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5 EXEMPLOS DE CASOS EM PLANEJAMENTO DOS RECURSOS HÍDRICOS

5.3 OUTROS EXEMPLOS

O mar de Aral

McKiney (1996) apresenta um retrato desse estudo de caso. Localizado na Ásia Central, o mar de Aral é um exemplo de políticas e planos que não inserem o uso sustentável da água e em que também se privilegia um uso setorial.

Na década de 1960, o mar de Aral alcançava uma superfície de cerca de 66.000 km2, sua profundidade média era de 16 metros e sua salinidade era um terço menor que a dos oceanos. Os dois rios que lançavam suas águas no Aral, o Amu Daria, ao sul e o Sir Daria, a nordeste, são as principais fontes de recursos hídricos da Ásia Central e têm suas nascentes no Himalaia a cerca de 1.000 km da foz.

Nessa década, foi colocada em prática pela então União Soviética uma política de irrigação utilizando as águas desses rios, especialmente o Amu Daria, para o cultivo do algodão. Esse sistema de cultivo tornou o Uzbequistão o quarto maior produtor e o segundo exportador mundial de algodão, fazendo com que, nos anos 1970, a população da região aumentasse de oito para 50 milhões de habitantes, com uma área de mais de sete milhões de hectares irrigados.

Na década de 1980, a vazão dos rios Amu Daria e do Sir Daria era apenas 10% daquela registrada antes da implementação desses projetos de irrigação. Isso, combinado com a forte evaporação e a pouca chuva devido ao clima desértico da região, fez diminuir a superfície do lago em aproximadamente 65% e seu volume de água em 80%.

O recuo da superfície do lago deixou um leito seco em áreas desérticas, recoberto por sais que os ventos dispersam por toda região. A água do lago e aquela do curso inferior dos rios tiveram seu teor de sal aumentado assim como a concentração de resíduos de defensivos agrícolas utilizados no cultivo de algodão.

Planejamento para a Gestão da bacia do rio Daqinghe, nordeste da China

Shin (1999) apresenta um caso de uso insustentável dos recursos hídricos de uma bacia, sendo que, devido à dinâmica econômica da região, não há perspectivas de reversão desse quadro.

A bacia do rio Daqinghe, localizada na China, fica próxima à aglomeração de Pequim, com uma área de 43.000 km2 e uma população, em 1995, de 19,5 milhões de habitantes, com uma taxa de crescimento de 1,9% ao ano. A irrigação é a atividade que mais demanda por recursos hídricos, vindo depois o uso industrial e doméstico. Atualmente, já existe um déficit de 30% da demanda em relação à disponibilidade hídrica considerada sustentável. Shin (1999) aplica uma análise de cenários-conseqüência a partir de níveis de crescimento econômico anuais. Essa metodologia foi desenvolvida pelo Banco de Desenvolvimento da Ásia. Foram propostos três cenários a partir de condições de alta, média e baixa taxa de

que seriam 15%, 10% e 5%. Também, são considerados o crescimento populacional, a atividade industrial e agrícola e a geração de efluentes e poluentes, para um horizonte de 15 anos.

Após elaborar esses três cenários, verificou-se que todos indicaram uma demanda bem superior à disponibilidade hídrica considerada sustentável. Isso era um resultado esperado, já que esses cenários são de tendência a partir de uma condição diferenciada de crescimento econômico. Se, na atualidade, já havia um déficit de disponibilidade, para qualquer taxa de crescimento esperada para o futuro, a condição de não-sustentabilidade permaneceria.

Segundo Shin (1999), a região está em um dilema de tentar compatibilizar os usos dos recursos hídricos com a necessidade de geração de empregos e de melhoria dos índices de qualidade de vida. Para tentar contornar essa situação, sugeriu-se uma reformulação nas políticas dos recursos hídricos assim como no arranjo institucional, a introdução de medidas de conservação da água e de gestão da demanda, bem como o controle da poluição. Mesmo com essas ações, não se espera a mudança desse quadro a curto e médio prazo.

Nesse caso, o uso do planejamento e de construção de cenários pode ter ajudado a mostrar que a continuidade da situação atual só faz com que a condição dos recursos hídricos piore, podendo dar maior força às medidas de reestruturação da gestão dos recursos hídricos na bacia.

5.4 - CONSIDERAÇÕES

Nos casos aqui apresentados pode-se constatar que, de uma forma geral, situações em que não ocorre o planejamento dos usos dos recursos hídricos tem-se resultados ruins para a questão da água, como ilustrado pelo exemplo da bacia do rio Daqinghe, nordeste da China.

Outro fator importante a ser levado em consideração em um planejamento são as bases e premissas em que ele se fundamenta, como fatores culturais, sociais e institucionais. Um

consultora estrangeira que pouco conhecia das características e peculiaridades desse país, que estava saindo de uma guerra civil, realizando-se uma proposta de um plano nacional de recursos hídricos que não refletia a realidade local, principalmente nos aspectos institucionais, não tendo sido implementado.

Em determinadas situações o planejamento pode ser bem sucedido, mas seu efeito nos recursos hídricos pode ser desastroso, como no mar de Aral, no qual, se analisado sob a ótica do cultivo de algodão, foi um sucesso, transformando o Uzbequistão em um dos maiores produtores e exportadores do mundo, mas que provocou um desastre ambiental na região. Pode-se dizer que esse é um bom exemplo de uma gestão setorial dos recursos hídricos levada ao extremo, o que contradiz as premissas de uso múltiplo das águas da legislação brasileira. Por outro lado, um caso de uso preponderante, mas que conseguiu harmonizar-se com outros, é o exemplo do canal do Panamá, cujo uso principal é a navegação, mas o órgão gestor conseguiu conciliar outros usos como abastecimento e uso industrial.

Outros exemplos de um bom planejamento do uso dos recursos hídricos estão nas cidades de Porto Alegre e no plano piloto de Brasília, em que a postura de antecipação para alguns problemas recorrentes do crescimento dessas cidades, foram mais bem solucionados por terem sido planejados de maneira mais adequada.

Algo que também pode ser verificado nesses exemplos, é que, quanto mais democrática for a sociedade, maior é a chance que o planejamento seja bem sucedido, indicando a importância dos processos participativos nas premissas e princípios do planejamento.