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CAPÍTULO 1 DESPERSONALIZAÇÃO DAS RELAÇÕES HUMANAS NA

1.4 Os limites da civilização industrial: entre a condição subvertida do ‘homem da

A concepção de civilização industrial refere-se, basicamente, a um período determinado de grandes e singulares feitos e realizações; a uma época de avanço, cujo potencial possui um caráter imprevisível. Por conceber-se a partir de um plano de trabalho tecnicamente definido, dentro do qual o ato de descobrir se impõe metodicamente, é que, nesta fase, a consciência europeia distingue-se pelo modo como concebe a relação entre as concepções de intervenção e realidade, sensação e ruptura, controle e desenvolvimento, produção e consumo, evolução e condicionamento.

Mediante o uso indevido que o homem faz da técnica e, através das características contraditórias que a civilização industrial apresenta, podemos reconhecer que, neste momento, as coisas deixam de ser firmes; tudo é problematizado e nada fica fora dos processos de intervenção, mutação e controle técnico. Conquanto os mecanismos de aperfeiçoamentos técnicos tenham conferido à cultura ocidental novas e promissoras possibilidades, há que se reconhecer suas confluências, limites e implicações humano-sociais.

De acordo com Gabriel Marcel, a noção de civilização industrial comporta em si mesma, uma natureza marcadamente ambígua. Por civilização, por exemplo, entendeu-se, por certo tempo, “a condição do homem civilizado por oposição a certo estado primitivo, selvagem ou bárbaro” (MARCEL, 1955, p. 13). Quiçá esta ideia tenha repercutido desde o período da cultura grega. Observamos que, a partir do século XVIII, a concepção de civilização passou a ser confrontada com uma espécie de naturismo, que se destaca por trazer o que ela comporta de inevitável corrupção.

Por um lado, no século XIX, fascinado pela concepção positivista de progresso, o homem ocidental pensou que a humanidade chegaria, com o desenvolvimento da razão, a um estado de aperfeiçoamento e plenitude de toda sua capacidade. Neste sentido, o conceito positivista de civilização passa a relacionar-se ao triunfo da luz cognitiva sobre as trevas da ignorância, do caos e da desordem epistêmico-social. De acordo com Marcel, esta era,

Para os otimistas do século XIX haveria de ser inclusive concebida como uma dominação pacificadora, que implicava a situação progressiva do direito

pela força e que se traduziria não só em um crescimento geral do bem-estar, senão também em um harmonioso desenvolvimento das ciências e das artes, que seria, em certo modo, seu corolário (MARCEL, 1955, p. 14).

A compreensão otimista, de que toda humanidade estava marchando para o pleno desenvolvimento, através dos processos dominadores da natureza e da expansão do direito e da razão, não se confirmou. Através dos estudos etnológicos, sociológicos e das ciências históricas, comprovou-se que a noção de civilização não comporta um sentido único- totalitário, que possa se aplicar à humanidade em geral; e que, por outro lado, a ideia unitária de civilização deve abrir espaço para as concepções plurais dos diversos modos de existências presentes no mundo (ELIAS98, 1993, 1995, 2000). Ou seja, há a necessidade de substituir a categoria difusa de processo civilizatório pela irredutibilidade de uma compreensão mais ampla, onde se diz que estamos diante de muitas civilizações99 e, não, de uma única e patronal

forma de ser, viver e abordar a realidade.

Resulta cada vez mais evidente, especialmente a luz dos descobrimentos etnológicos, que aqueles a quem nós qualificávamos presunçosamente de selvagens, possuem já certa civilização que mostrava uma estrutura e uma coesão perfeitamente definidas [...] O que se adverte as claras é que cada uma dessas civilizações tende a constituir-se ao redor de certo modo de existência, porque, sobre tudo, que esse modo de existência não é separável de determinado meio (MARCEL, 1955, p. 15-16).

