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Os minifúndios e os latifúndios continuam existindo na realidade agrária

No documento AINDA EXISTEM LATIFÚNDIOS NO BRASIL? (páginas 185-194)

5 O PROCESSO CONTRADITÓRIO DO DESENVOLVIMENTO DO CAPITALIS-

5.3 Os minifúndios e os latifúndios continuam existindo na realidade agrária

Para identificarmos e localizarmos espacialmente as regiões com maior intensidade da presença de latifúndios e de minifúndios, resgatamos os critérios que definiam esses conceitos na Lei n° 4.504 de 1964, o Estatuto da Terra, e os aplicamos às estatísticas cadastrais, sob titularidade particular, disponibilizadas pelo INCRA em 2014.

Como afirmado anteriormente, o INCRA utiliza o conceito de minifúndio oriundo do Estatuto da Terra para compor suas estatísticas cadastrais, mesmo este não estando normatizado na legislação agrária vigente. Conforme apontado nas Tabelas 11 e 12, os minifúndios compõem o maior percentual do número de imóveis rurais no Brasil e sua incidência é verificada em todo o território nacional (FIGURA 13).

90 Como por exemplo, a posição da professora Giselda Maria Fernandes Hironaka, que afirmou – nos debates durante a tramitação da Lei Agrária – que a tipologia do Estatuto da Terra era exemplar.

Figura 13 – Brasil: Número e área ocupada pelos minifúndios, por microrregiões - 2014

Fonte: INCRA. Estatísticas Cadastrais 1992, 1998, 2003 e 2014, 2014. Elaborado por: Alcione Talaska.

A concentração do número (FIGURA 13-A) e, por conseguinte, da área ocupada pelos minifúndios (FIGURA 13-B) no Brasil se realiza, sobretudo, nas regiões Sul, Sudeste e Nordeste do país. Entretanto, os minifúndios são também encontrados nas regiões Norte e Centro-Oeste, nas quais as maiores presenças desses imóveis são verificadas nas microrregiões de: Ji-Paraná, Ariquemes e Cocal, no Estado de Rondônia; de Rio Branco, no Estado do Acre; de Porangatu, no Estado de Goiás; de Miracema do Tocantins, no Estado do Tocantins; Alta Floresta e Aripuanã, no Estado do Mato Grosso; Caracaraí e Sudoeste de Roraima, no Estado de Roraima; Parintins e Manaus, no Estado de Amazonas e Guamá e Santarém, no Estado do Pará.

Quanto aos latifúndios, embora existam autores91 que utilizem critérios mais genéricos para caracterizá-los no Brasil, compreendemos que a melhor definição é aquela normatizada em lei, mesmo que já tenha sido revogada. Assim, relembrando os critérios dispostos no Estatuto da Terra, existiam dois tipos de latifúndios: o latifúndio por dimensão e o latifúndio por exploração.

No primeiro caso, os latifúndios por dimensão eram aqueles imóveis rurais que tivessem área que excedesse, no mínimo, um de dois parâmetros: i) a dimensão máxima de 600 vezes o módulo médio da propriedade rural na região; e/ou ii) a área média dos imóveis rurais na região.

91 Os latifúndios, em especial quando considerados em seu aspecto dimensional, aparecem em algumas publicações como sinônimos de grandes propriedades (ERTHAL, 2000; ALMEIDA, 2004), e, principalmente, como expressão qualitativa atribuída aos imóveis rurais “com mais de 1.000 ha” (FILHO; FONTES, 2009;

CAMACHO, 2011; entre outros).

Para o atendimento do primeiro parâmetro, consideramos como latifúndios os imóveis rurais que suas áreas excedessem 600 vezes o valor do módulo fiscal dos municípios, agregando-os em microrregiões. A utilização do módulo fiscal e não do módulo médio da propriedade rural, como disposto no Estatuto da Terra, considera o pressuposto indicado no item 4.1.1 Do PL n° 11/1991 à Lei n° 8.629/1993: a utilização e os significados dos sistemas de conceitos interpretativos da realidade agrária brasileira, que explicita que o módulo fiscal nada mais é do que a mediana do valor dos módulos rurais dos municípios. Para efeito de revisão metodológica e possibilidade prática de tal aplicação, consultamos o INCRA sobre a possibilidade da utilização dos módulos fiscais para a definição hipotética dos latifúndios por dimensão na atualidade, a resposta do instituto revelou que algebricamente o pressuposto é coerente.92

