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6. Tecnologia da exploração mineira

6.1 Sistema de aprovisionamento hidráulico

6.1.2 Os diversos canais conhecidos (Fig 24)

Os canais que faziam o transporte da água, a partir da sua captação, são bastante semelhantes, quer se trate de uma exploração aluvionar ou uma exploração de jazida primária, a céu aberto ou pelo sistema de poços e galerias. Ao contrário do que se poderia pensar, os canais que transportavam a água eram estruturas muito frágeis e perenes, que não eram, como os aquedutos e canais que alimentavam urbes e villae, construídos para durar permanentemente. Numa exploração mineira, não era possível saber quanto tempo esta ia durar: tanto poderia demorar alguns anos, como séculos. Tudo dependia da riqueza do filão.

Assim, o investimento nos canais de transporte de água era mínimo, sendo estes constituídos por uma vala de água, na maior parte dos casos, aberta na terra, fluindo para cisternas e depósitos de armazenamento. Não se tem encontrado canais em argamassa nas explorações mineiras. Como os canais eram frágeis, era imperativo que os mesmos tivessem

muito pouca inclinação, para evitar que a velocidade da água os destruísse, e esta se perdesse pelo caminho. Outra das suas típicas características, é serpentearem ao longo das curvas de nível, às vezes com dezenas de quilómetros de extensão. Este cuidado com a inclinação dos canais, havia já sido teorizado por Vitrúvio. Muitos autores creem mesmo que para se atingir esta perfeição, os romanos utilizavam o corobata ou corobathes (nível). Em Llamas de Cabrera (Sierra del Teleno, Espanha), a inclinação dos canais varia entre 0,15% e 0,4% (Matías Rodriguez, 2005: 289). Nas zonas com vertentes muito inclinadas era necessário construir muros e muretes de sustentação do canal (Fotos 4, 5 e 6). Quando não era possível desviar o canal, este era obrigado, por vezes, a romper por entre afloramentos rochosos, onde a rocha era talhada com o formato do canal (Fotos 7, 8 e 9) ou abrir uma trincheira no meio da qual este passava, como é o caso do canal do Conhal do Arneiro (Nisa) (Batata, 2010b) (Foto 10). Por vezes, os canais passavam em zonas muito escarpadas e outras vezes tinham que vencer vales, sendo construído um aqueduto aéreo, como aconteceu na área das conheiras do Codes (Batata e Gaspar, 2000: 26) e como existe na Serra do Teleno (León, Espanha). Finalmente, para evitar muitos quilómetros de construção de canal, abriam-se túneis na rocha que permitiam encurtar significativamente o trajeto. Foi assim em Tresminas, como foi também na Serra do Teleno e em Lamas de Cabrera. A rede de canais do Teleno, foi considerada por Claude Domergue (1987: 337), e outros autores, como a mais complexa de todo o noroeste peninsular. O encurtamento dos canais fazia-se sempre que possível, tanto para evitar as perdas de água, que se somem com os quilómetros, como para evitar a evaporação. Quando não havia água suficiente nas proximidades, tinha-se que a ir buscar mais longe, mesmo que tal significasse alguma perda de rendimento.

A maior parte dos canais encontra-se hoje colmatado por sedimentos que a erosão arrastou para o seu interior. A sua existência é denunciada pelos troços de canal escavados na rocha ainda existentes, pelos muros e muretes mais ou menos derrubados existentes nas zonas de exploração mineira, ou pelos afeiçoamentos de rocha que permitiam nivelar o assentamento dos muros e construir o próprio canal. Não se sabe qual a inclinação dos mesmos, mas esta parece enquadrar-se nas medidas estipuladas em época clássica e aproximarem-se das inclinações rigorosamente medidas por Matías Rodrigues na Serra do Teleno (León, Espanha).

A largura dos canais é-nos dada, na maior parte dos casos, por aquilo que é visível à flor da terra, ou seja, os troços escavados nos afloramentos rochosos. Dado que a investigação

arqueológica, através da escavação arqueológica em complexos mineiros é muito diminuta, cara e pouco motivadora, este é o método mais fácil e menos dispendioso de obter o traçado dos canais. Mas existem casos de escavação arqueológica de canais, e em Tresminas temos dois exemplos disso. Um realizado por Jürgen Wahl, na entrada do Túnel do Pedroso (Foto 11) e o que resultou das nossas escavações no Povoado Romano da Veiga da Samardã (Foto 12).

Os canais tinham uma largura entre os 50 e os 100 cm, na maior parte dos casos, dependendo a profundidade das necessidades de nivelamento do canal. Em Jales, verificou-se a existência de canaletes de menor largura e profundidade. Os canais da Sierra del Teleno, apresentam largura entre 60 e 90 cm, tendo o mais comprido a extensão de 21,3 km (Matías Rodriguez, 2006: 249 e 254), larguras entre 90 e 180 cm em Llamas de Cabrera, com um dos canais a atingir os 143 km de extensão (Matías Rodriguez, 2005: 288), e o do Conhal do Arneiro, com 50 cm de largura.

