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OS TRABALHADORES POBRES DA INGLATERRA

4 DICKENS – PERFIL

4.2 OS TRABALHADORES POBRES DA INGLATERRA

A época em que Dickens viveu (1812-1870), na Inglaterra, foi de grande transformação social, cultural e demográfica. Londres se transformava na maior metrópole da Europa, para não dizer, do mundo. Em busca de trabalho, os milhares de imigrantes e ingleses da zona rural que invadiram a cidade, tiveram que conviver com uma vida em transformação e em “ascensão”. Era uma “Londres mais comercial que industrial”, conforme afirma Eagleton:

A Londres de Dickens era mais comercial que industrial, por isso o foco da sua ficção são os funcionários, advogados e banqueiros, em vez de trabalhadores industriais ou donos de fábricas, seu único romance “industrial”, Hard Times, o mostrou não familiar com a industrialização, nunca foi nem possível saber o que era produzido nas fábricas, de Bounderby e a cidade Coketown é retratada em termos impressionistas, como se ele a estivesse olhando da janela de um trem. (2005, p. 143). (Tradução livre).

O modo de vida dos trabalhadores pobres, da Inglaterra vitoriana, mais precisamente, da Inglaterra “industrial” era de pura miséria, desmoralização e desesperança. Eles só tinham duas alternativas: lutar para fazer parte da burguesia individualista ou se revoltar contra a opressão desenfreada.

A primeira opção, de caráter individualista e utilitário, era bastante improvável, tendo em vista o ser não possuir o mínimo nem mesmo para viver, muito menos meios para conseguir chegar a burguesia ou fazer parte dela. O lema da sociedade burguesa, cada dia mais desumana, era: “cada um por si e Deus por todos”, No original: “Every man for himself and the devil take the hindmost” (provérbio do início do Século XVI). Como consequências desse abismo social, entre a burguesia e a classe trabalhadora, temos um alto índice de prostituição, infanticídio, suicídio, demência e alcoolismo. A

expectativa de vida, à época, em Manchester/Inglaterra, por exemplo, era de 17 anos de idade. A Europa Ocidental já se tornara uma grande catástrofe urbana social. Uma das consequências mais desastrosas dessa deterioração, para a classe trabalhadora, até então, foi a volta das grandes epidemias, destruindo cidades inteiras, do oeste europeu. Somente em 1848, quando essas epidemias atingiram também a burguesia, é que providências começaram a ser tomadas no sentido de melhorar a vida na urbanização.

A segunda opção da classe trabalhadora era a revolta contra a classe burguesa. Foi nessa época que surgiram o movimento trabalhista, o socialista e as revoluções em massa. Essa situação de “descompensação” social, onde a miséria estava superando os meios de subsistência, era visível por muitos, dentre eles, estudiosos e escritores. Nessa época, o número de mortes superara o de nascimentos. Sobreviver era uma batalha contra a moderna indústria. As mulheres e as crianças, por serem mais resilientes e menos inclinadas a revoltas, compunham a mão de obra preferida dos proprietários das fábricas. Com o passar do tempo, o grito dos pobres trabalhadores começou a ser ouvido pelos poderes instituídos graças às lutas dos movimentos operários. Nessa época (mais precisamente, em 1830), o movimento de consciência de classe e as revoltas passaram a ser entre a classe operária (a que realmente trabalhava) e a classe dos patrões capitalistas (que não trabalhavam); não mais entre os “ricos” e os “pobres”. Ser solidário era o maior mandamento do código moral dessa sociedade em luta de classes e, para o trabalhador pobre, essa luta era seu modo de vida. Tristemente, o que os mantinham unidos era a miséria, a esperança, o desespero.

Em A situação da classe trabalhadora na Inglaterra (2010), Engels ilustra essa constante luta de classes:

Na escala em que, nessa guerra social, as armas de combate são o capital, a propriedade direta ou indireta dos meios de subsistência e dos meios de produção, é óbvio que todos os ônus de uma tal situação recaem sobre o pobre. Ninguém se preocupa com ele: lançado nesse turbilhão caótico, ele deve sobreviver como puder.

Se tem a sorte de encontrar trabalho, isto é, se a burguesia lhe faz o favor de enriquecer à sua custa, espera-o um salário apenas suficiente para o manter vivo; se não encontrar trabalho e não temer a polícia, pode roubar; pode ainda morrer de fome, caso em que a polícia tomará cuidado para que a morte seja silenciosa para não chocar a burguesia (p. 69).

