• Nenhum resultado encontrado

3. Definição dos principais conceitos

3.3. Os regimes internacionais

Como já foi colocado anteriormente, depois da Segunda Guerra Mundial há um forte crescimento no número, na variedade e na importância das organizações internacionais. Essas organizações são para fins humanitários, de manutenção da paz e para fins financeiros, como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial, fundados nos anos oitenta. Os governos estão recorrendo cada vez mais às organizações internacionais para fins de segurança, respostas a problemas sociais e ecológicos e também para lidar com desafios humanitários.

Para Pierre de Senarclens poucos avanços foram feitos no estudo das organizações internacionais nas últimas décadas, pelo menos nada que fuja do viés funcionalista. Nem mesmo o crescimento das organizações internacionais e das organizações não- governamentais fizeram com que este tipo de estudo tomasse fôlego novo. Na verdade a grande variedade de organizações faz com seu estudo sistemático torne-se cada vez mais

difícil. Para este autor as análises políticas sobre as organizações internacionais ainda são bastante rudimentares. Ele deve isso à dominação exercida sobre a abordagem realista exposta acima. Esta abordagem coloca o foco nos Estados e não nas organizações internacionais.

Por outro lado, a abordagem funcionalista, tem base idealista e acredita que as organizações internacionais se baseiam na cooperação. Para este autor, o estudo das relações internacionais não deve se confinar às análises de relação de poder como acreditam os realistas, ele considera que este viés teórico coloca ênfase nas instituições internacionais, mas não identificam as partes que o compõem. Por isso o institucionalismo será também abordado neste trabalho, mais adiante.

Não existe uma única definição de regime, talvez tenha sido esta falta de clareza na definição que fez com que as organizações internacionais não desempenhassem o papel que deveriam dentro dos estudos das relações internacionais até agora. Regime é definido tradicionalmente como a maneira de administrar ou governar uma comunidade. Pode-se falar de regimes autoritários ou liberais quando se define um sistema de legitimidade e modelos específicos de organização econômica, social e política. Contudo, numa definição mais restrita, regime é o conjunto de provisões legais ou administrativas para organizar uma instituição. Transposto para o estudo de política internacional, o conceito de regime pode ser definido como um conjunto de princípios regras e práticas políticas que formam o cenário institucional para uma ordem regional ou mundial ou qualquer outra modalidade de cooperação muito específica como aquelas instituídas pela convenção internacional. A noção de regime internacional não pode ser confundida com a de ordem internacional. Esta é um conjunto institucional governando os membros da comunidade internacional.

Talvez a mais famosa definição de regimes seja a colocada por Stephen Krasner. Ele acredita que regimes são conjuntos de princípios, normas e regras. "International regimes

are defined as principles, norms, rules, and decision-making procedures around which actor expectations converge in a given issue-area" (Krasner, 1993, p. 1). Krasner aponta

três caminhos para a questão dos regimes. O primeiro é representado no livro International

Regimes por Oran Young, Raymond Hopkins e Donald Puchala. Estes autores acreditam

que os regimes são uma característica difusa do sistema internacional. Nenhum comportamento padronizado pode se sustentar sem gerar um regime congruente, portanto regimes e comportamento estão inexoravelmente interligados. Já para Suzan Strange regime é considerado um conceito enganoso que obscurece as relações econômicas e de poder. Esta autora rejeita todo papel significativo dos princípios, normas regras e processos de tomada de decisão.

A maioria dos outros autores que o livro apresenta, como: Arthur Stein, Keohane, Jervis, Ruggie, Lipson e Cohen, têm uma abordagem realista do sistema internacional que é funcionalmente simétrico. Os Estados são dotados de poder máximo convivendo num ambiente anárquico. Para estes autores os regimes têm um significado importante mesmo em um ambiente internacional anárquico.

Krasner define regimes como um conjunto de princípios, normas, regras e processos de tomada de decisão implícitos ou explícitos, em torno dos quais as expectativas dos atores convergem numa dada área das relações internacionais. Para ele princípios são crenças de fatos, causas e retidão, já normas são padrões de comportamento definidos em termos de direitos e obrigações. Regras são prescrições de ação e processos de tomada de decisão são práticas que prevalecem para fazer e para programar a decisão ou a escolha coletiva. Partindo disto, Keohane e Nye definem regimes como conjuntos de arranjos governamentais, sendo mais que simples arranjos temporários, diferenciando-se dos acordos.

