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3 A CONSTRUÇÃO DE UM CAMINHO NA PRODUÇÃO DA PESQUISA

4 O TERRITÓRIO DA USF ILHA DAS CAIEIRAS – HISTÓRIA, ESTÓRIAS E IMPASSES

4.1 OS IMPASSES NA DELIMITAÇÃO FÍSICA DO TERRITÓRIO

Cada secretaria municipal consultada, a Secretaria de Saúde (SEMUS), a Secretaria de Educação (SEME), a Secretaria de Obras (SEMOB), a Secretaria de Segurança (SEMSU) e a Secretaria de Gestão Estratégica (SEGES) tratava seus dados a partir de bases diferentes e não havia integração entre os dados e levantamentos feitos por essas secretarias para um mesmo espaço.

Não buscamos aqui afirmar que há dados verdadeiros a serem revelados, mas há algo da ordem do real que deve ser considerado. Por exemplo, quais bairros constituem o território da USF a ser pesquisada? Qual é o limite físico entre esses bairros? Qual é a população ali residente? Quantas famílias? Quem tem acesso a rede de saneamento em suas residências? Quantos óbitos ocorrem ali por mês? Quantas gestantes? Quantos nascimentos? Esses dados são importantes para a pesquisa e mais que isso, são da maior importância para a gestão da cidade e da vida das pessoas que ali residem. E, numa perspectiva de gestão pública, o conhecimento desses dados é relevantepara que ações conjuntas do poder público nas três instâncias – Municipal, Estadual e Federal – possam ali intervir no sentido de, juntamente com a população transformar a relação e a produção de vida – e de

saúde – que ali se dá.

Para a SEMUS, que acompanha os dados relativos a área da Saúde, a USF Ilha das Caieiras compreende os bairros São Pedro I, São Pedro II, São Pedro IV, Comdusa e Ilha das Caieiras. Esse território compreende uma população de cerca de dez mil habitantes (DATASUS, 2008).

No entanto, a SEMOB adotou a divisão em administrações regionais descentralizadas para auxiliar no planejamento, execução e acompanhamento das obras realizadas pela prefeitura. No total a cidade de Vitória está dividida em oito regiões administrativas, sendo que a região que abrange a “Grande São Pedro” é a Região 7 formada pelos bairros Comdusa, Conquista, Ilha das Caieiras, Nova Palestina, Redenção, Resistência, São José, Santo André, São Pedro e Santos Reis, com uma população de mais de cinqüenta mil pessoas (SEMOB/PMV, 2008). Já a SEGES, através da Gerência de Desenvolvimento de Informações, identificou a divergência no tratamento da área dos bairros e das regiões de Vitória inclusive e principalmente por setores internos à prefeitura, o que dificulta o planejamento de ações conjuntas e comparação de dados entre secretarias para uma mesma região. No ano de 2003 foi decretada a lei municipal nº 6077, conhecida como “Lei de bairros”, a qual objetivou regulamentar a organização da cidade de Vitória em bairros, utilizando como unidade espacial de análise os setores censitários definidos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE (SEGES/PMV, 2008). Segundo conversa com uma funcionária da Gerência de Desenvolvimento de Informações, o fato de a lei ter sido decretada não resolveu o problema da incompatibilidade de informações internas e externas à PMV, pois, a maioria das Secretarias não segue essa divisão por já possuir uma divisão própria que precede a lei, e, pela resistência em alterar seus sistemas de informações e adequar a um padrão único para a prefeitura. “As Secretarias de Educação e Saúde são os casos

mais sérios. Elas trabalham com divisões próprias e são resistentes à adequação proposta pela lei. Querem que toda a prefeitura de adapte às suas respectivas divisões, e não o contrário” (relato de uma funcionária da Gerência de

Desenvolvimento de Informações da PMV, agosto de 2008).

pela SEMUS, cabe um retrospecto quando do surgimento desses bairros. O que antes era chamado de São Pedro I, hoje chama-se apenas São Pedro; os que antes se chamavam São Pedro II e São Pedro IV hoje chamam-se Santos Reis e Conquista; o que antes se chamava São Pedro III hoje chama-se Santo André, São José e Redenção; o que antes se chamava São Pedro V hoje chama-se Nova Palestina; o que antes se chamava São Pedro VI hoje chama-se Resistência. Ilha das Caieiras que é o mais antigo dos bairros dessa região não mudou de denominação, assim como Comdusa, que foi o segundo bairro a surgir na região, cronologicamente.