De qualquer modo, o que se expressa é que a civilização industrial “[...] seja qual for à maneira como se pretende defini-la, se opõe, por exemplo, de uma maneira muito precisa, a uma civilização de tipo rural” (MARCEL, 1955, p. 16). Na relação entre o homem e o trabalho, a técnica aparece como uma dimensão coextensiva dos movimentos humanos. De acordo com a eficácia da técnica, o homem se impõe e interpõe-se entre o meio natural, a produção e a concretização de seus planos e objetivos (SPENGLER, 1998a). Este é um

98 A referência à análise sociológica de Norbert Elias, neste contexto da discussão, se dá em virtude dos pontos de convergência entre seu pensamento e as compreensões de Gabriel Marcel sobre a realidade social do seu tempo. Sobretudo, quando ambos ponderam a respeito do modo como pensam o conceito de ‘civilização’, enquanto modelo importado do processo de assimilação, imitação e negação da própria subjetividade do Ser humano e seu modo de autocompreensão.

99 Cf. DS, p. 15,16: “Nos sentiríamos tentados de decir, en tales condiciones, que una especie de disociación tiende a efectuarse entre la idea de civilización y la idea de valor que en la concepción unitaria parecían inseparables. Creo, a decir verdad, que esa disociación no puede ser nunca absoluta. Sería más exacto decir que el desarrollo de una concepción pluralista e historicista de las civilizaciones va unida con cierta relativización de los valores – lamento tener que recurrir a este término un tanto bárbaro. De cualquier manera que se defina una civilización, es de una evidencia innegable que ella implica creencias, esto es, valores. Pero sería peligroso afirmar a priori que tales valores coinciden necesariamente con los que el pensamiento racionalista europeo, a partir de los griegos, tratara de definir en su universalidad”.

âmbito natural, onde se conjugam os aspectos de presença e simpatia, riqueza e difusão, enquanto o meio técnico caracteriza-se por sua artificialidade, materialidade, produção e domínio artesã-industrial.

O mundo técnico comporta um movimento de aproximação e distanciamento do que é o homem. Ao mesmo tempo em que a técnica nasce e se desenvolve com o homem, também o desumaniza, à medida que exige dele a criação e o aprimoramento de melhores condições de trabalho, maior segurança e qualidade de vida (MARCEL, 1955; FRIEDMAN, 2012). No âmbito do trato da e com a matéria, encontra-se a submissão do homem ao meio, a fragilidade e o desgaste do vigor físico-mental, a despersonalização das relações interpessoais, o risco da perda de si na e pela abstração, a funcionalização da existência, a emergência da articulação, cada vez mais forte, entre as emergências política e as técnicas de aviltamento; encontra-se enfim, o “risco de congelar-se ou, em outras palavras, de transformar-se em outro condutor puro de outras correntes, inumanas, influenciado por fins de pura dominação” (MARCEL, 1955, p. 19).

De acordo com Oswald Spengler (1998a), as condições de criação e dominação surgem e se entrecruzam na condição existente do homem, podendo promover avanços e provocar retrocessos no seu próprio processo de humanização. A partir do influxo de uma postura inumana, o homem poderá reduzir-se ao nível mais baixo de sua dimensão existencial. Poderá ser levado à condição de um Ser que é senhor e escravo, dominador e dominado de e em sua própria natureza. Sobre as incidências dessas possibilidades, este autor comenta100:

Com a invenção da máquina a vapor, a natureza havia prestado alguns serviços; agora está submetida ao jugo como um escravo e seu trabalho é medido, como ironicamente, através de cavalos de força. Da força muscular dos negros, organizadas em fazendas, se passou as reservas orgânicas da crosta terrestre, onde a força vital de milhões é armazenada em forma de carvão, e a atenção se fixa hoje na natureza inorgânica, cujas forças hidráulicas servem agora para auxiliar o carvão. Com os milhões e milhões de cavalos de força os números da população chegam a um tal ponto que jamais outra cultura havia acreditado poder alcançar. Este crescimento é um produto da máquina, que quer ser servida e dirigida, para centuplicar em compensação as forças do indivíduo. Para a máquina a vida humana se faz valiosa. O trabalho se converte na grande palavra da reflexão ética. Essa palavra perde a partir do século XVIII, em todos os idiomas, seu sentido depreciativo. A máquina trabalha e obriga os homens a colaborar. Toda

100Resgatamos a fala literal, neste contexto do trabalho, de Oswald Spengler, não só porque a encontramos nas elaborações de Gabriel Marcel sobre os limites da civilização industrial (1955), mas, por entendermos que a mesma pode contribuir para ajudar o leitor a ampliar e aclarar suas compreensões, acerca da incidência da técnica sobre o humano e suas relações, no âmbito da sociedade técnico-industrial.

