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QUANTIDADE DE SUJEITOS

3.8 OS INSTRUMENTOS PARA RECOLHA DAS NARRATIVAS

Como instrumentos de pesquisa, para a recolha de dados, utilizamos: a legislação sobre educação inclusiva na universidade; os relatórios do Núcleo de Acessibilidade da UFSM, assim como os dados cedidos pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, sobre a situação dos alunos com deficiência matriculados nas instituições de ensino brasileiras. A entrevista narrativa semiestruturada foi gravada em áudio.

O emprego da entrevista semiestruturada baseou-se em Lankshear e Knobel (2008) e Bauer e Gaskell (2002), contendo tópicos guia. A entrevista consta no Apêndice C e os tópicos guia, estão expressos nas imagens das Figuras 1 e 2:

Figura 1 – Tópicos guia para a entrevista narrativa

Figura 2 – Síntese dos tópicos guia para a entrevista

Fonte: Própria autoria, baseado nos estudos de Hautrive (2011, p. 99-100).

As entrevistas foram agendadas em posse do termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE) (APÊNDICE D).

No que concerne a recolha de dados advindos da entrevista narrativa, o aporte teórico compreendeu os estudos de Connelly e Clandinin (1995), Jovchelovith e Bauer (2002) e Bakhtin (2006, 2010 e 2011) e Bolzan (2001, 2002). Para tanto, foram considerados, a compreensão das concepções que as pessoas têm do mundo, os significados, motivos e aspirações que produzem sobre o trabalho. Considerando os fenômenos em sua complexidade e particularidade (LANKSHEAR; KNOBEL, 2008).

Os pesquisadores Jovchelovitch e Bauer (2002) e Bolzan (2001, 2002) nos apresentaram os passos a serem adotados na condução das entrevistas narrativas, os quais assim se expressam:

Figura 3 – Etapas da entrevista narrativa sociocultural

Fonte: Construído pelo pesquisador, baseado nos estudos de Jovchelovith e Bauer (2002) e Bolzan (2001, 2002).

Consideramos que as questões direcionadas as entrevistas semiestruturadas, foram elaboradas de modo claro, evitando interpretações ambíguas e/ou a indução das narrativas. Para este estudo, as questões de pesquisa abrangeram duas categorias de questões de entrevista: as questões fechadas para a caracterização dos sujeitos e as abertas que compreenderam todas as vivências das trajetórias pessoal e profissional, abrangendo o trabalho com alunos com deficiência, na atualidade.

A entrevista narrativa semiestruturada é definida como um instrumento de recolha de dados que requer um contexto específico e planejado para sua execução. A finalidade principal da entrevista, neste estudo, esteve no fato dela ser um meio adequado no estudo de narrativas orais dos professores sobre o processo de ensino e de aprendizagem; identificando suas as concepções, suas crenças e seus valores relacionados à realidade dos novos contextos na universidade.

Embora na entrevista o campo de interação contribua para a narração das experiências pessoais e profissionais, sempre o instrumento da entrevista, versa em um recorte parcial e incompleto da realidade em estudo. Nosso objetivo foi obter o maior número possível de informações para assim, constituir um conjunto de acontecimentos necessários para a compreensão de como os professores aprendem a docência para atuar com os Cotistas B.

Nesse estudo, nosso enfoque encontra-se na trajetória profissional e pessoal dos professores de pessoas com deficiência e para tanto, procuramos garantir um destaque para a dimensão não cronológica dos fatos, considerando os enredos das histórias contadas, os

sentidos e significados que permeavam as memórias e/ou acontecimentos e não exatamente captar a sequência dos episódios.

Desse modo, as narrativas dos professores tomam diferentes entonações ao longo da entrevista, há ocasiões em que as trajetórias profissionais e pessoais se cruzam e um discurso passa a configurar as vivências dos professores, ou seja, o discurso passa a revelar a história de vida na docência, desses professores. Portanto, o momento da entrevista pode ser compreendido como uma situação favorecedora de reflexão docente, uma ocasião em que o professor e o entrevistador compartilham fazeres e saberes e podem produzir novas formas de ser professor, em função das exigências ou demandas apresentadas na atualidade. E, nessa orientação, estabelece-se uma relação de colaboração na compreensão do fenômeno estudado, analisando-o a partir de um recorte da realidade, ou seja, o particular é considerado uma ―instância da totalidade social‖ (FREITAS, 2002, p. 21).

Durante o desenvolvimento da entrevista semiestrutura, apresentamos as questões de pesquisa, tendo em vista os objetivos, do estudo, e a importância das vivências pessoais e profissionais dos professores na tessitura do aprender a ser professor, em novos contextos na universidade. Elaboramos um roteiro de trabalho, contendo as questões de pesquisa para guiar a entrevista, passando por alguns tópicos principais a serem tratados, seguindo uma sequência de assuntos, não descartando questões que poderiam surgir ao longo da conversa, as quais também foram importantes para o estudo.

Deste modo, a dinâmica de trabalho adotada na entrevista em pesquisas narrativas socioculturais, considera a dialogia entre cultura na qual a pessoa está imersa e a capacidade que ela possui de apropriar-se dos objetos oferecidos pelo meio. Assim, o desenvolvimento em um domínio específico, nesse caso, a aprendizagem da docência de professores que atuam com os alunos Cotistas B, se constrói em dois campos. O primeiro deles é coletivo/social/mediado (externo-interpessoal) e o segundo é, individual/psicológico (interno- intrapessoal).