Para o atendimento ao segundo parâmetro da caracterização dos latifúndios por dimensão, calculamos a área média dos imóveis rurais em cada microrregião geográfica definida pelo IBGE, dividindo a área ocupada com imóveis rurais pelo número de imóveis rurais existentes nas microrregiões. Posteriormente, identificamos os imóveis rurais que excederam 600 vezes o valor da área média dos imóveis em cada microrregião.93

Desse modo, aplicando esses critérios às estatísticas cadastrais de 2014, mesmo que o INCRA refute esse critério, quer do ponto de vista qualitativo ou aspecto quantitativo, revelamos a existência de 182 latifúndios por dimensão no Brasil, cujas áreas ocupadas totalizam 12.845.381,8 hectares. Ou seja, a área ocupada por esses latifúndios é superior a área territorial do Estado de Pernambuco (9.814.911,9 ha), ou de Santa Catarina (9.573.397,8 ha), ou ainda, conjuntamente, dos Estados do Espírito Santo (4.609.692,50 ha), do Rio de Janeiro (4.377.795,40 ha), de Alagoas (2.777.499,30 ha) e do Distrito Federal (577.999,90 ha).

A localização e a incidência territorial desses imóveis rurais podem ser verificadas no Mapa 05 e no Apêndice H, que traz a lista com o nome dos municípios e microrregiões, conjuntamente, com a área ocupada por esses imóveis, qualificados como latifúndios por dimensão.

92 O instituto informou: “acerca da aplicação do conceito de módulo fiscal – MF com vistas a quantificar o que poderia ser denominado hoje como ‘latifúndio por dimensão’ esclareça-se que tal classificação, com o advento da Lei n° 8.629 de 25 de fevereiro de 1993, foi revogada, passando a vigorar os conceitos de pequena e média propriedades rurais. Nesse sentido, ainda que algebricamente o exemplo citado no questionamento em tela seja, a princípio, coerente, não se vê sentido na delimitação deste universo de imóveis rurais, quer sob o sentido quantitativo, quer sob o aspecto qualitativo” (INCRA, Resposta ao Pedido de informação n°

54800001168/2014-50).

93 Esse parâmetro, no entanto, pode revelar um número menor de latifúndios do que os existentes na realidade agrária brasileira. Isso, pois, a identificação dos latifúndios, considerando a média de área dos imóveis na microrregião, foi realizada com base nas classes de área disponibilizadas pelo INCRA (Mais de 0 a menos de 1; 1 a menos de 2; 2 a menos de 5; 5 a menos de 10; 10 a menos de 25; 25 a menos de 50; 50 a menos de 100; 100 a menos de 250; 250 a menos de 500; 500 a menos de 1000; 1.000 a menos de 2.000; 2.000 a menos de 2.500; 2.500 a menos de 5.000; 5.000 a menos de 10.000; 10.000 a menos de 20.000; 20.000 a menos de 50.000; 50.000 a menos de 100.000 e 100.000 e Mais). O pressuposto ideal seria consultar diretamente no cadastro do INCRA, identificando os imóveis rurais que excedessem o valor exato da área média dos imóveis rurais em cada microrregião, por exemplo, os imóveis com área superior à 81.000 hectares (135ha x 600 = 81.000 ha).

A disposição espacial da localização desses imóveis rurais revela que a região Centro-Oeste é a que possui maior proporção no número de latifúndios por dimensão no país. São 57 (ou 31,3%) imóveis rurais que excederam em 600 vezes o valor dos módulos fiscais ou a área média dos imóveis rurais nas respectivas microrregiões de localização dos imóveis rurais. A região Norte, Sudeste, Nordeste aparecem na sequência, com 24,7%, 19,8% e 17%, respectivamente, enquanto a região Sul é a que menos possui latifúndios por dimensão, com 7,1% do total desses imóveis rurais.

Considerando os estados da federação, São Paulo, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Pará e Bahia, são os que apresentaram maior número de latifúndios por dimensão, com 24, 23, 17, 16 e 15 imóveis, respectivamente. Já, com base na escala espacial das microrregiões, a maior concentração desses imóveis rurais ocorre nas microrregiões de: Brasília/DF, com 12 latifúndios por dimensão; Três Lagoas/MS, com 7; Manaus/AM com 6, Sena Madureira/AC, com 5; e São Félix do Xingú/PA, Barra/BA, Itapecerica da Serra/SP, São Paulo/SP e Norte Araguaia/MT, com 4 latifúndios cada.

