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Os Projetos de Lei em tramitação no Brasil

O Congresso Nacional vem tentando debater e regulamentar a ortotanásia há muito tempo. Além dos Projetos de Lei (PL) em tramitação, algumas iniciativas de leis sobre o assunto foram propostas e arquivadas por falta de impulso. No Senado, por exemplo, o PL nº 125/96, que buscava autorizar a prática da morte sem dor, apresentado em 05/06/1996, foi encaminhado para Comissão de Constituição e Justiça e, depois de ser redistribuído para vários relatores, foi arquivado ao final da legislatura (29/01/1999).

Atualmente, duas propostas estão em trâmite por iniciativa do Senado Federal. São os projetos de lei 116/2000 e 524/2009, ambos de autoria do Senador Gerson Camata. O PL nº 524/2009 encontra-se na Comissão de Constituição e Justiça do Senado e busca dispor sobre os direitos da pessoa cuja doença está em fase terminal. Foram apensados a ele os projetos: PL 79/2003 e PL 101/2005, todos com o objetivo de disciplinar os direitos dos pacientes em serviços de saúde, e o PL 103/2005, que visa a instituir o estatuto do enfermo.

Por outro lado, o projeto de lei nº 116/2000, responsável por alterar o Código Penal Brasileiro para retirar expressamente a ilicitude da ortotanásia, autorizando a renúncia ao excesso terapêutico, acrescenta dois parágrafos ao final do artigo 121 do Código Penal Brasileiro. A matéria chegou a ser arquivada, tendo sido reativada em 2007, ante o

requerimento de 27 senadores. Após a realização de uma audiência pública, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal efetuou emendas, aprovou o projeto e encaminhou para a Câmara dos Deputados a proposta de criação do artigo 136-A52 para o Código Penal Brasileiro. Na Câmara dos Deputados, esse projeto foi registrado em 23/12/2009, sob o número 6.715/2009 e apensado às demais propostas no mesmo sentido. No dia 08/12/2010 foi aprovado pela Comissão de Seguridade Social e Família, encontrando-se, atualmente, na Comissão de Constituição e Justiça.

Antes de enfocar as propostas em tramitação na Câmara dos Deputados, impende registrar que o projeto para o novo Código Penal (PLS 236/2012), em andamento no Senado Federal, tipifica a eutanásia como crime, no caput do artigo 12253

, impondo pena reduzida (2 a 4 anos) em relação ao Código Penal atual (6 a 20 anos). No parágrafo 1º54

do mesmo dispositivo, o legislador pretende isentar o agente de pena, a depender das circunstâncias do caso concreto, e, no parágrafo 2º55

, reafirma a intenção de expressar a licitude da ortotanásia. No entanto, na Câmara dos Deputados, a iniciativa legislativa mais antiga em tramitação é a de nº 3.002/2008. A ela estão apensos, além do projeto de lei nº 6.715/2009, proveniente do Senado Federal, os projetos nº 5.008/2009 e 6.544/2009. O projeto nº 5.008/2009 tem por escopo proibir a suspensão de cuidados de pacientes em estado vegetativo persistente. Já o de nº 6.544/2009 visa a autorizar a ortotanásia, trazendo conceitos basilares sobre assunto, sem, contudo, fazer uma regulamentação de como ela seria desempenhada.

Já os deputados federais, em vez de tratar da matéria no âmbito penal, optaram, acertadamente, no projeto de lei nº 3.002/2008, por regulamentar a prática da ortotanásia no território nacional, como já acontece na Argentina. A proposta define a ortotanásia como a suspensão de procedimentos extraordinários, que se restringem a prolongar a vida de pacientes terminais artificialmente, quando a cura já não é mais possível.

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Art. 136-A. Não constitui crime, no âmbito dos cuidados paliativos aplicados a paciente terminal, deixar de fazer uso de meios desproporcionais e extraordinários, em situação de morte iminente e inevitável, desde que haja consentimento do paciente ou, em sua impossibilidade, do cônjuge, companheiro, ascendente, descendente ou irmão.