A média de 135 cm para os canais que alimentavam Las Médulas e outras explorações secundárias e primárias (Teleno) (Pérez González & Matías Rodríguez, 2011: 401), deve ser considerada excecional, pois na maior parte dos casos apresentam larguras inferiores. Muitos destes canais apresentam um corredor de serviço, para operações de manutenção e limpeza, situação que também se verifica em Tresminas, nos canais C1, C3, C4 e C11, onde os caminhos de serviço apresentam larguras entre 1,5 a 2 m, possibilitando o trânsito de um carro.

O canal C1 (SA 31) faria a ligação entre a Barragem das Ferrarias (Rio Tinhela) (SA 01) e a Cisterna (SA 07) (junto ao Povoado Romano de Tresminas), numa extensão de cerca de 6 km. Embora se encontre muito colmatado, são visíveis vestígios de afeiçoamento da rocha, à saída da barragem, na margem esquerda do rio Tinhela, em dois níveis distintos, o que pressupõe a existência de dois canais, a cotas diferentes. Tal constatação, demonstra-nos que a Barragem das Ferrarias não teria inicialmente a altura de 30 m, sendo mais baixa. Junto da estrada Tinhela de Baixo – Tresminas, no corte esquerdo da estrada, é visível uma camada de areia e pequenas pedras, de tom avermelhado, que corresponde ao enchimento do mesmo. Antes da cortada para a povoação de Cortas, devido a um incêndio ocorrido em 2010, era visível a plataforma de assentamento do canal, com algumas pedras de sustentação, bem como o caminho de serviço, com cerca de 1,5 m de largura, a avaliar pelas medidas tomadas no caminho de serviço do Canal de Cevivas (C4). O canal teria uma largura de cerca de 100

cm, a avaliar pela largura do canal C2, junto ao Túnel do Pedroso, com largura entre 90 e 100 cm de largura.

O canal C2 (SA 06) faria a ligação entre a Barragem do Vale das Veias (Rio Tinhela) (SA 02) e a Cisterna, numa extensão de cerca de 8 km. Pouco do seu traçado é detetável, com exceção do troço subterrâneo do Túnel do Pedroso (SA 06) e um pequeno troço junto à Cisterna. Com efeito, um pouco a montante da Cisterna, são visíveis no terreno, duas plataformas paralelas e a cotas diferentes, que nos parecem ser as condutas C1 e C2.

O Túnel do Pedroso foi construído segundo os modelos estabelecidos por Vitrúvio, com poços de arejamento a cada actus, ou seja, de 35 em 35 m, no total de 5 óculos ou poços de ventilação e iluminação, conforme observou o investigador alemão Jürgem Wahl.

Foi também alvo de escavações arqueológicas, realizadas pelo arqueólogo alemão, num troço de 5 m a montante, englobando parte do canal dentro do túnel e parte já no exterior, e que nos permitiu observar as camadas de assoreamento que colmatam o seu interior quase até ao teto. A jusante, a terraplanagem de um caminho rural, deixou à vista o traçado do canal de cor castanho- escura, contrastando com o esverdeado dos xistos de base, numa extensão de 50 m.

O canal C3 (SA 32), com cerca de 20 m de comprimento reconhecido no terreno, e com uma largura mais estreita que os anteriores (80 cm), teria a sua origem no Ribeiro das Fragas, onde deve ter existido uma barragem ou um açude, passando na margem direita, a meia-encosta; na parte terminal, assenta sobre os afloramentos escarpados das Fragas Negras, onde são visíveis afeiçoamentos das rochas para assentamento do muro de sustentação do canal e caminho de serviço, terminando no enfiamento do Aqueduto I, através da escavação e nivelamento do afloramento rochoso. Teria um comprimento total de 1 km, se considerarmos que a captação seria feita neste local. Com efeito, a quantidade de água acumulável não seria grande, pois não se conhece nenhuma nascente e a bacia hidrográfica é pequena.

Outras possibilidades, seriam a existência de um aqueduto aéreo, provindo a água do Canal de Cevivas (C4), e nesse caso, teria uma extensão total de cerca de 5 km ou então, o canal de Cevivas alimentaria a barragem ou açude aí existente, reforçando o manancial de água necessária.

m em terra, com muros de sustentação para o caminho de serviço, provinha de uma barragem de que já não há vestígios, situada provavelmente no Regato do Sabugueiro e destinava-se a alimentar, ou uma exploração independente, na área de Cevivas, ou então alimentava a barragem de onde saía a C3. Apresenta largura entre 70 e 90 cm, a altura máxima de rocha cortada atinge 1,5 m, e a altura do canal tinha 40 cm, com a rocha afeiçoada no rebordo. O muro de sustentação do caminho de serviço, toscamente construído (Foto 5), para que pudesse assentar na rocha inclinada, foi talhado em degraus de assentamento (Foto 4), que impediam as pedras de resvalarem pela encosta, e destruírem, tanto o canal como o caminho de serviço.