Foi nessa época que Dickens escreveu suas obras para denunciar esses abusos sociais. Ele, como uma criança que já havia testemunhado a exploração de sua família e a si mesmo pela classe alta, se utilizou desses horrores e fez de seus dias o prazer de uma criança: rir dos adultos. Ele era um reformista, não realista, por natureza.

Assim como Dickens, outros revolucionários denunciaram esses abusos, como relata Hobsbawn, no trecho abaixo:

Dickens escreveu romances para atacar os abusos sociais. Dostoievski foi condenado à morte em 1849 por atividades revolucionárias. W agner e Goya foram para o exílio político. Pushkin foi punido por se envolver com os dezembristas, e toda a Comédia humana de Balzac é um monumento de consciência social. (2014, p. 395).

Com essa citação de Hobsbawn, podemos ver que o artista gritava para ser ouvido. Ser aceito ou não pelo público era seu maior desafio. Foi isso que Dickens fez de melhor: alcançou todas as camadas sociais de sua época, do proletariado a família real, de uma forma ou de outra. Oliver Twist foi publicado em folhetins, à medida que seu autor levava, ao seu público, aquilo que ele sentia dentro de si, diariamente.

Quando Jose Paulo Paes cita Freud em seu artigo Criança:

Infância e Poesia (1998, p.5), com a frase “tudo que é cômico, baseia-

se fundamentalmente na degradação à infância”, vemos que essa citação realça, brilhantemente, alguns dos “tipos” criados por Dickens, com papéis infantilizados. Para Paes, ao voltar à infância, os adultos se desapegam dos padrões de seriedade que a cidade impõe. Um exemplo típico dessa comicidade “infantil” é dado, em Oliver Twist, por Artful Dodger (uma das crianças chefiadas por Fagin), o qual em troca

de abrigo, pratica pequenos furtos e outros crimes, pelas ruas de Londres.

O mesmo tipo de abordagem foi feita por Eagleton (2005, p.153):

Dickens´s fiction is thronged with prematurely aged children and childish adults. (p.153), traduzindo: “A ficção de Dickens está repleta

de crianças precoces e adultos infantis”. Artful Dodger e Charley Bates (crianças de Oliver Twist) são precoces e levam uma vida tipicamente adulta, sem direito a momentos e brincadeiras de crianças. Os papéis infantilizados representados por adultos, nas obras de Charles Dickens são cômicos. Nesse sentido, ainda, segundo Paes (1998, p.5): “essa degradação à infância é prazerosa para as crianças, porque ao assumi- la, o adulto renuncia à sua superioridade e brinca com ela em pé de igualdade”. Vemos, portanto, que Dickens se utiliza da infantilização e dos papéis de criança em suas obras, para denunciar sua sociedade, tendo em vista a criança, representar a superação dos valores morais como também a criação de novos. A criança é, portanto, ao mesmo tempo, lembrança e esquecimento.

4.3 DICKENS, O ATIVISTA SOCIAL

Dickens nasceu no tempo em que a Inglaterra estava no período da Regência (1812). Era uma Inglaterra aristocrática, cuja economia era baseada na agricultura. Durante sua vida, a Inglaterra começou a expandir seu comércio e indústria e a classe média iniciaram um processo de expansão social. Havia, porém, ao mesmo tempo, além de um ar de intranquilidade e ansiedade, tanto na sociedade como na vida privada, uma instabilidade econômica e sinais de violência iminente. Não é, portanto, surpresa que em suas obras possamos encontrar sinais claros dessas turbulências pelas quais ele passou. Ao mesmo tempo em que essas instabilidades o levaram a um sentimento de rejeição ao passado e desejo de progresso e reforma para o futuro, elas também o fizeram ver quão destrutivo e desumano foram os sentimentos desencadeados pela revolução industrial. Logo, em

algumas de suas obras, essas contradições estão bem delimitadas: o advogado da reforma tinha receio da revolução; o idealista também era materialista e realista; o herói da classe média era também seu maior crítico. São exatamente, essas contradições que definem o rumo das obras do autor. Foi, por meio desses paradoxos, que Dickens conseguiu expressar revolta e desejo de esquecer o passado.

