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CAPÍTULO 4 – O ENSINO SUPERIOR COMPETÊNCIAS E QUALIDADE

4.3 Os desafios da qualidade no Ensino Superior

Ao nível de Moçambique, a qualidade do ensino superior tornou-se mais exigente depois de um percurso histórico turbulento. Para Langa (2012) tudo começa pela mercantilização do ensino superior em Moçambique, referindo-se à reorientação das universidades de acordo com os princípios e a lógica do mercado - tanto no âmbito estatal como no privado. E aí prevaleceu o princípio da competição, desde 1990 com a democracia multipartidária e a economia do mercado. Nessa altura, aprovou-se a Lei 1/93 do ensino superior. A partir de 1994/5 surgem diversas instituições privadas de ensino superior e depois de 10 anos já existiam dezenas de universidades. Tratava-se de um fenómeno de extensão muito acelerada do ensino superior. As questões de algumas das novas universidades privadas foram, de acordo com Langa (2012) e Rosário (2012): más condições das instalações, exiguidade de equipamento, bibliotecas, número mínimo de docentes a tempo inteiro e respetivos graus, bem como a inexistência de laboratórios. Os autores continuam ainda afirmando que para além dessa situação de algumas das novas universidades privadas, também as antigas universidades públicas, por causa da insuficiência financeira, decidiram cobrar taxas elevadas aos seus estudantes noturnos propondo cursos, de economia, contabilidade, gestão de empresas nas faculdades de letras, de ciências sociais e nas instituição de cursos de cariz psicopedagógico (em 2007). Era uma forma de angariar receitas e subsistir face às despesas, sendo que para Langa (2012) estas instituições eram públicas de dia e privadas de noite. Nas universidades privadas, os estudantes pagavam propinas ao preço competitivo do mercado. Os curricula das universidades foram modificados orientando-os para o mercado, tais como, secretariado, contabilidade e auditoria, gestão, relações públicas e marketing, técnicas de comunicação, gestão de recursos humanos, história política. Assim, já estava instalado o preceito de relação entre o ensino superior e o mercado. Para Langa (2012) se, por um lado, esta abertura permitiu a extensão do ensino superior até aos diversos distritos e a arrecadação de mais receitas, por outro lado foi descaraterizando a instituição com a crescente ambivalência da sua missão. Havia uma corrida para os diplomas e pelo dinheiro. Diplomas esses, de acordo com Rosário (2012) que transportam consigo o vírus da suspeição, sobretudo no confronto com os diplomados estrangeirados. Rosário (2012) e Langa (2012) observam ainda que houve nas universidades, multiplicação de horas para os mesmos docentes, pois eram poucos para várias universidades onde prestavam serviços de lecionação em períodos determinados. Para algumas universidades as turmas tinham acima de 50 estudantes e ainda assim as taxas de aprovações eram elevadas. Isto tocava o nível de qualidade nas universidades. Os autores apontam que nas Universidades Católica e depois algumas faculdades da UEM, formavam-se

licenciados passados pouco mais de três anos, mesmo sabendo do nível de qualidade baixa do ciclo primário, básico e secundário em Moçambique. De acordo com Dias (2012) o ensino por módulos entrou na moda nos cursos de muitas universidades moçambicanas, sobretudo nos cursos de Pós-Graduação, com deficiências nas práticas pedagógicas.

Como implicações, tanto Rosário (2012) como Langa (2012) apontam que esse cenário fez com que houvesse baixa qualidade do ensino superior, a procura do conhecimento diminuiu, a expansão foi desregulada com as condições de aprendizagem péssimas. Diante desta situação, o próprio governo e o conselho dos reitores em Moçambique fizeram da qualidade sua prioridade começando a implementar uma série de iniciativas para regular o sistema de ensino superior, incluindo o estabelecimento de mecanismos de avaliação, controle e garantia de qualidade.

Desta forma, a necessidade de políticas publicas sobre o ensino superior tornou-se cada vez mais crucial para que nem os governos e nem qualquer instituição privada interfiram diretamente na produção de uma série de diretivas para a estruturação e governação do ensino superior. Então, após a independência de Moçambique, a primeira forma estruturada de coordenação e governação do ensino superior surgiu com a criação do Ministério do Ensino Superior Ciência e Tecnologia (MESCT) em 2000. Este Ministério criou os seguintes órgãos: o Conselho Nacional do Ensino Superior (CNES), o Conselho do Ensino Superior (CES) e, mais tarde, o Conselho Nacional de Avaliação de Qualidade do Ensino Superior (CNAQ) - que para Langa (2006) são exemplos que caracterizaram a criação de estruturas governativas do ensino superior. Para Rosário (2012), no quinquénio (2005/2009) em que o Ensino Superior fica sob tutela do Ministério de Educação e Cultura em Moçambique, nota-se uma desarticulação entre Ensino Superior e Ciências e Tecnologia assim como entre os diferentes níveis de coordenação do ensino superior. E, quando o Ensino Superior, Ciências e Tecnologia permanecem no mesmo Ministério (MESCT) então resulta uma articulação que facilita a governação deste ensino.

