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3. Organização e Gestão do Ensino e da Aprendizagem

3.1. Os Saberes Profissionais: A Identidade

A necessidade do estudo das identidades profissionais, especificamente a dos professores, deve-se à existência de múltiplas possibilidades de interpretação da mesma, dependendo do ponto de vista que se quer abordar, (Miranda, 2010).

Assim, para melhor perceber e contextualizar o sentido identitário do professor, com focalização particular no de EF, realizei pesquisa bibliográfica. A partir dos autores consultados, destaco as ideias seguintes:

Segundo Miranda (2010, p. 127), “A construção da identidade

profissional está atrelada às relações que o professor estabelece com a sua profissão e com as pessoas com quem trabalha (…)”. Refere ainda a mesma,

que vários autores compreendem que “(…) identidade profissional e pessoal

são processos integradores, constituindo uma unidade professor-pessoa pela qual não se pode analisar uma identidade pessoal desvinculada da identidade profissional.”, ideia corroborada por Gohier et al. (2001), referindo-se à

identidade profissional como um processo que integra uma dualidade: a dimensão profissional e a pessoal, e estas não dissociáveis (Miranda, 2010).

Miranda (2010) assume que as transformações sucedidas no ser humano dependem dos contextos pessoais e profissionais nos quais estão inseridos, dado que não é praticável dissociar o indivíduo do mundo exterior, o que indica que toda a alteração no campo profissional está ligada às alterações pessoais.

Neste âmbito, Tardif (2000), citado por Miranda, faz uma afirmação que me suscitou particular interesse, quando refere que “Trabalhar não é somente

fazer alguma coisa, mas fazer alguma coisa de si mesmo consigo mesmo (…) consequentemente, a atividade profissional imprime marcas na identidade

O desenvolvimento profissional é, assim, visto numa perspetiva holística, de unicidade do indivíduo (Miranda, 2010). A história, as experiências de vida e os contextos sociais, culturais e institucionais e aquilo que é enquanto pessoa, o que aprende e ensina, fazem parte do desenvolvimento profissional do professor.

Oliveira (2004), citado por Miranda (2010), defende ainda, que a identidade profissional, para além das dimensões referidas, depende igualmente da dimensão social. A construção da identidade profissional também está ligada à relação que o professor estabelece com os seus pares, constituindo-se assim a profissão como uma fonte capital de produção identitária, sendo que a dimensão social está associada ao processo de socialização na profissão, uma vez que o individuo adota os papéis, valores e padrões do seu grupo profissional.

Revejo-me nestas palavras, dado que, como professora estagiária, sinto que toda a minha experiência de vida efetivamente me influencia na prática pedagógica. Por exemplo, tendo um filho com uma idade muito próxima da dos meus alunos, vi-me a entendê-los nos papéis de professora e até de mãe. Neste aspeto num dos momentos de supervisão, o meu Orientador, Professor José Guilherme, situou-me ao fazer-me perceber que não podia desenvolver um sentimento tão maternal pelos alunos, usando uma frase que me marcou indelevelmente: “És professora deles e não mãe deles!”. Serve isto para mostrar o quanto o “eu” pessoal me estava a influenciar enquanto profissional.

A essência da identidade profissional resulta, segundo Ferreira (2003), citado por Miranda (2010, p. 123), que “(…), a identidade profissional são

processos e produtos que surgem de dinâmicas de ação individual e coletiva e não pode ser considerada como dados objetivos nem sentimentos subjetivos. De acordo com o autor, a compreensão das relações de trabalho e da formação resulta na noção de identidade profissional.” Na mesma linha,

Lessard (1986),citado por Cunha, (2008, p. 42), referindo-se especificamente à identidade profissional do professor, indica que esta apresenta-se na relação docente-profissão-grupo de pares, traduzida numa perspetiva que envolve na sua atividade as dimensões “(…): capital de saberes, saber–fazer e saber-ser,

que fundamentam a prática do professor, condições do seu exercicio, em termos de autonomia, controlo e circunstancialismos de contexto; pertinência cultural e social; questões relativas ao estatuto profissional e social da função do docente.”