Para Krasner, princípios e normas são a características básicas de um regime. Já regras e processos de tomada de decisão podem ser diferentes e continuarem a serem consistentes com os mesmos princípios e normas que estruturam os regimes. Mudanças nas regras e nos procedimentos não significam mudanças profundas nos regimes. Ao contrário, mudanças nos princípios e normas refletem mudanças nos regimes. Os regimes são

definidos como variáveis intervenientes que se colocam entre as variáveis causais básicas e os comportamentos e resultados relacionados.

A questão analítica central colocada por International Regimes é se os regimes realmente importam. Para esta pergunta cada grupo de autores do livro coloca uma resposta diferente. A primeira corrente apresentada acredita que o conceito é pernicioso porque ofusca e obscurece as relações de poder e interesses. Para Suzan Strange, o poder e os interesses são as causas mais próximas do comportamento dos países no sistema internacional. Para esta corrente, os regimes têm pouco ou nenhum impacto. Os Estados agem de acordo com seus próprios interesses, no mínimo buscam a sua preservação e no máximo buscam a dominação universal. Para a segunda abordagem tratada o sistema de regimes internacionais é derivado de acordos voluntários entre atores juridicamente iguais. Para Stein, a definição clássica de política internacional é uma relação entre entidades soberanas.

Num mundo de Estados soberanos a função dos regimes é coordenar o comportamento destes Estados, pois os cálculos individuais podem não promover os níveis necessários de coordenação. No entanto os regimes não são relevantes para situações de soma zero, quando os Estados agem para maximizar as diferenças entre suas utilidades e as dos outros. Para a maioria das situações há uma ligação direta entre as variáveis causais básicas e as conseqüências relacionadas. No entanto, sob circunstâncias que não são puramente conflituais ou quando as decisões individuais trazem respostas ou conseqüências que são subótimas os regimes são mais relevantes.

A terceira abordagem, representada principalmente por Hopkins, Puchala e Young, vem de uma tradição grotiana que vê os regimes como um fenômeno difuso de todos os sistemas políticos, para eles, os regimes existem em todas as áreas das relações internacionais. Acreditam que a perspectiva realista sobre regimes é muito, limitada para explicar um mundo complexo, interdependente e perigoso. Esta visão também rejeita a

idéia de que o sistema internacional é composto de Estados soberanos limitados apenas pelo balanço de poder.

Isto posto, pode-se considerar com o realismo político as relações internacionais são entendidas através de seu elemento conflitivo, ou seja, considerando a característica anárquica do sistema internacional, onde o equilíbrio entre as nações é obtido através do conflito ou da possibilidade deste. Mesmo o neo-realismo criado na década de 70 baseia-se na busca do poder e na concepção de um sistema internacional cuja natureza é anárquica. O Estado é o ator central das decisões internacionais, é o único cuja relevância não pode ser contestada. Mesmo que o sistema internacional seja bipolar ou pluripolar a base deste é o Estado.

Quanto aos regimes, é possível perceber que há predominância atribuída às relações de poder na formação e eventual permanência dos regimes internacionais. Partindo desta perspectiva é possível entender que, mais que negociados, os regimes surgem na medida em que são impostos aos atores nas relações internacionais por aqueles que dispõem de maior volume de recursos de poder. Assim, a atenção de alguns dos autores aqui descritos direciona-se para a teoria da estabilidade hegemônica e suas variantes. A noção de que o poder é visto como um meio de que se servem os Estados para atingir seus objetivos nos faz acreditar que os regimes desempenham papel crucial para o estabelecimento e a manutenção das relações de poder.

Pode-se perceber, desta maneira, que não é possível dissociar a análise dos regimes do entendimento prévio dos paradigmas das relações internacionais, principalmente do paradigma realista que fundamenta a reflexão de muitos autores que pensam os regimes internacionais.

Assim as nações com seus regimes e suas civilizações, ou seja, a natureza humana e social constituem os determinantes mais ou menos disponíveis da política externa. Vê-se,

portanto a importância que os regimes representam para o estudo das relações internacionais.

Capítulo II

Brasil e sua história diplomática

Para que possamos entender quais as posições dos atuais líderes da política externa brasileira é importante que tenhamos a dimensão da história que os precedeu. Assim, este capítulo pretende expor brevemente os antecedentes da política externa brasileira.