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Os impactos causados nas operadoras de planos de saúde

4. A JUDICIALIZAÇÃO DA SAÚDE SUPLEMENTAR E O IMPACTO DAS

4.3 Os impactos causados nas operadoras de planos de saúde

O acesso ao judiciário, como já debatido, é um valor da sociedade moderna. Entretanto, cada vez mais a indústria do direito individual se sobrepõe ao direito coletivo, como consequência disso acaba, paradoxalmente, sendo injusta, porque, quando ocorrem decisões que concedem procedimentos não previstos em lei ou no contrato, prejudica todos os beneficiários daquele plano de quem moveu a ação e todos pagam a conta.

Como se sabe, os recursos da saúde no Brasil são escassos, em razão disto, boa parte da população vai em busca de amparo através do sistema de saúde suplementar. Ocorre que em razão de vários fatores, como por exemplo a crise financeira enfrentada muitas pessoas perderam seu acesso à saúde suplementar. Segundo dados da ANS52, em dezembro de 2014, 50.139.736 de pessoas eram usuárias do sistema de saúde suplementar, atualmente, este

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49 número foi reduzido para 47.152.579, ou seja, mais de 3 milhões de pessoas deixaram de se utilizar do sistema privado. Isso é duplamente grave. Não só porque a fila do SUS aumenta, mas também porque o preço da Saúde Suplementar, com menos segurados para ratear os custos, também será majorado. Subsidiariamente a isto, houve um aumento de 129% nos gastos com judicialização na área de Saúde.

Cada vez mais se mostra necessária a garantia ao acesso à informação, bem como, incentivar o trabalho de grupos de apoio técnico no judiciário para que sejam tomadas decisões cientes e baseadas em dados médicos. É evidente também que ANS comete diversos erros no seu papel de agência reguladora, como por exemplo quando libera registros de operadoras que não têm condições de se manter no mercado, mostrando que seu ciclo de monitoramento, com suspensão de comercialização, é ineficaz. As operadoras, por sua vez, não aplicam a devida transparência na aplicação dos reajustes.

O crescente fenômeno da judicialização da saúde nos tribunais brasileiros tem como consequência direta a desorganização do sistema de saúde, o desequilíbrio orçamentário do setor, além de desigualdades de direito na sociedade. Em 2016, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) contabilizou 103.896 processos na saúde suplementar. No ano de 2015, o gasto aproximado com demandas judiciais ligadas à saúde pública e privada foi de R$ 8,2 bilhões53. Isso reforça a necessidade de se criar políticas mais claras, um sistema de monitoramento mais eficaz, aumentar o alcance das informações para os consumidores, dentre outros.

A maioria das ações que diz respeito à saúde é relativa ao sistema público. Segundo dados do site do Ministério da Saúde, desde 2010 houve um aumento de 727% nos gastos da União com processos para aquisição de medicamentos, equipamentos, realização de cirurgias e depósitos judiciais. Ainda segundo o Ministério, os gastos com as demandas judiciais ligadas à saúde pública foram na ordem de R$ 7 bilhões em 2015, enquanto na Saúde Suplementar esse número gira em torno de R$ 1,2 bi, diz estudo da Associação Brasileira de Planos de Saúde (ABRAMGE).

O sistema de saúde suplementar possui a função de auxiliar o sistema público, ocorre que os baixos investimentos em saúde pública aliada as decisões judicias que analisam apenas caso a caso e não o sistema como um todo, corroboram para o enfraquecimento da saúde

53 Disponível em https://oglobo.globo.com/sociedade/saude/fenasaude-aumento-da-judicializacao-da-saude-

50 financeira dos planos de saúde, portanto, é preciso repensar o modelo do SUS e dar atenção primária à saúde.

As operadoras de planos de saúde são obrigadas a cumprir sentenças judiciais, mesmo em casos não previstos no Rol de Procedimentos da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) ou no contrato firmado entre o consumidor e a operadora, segundo a presidente da FenaSaúde.

Entre os itens mais demandados, na Justiça, em relação às operadoras que fazem parte da FenaSaúde, estão a negativa de cobertura (geralmente de contratos antigos), rede de atendimento (quando o médico não atende por determinado plano, e mesmo assim o beneficiário quer ser atendido por ele), carência (uso do plano antes da carência mínima), procedimentos que não são oferecidos pelo plano e reajuste de mensalidades.