Cunha, (2008, p. 27), alude a que “(…), a identidade e o processo de

construção da identidade do professor seja uma dinâmica que se desenvolve ao longo da vida, em espaços diversificados, onde estão presentes conflitos mais ou menos intensos, que têm subjacentes normas, funções valores e códigos de comportamento, associados ao grupo profissional dos professores.”, vincando assim que, no sistema de educação atual, são

múltiplas as funções e responsabilidades do profissional de educação, o que provoca uma indefinição do seu papel, existindo uma subsequente crise profissional, devido ao mau-estar provocado por estes fatores.

Cunha (2008, p. 64) refere que “As funções do professor são cada vez mais multifacetadas e complexas, uma vez que já não se limitam apenas aos conhecimentos especificos (…), sendo-lhes exigidas outras actuações,(…)) situação esta devida, segundo o mesmo autor ao aparecimento da escola de massas, que levou a transformações profundas na Educação, na formação e na profissão dos professores. Por consequência, segundo Formosinho (1992 a), citado por Cunha (2008, p. 26), “(…) a profissão deverá pressupor um

construto individual e coletivo, enquadrado em normas, valores e códigos de comportamento, que caracterizam o grupo, o individuo, bem como os outros pares, a sociedade, os elementos exteriores ao grupo e outros grupos profissionais que reconhecem a profissão.”

Para Popkewitz (1992), citado por Cunha, (2008, p. 17) “(…) o vocábulo

«profissão» refere-se a um grupo altamente competente, especializado, dedicado e bem formado, que preconiza uma categoria, concedendo uma posição social (confiança) e privilégios a determinados grupos (p. 37.)”. Dado

que se aprende em instituições educativas (o que permite a aquisição de um conjunto de conhecimentos especializados de caráter cientifico, técnico, … de acesso específico a este grupo profissional), a aquisição destes

grupo profissional e garantem a qualidade do serviço que se presta à comunidade (saber, saber fazer).”

No caso do professor de EF, o processo de socialização acontece de uma forma não distante à dos professores em geral, existindo muitos pontos em comum a estes e embora permaneçam particularidades desta área que influenciam e são integradas no futuro docente que, ao participar no mundo da atividade física e no seu contexto, refletem-no no futuro. O indivíduo ao passar pela experiência da prática de um desporto, ou de uma atividade física, reporta essa experiência para a sua história enquanto professor de EF no futuro, assistindo-se a uma influência bastante significativa na sua socialização profissional (Miranda, 2010). Particularmente para estes professores, o processo de socialização decorre ao longo da vida, bem como a sua experiência enquanto alunos durante anos enriquece os seus processos de socialização. Alguns autores referenciam este processo como “socialização

antecipatória” (Miranda, 2010). Embora, o prisma de visão enquanto alunos

não seja o adequado, para a prática docente, caberá aos cursos de formação diligenciar a modificação dessas crenças e outras que se revelem desapropriadas para o ensino. Caberá ao professor, durante a sua formação inicial, adquirir “(…) os conhecimentos científicos e pedagógicos e as

competências necessárias para enfrentar adequadamente a carreira docente.”

como afirma Camilo Cunha, citado por Miranda, (2010, p. 120).

Daí a importância do EP, no qual a reflexão se caracteriza como essência primordial, auxiliando deste modo o decurso da apropriação e reinterpretação do papel de professor e da cultura da EF escolar. O EP contribui para que o estagiário se encontre frente a frente com situações problemáticas reais as quais o levam a desenvolver resoluções para as mesmas, levando à construção de novos saberes. Ele constitui um espaço de reflexão sobre a aprendizagem da docência, pois este tipo de aprendizagem necessita de reflexão para que o estudante compreenda e interiorize a alteração do significado do ser professor, como indica Miranda, (2010, p. 122).