cultura está centrada na atividade do trabalho, que faz tremer a terra. O que se desenvolve agora, no curso de apenas um século, é um espetáculo de tal magnitude, que o homem vindo de outra cultura, com outra alma e outras paixões, se perguntará se a natureza inteira não terá sido transformada. Em outras ocasiões, também a política excedeu os limites das cidades e os povos e a economia humana intervieram profundamente nos destinos do mundo animal e do vegetal; mas não era mais do que a vida e foi eclipsado por sua vez. Esta técnica, pelo contrario, deixa pegadas de sua existência quando todo resto foi extinto e já tenha sido enterrado. Esta paixão fáustica tem caminhado pela face da superfície da terra. Este sentimento da vida cujo impulso em direção a distancia e as alturas o aparenta profundamente com o sentimento gótico, é o que expressam, na infância da máquina a vapor, os monólogos do Fausto de Goethe: a alma ébria quer sobrevoar o espaço e o tempo. Uma indizível nostalgia a leva a um horizonte sem limites. Queria libertar-se da terra, dissolve-se no infinito, corta as ligaduras do corpo e circula o espaço cósmico, entre as estrelas. O que em princípio buscara o fervor ascendente de São Bernardo, o que Grünewald e Rembrandt imaginaram no fundo e Beethoven vislumbrara nos sonetos etéreos de seus últimos quartetos é o que reaparece agora na espiritual embriaguez dessa densa série de descobrimentos. Por esses meios de comunicação fantasmagóricos que permitem dar a volta ao mundo em poucos dias, atravessar oceanos em cidades flutuantes, ultrapassar cadeias de montanhas, navegar os labirintos subterrâneos. É por isso que a palavra falada é enviada instantaneamente além dos mares; por ele assistimos a esta ambição de recordes e dimensões, hangares grandes para aparatos gigantescos, barcos e pontes monstruosas, construções de arranha céus; forças fabulosas que obedecem, com um só aperto de um botão, na mão de um menino, fábricas de aço e cristal que vibram e tremem nas quais o menos homúnculo circular, senhor absoluto, sente a natureza rendida aos seus pés. E a forma das máquinas se faz cada vez mais inumanas, ascéticas, místicas, esotéricas. Rodeiam a terra com um tecido infinito de forças sutis, de correntes e tensões. Seu corpo se faz cada dia espiritual, mais dissimulado. Essas rodas, esses cilindros e alavancas, são emudecidos. Tudo o que é importante na máquina se dissimula em seu interior. Nós cheirávamos o diabo na máquina e não nos equivocamos. Ela significa, para os crentes o Deus destronado. Oferece ao homem a casualidade venerável e é posta em marcha silenciosamente, irresistivelmente, como uma espécie de omnisciência profética (SPENGLER, 1998b, p. 772-774).

A expressão ‘paixão fáustica’, citada por Spengler, surpreende e justifica seu emprego, quando o próprio Fausto101 declara: “[...] isto é ainda bastante grande para grandes ações capazes de iluminar o mundo com seu êxito. Sinto em mim uma força pronta a empregar-se corajosamente [...]”. E mais à frente, acrescenta o Imperador de Espíritos: “[...] a quem devemos nós que a natureza, por nosso bem solicita, acumule, os mais raros prodígios?” (GOETHE, 2002, p. 403-404, 419).

101A figura do Dr. Fausto, que vendeu sua própria alma ao ‘Espírito que aparece na chama’ em troca de poder e prestígio, deu origem a uma lenda emblemática na arte Ocidental. E, é com base nesta lenda, que Goethe (2002), procurou, desde a sua juventude, tratar, no poema dramático de ‘Fausto’, acerca da pretensão conflituosa, tão presente na história da humanidade, do homem que quer elevar-se, a partir das conquistas de bens e realizações materiais.

Para Gabriel Marcel, “é legítimo conservar a expressão spengleriana e dizer que a civilização industrial está regida por valores fáusticos” (MARCEL, 1955, p. 22). Esta é uma civilização ávida por dominar a natureza e exercer controle sobre a matéria, o tempo e o espaço; é uma civilização tecnicista atravessada, não só pelo signo da produção e do progresso, como também, pelos vieses da escravidão e da sujeição do próprio homem a todo processo técnico-inventivo.

