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Os quadros curriculares dos cursos de Pedagogia da cidade de Santos e sua relação com a

CAPÍTULO 2 – DOCENTES E SOCIEDADES MIDIÁTICAS: PENSANDO A FORMAÇÃO

2.6 Os quadros curriculares dos cursos de Pedagogia da cidade de Santos e sua relação com a

A cidade de Santos, localizada na região da Baixada Santista, Estado de São Paulo, conta hoje com seis cursos de Pedagogia, oferecidos pelas seguintes instituições:

UNIMONTE – Centro Universitário Monte Serrat; UNIP – Universidade Paulista; UNISANTA – Universidade Santa Cecília; UNISANTOS – Universidade Católica de Santos; UNIMES – Universidade Metropolitana de Santos e UNILUS – Centro Universitário Lusíadas. São cinco cursos presenciais e um curso à distância – o da UNIMES. Todos os cursos são oferecidos por instituições privadas. Quatro por Universidades e dois por Centros Universitários. Trabalharemos com os quadros curriculares desses cursos, visto que a maior parte dos professores em atuação na rede municipal de Santos é formada por um destes cursos. Discuto dados da pesquisa de campo relativa aos professores e suas atividades docentes no capítulo 4.

Em seguida, apresentaremos, resumidamente, os quadros curriculares dos seis cursos, no aspecto que aqui nos interessa: a relação entre a formação inicial de professores e os aspectos do preparo desses docentes para trabalharem com mídias nas escolas, em sua atuação profissional. Destacarei a relação entre o total de disciplinas propostas, a carga horária total de formação do curso e à proporção que está direcionada, de forma mais específica, a tratar da relação entre aspectos educacionais e comunicacionais. Esta é uma primeira abordagem para trazer à reflexão a relação existente hoje entre a formação inicial de professores e os aspectos relacionados à comunicação midiática, numa sociedade tecnologizada como a nossa. Necessário pensarmos como estão as propostas, inclusive em termos de carga horária, para os cursos de formação de professores e analisarmos se essa carga horária proposta está de acordo com as exigências das quais falamos ao longo deste capítulo, quais sejam: as de uma sociedade com novas demandas, também no que tange a aspectos educacionais e escolares, demandas estas relacionadas ao desenvolvimento tecnológico, a entrada cada vez maior de aparatos tecnológicos em nossas vidas cotidianas, trazendo novas formas de ser e estar no mundo, novas formas de nos relacionarmos enquanto seres humanos. A discussão das cargas horárias é, portanto, apenas uma faceta da nossa reflexão, considerando que os números podem nos ajudar a pensar sobre as questões relacionadas à formação de professores e sua relação com uma sociedade midiática comunicacional. (Os quadros curriculares completos dos cursos de Pedagogia estão nos anexos A, B, C, D, E e F)

Dos seis cursos de Pedagogia da cidade de Santos, cinco fazem referência direta, nos quadros curriculares, à presença de disciplinas que trazem em seu título e suas

ementas, aspectos da formação docente relacionados às novas tecnologias e às questões midiáticas comunicacionais.

Comecemos pelos cursos dos dois centros universitários, UNILUS e UNIMONTE. No curso do UNILUS, a matriz curricular apresenta entre as disciplinas elencadas no 1º. ano a disciplina “Tecnologias Aplicadas à educação”, com carga horária de 80 h. O quadro total de horas do curso é de 3280 horas, sendo destas, portanto, 80 horas destinada a discutir especificamente a relação entre tecnologia e educação. Portanto, podemos considerar que, aproximadamente, 2,43% do curso de Pedagogia do UNILUS discute temas específicos relacionados à comunicação e educação.

No curso do UNIMONTE, com carga horária total de 3280 horas, no 8º. módulo aparece à disciplina: “Educação e Tecnologias”, com uma carga horária de 80 horas, num percentual de 2,5% diante do total de horas de formação proposta aos alunos.

Quatro cursos de Pedagogia são oferecidos por Universidades. São elas: UNISANTOS, UNISANTA, UNIMES e UNIP.

Na matriz curricular da UNISANTA, o 1º. semestre traz a disciplina “Educação e Tecnologias I” e o 2º. semestre a disciplina “Educação e Tecnologias II”, cada uma com respectivamente 72 horas. Com um total de 3280 horas de formação, 144 h são direcionadas a discutir a relação entre educação e tecnologias, num percentual de 4,39% em relação à carga total da formação docente.

