando a influência da CEPAL (Comissão Econômica para a América Latina) e da Faculdade de Economia do Chile. (FREDRIGO, 1998, p. 34)

Um dos principais pontos que o novo regime precisou abarcar era a necessidade de se afastar completamente das ações que o governo popular tinha tomado até então. Foi nesse contexto que os intelectuais econômicos formados pela parceria entre EUA e Chile puderam se articular com a política e estabelecer os credos do neoliberalismo em sua essência. É importante reforçar também o papel fundamental que esse corpo de economistas ainda, ainda que dentro do governo, não faziam parte das Forças Armadas que tomaram o poder. E essa diferenciação é essencial para firmarfirmar a autonomia de suas ações.

Para calcular a efetividade desses feitos foram selecionados alguns indicadores para balancear as ações do neoliberalismo tanto para o crescimento do Chile quanto em aspectos negativos do país. Para isso, foram elencados o Produto Interno Bruto (PIB) chilenochileno, os gastos do governo, o valor da inflação e da indústria de valor agregado, tentando estabelecer um quadro do cenário que o país vivenciou nos quinze de governo Pinochet. Alguns dados não existiam na época ou não eram averiguados com tanta

frequência, principalmente indicadores sociais, o que dificulta a análise em alguns quesitos.

Estudar o PIB de um país é fundamental para perceber o crescimento real de sua economia. O ano de 1970 marca o início do governo de Salvador Allende e vemos que em momento algum houve diminuição no PIB durante sua gestão;; pelo contrário, há um crescimento moderado, mas real. Após o golpe militar de 1973, o país encarou uma série de reformas feitas pelo Estado chileno aliada àà insegurança que um golpe justificado ou não atribuía aos investidores.

Os anos que se seguiram foram marcados pela recessão e o aumento do desemprego. Só a partir de 1976 começou a retomada da economia; em 1978, recuperou- se o que foi perdido na crise e há um crescimento de fato, que alcança níveis muito positivos e que foram nomeados como o “primeiro milagre econômico” chileno.

É interessante perceber ainda que as demais ditaduras do continente sul-americano também tiveram momentos de milagres econômicos durante esses períodos financiados pelo capital externo. No caso do Chile, a economia conseguiu se reestruturar de tal forma que mesmo com as crises do final dos anos 1970, ela voltou a crescer, sendo possível a a evolução ao longo dos anos 1980, o que na época do plebiscito de 1988, por exemplo, era muito positivo, pois havia uma sensação de riqueza e desenvolvimento compartilhada em alguma medida pela sociedade civil.

Gráfico 1: PIB do Chile de 1970 a 1990

Entretanto, esse modelo também entrou em crise devido a conjuntura internacional do final da década de 1970 e início dos anos 1980. Para tentar conter o contexto interno e a dependência externa, as autoridades do país adotaram uma postura de maior protecionismo econômico, aumentando o tamanho da máquina estatal e colocando em xeque algumas questões, como a diferença entre o Estado Mínimo e o Estado de Bem-estar Social. A partir de 1984, houve outra recuperação da economia, como já analisado, sob a administração de Büchi.

Essa ideia é importante por ser também uma contraposição ao projeto de Estado proposto pelo governo de Allende, que a longo prazo abarcaria mais a sociedade. Aproveitando a ideia sobre a diferença do tamanho do Estado, uma informação pertinente de ser analisada são os gastos do governo para a sua manutenção e existência, ou seja, considerando todo o PIB do país, quanto dele é destinado para a existência da máquina pública:

Gráfico 2: Gastos do Governo em Relação ao PIB do Chile (1972-1990)

Fonte: Banco Mundial

Podemos ver que de 1972 até 1973 há uma diminuição de cerca de 6% nos gastos governamentais. Essa informação é muito útil ao pensar o período final do governo de Allende e suas propostas de reformas e ações, e que também corresponde ao período em que o governo da Unidade Popular passou a ter mais problemas com investimentos externos. Então, mesmo que houvesse um crescimento do PIB ainda era necessário conter gastos em outros setores.