Uma das maiores conquistas de Dickens foi o fato de ele ter conseguido, através de sua obra, com ares de sentimentalismo vitoriano, mostrar ao público inglês os abusos que sua sociedade sofria e os remédios que muitos foram capazes de criar para combater esses abusos. Ele era um ativista, longe de ser político, tendo inclusive rejeitado, por duas vezes, cargos no Parlamento Inglês.

A maioria dos problemas sociais, da industrialização Inglesa, apareceu retratada em toda sua obra: 1) A injustiça e a opressão da

Poor Law (lei de proteção, criada pela igreja, para “ajudar” os mais

pobres e desabrigados) e os horrores do submundo londrino em Oliver

Twist; 2) os supostos problemas sociais causados pelas mães solteiras

e o escândalo das instituições que “cuidavam” de crianças abandonas, em Nicholas Nickleby; 3) as consequências sombrias da revolução industrial, em The Old Curiosity Shop e em Hard Times;4) a frieza de uma sociedade comercial, em Dombey and Son; 5) a corrupção do governo e da lei da insolvência financeira, em Little Dorrit e 6) a degradação do sistema penal em Great Expectations e Our Mutual

Friend.

Talvez essa seja a razão pela qual a crítica inglesa moderna não goste tanto de Dickens, como afirma Carpeaux (1999):

Criou o romance moral, cuja leitura as pessoas de ambos os sexos, de qualquer idade e de qualquer classe podiam confessar. Justamente esses qualitativos “moral” e “popular” irritam os homens da profissão literária. A crítica inglesa moderna não gosta de Dickens – eterno outsider. (p. 649).

Seguindo-se a essa crítica de Carpeaux, em relação aos temas explorados por Dickens em suas obras, Terry Eagleton (2005, p.155), como membro da crítica inglesa moderna, também expressa insatisfação e descontentamento quanto à linha crítica que Dickens se utilizou para denunciar a sociedade Inglesa, do Sécluo XIX: “a obra de Dickens é repleta de ansiedade e desorientação”. Como podemos ver, nos dois textos acima destacados, dois dois críticos, Dickens é considerado um ávido ativista. Havia, porém, outros assuntos que ele não queria que se tornassem públicos, como um projeto para ajudar a recuperar as prostitutas e outro, o Ragged School Movement, em que ele ajudava a manter escolas que recebiam doações para cuidar e educar crianças que não tinham como pagar pela sua educação.

Para ele, a filantropia não era uma indulgência, mas uma paixão que nascia de uma necessidade desesperadora. Mesmo que o garoto Oliver tenha sido criado por prostitutas e batedores de carteira, sua bondade jamais se alterara, jamais se contaminara. Essa inocência de Oliver é questionada por Eagleton, bem como seu inglês impecável, no “romance Inglês”, realçando assim a não aceitação do escritor pela moderna crítica inglesa.

5 GRACILIANO E DICKENS: ESPAÇOS E TEMPOS DIFERENTES, CONTEXTOS SOCIONARRATIVOS SEMELHANTES

As obras de Graciliano se constroem em dezenas de tons

“repetitivos” e dezenas de adjetivos são designados para uma tentativa de descrever o seu estilo, o seu tom: memorialista, introspectivo, seco, opaco, gris, enfim, sem vida; é uma espécie de ressonância da anatomia do interior do seu autor, que se vale da literatura para revelar cenas da história de sua vida, da cultura de sua região e, também, da realidade sociopolítica de uma época tão cinzenta e sem boas perspectivas sociais para população brasileira. Vale dizer que essa obscuridade não deriva direta e tão somente da verve poética de nosso escritor, mas é elemento indissociável de uma época, de um período de nosso país.

No livro Infância narram-se os onze primeiros anos de vida do menino Graciliano Ramos, filho de uma família do interior de Alagoas. É uma autobiografia, mas não se limita a isso vai além do simples biografismo. A narrativa remonta a passagem dos primeiros anos de vida de um menino inserido em um contexto social opressivo, no qual a educação da criança tem a opressão como ferramenta. Apesar de ser um autorretrato do menino Graciliano, Infância não se ocupa em ser um mero apanhado de informações biográficas, as reminiscências que vão surgindo deixam de ser pequenos retalhos de memórias e passam a compor uma narrativa de uma vida em seu período de infância sem dignidade.