No quadro curricular da UNIP, com um total de 3200 horas, aparecem as disciplinas “Didática para o ensino à distância”, ofertada no 6º. semestre e “Informática: tecnologias aplicadas à educação”, no 2º. Semestre, cada uma com carga horária de 36 horas, numa proporção diante do total da carga de 2,25%.

No curso de Pedagogia– ensino a distância – EAD - da UNIMES, no primeiro ano temos a disciplina Comunicação, Educação e Tecnologias, com uma carga horária de 80 h, diante da carga total do curso que é de 3570 horas, trazendo, portanto, um percentual de 2,24% de carga referente à assuntos específicos da relação entre educação, tecnologias e comunicação.

No quadro curricular da UNISANTOS, não aparece uma referência direta a relação entre comunicação, educação e tecnologias no nome de nenhuma das disciplinas. As disciplinas que indicam alguma possibilidade de discussão sobre a relação entre educação e comunicação são: nos 3º e 4º semestres – “Gestão da

Informação I e II”, respectivamente, com carga horária de 34 h cada uma diante da carga total do curso de 3278 horas, o que nos daria um percentual de 2,07% de disciplinas que discutem a relação entre comunicação e educação.

Percebe-se, portanto, que ainda que todos os quadros curriculares apresentem disciplinas que fazem referência à relação entre comunicação e educação, a presença, em termos de carga horária diante do quadro total de horas de formação, é mínima diante das demandas da sociedade atual e das novas formas pelas quais as crianças aprendem, exigindo uma formação de professores compatível com essas transformações. O curso que apresenta uma quantidade maior de horas dedicada diretamente ao tema oferece 4,39% da carga horária total do curso. Se pensarmos na importância que o tema tem hoje, podemos dizer que os cursos de formação inicial não estão dando destaque para as questões educomunicacionais, ainda não tem uma estrutura curricular articulada às interfaces entre questões comunicacionais e educacionais, necessitando pensar em como é possível realizar um repensar dos processos formativos.

Em pesquisa realizada por GATTI e BARRETO (2009), com cursos de formação de professores em todo o Brasil, aparece dado semelhante. As pesquisadoras fazem uma categorização quanto às disciplinas obrigatórias presentes nas estruturas curriculares dos cursos de formação inicial docente e evidenciam que os conhecimentos relativos às tecnologias estão na categoria de análise “conhecimentos relativos à formação profissional específica”, na subcategoria “tecnologias” e aparecem num percentual de 0,7% nos quadros curriculares. Outra categoria utilizada pelas pesquisadoras foi a categoria “outros saberes’, que incluía as disciplinas que ampliam o repertório dos professores como, temas transversais, novas tecnologias etc. Essa categoria aparece, em termos de Brasil, oferecida em 5,6% dos cursos de formação de professores, número bastante próximo aos encontrados nas estruturas curriculares dos cursos de Pedagogia da cidade de Santos.

Analisados estes quadros percebe-se que existe, por parte das instituições formadoras - pelo menos quanto aos quadros curriculares - uma atenção pequena em termos de quantidade de horas diante do computo geral de horas dos cursos - ao aspecto do preparo do futuro docente para seu trabalho com a questão das mídias comunicacionais em sua relação com processos educacionais.

Ao evidenciarmos o impacto que as novas tecnologias trazem para a constituição da dinâmica social, evidenciamos também o impacto que trazem para as escolas, para o cotidiano dos processos de ensino aprendizagem, o que traz novas exigências para os processos de formação de professores. Como coloca Citelli:

A despeito dos novos paradigmas sociotécnicos, da ambiência mediática, da presença dos nativos digitais, de formas de sensibilidade e sociabilidade orientadas por outras percepções dos vínculos entre tempo e espaço, os programas de formação para o magistério tendem a permanecer amarrados a outros contornos epistemológicos, certamente de extrema importância em suas singularidades, mas insuficientes para abranger demandas, expectativas, contradições, jogos de linguagem, operações de acobertamentos e revelações, que a amplitude da comunicação oferece à vida social. (CITELLI, 2011: 61-62)

Há necessidade de repensar práticas didáticas e pedagógicas e está reflexão precisa estar presente nos cursos de formação inicial de professores, onde os futuros docentes têm tempo e espaço para reflexões, para construir novas possibilidades pedagógicas, onde podem entrar em contato, também em seus processos de formação inicial, com maneiras de se relacionar com novas linguagens, com sistemas de signos veiculados em suportes diferentes dos tradicionais.