Mapa 05 – Brasil: Localização das microrregiões, por número de latifúndios por dimensão em 2014

Fonte: INCRA. Estatísticas Cadastrais 1992, 1998, 2003 e 2014, 2014. Elaborado por: Alcione Talaska.

Assim, o número e localização dos latifúndios por dimensão no território brasileiro indicam que eles estão proporcionalmente concentrados no estado de São Paulo, que mesmo ocupando apenas 2,9% do território nacional, concentra 13,2%

dos latifúndios por dimensão. Do mesmo modo, Brasília, capital nacional, sede do

Governo Federal, arena central dos embates e debates que levaram à mudança no sistema de conceitos interpretativos da realidade agrária brasileira, concentra, sozinha, 6,6% dos latifúndios por dimensão identificados no Brasil.

No segundo caso, o Estatuto da Terra, especificou os latifúndios por exploração como sendo aqueles imóveis rurais com dimensão superior ao módulo de propriedade rural (módulo fiscal), mantidos inexplorados em relação às suas possibilidades físicas, econômicas e sociais, com fins especulativos. Ou seja, os latifúndios por exploração eram aqueles imóveis rurais, com área superior ao módulo fiscal, mantidos deficiente ou inadequadamente explorados em razão dos padrões de produtividade da época.

Para a identificação desses imóveis rurais na atualidade, consideramos latifúndios por exploração os imóveis que não se enquadram no conceito de propriedade produtiva, segundo as estatísticas cadastrais disponibilizadas pelo INCRA em 2014.

Isso se justifica pelo fato de que, à medida que, os imóveis rurais não são considerados produtivos, eles são explorados inadequadamente e, portanto, não atingem o padrão de produtividade definido pelo órgão oficial competente, não cumprindo a sua função social e configurando-se como imóveis rurais com fins especulativos, que funcionam

“ora reserva de valor, ora como reserva patrimonial [...], como instrumentos de garantia para o acesso ao sistema de financiamentos bancários, ou ao sistema de políticas de incentivos governamentais” (OLIVEIRA, 2001b, p. 187), ampliando, dessa forma, a concentração fundiária no Brasil e seus problemas decorrentes.

Convém ressaltarmos que a definição de produtividade dos imóveis rurais na atualidade é realizada mediante, o cálculo do GUT e do GEE, a partir de informações sobre as formas de exploração do imóvel rural fornecidas pelo declarante (proprietário/

posseiro) por meio da Declaração do Formulário de Dados sobre Uso junto ao INCRA.

A atualização dessas informações é dever do

proprietário, titular do domínio útil ou possuidor a qualquer tempo [...], sempre que seu imóvel rural for objeto de remembramento, desmembramento, alterações de formas de uso, entre outras. [Assim]

a classificação do imóvel rural quanto à produtividade é efetuada com base nos dados mais recentes informados pelo declarante [...].

(INCRA. Resposta ao Pedido de informação n° 54800001100/2014-71).

Esse fato pode encobrir imóveis rurais atualmente produtivos, mas que no período da declaração não atingiam os índices que comprovariam a produtividade.

Da mesma forma, pode encobrir imóveis rurais atualmente improdutivos, mas que na época da realização da declaração foram informados como produtivos. Talvez por isso, o chefe da Divisão de Ordenamento da Estrutura Fundiária do INCRA no Rio Grande do Sul, Francisco Lemos, afirmou “Se tu me perguntares se existe latifúndio no Rio Grande do Sul, vou te dizer que sim. Mas se quiseres saber em que quantidade

e onde, vou te responder não sei” (JORNAL ZERO HORA On line, 12 jan. 2015, n.p.).

A aferição da real produtividade dos imóveis rurais e a consequente qualificação do imóvel como produtivo ou improdutivo, em procedimentos desapropriatórios para fins de reforma agrária, somente podem ser realizadas por meio de ações de fiscalização cadastrais in loco realizadas pelo INCRA.