O final do século XIX é marcado pela alternância paulatina do otimismo para o pessimismo. As Grandes Revoluções que caracterizaram esse século cedem espaço e o mundo vive uma cautela reflexiva, serena e, ao fim, pessimista. O Velho Continente, ao fim do século XIX, vive muitas e novas aspirações e indefinições advindas com as descobertas científicas da época, e estas, originaram mudanças significativas na mentalidade europeia, valores sociais centenários e convicções religiosas passaram a ser contestados. A sociedade industrial começava a adequar-se ao sistema capitalista e a sua

prosperidade elitista e miserável e estática para o proletariado. (HOBSBAW UM, 2006).

Ademais de outras formas de expressão artísticas, a literatura também experimentava um sabor de pessimismo que se espraiava pelo Velho Continente. A Arte já não se apoiava mais nos sentimentos que se ancoravam nos ares românticos que serviam de prisma para a compreensão da realidade. Mas, nesse momento, havia um ar anacrônico, no qual a razão não servia mais para entender o mundo depois dos novos cenários sociais redefinidos pela Revolução Industrial.

A era industrial, então, impulsionada pelo capitalismo desenfreado e pelo positivismo, provocou, desse modo, uma aceleração no desenvolvimento da tecnologia, tendo como consequência outro olhar para apreender a sociedade e seus inúmeros significados. Diante de todas essas mudanças, é chegada a hora de reorganizar a economia e, consequentemente, a sociedade. Essa reorganização implica em um maior acesso aos bens de consumo e de capital, por um lado, e por outro, a exclusão social em massa, abrindo espaço para problemas seríssimos de uma “modernidade”, cujos efeitos só foram percebidos quando a racionalização da vida diária passou a ser o auge do mundo ocidental “desenvolvido”.

Como consequência dessa descompensação social e econômica, o ser humano passou, materialisticamente falando, à condição de mero instrumento de manipulação capitalista, onde a mais-valia passou a ser o mais importante meio de obter lucro, pelos donos das fábricas de manufatura, aqueles que detinham os meios de produção.

Eric Hobsbawn, (2006) demonstra, claramente, esse descontentamento:

Suas mais sérias consequências foram sociais (referindo- se à primeira crise geral do advento do capitalismo): a transição da nova economia criou a miséria e o descontentamento, os ingredientes da revolução social. E, de fato, a revolução social eclodiu na forma de levantes espontâneos dos trabalhadores da indústria e das populações pobres das cidades, produzindo as

revoluções de 1848 no continente e os amplos

movimentos cartistas na Grã-Bretanha. O

descontentamento não estava ligado apenas aos trabalhadores pobres. Os pequenos comerciantes, sem saída, a pequena burguesia, setores especiais da economia eram também vítimas da revolução industrial e de suas ramificações. (p. 74-75). (Grifos nossos).

Nesse cenário, conceitos como o sentimentalismo e o humanitarismo perdem cada vez mais força, restando muitas vezes, à literatura, a tarefa de dar conta desses registros.

É exatamente nesse contexto, que aparece, nesse período de exclusão social x industrialização, na época vitoriana, um escritor insatisfeito com as injustiças oriundas dessa dicotomia: Charles Dickens, que viveu e conviveu com as mesmas mazelas que os trabalhadores de sua época. Ele foi, portanto, um representante fiel desses paradoxos sociais causados pelo advento da modernização Europeia, idealizando personagens, os quais representavam e levavam, por meio de suas obras literárias a crítica social ao ápice. Sendo assim, narrou o cotidiano burguês vitoriano, por meio da dramatização, fazendo de sua produção literária, um retrato perfeito do processo de modernização sócio excludente de que a classe trabalhadora inglesa foi vítima.

Já o Brasil do final do Século XIX, é despertado por alguns movimentos revolucionários e pela chegada da República. A sua Proclamação, em 1888, não provocou grandes mudanças no cenário socioeconômico. Historicamente, o Brasil permaneceu dividido pelos grandes proprietários de terras: a grande população da zona rural, que ia do sertão ao litoral nordestino, morando em terras que não eram suas e sim de propriedade dos grandes latifundiários.

