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Os discursos de lazer e cultura nacional e internacional (2004-

3.1 A FERMENTAÇÃO DISCURSIVA SOBRE A HOMOFOBIA NA

3.1.3 Os discursos de lazer e cultura nacional e internacional (2004-

Levando em conta o largo período estudado - de 2004 a 2009 - em termos proporcionais é perceptível uma queda na quantidade de matérias com a veiculação de discursos de lazer e cultura nacional e internacional, num total de 23 e 19 casos, respectivamente. De outra parte há uma tendência de maior segmentação do público alvo, com a abordagem de assuntos de interesse da comunidade LGBT, em matérias como as seguintes:

Cotidiano da edição dominical de 10.06.07, p. C4

O fragmento discursivo relacionado com a homofobia veio na voz do jornalista autor da matéria da reportagem local, que frequentando boates, churrascos e festas de pagode, percebeu traços homofóbicos entre muitos frequentadores desses locais, apesar de voltados ao público gay e lésbico, cujas vozes aparecem no decorrer do texto.

Alguns espetáculos encampam de modo declarado a luta contra a homofobia, como no caso divulgado na Ilustrada do dia 23.12.04, uma quinta-feira:

Parte da p. E6 da Ilustrada do dia 23.12.04.

No material pinçado o uso discursivo se dá tanto pelo jornalista da reportagem local, como pelo artista ouvido, no caso o diretor teatral José Celso Martinez Corrêa, que monta uma peça para homenagear o irmão que foi vítima de uma assassinato com motivação homofóbica na década de 1980.

Numa indicação da silenciosa mudança de tempos e de sensibilidades que se processava, começaram a ser destacadas notícias diferentes no campo cultural e de lazer, não sobre iniciativas, obras e espetáculos engajados na luta contra a homofobia, como era de praxe. Mas, sim, denúncias e notícias sobre espetáculos, filmes, músicas ou programas cuja nova sensibilidade social passa a identificar e denunciar como fomentadores da homofobia. Neste sentido a filtragem que remeteu para a Ilustrada do dia 18.10.05, uma terça-feira, é um bom exemplo:

Página E8

A referência à homofobia surge já no título em destaque, sendo associada no decorrer do texto à "'prática de discriminação por orientação sexual', contra gays, lésbicas, bissexuais e transgêneros", tal como compreendido pela procuradora regional dos direitos humanos no Distrito Federal, presente em voz indireta.

A mesma tendência de convívio de práticas discursivas ora enaltecendo a engajada luta contra a homofobia, ora condenando iniciativas consideradas homofóbicas, é perceptível no âmbito do tipo discursivo de lazer e cultura internacional sobressaem-se notícias indiretamente relacionadas com a temática da homofobia, com prevalência (seis entre os nove casos) de matérias divulgando ou então criticando filmes estrangeiros como os norte-americanos "Borat" e "Bruno", o norte-americano e canadense "Brokeback Montain", o germano-americano "Kinsey, vamos falar de sexo" e o francês "Entre os Muros". Constatei, no entanto, uma tendência que os exemplos abaixo deixam transparecer:

Dia, 26.09.04, Domingo, Primeiro Caderno, p. 22.

Dia 20.05.08, terça-feira, Primeiro Caderno, p. 17.

Ou seja, no campo dos discursos relacionados com a lazer e cultura internacional há uma abertura de espaços para o contexto latino- americano. Os interlocutores ouvidos são ativistas, artistas, com destaque para uma travesti que vira celebridade na argentina ao participar de uma telenovela exibida em horário nobre, além da sexóloga Mariela Castro que organiza uma jornada gay em Cuba, com eventos contra a homofobia. Nos dois casos transparece a noção de que o conceito de homofobia é autoevidente.

3.1.4 Os discursos sobre realidade internacional e sobre realidade internacional associada a realidade nacional (2004-2009)

Entre as quatorze matérias identificadas no segmento discursivo relativo a realidade internacional primeiro faço menção ao material pinçado no Primeiro Caderno do dia 10.12.04, uma sexta-feira, quando uma notícia intitulada "França deve vetar discurso homofóbico" explica a tramitação na Assembleia Nacional daquele país de um projeto de lei que tem por objetivo reprimir discursos preconceituosos ou difamatórios com base na orientação da orientação sexual de qualquer pessoa. A referência à homofobia surge na fala do Ministro da Justiça para o qual a lei é necessária para coibir o aumento de homofobia no país. Na mesma página 12 há outra notícia em destaque, guarnecida de uma foto colorida de um casal gay, com o título "Supremo do Canadá libera casamento gay."

Em 19.06.05 a filtragem remeteu para a noticia "Igreja reage a união gay na Espanha", encontrada em um domingo, Primeiro Caderno, folha 25, sendo que o fragmento discursivo de interesse apareceu na voz indireta do jornalista redator ao fazer referência à nota divulgada pela Federação LGBT daquele país contra a homofobia, sendo ouvidos, ainda, representantes da Conferência Episcopal Espanhola, políticos e ativistas. Já no dia 21.05.07, uma terça feira, o Primeiro Caderno em sua página A12 traz notícia relativa a realidade peruana. O discurso surge em uma nota66 do Movimento Homossexual de Lima que denuncia a perseguição do Grupo Sendero Luminoso aos homossexuais do país.

A formula preponderante de associação de matérias sobre a realidade internacional com a realidade nacional característica do período inicial de surgimento de discursos sobre a homofobia perde

66 "Nos panfletos distribuídos em várias regiões do país na madrugada do Dia Internacional de Luta contra a Homofobia (17 de maio), a organização Sendero Luminoso também comemorou o 27º aniversário de sua luta armada e ameaçou a comunidade homossexual."

espaço, eis que nos seis anos em foco tal prática foi identificada somente em uma oportunidade:

Dia 18.07.04, Domingo, Primeiro Caderno, p. 17.

A matéria sobre a realidade internacional traz o título "Ativismo gay causa homofobia, diz anistia", embora sua leitura indique que, na realidade a afirmação da entidade tenha sido no sentido de que a maior visibilidade conquistada pelas demandas LGBT, estava gerando um refluxo conservador e homofóbico. No mesmo espaço é divulgado um estudo da Anistia Internacional, com dados sobre a homofobia ao redor do planeta inserida numa lógica de promoção de direitos LGBT como direitos humanos. As práticas discursivas destacadas são encampadas pelo jornalista redator da matéria, de Londres e da pesquisadora britânica responsável pelo estudo.

Já na parte inferior da página a realidade brasileira é explorada em reportagem produzida por jornalista da redação local - "Parada gay

não barra avanço da homofobia em SP" - da qual transcrevo aqui a seguinte parte:

São Paulo lidera

Na ausência de dados oficiais sobre a homofobia, são os próprios ativistas do movimento gay que fazem o levantamento, com base em reportagens e denúncias.

Esses levantamentos colocam São Paulo como o Estado líder em assassinatos de homossexuais: 71 casos entre os anos 2000 e 2002, segundo o Grupo Gay da Bahia (GGB).

"Os dados com certeza são subestimados. Faltam informações de sete Estados e, em muitos casos, a família esconde a homossexualidade da vítima ou a polícia não a revela", explica Luiz Mott, fundador do GGB. Ainda assim, a média no Brasil é alta: um assassinato a cada três dias.

Outros ativistas enfatizam que boa parte dos casos de violência se dá no âmbito doméstico e familiar, e elogiam o lançamento do "Brasil sem Homofobia".