Entretanto, os dados mais importantes constatados são a gradativa diminuição dos gastos, a partir de 1984, que basicamente reduzem pela metade os gastos totais. Esse momento é marcado pela nova onda de medidas neoliberais adotadas. Essa informação é muito válida em comparação com a progressão do PIB nesse período, uma vez que esteeste aumenta substancialmente, enquanto os gastos governamentais diminuem em igual grandeza.

Uma dasprioridades do governo de Pinochet e que foi bem orquestrada foi o controle da inflação. Se por um lado esse era um problema que assombrou boa parte do governo de Allende, o mesmo não acontece com Pinochet. Ainda que nos primeiros anos do regime a inflação tenha crescido de forma vertiginosa, a partir de 1977 ela alcança patamares relativamente baixos e que não eram vivenciados no Chile há bastante tempo. A seguir podemos conferir a evolução desse dado:

Gráfico 3: Inflação no Chile (1970-1990)

Fonte: Banco Mundial

A inflação é um dos indicadores disponíveis pelo Banco Mundial mais precisos para se medir o poder de compra do país no período12. Com o desabastecimento

provocado como reflexo às reformas de base propostas nos anos iniciais do governo de Allende, umas das reações do governo é a impressão de moeda para tentar acelerar a

12 Existem outros indicadores, no entanto, para o período analisado nesse artigo, a inflação é o indicador

economia e gerar o consumo. No. No entanto, isso gera inflação, ao haver muito dinheiro circulando.

Dessa forma, uma das primeiras ações do governo de Pinochet, liderada pelos Chicago boys13 era o controle da inflação a partir de uma lógica monetarista, na qual o

controle do capital, e com o papel da política monetária, era essencial para o desenvolvimento do país. (FAZIO & RAMÍREZ, 1977; BARDON, CARRASCO & VIAL, 1985)

E de fato, dá certo: o país mantém uma das menores inflações do continente. No entanto, um dos preços a serem pagos por isso é a desindustrialização da economia, ou seja, o desmantelamento da indústria de base chilena, que pode ser percebidovisto no gráfico a seguir:

Gráfico 4: Indústria de valor agregado no Chile (1970-1990)

Fonte: Banco Mundial

Há uma industrialização durante o governo de Allende que é resultado também das ações e do plano de base do então presidente, que pretendia promover um desenvolvimento seguro e sustentável para o país, além de investir os ganhos com a nacionalização do cobre. Além disso, durante esse período, várias companhias internacionais foram nacionalizadas, o que ajudou a aumentar o número de empresas.

13De acordo com Memoria Chilena, os Chicago Boys foram um grupo de economistas chilenos que se

formaram inicialmente na Pontifica Universidade Católica de Chile ou na Universidade de Chile e continuaram seus estudos na Universidade de Chicago, graças ao convênio entre as instituições. Esse convênio previa o intercâmbio de professores, a criação de um centro de investigação econômica no Chile, entre outras coisas. (MEMORIA CHILENA, 2020)

Durante os anos seguintes, estas sofrem um completo desmanche: asAs nacionalizações foram desfeitas, há um alto custo de multas, e o Chile voltou-se para a exportação de itens primários, como o próprio cobre, mas também frutas, principalmente a uva. Os momentos em que houve investimento nas indústrias do país coincidem também com as crises do modelo, necessidade de alteração de algum fator, como a adoção de políticas Keynesianas. Durante os quinze do governo de Pinochet o que pode ser visto é um desmonte da industrialização do país.

As crises resultantes do modelo econômico norte-americano foram marcantes na medida em que é a partir dos anos 1980, com um crescimento expressivo em 1983, que ressurge no Chile a resistência organizada ao governo de Pinochet. A partir disso, ressurge no Chile a organização de mobilizações sociais que tiveram como palco as protestas, como aponta Fredrigo, que busca compreender os “alcances e limites das jornadas de protesto” e avaliar “as causas das mudanças ocorridas no interior da oposição política que