Os dados trazidos no estudo nacional de ementas das estruturas curriculares apontam como estão nossos cursos de formação inicial na constatação de GATTI e BARRETO:

Destaque-se o desequilíbrio na relação teoria- prática, em favor do pretenso tratamento de fundamentos e teorizações. Note-se que a escola é objeto quase ausente nas ementas, o que leva a pensar numa formação de caráter mais abstrato e pouco integrado ao contexto concreto em que o profissional professor deve atuar, haja vista que, dentre as ementas examinadas, pode- se encontrar referência explícita à palavra escola em apenas 8% delas. (GATTI e BARRETO, 2009: 130-131)

Estamos nos construindo professores de uma forma um pouco distante em relação ao cotidiano das nossas escolas, aos nossos cotidianos sociais! As matrizes curriculares dos cursos de formação inicial, em função das diferentes realidades que vivenciamos nas sociedades contemporâneas, podem ser revistas, repensadas, trazendo em seu bojo uma articulação mais consistente com as realidades das escolas e das crianças e jovens atuais, trazendo uma articulação mais consistente entre as questões da educação e as questões da comunicação, trazendo um pensar sobre a formação docente

numa sociedade perpassada por mídias, por avanços tecnológicos constantes e impactantes em todo o tecido social.

As propostas de formação das instituições educacionais necessitam estar atentas a questões contemporâneas, atentas no que se refere a mudanças tecnológicas e comunicacionais e como essas mudanças impactam o cotidiano das escolas.

Os estudiosos da área de formação de professores, como apresentamos acima, destacam a necessidade de uma formação inicial mais conectada às dimensões do cotidiano, uma formação inicial que ajude os professores, na constituição de sua profissionalidade docente, a refletir sobre as questões educacionais e escolares em sua relação com as questões sócio culturais e construir possibilidades efetivas de ação e transformação na direção da construção de uma escola mais cidadã, articulada a construção de uma sociedade mais igualitária e democrática. Nas palavras de PIMENTA:

Qual é o papel da escola na sociedade hoje? É garantir o acesso ao conhecimento de qualidade por parte de todas as crianças e jovens a esse instrumental, a fim de que se situem no mundo. Um mundo que é rico em avanços civilizatórios. E, em decorrência, apresenta imensos problemas de desigualdade social, econômica e cultural. De valores. De finalidades. A tarefa da escola é inserir as crianças e jovens tanto no avanço como na problemática do mundo de hoje, pela reflexão, pelo conhecimento, pela análise, pela compreensão, pela contextualização, pelo desenvolvimento de habilidades e atitudes. (PIMENTA, 2002: 62)

Para que a escola se situe desta forma, capaz de colaborar na inserção cidadã das crianças e jovens no mundo contemporâneo, a formação de professores precisa estar articulada com essas mesmas questões, para preparar professores capazes de se situarem no mundo, refletir sobre a sociedade em que estão inseridos, capazes de fazer análises das conjunturas sócio culturais, de buscar caminhos alternativos para os problemas que se apresentam, capazes de fazer a gestão dos processos de sala de aula, na construção de uma escola mais democrática e cidadã.

Diante da sociedade atual, com novas demandas em diversos setores, principalmente nos referentes à comunicação e sua implicações na educação, há falta de políticas de formação de professores voltadas, de forma mais específicas, para essas questões da educomunicação. O país precisa de um projeto formativo claro de acordo com as necessidades e objetivos reais para as escolas atuais, que entre outras questões, também considere a necessidade urgente de articular as questões educacionais a

questões comunicacionais, área tão estratégica para o desenvolvimento dos países, para um desenvolvimento que considere a autonomia do ser humano, sua capacidade crítica, seu posicionamento claro diante das questões fundamentais que envolvem o viver em sociedade. Segundo Almeida:

(...) necessidade de formar um professor capaz de desenvolver uma cultura profissional que lhe assegure o papel e a possibilidade de ser, individual e coletivamente, um agente de mudança que dê conta de enfrentar situações problemáticas contextualizadas, em meio às quais ele saiba não só o que fazer e como fazer, mas também porque e para que fazê-lo. Ou seja, falamos de um processo formativo sustentado na articulação teoria-prática, onde o professor desenvolva a capacidade de olhar para si, para o ensino e para a aprendizagem enquanto um processo de ação dinâmica, vivo, contextualizado e transformador, ou seja, uma prática social complexa. (ALMEIDA, 2011:54)

Esta complexidade da prática docente contemporânea exige a produção de conhecimentos que possam fundamentar tal prática. Esses conhecimentos podem ser construídos a partir de saberes trabalhados nos cursos de Pedagogia, nos cursos de formação inicial de docentes. Saberes construídos coletivamente pelos docentes, os que estão já formados, portanto em processos de formação contínua e os que estão em processos de formação inicial, ressignificando os cotidianos escolares, a partir de uma concepção epistemológica da prática, que promova uma articulação entre teoria e prática capaz de fertilizar nossas escolas e seus processos de ensino e aprendizagem.