A discussão feita anteriormente implica um certo entrave na comunicação entre a SEMUS e as demais secretarias uma vez que a SEMUS alimenta com relatórios gerados mensalmente enviados pela USF Ilha das Caieiras o banco de dados nacional de informações dos sistemas de saúde – o DATASUS, e, o fato de a SEMUS trabalhar com divisão territorial distinta da legitimada pela “lei de bairros” evidencia a polêmica se os dados relativos a saúde dos moradores do território da Região 7 estão corretamente registrados no DATASUS. Essa discussão ganha força pelo fato de a região 7 que antes compreendia seis bairros passou a abranger dez bairros e, a própria população não legitimou a nova divisão proposta pela lei. Dessa forma, os moradores continuam denominando São Pedro III o que hoje são três bairros e São Pedro IV o que são dois bairros sendo que um também compreende parte do que já foi São Pedro II.

A despeito desses conflitos de dados que há entre as secretarias, a lei de divisão territorial em bairros e o que considera a população residente, tomaremos o território da USF Ilha das Caieiras para efeito de análise desta pesquisa a divisão territorial da SEMUS e a legitimada pela população residente que são semelhantes.

Mas fica a indagação, como esses dados podem ser tratados no encontro das informações entre as diversas áreas que demandam um planejamento e gestão unificada, como Saúde, Educação, Planejamento Estratégico, Obras, Segurança, entre outras, se elas não são registradas de forma a serem tratadas conjuntamente? Para fins desse estudo consideraremos que o território da USF Ilha das Caieiras abrange os bairros São Pedro I, São Pedro II, São Pedro IV, Comdusa e Ilha das Caieiras, conforme apresentado no início deste trabalho. A população total dessa

região, segundo o censo é de aproximadamente 10 mil habitantes (IBGE, 2000). O total de famílias cadastradas na USF Ilha das Caieiras, até o mês de agosto de 2008 era de 2.257 famílias.

Antes de seguirmos para a caracterização do cotidiano da USF Ilha das Caieiras no que diz respeito ao espaço físico, equipes de saúde, trabalhadores, horários e serviços oferecidos, vamos relatar o movimento de constituição dos bairros que compõem esse território como nos foi contada, pois consideramos que a história desse povo está prescrita no corpo e nos modos de vida das pessoas que ali habitam. Lembramos que parte do que está aqui relatado não está apontado em documentos oficiais publicados nos meios de comunicação.

As histórias e estórias que trazemos aqui estão marcadas no corpo das pessoas que lutaram pela construção desses bairros e vieram a tona no momento dos relatos, no encontro com a pesquisadora. Conversamos com antigos moradores nas visitas dos agentes em suas residências, algumas visitas espontâneas, outras induzidas pelas agentes (quando a pesquisadora solicitava conhecer algum personagem citado por outro). Além de entrevistas com ex-moradores que se destacaram como liderança do movimento comunitário, instituição que teve papel de destaque nessa história. Também merece destaque a conversa com professores e militantes que viveram aquele momento e fizeram parte desse movimento que marcou o final da década de 1970 e início da década de 1980.

Procurando afirmar os princípios da história oral, não nos preocupamos em fazer uma descrição respeitando a cronologia dos acontecimentos, apenas os descrevemos a medida que nos foram sendo contados pelos personagens. Destacamos que a Ilha das Caieiras, por ser o bairro mais antigo e com características diferentes dos demais, aparece primeiro nos relatos. Em seguida, nos contam sobre o surgimento do bairro Comdusa que foi diferente e até mesmo controverso. E os “São Pedros”, que são os bairros cujo surgimento foi marcado por luta popular e resistência, é uma longa história que sempre enche os olhos de quem ao contar, a revive.

Apesar de o território da USF Ilha das Caieiras abranger apenas os “São Pedros” I, II e IV, os relatos trazem a história do surgimento de um grande complexo de casas que só posteriormente foi dividido em seis bairros criados com esse nome variando-

se apenas o numeral romano, e, posteriormente, em 2003 com a “lei de bairros”, conforme exposto, ganharam outros nomes, embora os moradores ainda os tratem como “São Pedros”.

4.2 ANTES: ILHA DOS PESCADORES. HOJE: PENÍNSULA, O PESCADO É