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Outras Ações Afirmativas voltadas à permanência de indígenas no Ensino Superior

Há outras ações voltadas para a permanência de estudantes indígenas no ensino superior além do apoio financeiro. As bolsas e demais auxílios são fundamentais, mas a permanência de indígenas nas universidades não costuma depender so- mente desse tipo de assistência. Embora, hoje, um grande número de Instituições de Ensino Superior tenham implementado ações afirmativas que facilitam o acesso de estudantes indígenas, isto não significa que elas estejam de fato abertas e pre- paradas para recebê-los.

Pesquisas têm demonstrado que, de um modo geral, tem sido alto o índice de evasão de alunos indígenas nas instituições de ensino superior, ou seja, é grande a quantidade de alunos indígenas que deixam o curso antes de terminá-lo. Pesqui- sas têm demonstrado também que este número tende a diminuir quando o aluno está de fato integrado à comunidade universitária, sendo reconhecido e valorizado como indígena por seus colegas e professores e estando envolvido na vida acadê- mica de uma forma mais ampla.

Portanto, tão importante quanto as bolsas e auxílios financeiros são outras ações que vêm sendo implementadas por algumas instituições de ensino superior e sobre as quais trataremos neste tópico. Em algumas IES, inclusive, foram criadas instâncias (secretarias, setores, núcleos) voltadas especificamente para a criação, implementação e acompanhamento de ações afirmativas na instituição. Listare- mos, abaixo, algumas "boas práticas" nesse sentido:

1 - Divulgação junto às comunidades indígenas – Algumas instituições divul-

gam seus processos seletivos, cursos e programas de ação afirmativa junto ao pú- blico indígena de sua região através de reuniões nas próprias comunidades ou em alguma cidade-pólo onde se reúnem com os representantes indígenas de diversos povos. Nessas reuniões, explica-se como funciona o processo seletivo e as bolsas e programas que poderão ser acessadas pelo estudante indígena. Além da divulga- ção das informações, esta ação é importante também pois é uma forma de estabe- lecer uma relação entre a IES e as comunidades indígenas, suas lideranças e demais representantes, e não somente com os estudantes. Durante nosso levantamento,

esta foi uma reivindicação feita pelos Guajajara; eles gostariam que as instituições de ensino superior públicas fossem até as aldeias para informar-lhes diretamente sobre os editais de seleção e cursos oferecidos, assim como fazem os institutos de educação particulares da região.

2 - Recepção dos alunos "calouros" - Algumas instituições realizam atividades de

acolhimento direcionadas especificamente para os estudantes indígenas no mo- mento em que ingressam na universidade. São atividades voltadas para apresentá- -los à instituição, aos setores ou núcleos responsáveis por apoiá-los, aos demais estudantes indígenas "veteranos", bem como informá-los sobre oportunidades acadêmicas e benefícios, regras da universidade, etc. Em algumas universidades, esta "recepção" chega a durar uma semana e envolve também atividades culturais. A programação costuma ser preparada juntamente com os estudantes indígenas veteranos que também participam ativamente das atividades. O entrosamento ge- rado entre os estudantes é um fator importante que contribui para a permanência do aluno indígena na universidade.

3 - Capacitações direcionadas ao corpo docente e técnico – Algumas institui-

ções realizam capacitações direcionadas ao seu corpo docente e demais funcio- nários sobre as políticas de ações afirmativas e os direitos dos povos indígenas. O objetivo desta ação é diminuir o preconceito em relação aos estudantes indígenas.

4 – Monitorias, tutorias, aulas de reforço e aulas complementares – Algumas

instituições oferecem monitoria ou aulas de reforço para os estudantes indígenas nas disciplinas em que eles mais encontram dificuldades. A monitoria é realizada por alunos da própria IES que podem ser indígenas ou não e que costumam rece- ber uma bolsa para realizá-la. Além das monitorias, em algumas instituições os alu- nos indígenas também têm acesso a um "docente tutor", ou "professor orientador" que passa a lhe acompanhar durante todo o seu percurso acadêmico.

Nas universidades do Mato Grosso do Sul ligadas ao Programa Rede de Sabe-

res15 (UEMS, UCDB, UFMS e UFGD), são organizados seminários e oficinas para a

15 O programa Rede de Saberes envolve as quatro principais universidades do Mato Grosso do Sul (públicas e privada):

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complementação da formação dos alunos. A intenção aqui é não somente tentar suprir as defasagens curriculares do estudante indígena, mas também promover um maior diálogo entre os conhecimentos acadêmicos e as questões e conheci- mentos próprios indígenas, uma vez que os cursos regulares não costumam con- templá-los.

Algumas universidades, como a Universidade Estadual de Londrina (UEL) e a Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA), oferecem um ano inteiro de for- mação voltada especificamente para os estudantes indígenas que ingressam na universidade. Trata-se de um ano preparatório que inclui desde o reforço de alguns conteúdos do ensino médio, especialmente nas áreas de Língua Portuguesa e Ma- temática, até a discussão de assuntos variados que dizem respeito aos povos indí- genas e à experiência no ensino superior. Esta formação é obrigatória a todos os alunos indígenas e somente após a sua conclusão ele poderá se matricular no curso de graduação propriamente. Na UEL, esta formação é denominada "Ciclo Intercul- tural de Iniciação Acadêmica", enquanto na UFOPA ela é chamada de "Formação Básica Indígena" (UFOPA).