Como colocado por Gatti, Barreto e André, há necessidade de políticas públicas voltadas para a formação docente que sejam mais claras e incisivas, pois

O problema da formação do licenciado como profissional professor se acha descurado de sua qualidade na direção do perfil de profissional com condições mínimas de adentrar em uma escola em que crianças e jovens em desenvolvimento dependem de seu trabalho para chegar à cidadania plena. (GATTI, BARRETO e ANDRÉ, 2011: 117)

Portanto, as políticas docentes também precisam debruçar-se sobre a complexidade das sociedades atuais, colaborando para que haja articulação entre teoria e prática nos processos de formação inicial de docentes, preparando-os para as múltiplas realidades com as quais se defrontarão em seus tempos e espaços de trabalho. Ainda cabe destacar que, embora muitas iniciativas e propostas de mudanças sejam apresentadas quanto à formação inicial de professores, os pesquisadores alertam que não se tem mexido no ponto nevrálgico:

As gestões educacionais e as universidades têm apenas proposto reformulação deste ou daquele aspecto desses cursos, não tocando no âmago da questão, tão bem salientado nas análises: sua estrutura institucional e a distribuição de seus conteúdos curriculares. (GATTI, BARRETO e ANDRÉ, 2011:135)

Ressalte-se que a maior parte dos cursos de formação de professores está sob o controle da iniciativa privada, o que inclui as licenciaturas em geral e, principalmente, os cursos de Pedagogia. O governo federal brasileiro tem ampliado sua participação nos processos de formação inicial de professores, com cursos voltados a essa questão e também com ações via ensino à distância. Entretanto, os cursos de Pedagogia, onde formamos os professores polivalentes do ensino fundamental e da educação infantil são predominantemente privados.11 Embora esse não seja o foco desta pesquisa, são dados que trazem a premência de reflexões e análises diante da complexidade das relações de poder que estão permeando os processos formativos dos docentes.

Ainda destaco outra situação a ser levada em consideração. “Ao falar de qualidade dos professores da educação básica, também se está indiretamente referindo aos gestores de escolas que, de origem, são professores.” (GATTI, BARRETO e ANDRÉ, 2011:28). Aqueles que podem colaborar na articulação dos processos escolares, junto aos docentes, também foram formados nos cursos de Pedagogia, portanto tem as mesmas fragilidades já apontadas em seus processos formativos. Os gestores das escolas foram formados diante do quadro que apresentamos: com uma formação mais teórica do que vinculada com as práticas, com um olhar que pouco se debruça diante das realidades das escolas concretas. No caso do foco desta pesquisa, foram formados com poucas discussões e vivências quanto aos aspectos educomunicacionais, quanto às interfaces entre processos escolares e sociedades midiáticas.

A formação de profissionais professores para a educação básica tem de basear-se em seu campo de prática, com seus saberes, integrando-os com os conhecimentos necessários como valorosos, em seus fundamentos e com as mediações didáticas necessárias, sobretudo por se tratar de formação para o trabalho educacional com crianças e adolescentes. (GATTI, BARRETO e ANDRÉ, 2011:136)

Destacando que hoje a prática é perpassada pelas questões midiáticas, os saberes são atravessados pelas múltiplas linguagens, nos mais variados suportes, com os quais

11 Segundo o Censo 2010 da Educação Superior, são os seguintes os números de matrículas em cursos de graduação presenciais de Pedagogia: total de matrículas: 297.581, sendo 36.120 em instituições federais, 52.104 em estaduais, 5.662 em municipais e 203.695 em instituições privadas. (portal.inep.gov.br, acesso em 27.01.12)

convivemos todos os dias, nós professores e nossos alunos, inclusive os que estão em processo de formação para a docência.

Para aprofundarmos a compreensão das questões que relacionam aspectos da formação de professores a aspectos comunicacionais e tecnológicos da sociedade contemporânea, no próximo capítulo discutimos a formação docente e sua relação com a comunicação, com as mídias e suas interfaces com a educação e o cotidiano das escolas. Discutiremos o que está proposto nas ementas das disciplinas acima elencadas e quais outros aspectos e elementos formativos dos cursos de professores que podem colaborar na construção da identidade de um profissional preparado para novas demandas sociais que interpelam os processos de ensino e aprendizagem nas sociedades midiáticas contemporâneas.

CAPÍTULO 3 - FORMAÇÃO DE PROFESSORES E INTERFACES