Contudo, em que pese a possibilidade de existir na realidade condições de imóveis rurais diversas daquela disponibilizada pelo INCRA em seu cadastro e seguindo a concepção anteriormente comentada, com base nas estatísticas oficiais do INCRA, de 30 de junho de 2014, sob titularidade particular, existiriam no Brasil 794.351 imóveis rurais (13,78% do número total de imóveis) que poderiam ser categorizados como latifúndios por exploração. Essas propriedades improdutivas totalizariam algo em torno de 250.000.000 hectares, mais de 48% do total da área ocupada pelos imóveis rurais, sob titularidade particular, no Brasil (TABELA 14).

Tabela 14 – Brasil: pequenas, médias e grandes propriedades improdutivas, sob titularidade particular - 2014

Fonte: INCRA. Estatísticas Cadastrais 1992, 1998, 2003 e 2014, 2014. Elaborado por: Alcione Talaska.

Note-se, que os critérios do Estatuto da Terra incluiriam as pequenas, médias e grandes propriedades improdutivas nas definições de latifúndio por exploração.

Entretanto, considerando somente as grandes propriedades, já que a Constituição Federal de 1988 deixou claro que as pequenas e médias propriedades são insuscetíveis à desapropriação para fins de reforma agrária, teríamos 64.509 imóveis rurais qualificados como latifúndios por exploração no Brasil, pouco mais de 1% do total dos imóveis rurais existentes, mas que ocupam mais de ¼ (um quarto) do total das terras ocupadas pelos imóveis rurais no Brasil em 2014.

Em números absolutos, esses latifúndios por exploração, especificamente grandes propriedades improdutivas, detêm o domínio de 143.812.583,82 dos 521.837.118,99 hectares ocupados pelos imóveis rurais no Brasil e declarados ao INCRA, o que representa 27,56% em números percentuais. Esse montante de área impressiona ainda mais se considerarmos que representa 16,89% do total da

Categoria Qt. Pequena Propriedade Improdutiva 521.431 38.183.973,29 9,04% 7,32%

Média Propriedade Improdutiva 208.411 69.059.002,68 3,61% 13,23%

Grande Propriedade Improdutiva 64.509 143.812.583,82 1,12% 27,56%

TOTAL PROPRIEDADES IMPRODUTIVAS 794.351 251.055.559,79 13,78% 48,11%

TOTAL IMÓVEIS RURAIS BRASIL 5.766.542 521.837.118,99 100% 100%

superfície territorial brasileira, ou ainda, praticamente, toda a região Sul e Sudeste do país.

O Mapa 06 mostra a localização dos latifúndios por exploração (grandes propriedades improdutivas), considerando as microrregiões brasileiras, e mostra que a região Centro-Oeste do país foi a que possui maior número de latifúndios por exploração (24,98%). Nessa região, e inclusive em escala nacional, o destaque é atribuído para o Estado de Mato Grosso, que possuía 10.210 grandes propriedades improdutivas. A região Norte do país aparece logo na sequência, com 24,6% do total de latifúndios por exploração, destacando-se o Estado do Pará, com 8.753 imóveis. Na região Nordeste, que apresentou 22,3% dos latifúndios por exploração do Brasil, o Estado com o maior número desses imóveis foi a Bahia (6.021 imóveis).

Na região Sudeste e Sul, com 18,2% e 9,9% da proporção do número de latifúndios por exploração, os Estados que se destacaram foram Minas Gerais (5.915 imóveis) e Paraná (2.527 imóveis), respectivamente.

Mapa 06 – Brasil: Localização das microrregiões, por número de latifúndios por exploração em 2014

Fonte: INCRA. Estatísticas Cadastrais 1992, 1998, 2003 e 2014, 2014. Elaborado por: Alcione Talaska.

Considerando as microrregiões, o maior quantitativo de imóveis rurais qualificados como latifúndios por exploração estava localizado na microrregião de Itaituba/PA (2.412), seguida pela microrregião de Barreiras/BA (1.481), Altamira/PA (1.378), Aripuanã/MT (1.012), São Félix do Xingú/PA (962), Jalapão/TO (889) e Norte Araguaia/MT (886). O Apêndice I, traz a lista com a identificação das 100 principais microrregiões em número de latifúndios por exploração no Brasil, conjuntamente com a área ocupada por esses imóveis nas respectivas microrregiões.

A Figura 14 mostra a relação proporcional entre a área ocupada pelos latifúndios (por exploração e por dimensão) e a área total ocupada pelos imóveis rurais no Brasil.