5 - Acompanhamento permanente – Em algumas instituições os estudantes in-

dígenas são acompanhados durante todo o seu percurso acadêmico. São organi- zadas reuniões coletivas, onde eles têm a oportunidade de expressar suas dificul- dades e reivindicações. Estas reuniões têm sido apontadas como um importante amparo emocional pelos estudantes que as frequentam, como também pelos pro- fessores que os acompanham. Além das reuniões, o acompanhamento aos alunos

Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS), Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), Univer- sidade Federal da Grande Dourados (UFGD) e Universidade Católica Dom Bosco (UCDB). Ele teve início em 2005, com financiamento da Fundação Ford, com o objetivo de apoiar a permanência de estudantes indígenas no ensino superior. Dentre as atividades desenvolvidas pelo programa podemos listar a realização de levantamentos sobre a situação e as demandas dos estudantes indígenas no Mato Grosso do Sul, a capacitação de docentes, funcionários e estudantes das universidades participantes sobre as questões indígenas, a criação de laboratórios de informática para uso dos estudantes indígenas, monitoria e apoio para a execução das tarefas acadêmicas, oferta de cursos de línguas e de informática, tutorias de matérias especificas, incentivo à participação em projetos de pesquisa, organização de seminários e encontros, entre outras.

Para mais informações sobre o Programa Rede de Saberes, ver: Rede de Saberes: Políticas de Ação Afirmativa no Ensino

Superior para Indígenas no Mato Grosso do Sul (Antonio H. Aguilera Urquiza e Adir Casaro Nascimento). FLACSO. Rio de

Janeiro, 2013. Disponível em: flacso.redelivre.org.br/files/2015/03/Politicasde_Acao_Afirmativa_ms.pdf

indígenas inclui também a inserção deles nos programas acadêmicos existentes, projetos de extensão e de iniciação à pesquisa, em fóruns de discussão sobre ações afirmativas, entre outros.

6 – Infraestrutura própria – Em algumas instituições os estudantes indígenas

dispõem de alguns espaços e infraestrutura própria destinada a eles. Na UnB, por exemplo, foi construído o Centro de Convivência Multicultural dos Povos Indíge- nas, conhecido como "Maloca". Trata-se de um espaço com cinco salas de estudo, laboratório de informática e "arena" para manifestações culturais. O espaço é utili- zado pelos estudantes indígenas para estudo, convivência e realização de eventos. Nas universidades do Mato Grosso do Sul que fazem parte do Programa Rede de Saberes (UEMS, UCDB, UFMS e UFGD), há uma sala equipada com computadores, internet, impressora, scanner e máquina fotocopiadora disponível para uso gratui- to dos alunos indígenas, além de biblioteca. Na Universidade Federal do Rio Gran- de (FURG) e Universidade Federal de Roraima (UFRR) há alojamentos destinados exclusivamente aos estudantes indígenas.

7 - Realização / Apoio a "eventos indígenas" – Algumas instituições realizam ou

apoiam eventos que divulgam, no âmbito da própria comunidade acadêmica, as culturas e lutas dos povos indígenas. Alguns eventos interessantes nesse sentido são a "Semana dos Estudantes Indígenas da UFSCAR", os "Jogos Indígenas" promovi- dos pela UFRGS, a "Semana dos Acadêmicos Indígenas da UnB", entre tantos outros. Tais iniciativas são importantes pois valorizam e dão maior visibilidade à presença indígena na IES. Muitos desses eventos são realizados por iniciativa dos próprios alunos indígenas, com apoio da instituição. A propósito, um evento importante nesse contexto é o Encontro Nacional de Estudantes Indígenas (ENEI) - que reúne estudantes de todo o Brasil e a cada ano é sediado por uma universidade diferente.

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Para

saber

mais

Veja algumas páginas no facebook de organizações de estu- dantes indígenas:

Encontro Nacional de Estudantes Indígenas https://www.facebook.com/enei.ofi cial/

Estudantes Indígenas da Universidade de Brasília (UNB) https://www.facebook.com/Estudantes-Indigenas- UnB-527543430650397/

Estudantes Indígenas Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD)

https://www.facebook.com/indigenasufgd

Estudantes Indígenas da Universidade Federal do Pará (UFPA)

https://www.facebook.com/apyeufpa

Estudantes Indígenas da Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR)

https://www.facebook.com/ufscarcci/

Estudantes indígenas da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)

https://www.facebook.com/estudantesindigenasufsc/

Dentre as 25 propostas nacionais aprovadas durante a II CO- NEEI (Brasília, 2018), uma delas propõe a criação de uma Po- lítica Nacional de Educação Superior com e para os povos indígenas:

“Que a União crie e fomente uma Política Nacional de Educa- ção Superior com e para os povos indígenas, em parceria com as Universidades, Institutos Federais e demais instituições de ensino superior, assegurando o suporte necessário aos esta- dos e municípios para que garantam as condições de acesso e permanência na graduação e pós-graduação (nas diferentes modalidades: presencial, alternância e Educação a Distân- cia - EaD), envolvendo: criação e ampliação de vagas e cotas; processos seletivos específi cos; mecanismos de consulta às comunidades indígenas sobre os processos de reconhecimen- to étnico dos estudantes indígenas cotistas; criação, expan- são e aperfeiçoamento de programas específi cos, como Bolsa Permanência e Assistência Estudantil (moradia, transporte e alimentação); o fomento à concessão de bolsas de ensino, pesquisa e extensão; ações de acompanhamento acadêmico (assistência pedagógica, psicológica e à saúde), em especial para as mulheres indígenas, de acordo com as especifi cidades de cada povo indígena.” (Proposta 10)

II Conferência Nacional de

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