Contudo, os planos de saúde não estão na lista dos dez assuntos mais reclamados. No ranking geral do Boletim do Sistema Nacional de Informações de Defesa do Consumidor (Sindec) de 2016, o segmento aparece na 13º posição dentre os 20 listados, com 1,5% do total de reclamações. Em relação à quantidade de atendimentos registrados em 2015, houve recuo de 4,4% nas contestações ligadas aos planos de saúde.

Para diminuir os impactos da judicialização, as operadoras estão investindo constantemente na qualificação e aperfeiçoamento dos canais de atendimento ao consumidor, como os SACs e Ouvidorias (89,3% respondem aos seus demandantes em até 7 dias úteis, 10,4% dentro de prazo pactuado (do 8° até o 30° dia útil) e somente 0,2% fora do prazo (após 30 dias úteis). A ANS também pode ser um canal para resolução de problemas não solucionados diretamente com a operadora antes do judiciário. Na esfera judicial, por sua vez, o Núcleo de Apoio Técnico – NAT, iniciativa do judiciário, foi criado para auxiliar tecnicamente os magistrados nas tomadas de decisões sobre saúde.

Em entrevista concedida ao jornal O Globo54, a coordenadora do Núcleo de Defesa do Consumidor (NUDECON), Patrícia Cardoso, acredita que o consumidor deve inicialmente procurar a empresa para tentar uma solução amigável. Ela explica que:

54 Disponível em https://oglobo.globo.com/sociedade/saude/fenasaude-aumento-da-judicializacao-da-saude-

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No NUDECON, temos um projeto muito consistente de não judicialização de casos. Assinamos com as principais operadoras termos de cooperação criando canais efetivos de solução dos problemas. As empresas, nesses termos, se comprometem a enviar resposta, positiva ou negativa, nos casos de urgência e emergência em até três horas para o defensor público. Com isso, temos alcançado índices de solução em torno de 90%.

Durante a realização de uma mesa redonda supervisionada pelo CNJ em São Paulo no mês passado, o ministro Paulo de Tarso Vieira Sanseverino, informou que dos 327 mil processos que tramitaram em 2017 no STJ, um número expressivo diz respeito a questões de saúde.

Esse movimento de judicialização da saúde preocupa a magistratura brasileira, especialmente o CNJ. Segundo o conselheiro Arnaldo Hossepian, supervisor do Fórum Nacional do Judiciário: “A nossa preocupação é que as pessoas tenham acesso à saúde e, se

for necessário, pela via do Poder Judiciário, mas mediante aquilo que costumamos chamar da boa judicialização”,

Com o objetivo de discutir as melhores estratégias para enfrentar esse cenário e promover a interação de experiências nacionais na área, a reunião contou com a participação de outros dois ministros do STJ, Ricardo Villas Bôas Cueva, Paulo Dias de Moura Ribeiro e dos conselheiros do CNJ Henrique Ávila e Fernando Mattos.

Entre as questões abordadas as ações que tratam de planos de saúde foram destaque, uma vez que, ocupam o segundo lugar entre todas as demandas. Além dos processos relativos a negativa de cobertura pelas operadoras de saúde privadas a medicamentos importados não registrados pela Anvisa, que correspondem por 35% dos casos, a manutenção de ex-empregados demitidos ou aposentados no plano de saúde por 17% das queixas e o reajuste de mensalidade por faixa etária em planos coletivos por 21% dos processos.

A reunião que ocorreu no Hospital Sírio Libanês contou com a presença de Giovanni Guido Cerri, médico e professor do Conselho de Administração do Hospital, que ressaltou a importância de iniciativas como a plataforma e-NATJus. A ferramenta, idealizada e mantida pelo CNJ, auxilia juízes na tomada de decisões e traz justiça social permitindo o uso razoável dos recursos financeiros na saúde.