Verificamos, desse modo, que a maior incidência da área ocupada por esses imóveis rurais está localizada no conjunto Norte, Centro-Oeste e parte oeste do Nordeste brasileiro. Especificamente, os Estados do Mato Grosso, do Pará, parcela do Estado do Amazonas, o nordeste do Tocantins, o sul do Piauí e o oeste do Estado da Bahia possuem maior proporção de área ocupada com latifúndios no Brasil.

Figura 14 – Brasil: Área ocupada pelos latifúndios em relação ao total de área dos imóveis rurais no Brasil em 2014

Fonte: INCRA. Estatísticas Cadastrais 1992, 1998, 2003 e 2014, 2014. Elaborado por: Alcione Talaska.

Nesses estados, as microrregiões de Itaituba/PA (5.948.727,24ha), Norte Araguaia/MT (4.940356,76 ha), Aripuanã/MT (4.562.665,02 ha), Barreiras/BA (4.562.569,49 ha), São Félix do Xingú/PA (4.080.762,49 ha), Altamira/PA (3.887.049,06 ha), Alta Floresta/MT (3.008.900,10 ha), Médio Araguaia/MT (2.851.5999,77 ha), Santa Maria da Vitória/BA (2.836.733,94 ha) e Parecis/MT (2.692.153,19 ha) se destacam,

em ordem hierárquica decrescente, na proporção de área ocupada com latifúndios em relação ao total da área ocupada com imóveis rurais no Brasil.

Na região Sul, a maior proporção de área ocupada com latifúndios abrange as microrregiões da Campanha Ocidental/RS, Campos de Lages/SC, Guarapuava/

PR, Toledo/PR, Paranaguá/PR e Curitiba/PR. Na região Sudeste, além da parcela noroeste do Estado de Minas Gerais, também apresentam maior percentual de área ocupada com latifúndios em relação ao total de área ocupada pelos imóveis rurais no Brasil, as microrregiões de Uberlândia/MG, Registro/SP e Presidente Prudente/SP.

Assim, com base nessas informações destacadas, constatamos que a aplicação dos critérios estabelecidos pelo Estatuto da Terra às estatísticas cadastrais atuais do INCRA, evidencia a existência e permanência dos minifúndios e latifúndios na realidade agrária brasileira. Isso significa que, por mais que o processo de elaboração da Constituição Federal de 1988 e os debates e os embates em torno da regulamentação dos dispositivos constitucionais referentes à reforma agrária tenham caminhado para que tais conceitos fossem suprimidos do arcabouço normativo que trata do agrário brasileiro, eles ainda podem contribuir para a interpretação da real conformação agrária do país, pois, ao contrário do que definiu o Art. 16 do Estatuto da Terra, os minifúndios e os latifúndios não foram gradualmente extintos da realidade agrária brasileira, mas sim, foram excluídos do conteúdo das leis, cunhadas a partir de interesses.

Dessa forma, a não utilização de tais conceitos e tipologias na legislação, nos documentos oficiais e, inclusive, nas pesquisas científicas, revela finalidades que suportam estratégias que se materializam através de pretensões de classe – dos proprietários de terras e capitalistas –, pois o processo atual de desenvolvimento do capitalismo no campo mantém inalterada a concentração fundiária do país, criando e recriando, contraditoriamente, latifúndios e minifúndios e mantendo as grandes propriedades improdutivas como forma pela qual seus proprietários auferem a renda da terra e enriquecem, mesmo sem trabalhar. É a “contradição representada pela propriedade privada da terra no Brasil, retida para fins não produtivos” (OLIVEIRA, 2001b, p. 187), mas, especulativos, que possibilita que o “simples fato de ter terra no Brasil, ainda que improdutiva, enriqueça seus proprietários. É um problema grave da questão fundiária” brasileira.

Nesse contexto, na sequência, apresentamos ainda as distorções existentes entre os índices mínimos de produtividade da terra exigidos pelo órgão federal competente e a realidade produtiva agropecuária brasileira, de modo a reforçar o pressuposto de que não há interesse, por parte dos governantes, dos legisladores e do judiciário brasileiro, em limitarem a concentração fundiária e em fazerem cumprir a função social da propriedade da terra no Brasil.

5.4 O escamoteamento das propriedades improdutivas e o não cumprimento da

No documento AINDA EXISTEM LATIFÚNDIOS NO BRASIL? (páginas 185-194)