A região Nordeste, já bastante flagelada pela seca historicamente cíclica, tendo lutado e resistido por diversas frentes aos descasos políticos, teve o Arraial de Canudos2 e sua Guerra (1896-1897) como o

2 O Arraial de Canudos - liderado pelo profeta” Antonio Conselheiro que queria transform ar o sertão nordestino em m ar, foi o palco m ais sangrento entre todos os eventos de confrontos internos do país. O sertão nordestino virou palco para batalhas entre a política e grupo de cangaceiros, que exigiam dos coronéis o

maior ícone dessa Resistência à opressão político-ideológica. Na região Norte, a borracha trazia riqueza e prosperidade para uma região isolada e desconhecida. Com a riqueza que a extração da borracha gerava, Manaus e Belém prosperaram, tornaram-se importantes centros culturais, como registram até hoje os monumentais “palácios” erguidos pelos barões da borracha nessas duas capitais. No Sudeste, a riqueza de São Paulo é proveniente do café (o “ouro negro”), das largas plantações impulsionadas pelas mãos ávidas dos imigrantes, especialmente italianos. Os imigrantes chegavam em grandes levas, e consigo traziam suas mais diferentes culturas. É nesse ambiente hostil, que Graciliano encontra inspiração para sua obra, conforme atesta Carpeaux (1999):

O herói de Graciliano Ramos é o sertanejo desarraigado, levado do mundo primitivo, imóvel, para o mundo do movimento. É o vagabundo (“um pobre nordestino...”); e explica-se o seu ódio balzaquiano ao mundo burguês, que conseguiu a estabilidade relativa do comércio de secos e molhados. Esta vagabundagem é o aspecto sociológico do egoísmo do sonho quando se choca com a realidade. (p. 449).

No Nordeste, o crônico e politicamente conveniente problema da seca foi extensivamente trabalhado e denunciado por Graciliano, especialmente no livro de 1938, Vidas secas. Candido aborda assim em seu ensaio “A revolução de 1930 e a cultura”:

Graças a isto, no decênio de 1930 o inconformismo e o anticonvencionalismo se tornaram um direito, não uma transgressão, fato notório mesmo nos que ignoravam, repeliam ou passavam longe do modernismo. Na verdade, quase todos os escritores de qualidade acabaram escrevendo como beneficiários da libertação operada pelos modernistas, que acarretava a depuração antioratória da linguagem, com a busca de uma simplificação crescente e dos torneios coloquiais que rompem o tipo anterior de artificialismo. Assim, a escrita de um Graciliano Ramos ou de um Dionélio Machado

pagam ento de “taxas” de proteção de suas fazendas. O m ais fam oso desses cangaceiros foi Virgulino Ferreira da Silva, o Lam pião.

("clássicas" de algum modo), embora não sofrendo a influência modernista, pôde ser aceita como "normal" porque a sua despojada secura tinha sido também assegurada pela libertação que o modernismo efetuou. (1989, p. 186).

No Brasil do Século XIX, a produção literária se fragmenta e outros autores escrevem sobre as diferentes regiões, os centros urbanos, os funcionários públicos, os sertanejos, comerciários, peões de chão de fábrica, os imigrantes. Ramos, com sua verve descritiva, sabiamente, retrata em sua obra todos esses personagens e temas.

As artes em geral e, não diferentemente a literatura, tinham a incumbência de registrar essas diversas cenas, tinham o desafio, portanto, de representar essas cenas tão díspares e contrastantes. Diversidades e complexidades se articulavam num Brasil que buscava, entre outras coisas, a sua identidade.

As obras escritas nos primeiros decênios do século XX lançavam um olhar para o Brasil real. Essas obras usam a literatura como veículo de publicação de um país aos seus habitantes, o Brasil aos brasileiros. Desfazendo um olhar típico da Belle Époque, de demonstrar os salões, a nobreza, e as classes abastadas, de fato a literatura passou a retratar as classes sociais menos favorecidas, a maioria da população brasileira. Até então, grande parte dos romances escritos no Brasil se ocupavam em retratar as classes privilegiadas. A partir dessa consciência social, foi possível registrar um país marcado pela desigualdade e pela diversidade cultural. Nesse cenário, a denúncia social da realidade é um instrumento de defesa do próprio povo.

De maneira inevitável, frente às situações de injustiças sociais que caracterizavam (como ainda caracterizam) o povo brasileiro, as narrativas deram conta de acontecimentos históricos e atualidades.

Já o mundo artístico da Europa, nas primeiras décadas do século XX, estava em um momento de efervescência. Surgiram muitos movimentos artísticos que foram designados vanguardas, e este termo passou a ser empregado para se referir às novas referências artísticas de qualquer área: pintura, literatura, música, escultura, enfim. A palavra vanguarda, desde então, define uma proposta, uma nova

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