No paradoxo fundamental da civilização industrial, sobre a condição do homem, faz- se necessário não só discernir suas implicações, como procurar apontar a natureza das reais problemáticas que envolvem a própria existência humana. Convém ressaltar que, na civilização industrial, à medida que o conhecimento da técnica triunfa, o homem se desumaniza e subverte sua própria condição e modo de existir.

A subversão da qual fala Gabriel Marcel refere-se a um conjunto “de modalidades existenciais que se situam por debaixo do nível da consciência cotidiana” (MARCEL, 1940, p. 11). Trata-se de um processo de alienação através do qual o homem torna-se, cada vez mais, estranho a si mesmo. É como o Ser que, olhando num espelho ofuscado sua própria imagem, não se inquieta externa e interiormente diante daquilo que seus próprios olhos contemplam; é como o homem que, diante das perguntas; “quem sou eu? Porque existo? E qual o sentido tem tudo isto?” (1940, p. 12), por certo, não espera receber nenhuma resposta. É como o Ser, a quem nosso autor, contemplando-o na contemporaneidade, o chama de “O Homem da Barraca”102.

A consciência do ‘homem da barraca’ é a de alguém que se perdeu no âmbito das suas relações. Ele é o Ser que não existe para si mesmo, não é presença na vida do outro, vive alheio à dimensão transcendente e nem demonstra interesse pelas questões sociais, ecológicas e planetárias. Na relação com o Estado, este homem aparece perdido nos conceitos abstratos de emprego, reforma agrária, burocratização, aposentadoria e sindicato. Para a sociedade em geral, ele não representa nenhuma realidade viva, não é considerado como um indivíduo,

102 Cf. HP, p. 11,12: “Ese hombre tiene alrededor de 45 años. Los cabellos grises. Podría tomarse por una sonrisa irónica cierta mueca de su rostro, pero poco a poco se descubre que esa mueca debe tener otro significado pues es permanente: más bien debe pensarse en una especie de congelación de los rasgos. Ese hombre poseyó un hogar, una casa con muebles, tierras, una granja, animales. Tenía padres, una mujer, hijos, seres próximos habitaban su contorno. Pero ya no posee más que lo que lleva encima. Trabaja ocho horas por día, quizá en la reparación de un camino; tiene qué comer, y aun esa comida es buena. Cuando no está demasiado cansado puede conseguir en la aldea pequeños trabajos que lo ayudan, que le valdrán un suplemento en su alimentación, o un poco de tabaco. No puede decirse que la colectividad no se haya preocupado por él, y aun él no lo diría. Habla poco, lento, circunspecto. Habla de lo que poseyó en otros tiempos, de los suyos, de su grandeza y entonces se convierte en un ser humano en el presente, mientras que antes lo era en el pasado; muy pronto recae en su mutismo. Pero ya había planteado un interrogante, siempre el mismo, y por cierto no espera obtener respuesta: quién soy? Por qué vivo? Qué sentido tiene todo esto?”.

porque foi absorvido pelas categorias despersonalizadoras dos processos da funcionalização, quando o tratam como: número, ficha, rótulo, dado estatístico, índice, senha, código e todo tipo de reducionismos que encerram estes termos e suas respectivas imagens. Para Marcel, isto significa

[...] inevitavelmente funcionalizá-lo de maneira absoluta ou mesmo reduzi-lo a um simples comportamento. A ideia que aqui se impõe naturalmente ao espírito é a das prisões dos campos de concentração, onde o indivíduo é designado por um número de ordem. Também é possível evocar-se, com um sentido menos trágico, dos hotéis, onde o viajante é confundido com sua própria habitação: é o ocupante de tal cama. Em tais casos a atenção se aparta sistematicamente do sujeito como sujeito para dirigir-se exclusivamente a uma tarefa que terá de terminar, um rendimento que produzirá ou rendimento que terá de pagar. Na vida corrente nada me impede de comportar-me com os outros de uma forma que corresponde a esta maneira totalmente pragmática de considerá-los [...] Podem ser também selecionados e numerados; é teoricamente possível proceder a um inventário dos seres humanos existentes no planeta como se precederia ao inventar os objetos que figuram numa coleção. Por que, como não ver que esses seres, quando são tratados dessa maneira, quer dizer, submetidos a um verdadeiro senso, já não são encarados como seres, senão como se fossem coisas? (MARCEL, 1951a, p. 245, 246, 247).