O canal C5 (SA 34), com cerca de 700 m de comprimento, revelado por um incêndio em 2010, saía da Cisterna, passava a meia-encosta das Fragas Negras, do lado sul, e alimentava o Aqueduto III e provavelmente o Aqueduto II. Não se sabe a largura do canal, por se encontrar repleto de sedimentos e pequenas rochas da íngreme encosta, mas são visíveis os alinhamentos dos muros de sustentação do canal.

O canal C6 (SA 15) foi localizado no interior do Povoado Romano de Tresminas, na Veiga da Samardã, nas escavações arqueológicas de 2007 (Batata, 2007), tendo 1 m de largura e uma profundidade de 2 m. A profundidade atingida destinava-se a encurtar o seu trajeto, poupando cerca de 150 m de escavação em rocha.

Terá a sua origem na Cisterna, e parece dirigir-se à Galeria de Esteves Pinto, onde se situaria uma lavaria da fase inicial dos trabalhos de desmonte da Corta de Covas, tendo um comprimento provável de 500 m. Foi propositadamente entulhado com grandes pedras, talvez em finais do séc. I d.C., de modo a que o povoado se pudesse expandir para sul. Durante o séc. I encontrava-se em funcionamento, com uma ponte de madeira, de 1,40 m de largura, que permitia a pessoas e carros fazer a travessia do mesmo. O sistema de efluentes do povoado (canalizações) estava direcionado para o canal, e do lado sul, corria à sua beira, uma via com 3 m de largura.

É possível que, para além de alimentar a Lavaria da Galeria de Esteves Pinto, alimentasse outras lavarias, pois o incêndio referido, revelou a existência de sapatas incipientes de aquedutos, na encosta norte da Corta de Covas, e o destino seria a Lavaria da Galeria do Pilar. Da mesma forma, poderia alimentar a Lavaria da Corta da Ribeirinha, Lavaria da Galeria dos Alargamentos e Lavaria da Galeria do Pastor II. Nestes casos, teríamos

canais com o comprimento, respetivamente de 1200, 900, 1300 e 1700 m. Tantas lavarias levam-nos a pensar em maior quantidade de canais, e é provável que eles existam, pois Jürgen Wahl assinalou duas trincheiras a sul do povoado romano, que poderiam ter sido criadas para permitir a passagem de canais de água (Fig. 25).

Na área de Jales também se encontram diversos canais, dos quais apenas em um se conhece a origem e o destino.

O canal C7 (SA 35), situado na margem esquerda do rio Tinhela, tem um comprimento de 1 500 m e a largura de 80 cm, dado pela largura da vala escavada na rocha. Como se referiu anteriormente, sabe-se a sua origem, não restando vestígios da respetiva barragem. Destinar-se-ia certamente a uma lavaria que não se encontra identificada, pois o canal perde-se num vale que se encontra agricultado. Tal como os anteriores, também tem troços escavados nos afloramentos e troços sustentados por muros. A extensão reconhecida no terreno ronda os 1300 m.

Se colocarmos a hipótese deste canal alimentar as Minas de Revel, a sua extensão seria de cerca de 3,5 km.

O canal C8 (SA 36) é o que se encontra melhor estudado, sabendo-se a sua origem, na Ribeira da Peliteira, e o seu destino, que era a Lavaria da Ribeira dos Moinhos. Tem um comprimento total de 800 m, assentando a parte inicial em batólitos graníticos cortados para o efeito, e o restante traçado escavado em xistos.

O canal C9 (SA 37) tem a sua origem na Ribeira da Presa e, apesar de não ter sido reconhecido em nenhuma parte do seu trajeto, não poderia alimentar as lavarias de Jales, pois teria que ter uma inclinação muito grande, o que era contraproducente, não havendo exemplo de que os romanos o tenham feito. A ser assim, só poderia alimentar a mina da Fraga das Varandas, situada na ER 206, entre os cruzamentos para Tresminas e Guilhado. Teria uma extensão de cerca 5,5 km.

Na área de Cabanas também se encontra um canal escavado em vários troços de rocha. O canal C10 (SA 28), tem a sua origem numa pequena barragem de terra, no Regato do Sobreiro, e desconhece-se o seu destino, apesar da população referir que alimentaria a

Corta da Ribeirinha. Não é impossível que alimentasse Tresminas, através do Canal de Cevivas, pois sabemos que existem canais com muitos quilómetros, construídos em encostas abruptas, como vimos anteriormente. A ser assim, seria um canal com cerca de 13 km.

Apresenta uma largura variável entre 60 e 90 cm e a altura máxima de rocha cortada é de 2 m. Tinha também caminho de serviço.