Logo, considerando esses aspectos, realizamos a gravação da entrevista. Por meio dela, retomamos seus detalhes e a essência dos enunciados, os quais fomos incapazes de internalizar no momento do diálogo com os sujeitos da pesquisa. Inicialmente, no processo de transcrição das entrevistas, logo após o encontro com os professores, realizamos a escuta do material recolhido, em áudio. Assim, tornou-se possível o desenvolvimento da análise dos achados, ao relembrarmos os enunciados, atentando para os sentidos e significados que estão para além do que foi narrado, literalmente. No processo de análise, procuramos evitar interpretações contraditórias ou imprudentes das enunciações professorais. Em alguns casos,

foi necessário um novo agendamento com os sujeitos de pesquisa, em função do aprofundamento dos tópicosguia; dos objetivos específicos do estudo e ainda, a pedido dos sujeitos de pesquisa que solicitaram outro encontro para refletir mais aprofundadamente acerca do tema.

Na atividade de transcrição das narrativas, procuramos destacar, os momentos em que estabelecíamos confrontos ou alteração de nossos pontos de vista, os quais garantiram uma postura de responsabilidade na compreensão dos enunciados docentes. Nessa direção, Bakhtin coloca que a responsabilidade corresponde ao dever ético que temos com relação ao discurso dos outros, o qual temos a obrigação de refletir de forma participativa, compartilhada (BAKHTIN, 2006).

Ainda no que se refere à transcrição das entrevistas, produzimos uma estratégia para elencar os significados que estavam relacionados com os nossos objetivos de pesquisa. Assim, marcamos com a fonte em negrito os excertos dos enunciados correspondentes. Além disso, adotamos o sinal Gráfico das aspas duplas nos excertos da oralidade dos professores que se referiam a citações de diálogos estabelecidos com outras pessoas. Já as aspas simples foram utilizadas, para demonstrar a expressão da alegria, da empatia e da exaltação. O código das reticências foi usado para partes inaudíveis ou impossíveis de compreender ou, quando havia silêncio entre as frases.

Na fase final da transcrição das entrevistas, as mesmas foram entregues aos seus oradores, para que assim fossem realizadas as alterações que julgassem necessárias. Após a devolução das mesmas, ocorreu a edição dos textos, para evitar a presença de vícios de linguagens, atentando para a valorização da originalidade dos ditos professorais. Toda a transcrição foi devolvida aos entrevistados para que pudessem retirar ou acrescentar informações e/ou considerações sobre o tema narrado.

Após a transcrição dos dados, os mesmos sofreram um processo de organização das narrativas para uma possível construção categorial. Nessa etapa, consideramos que o discurso é constituído de múltiplas vozes que produzem novas orientações a partir de sua orientação inicial. Legitima essa concepção o que expressa Bakhtin (2010):

[...] um autor pode usar o discurso de um outro para os seus fins pelo mesmo caminho que imprime nova orientação significativa ao discurso que já tem sua própria orientação e a conserva. Neste caso, esse discurso, conforme a tarefa, deve ser sentido como o de um outro. Em um só discurso ocorrem duas orientações significativas, duas vozes (p. 162).

Assim, o entrevistador, na entrevista narrativa sociocultural considera como aspectos significativos, embora não os empreguem como elemento de análise, as posturas corporais; a entonação; a expressão dos sentimentos como a afetividade e a empatia; a ansiedade e os medos. Esses recursos adotados pelos professores, no ato da entrevista, ao serem ponderados, nos conduzem a compreensão sobre as condições de ambiência universitária, assim como a qualidade do envolvimento pessoal e profissional desses professores com a aprendizagem de ser professor.

Na produção do cenário da entrevista, estabelecemos com os professores uma dinâmica de conversação, levando em consideração o ângulo de visão peculiar que nosso horizonte social é capaz de produzir na compreensão de como eles aprendem a docência diante de pessoas com deficiência. Assim, foi possível dar a importância que Bakhtin (2006) propõe a linguagem ao considerar que a tensão estabelecida entre a palavra do entrevistador e do entrevistado, os compõe; os constrói. Em meio à referida tensão, do ato dialógico, é que encontramos a produção do sentido da vivência de ser professor em novos contextos universitários. Na tensão que se instaura, estão presentes os encontros/confrontos das vozes/ditos ou contrapalavras, os quais devem ser objeto de análise.

Além disso, é importante considerar que no momento da entrevista, nós pesquisadores, somos tomados por ela e pelos seus enunciados. Dessa forma, realizar uma entrevista, na perspectiva narrativa sociocultural, requer envolvimento por parte do entrevistado; disposição na composição de novas formas de compreender a docência e, fundamentalmente, a capacidade de prestar uma postura de distanciamento, livre de julgamentos ou pré-conceitos, para com os sujeitos de pesquisa.

Em função disso, os professores que participaram dessa pesquisa, mostraram-se confortáveis para revelar-nos, de forma mais fiel possível, a sua vivência com alunos cotistas B, considerando os desafios e exigências desse novo contexto na universidade.