§ 1º A situação de morte iminente e inevitável deve ser previamente atestada por 2 (dois) médicos. § 2º A exclusão de ilicitude prevista neste artigo não se aplica em caso de omissão de uso dos meios terapêuticos ordinários e proporcionais devidos a paciente terminal.

53Art. 122. Matar, por piedade ou compaixão, paciente em estado terminal, imputável e maior, a seu pedido, para abreviar-lhe sofrimento físico insuportável em razão de doença grave: Pena – prisão, de dois a quatro anos. 54

§ 1º O juiz deixará de aplicar a pena avaliando as circunstâncias do caso, bem como a relação de parentesco ou estreitos laços de afeição do agente com a vítima.

55§ 2º Não há crime quando o agente deixa de fazer uso de meios artificiais para manter a vida do paciente em caso de doença grave irreversível, e desde que essa circunstância esteja previamente atestada por dois médicos e haja consentimento do paciente, ou, na sua impossibilidade, de ascendente, descendente, cônjuge, companheiro ou irmão.

Nessa perspectiva, o projeto distingue a obstinação terapêutica das terapias ordinárias, que abrange os cuidados essenciais ao enfermo, englobando assistência de equipe multidisciplinar, nutrição adequada, remédios para alívio da dor e medidas de conforto físico, psíquico, social e espiritual. A proposta busca preservar o direito à informação do doente, pois o médico tem o dever de assegurar que ele tome sua decisão, quando plenamente informado sobre o seu diagnóstico, prognóstico, terapias disponíveis, além das alternativas para alívio da dor. Deve, ainda, cientificá-lo que sempre será possível desistir da ortotanásia, a qualquer tempo e sem nenhuma justificativa.

O projeto registra, ainda, que os planos de saúde, seguros de vida ou testamentos não serão questionados em decorrência do pedido de ortotanásia realizado pelo doente, visto que, nessa hipótese, a morte é natural. A iniciativa legislativa autoriza o médico responsável pelo doente a praticar a ortotanásia, mediante solicitação expressa e por escrito deste ou de seu representante legal, por meio de formulário próprio, que ficará registrado no prontuário. O pedido do paciente deve ser datado e assinado na presença de duas testemunhas e uma junta médica especializada o apreciará. Além do formulário preenchido, o prontuário deverá conter o diagnóstico, o prognóstico, as informações prestadas ao paciente e o parecer da junta médica especializada, ratificando a opinião do médico.

A proposta parece sugerir que é o médico, sob o aval da junta médica especializada, quem decidirá sobre a autorização para a ortotanásia, o que seria uma falha. À equipe médica compete investigar se o caso se enquadra numa situação terminal e prestar ao paciente todas as informações necessárias para que ele possa decidir a respeito do assunto. A iniciativa legislativa também se equivoca ao exigir que a prática da ortotanásia somente poderá ser efetuada após parecer favorável do Ministério Público que, em caso de dúvida, deverá provocar o Poder Judiciário para se manifestar sobre a o pedido do enfermo.

Com toda a deferência que esses órgãos merecem, a decisão é pessoal, não competindo ao Estado, sob qualquer forma, imiscuir-se na vontade consciente e motivada do doente terminal. Não se deve ignorar que esse tipo de expediente inviabiliza a materialização do próprio direito do paciente à ortotanásia, pois o seu sofrimento será prolongado, não só pelos aparelhos, mas pela morosidade e burocracia estatais.

Lembre-se, por oportuno, que competirá ao Ministério Público fiscalizar eventuais irregularidades, tais como: a prática de eutanásia social, traduzida na liberação desregrada de leitos por profissionais de saúde, as negativas injustificadas dos planos de saúde para evitar gastos com pacientes internados nas Unidades de Terapias Intensivas, além do interesse dos hospitais privados em manter pacientes internados na UTI desnecessariamente com o objetivo de auferir mais lucros.

4 O “TESTAMENTO VITAL”: UMA DECLARAÇÃO VÁLIDA E EFICAZ

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