Submisso ao processo de abstração de si, ‘o homem da barraca’ “não consegue tomar consciência do caráter precário e contingente das condições que constituem o marco mesmo de sua existência” (MARCEL, 1940, p. 16). Na substituição do concreto pelo abstrato, o homem torna impossível sua condição existencial. Conduzido pelas tendências industriais, fica impedido de avaliar as consequências da técnica sobre o modo como concebe a si mesmo e ao mundo ao qual pertence. Impedido de imaginar concretamente o que poderá vir a ser, o homem fica exposto a todo tipo de interpretação103 sobre si, sobre a vida, a realidade, seu futuro e suas possibilidades.

103 Cf. HP, p. 22-25: “Pero ciertamente se puede notar que se produjo en el siglo XIX una conjunción del nacionalismo por una parte, de la revolución industrial por otra, cuyos efectos fueron muy nefastos en el plano de lo humano. Pues ni siquiera puede decirse que el nacionalismo haya contribuido a hacer más soportable el yugo de la industria o de la máquina; muy al contrario. Pero en realidad no habría que detenerse aquí. Sería necesario investigar por una parte cómo el nacionalismo y el industrialismo se han desarrollado conjuntamente, y por otra qué consecuencias tuvieron para la imagen que el hombre se há hecho de si mismo y del mundo en el cual arraiga. Es difícil discutir, en particular, que el nacionalismo bajo su forma moderna y pos revolucionaria sea el producto de una ideología que se desarrolló en el siglo XVIII y se combinó, en condiciones muy difíciles de precisar, con un pre-romanticismo cuyos Orígenes parecen situarse en Rousseau. Abandonada a su pendiente natural, esta ideología llevaba más bien a un cosmopolitismo de la razón. El nacionalismo surgido de la Revolución Francesa se ha construido en gran medida sobre la ruina de las comunidades de base que habían persistido hasta el final del Antiguo Régimen, pero que el individualismo de la Filosofía de las luces contribuía inevitablemente a disolver. Por otra parte no se puede negar que haya una conexión estrecha entre este hecho general y la desvitalización de la religión que se produjo en la misma época. Pero la Revolución Industrial, al menos durante la primera mitad del siglo XIX, debió contribuir a agravar

Na relação entre desumanização e conhecimento técnico há sempre uma concepção de sujeito que lhe atravessa, uma concepção que trata a aptidão humana como uma habilidade condicionante de toda sua existência. Nesta perspectiva, o desenvolvimento do homem fica reduzido à dimensão sensório-motora; a um tratamento que pretende levá-lo ao aprimoramento de certas funções totalmente precisas; à adequação às atividades rotineiras e produções em série.

A base deste processo consiste na aplicação de testes e experimentos, que consistem num conjunto de procedimentos pelos quais o Ser é conduzido ao processo de adequação, à condição de adaptação funcional, controle volitivo e modelagem comportamental. Para esta tendência comportamentalista, “o indivíduo é considerado como uma certa unidade sobre a qual se pode e deve proceder como todas as demais unidades da mesma categoria” (MARCEL, 1955, p. 40).

A pragmatização geral do homem constitui-se num atentado contra a sua condição fundamental de ser existente. “Em tais condições, o sujeito será tratado cada vez menos como sujeito, e em conseqüência, cada vez menos respeitado” (MARCEL, 1955, p. 42). No ato de violação da dignidade do homem, as técnicas condicionantes exercem total predomínio sobre sua liberdade. A possibilidade do fazer-se humano é posta em dúvida e sua historicidade fica reduzida a certos aspectos, nada mais que um simples corolário. “Com isto quero dizer que o que em certos casos é tratado como ser pode também qualificar-se como não ser” (MARCEL, 1951a, p. 249).

De acordo com Marcel (1955), o desenvolvimento da técnica não só serve para afirmar as conquistas do homem sobre sua realidade, como pode ajudar a comprometer a identidade