Langa (2014) coloca a dois níveis os desafios da governação do ensino superior em Moçambique: (i) a passagem da formulação de políticas públicas com base na intuição derivada da experiência de gestão ou com suporte de estudos assistemáticos – fundamentalmente de consultoria. (ii) repensar a própria governação do ensino superior e a coordenação do sistema assim como a articulação dos vários órgãos nos diferentes níveis do sistema. Os órgãos e instrumentos já aprovados incluem o Quadro Nacional de Qualificações de Ensino Superior (QUANQES), o Sistema Nacional de Acumulação e Transferência de

Créditos (SNATCA), o Sistema Nacional para a Avaliação da Qualidade (SINAQES) e a estratégia de Financiamento do Ensino Superior, (CNES, o Conselho do Ensino Superior (CES) e, mais tarde, o Conselho Nacional de Avaliação de Qualidade do Ensino Superior (CNAQ) que vela sobretudo pelos técnicos profissionais de nível superior capacitados em diversas sub-áreas do ensino superior.

Tal como observou Rosário (2012, p. 99) “as estratégias seguidas em relação à expansão do ensino superior em Moçambique e as medidas tomadas para a sua efetivação não tomaram em linha de conta a defesa de padrões, que, em princípio, deviam ser considerados como fundamentais para que a educação superior se mantenha nos parâmetros adequados”. De modo geral, conclui Langa (2014), com o quadro de criação e disposição de Instituições do Ensino Superior em Moçambique a governação desse ensino superior em Moçambique faz-se com algum conhecimento experiencial, e com muita política populista. Para o autor, esta política traduz-se, infelizmente, na ilusão de que da quantidade sai qualidade e com muito pouca ciência.

Para Dias (2012), as competências do professor universitário hoje são múltiplas e exige-se dele uma formação mais complexa. O docente deve saber, no sentido de pesquisar conhecimentos científicos atualizados, participar em eventos científicos, investir e usar métodos, técnicas de ensino e aprendizagem modernos e adequados, planificar e gerir currículos. Para além disso, o docente deve saber fazer, isto é, deve procurar ter habilidades específicas da área, saber comunicar, procurar trabalhar em equipa e em cooperação, relacionar conhecimentos tendo a capacidade de transdisciplinaridade, dominar novas tecnologias. E, mais ainda, o docente deve saber estar, ser e estar com os outros, como também defenderam, para além de Morin (2000) e outros autores, sobretudo Sá-Chaves (2008) quando refletiu sobre novos paradigmas, novas competências, e identidade-docente. O docente, continuando na linha de Dias (2012) deve saber cooperar, respeitando os outros, considerando as diferenças, refletindo criticamente, apreciando o belo defendendo os valores éticos e morais. Leite e Martins (2006), defendem que os docentes são também supervisores de trabalhos científicos dos seus estudantes e sendo assim deve haver uma relação de competência entre supervisor e o supervisionando para privilegiar mais a aprendizagem sem autocracia. Os autores Leite e Martins (2006, p. 51) observam que:

Registra a fraqueza intelectual dos orientadores, pois, apesar de ser um aspeto institucional a escolha de uma linha de pesquisa específica para desenvolvimento do trabalho de pesquisa, foi notada uma rejeição, por parte dos orientadores, aos temas que estão fora dos seus interesses. Quando agem desta forma, destituem-se do seu papel de educador e do desafio de,

juntamente com o orientando, buscar coisas novas, ou até um desentendimento do que é orientar e do papel do orientador como educador.

Esses são alguns dos muitos desafios que as universidades devem enfrentar para se adaptarem às condições atuais do século XXI. E, quando se diz desafio das universidades, para Dias (2012) não nos referimos simplesmente à Universidade como Instituição com os seus dirigentes. Trata-se da Universidade incluindo, sem falta, os dirigentes, os professores, os próprios estudantes e todo o pessoal administrativo. Desta forma, de acordo com o autor, a Universidade deve saber articular as exigências de um currículo homogéneo com as necessidades de diferenciação e individualização do ensino e da aprendizagem e deve ser capaz de articular os saberes universais, com os particulares e os locais. E Silva (2002) defende que as universidades devem também ter em conta as oportunidades e as necessidades de cada contexto e conjuntura. Isto porque a formação superior deve assumir características de instituição capacitadora de recursos humanos qualificados para o mercado de emprego, de acordo com a realidade social, económica e cultural.