52 Conforme pontua o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva do STJ: "O Judiciário não

tem competência técnica nem dispõe das informações que os médicos possuem para evitar o colapso do SUS e da saúde suplementar". O ministro Moura Ribeiro lembra da importância

do diálogo com a sociedade civil para o tratamento do tema que diz respeito à dignidade humana: "Essas demandas certamente devem ter tocado o coração de todos socialmente. A

legislação é dura, mas o direito é maleável. Estamos diante de um momento novo em que temos de pensar no cidadão com direitos a ter direitos". Como exemplo, podemos citar o

caso de um juiz que usou o sistema para apreciar o caso de um paciente que pleiteava medicamento de alto custo fornecido pelo SUS. Um parecer do CNJ e do Ministério da Saúde apontou que o remédio indicado custava US$ 1.950, sendo que outro medicamento, com a mesma eficácia clínica, poderia ser adquirido por US$ 50, ou seja, 20 vezes menos.

Como se nota, o enfrentamento da questão é bastante pertinente, uma vez que a judicialização da saúde não é um problema enfrentado apenas no País, mas cresce em todo o mundo e o Judiciário não tem competência técnica e tampouco dispõe das informações que os médicos possuem para evitar o colapso do SUS e da saúde suplementar. Ressalte-se ainda a importância do diálogo com a sociedade civil para o tratamento do tema, uma vez que essas demandas certamente tocam o coração de todos socialmente.

Plataforma se mostra uma boa alternativa no enfretamento da judicilização da saúde no Brasil. A plataforma (e-NATJus) é capaz de fazer com que o magistrado se sinta seguro em suas decisões, pois passa a contar com um ambiente seguro, com informações isentas. A questão não se limita em economia de recursos, mas sim de cumprir o que está assegurado na Constituição, oferecer ao cidadão o direito à saúde em sua plenitude.

Em 13/03/2018, foi determinada a suspensão dos processos judiciais que envolvem a Saúde Suplementar, em que se discute o fornecimento de fármacos não registrado na Anvisa. Esta foi a ementa da decisão proferida pelo STJ:

PROPOSTA DE AFETAÇÃO. RECURSO ESPECIAL. RITO DOS RECURSOS ESPECIAIS REPETITIVOS. PLANO DE SAÚDE. CONTROVÉRSIA ACERCA DA OBRIGATORIEDADE DE FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO IMPORTADO NÃO REGISTRADO NA ANVISA. 1. Delimitação da controvérsia: Definir se as operadoras de plano de saúde estão obrigadas ou não a fornecer

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medicamento importado, não registrado na ANVISA. 2. Recurso especial afetado ao rito do art. 1.036 NCPC.55

Consolidada a posição do STJ em negar o fornecimento de medicamentos sem o registro na Anvisa, se faz necessário invocar o artigo 1036 do CPC56 que tem por finalidade impedir que novos processos subam até o STJ, já que devem permanecer no Tribunal de origem, até a decisão final da Corte, assim, a nova decisão57:

(i) determina a suspensão de todos os processos judiciais, em qualquer grau de jurisdição;

(ii) exige do próprio STJ uma resolução rápida, pois a demora no julgamento gera: (a) sensação de injustiça; (b) desconsidera a prioridade do Direito à Saúde; (c) represamento dos processos em todo o país; (d) ansiedade da população e da comunidade jurídica.

O STJ assumiu importante responsabilidade em relação ao tema e possui a missão constitucional de decidir a questão com agilidade e presteza, dentro do prazo de um ano.

Como se vê, a necessidade de diminuir a quantidade de demandas que envolvem a saúde como um todo é patente. Deve haver interação entre o judiciário, o legislativo e o executivo na busca de um caminho para solucionar a questão e reduzir a quantidade de demandas.

Políticas bem pautadas, claras, são um caminho viável para redução da judicialização, uma vez que a temática assombra o sistema suplementar de saúde.

55 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 1.726.563 – SP. Segunda Seção. Relator Ministro

Moura Ribeiro. 13 Mar 2018. Disponível em

https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=1687172&num_regi stro=201701201853&data=20180319&formato=PDF. - Acessado em 28 Mar 2018.

56 “Art. 1.036. Sempre que houver multiplicidade de recursos extraordinários ou especiais com fundamento em

idêntica questão de direito, haverá afetação para julgamento de acordo com as disposições desta Subseção, observado o disposto no Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal e no do Superior Tribunal de Justiça.”

57 Extraído de http://emporiododireito.com.br/leitura/suspensao-dos-processos-na-saude-suplementar- . Acessado

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