1 O TRABALHO E SUAS TENTATIVAS DE RESSIGNIFICAÇÕES NA
2.3 Os sentidos da universidade
A vivência ou própria projeção dessa vivência na universidade aflora os
sentidos: visão, paladar, audição, tato e olfato. Para os sujeitos que utilizam as mais
variadas maneiras desse espaço as sensações do tempo-espaço universitário são distintas
e até mesmo conflituosas. Poderia delongar aqui só descrevendo as variações possíveis
acerca de subjetividades sugeridas por estar ou ter passado pela universidade, todavia
não o farei. Mas tenciono aguçar a reflexão sobre esse espaço universitário para além de
análises frias, também necessárias, para compreensão de como esta transparece afetos
(no sentido de mudar ou de tornar o outro mais próximo a partir da reflexão de
determinada realidade) através dos consensos ou disputas em seu meio.
Engels (1999) já anunciava que os sentidos contribuem para que o homem
desenvolva e aprimore suas manifestações de desenvolvimento humano e próprias
habilidades e competências essenciais a subsistência ao utilizar a natureza e a si mesmo
no processo de aprendizagens.
O ambiente proposto pela universidade permite utilizar dos sentidos para tornar
as vivências e interações do meio universitário a partir de imagens momentâneas de
percepções e sensações que se permite refletir seus cenários como elemento constituinte
das relações institucionais e organizacionais no seu interior, assim como esta tem sido
âncora permanente de pensamentos a favor de estabelecimentos do capitalismo
dependente, e por pequenos grupos combativos as atrocidades que são solapadas por
essa sociedade. Portanto, afirmo que a universidade tem sido ao longo do tempo um
aparelho privado de hegemonia (GRAMSCI), dotada de grupos que precariza sua esfera
institucional quanto abrangência política e autônoma por seu colegiado, e ao mesmo
tempo organizacional quanto às necessidades de ajustes para sua expansão seja ele
público ou de caráter privado.
Na presente tese, compreende que tudo isso coaduna com as relações intrínsecas
ao trabalho. Pois o trabalho é constituinte da própria vida do homem. No entanto,
mesmo sabendo da existência de outros fatores de constituição do homem, atrelo a essa
discussão a universidade, em particular o curso de Pedagogia, como um nicho
fundamental para a formação dessa vida humana em sociedade e carregada de
subjetividades, que sofre disputas desde sua fundação, pois é lugar de materialidade da
discussão de sociedade pelos eixos constituintes de ensino, pesquisa e extensão.
Parto da universidade, porque na sociedade foi feito um construto, em especial
pela classe trabalhadora, que na busca de um profissionalismo cada vez mais latente por
ter se tornado também nicho de acumulação do capital, projeta seu futuro de
sobrevivência pela entrada na universidade. Se antes, era a necessidade de entender a
máquina que se fazia surgir a TCH, na atualidade o próprio homem virou mercadoria
como Marx (2006, p.66) já postulava: “O trabalhador transformou-se numa mercadoria
e terá muita sorte se puder encontrar um comprador”. O consumo de mais
aprimoramento educacional fez com que a classe trabalhadora vislumbrasse o escambo
do conhecimento como método de ascensão social .
Chauí (2001) acrescenta que:
Se, outrora, a escola foi o lugar privilegiado para a reprodução da estrutura de classe, das relações de poder e da ideologia dominante, e se, na concepção liberal, a escola superior se distinguia das demais por ser um bem cultural das elites dirigentes, hoje, com a reforma do ensino, a educação é encarada como adestramento de mão de obra para o mercado. (CHAUÍ, 2001, p.52).
Ainda em Chauí (Ibdem) colabora-se para a percepção:
[...] que a universidade tem hoje um papel que alguns não querem desempenhar, mas que é determinante para a existência da própria universidade: criar incompetentes sociais e políticos, realizar com a cultura o que a empresa realiza com o trabalho, isto é, parcelar, fragmentar, limitar o conhecimento e impedir o pensamento, de modo a bloquear toda tentativa concreta de decisão, controle e participação, tanto no plano da produção material quanto no da produção intelectual. Se a universidade brasileira está em crise é simplesmente porque a reforma do ensino inverteu seu sentido e finalidade – em lugar de criar elites dirigentes, está destinada a adestrar mão de obra dócil para um mercado sempre incerto. (CHAUÍ, 2001, p.46).
Essa agenda voltada para a universidade desde então só se sofisticou e se
transformou em discursos mais brandos e envolventes, de modo a tirar a “rebeldia” da
universidade para alavancar processos de expansão e popularização desse espaço. Essa
afirmação de Chauí continua tão vida quanto em sua elaboração em nossa análise.
Em pleno meado de 2019, um novo programa permeando as discussões de
universidade, “Future-se”, a fim de colocar a educação no campo dos serviços, deixa de
considerá-la um direito dos cidadãos e passa a tratá-la como qualquer outro serviço
público, que pode ser terceirizado ou privatizado(CHAUÍ, 2001, p.177).
Nesse sentido, o ensino superior continua a:
[...] funcionar como uma espécie de „variável flutuante‟ do modelo econômico, que ora é estimulada com investimento ora é desativada por cortes de verbas, segundo critérios totalmente alheios à educação e à pesquisa, pois determinados exclusivamente pelo desempenho do capital. (CHAUÍ, 2001, pp.52-53).