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6 APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS

6.1 Articulando os dados

6.1.7 Outros resultados

Os instrumentos geradores dos Mapas Afetivos, além das assertivas categorias da escala Likert, estabelecem outras questões qualitativas que pela objetividade de suas formulações podem resultar em grupos de respostas com significado similares ou afins. Dessa forma exporemos num arranjo quantitativo e por entornos as respostas surgidas a partir das seguintes questões: Indique o lugar que para você representa o Centro, O que gosta no

Centro e O que não gosta no Centro.

Gráfico 9 – Local que representa o Centro

Do total de 100 sujeitos pesquisados, 66% identificaram a Praça do Ferreira como local representativo do Centro de Fortaleza. Esse número não surpreende, a despeito deste lócus vir sofrendo transformações que foram modificando sua estrutura em função das necessidades urbanas e de interesses políticos.

Além disso, a Praça do Ferreira agrega em seu entorno, edificações profundamente significativas do ponto de vista histórico-cultural e arquitetônico que em seus usos representaram – em época áurea – toda a efervescência política e cultural da cidade e

PRAÇA DO FERREIRA ; 66% PRAÇA JOSÉ DE

ALENCAR; 9% PARQUE CIDADE DAS

CRIANÇAS; 4% PASSEIO PÚBLICO; 2% IGREJA DA SÉ; 2% CENTRO CULTURAL DRAGÃO DO MAR; 1% ESTAÇÃO JOÃO FELIPE; 1% PRAÇA E IGREJA DO CARMO; 1% NÃO RECONHECE; 6% OUTROS, 8% PRAÇA DO FERREIRA PRAÇA JOSÉ DE ALENCAR PARQUE CIDADE DAS CRIANÇAS

PASSEIO PÚBLICO IGREJA DA SÉ CENTRO CULTURAL DRAGÃO DO MAR ESTAÇÃO JOÃO FELIPE PRAÇA E IGREJA DO CARMO

como defende Villaça (1997) a simbologia de um lugar é definida em função de suas condições materiais.

A primazia da Praça do Ferreira como ponto “coronário”, guindado a Centro cívico da cidade, começa de fato a partir dos anos 30 do século XX quando o Passeio Público – até então o ponto de lazer e diversão da elite e de nem tão eleitos assim – passa a sofrer a concorrência de outras atrações de entretenimento como o cinema, os clubes e os banhos de mar. O fato que acelera o processo de esvaziamento do passeio Público a partir desta década é a transformação do Centro em área comercial obrigando a migração das elites e classe média para outras zonas urbanas (PONTE, 1993).

Ao mesmo tempo, a Praça do Ferreira passava a aglutinar boa parte desses usos comerciais onde o serviço e o lazer buscavam copiar a grande referência cultural da época, no caso, Paris. Foi no Café Java (um dos quatro chalés ao estilo francês erguidos nos quatro cantos da praça), em 1892, que Antônio Sales e parceiros tiveram a ideia de fundar uma agremiação literária (PONTE, 1993) que para muitos foi precursora da moderna literatura brasileira surgida no movimento de 1922: a Padaria Espiritual.

A confirmação da Praça do Ferreira como lócus representativo do Centro nos dias de hoje – mesmo sem os atrativos culturais e de lazer perdidos a partir dos anos 70 e fuga institucional de importantes órgãos gestores do poder – atualiza-se diante do papel que o Centro passou a assumir nos últimos 30 anos, qual seja, a tendência de sua transformação em “lócus” do consumo (DANTAS, 2009), tendência inteiramente confirmada a partir dos relatos escritos onde a grande maioria dos sujeitos destacam os atrativos do comércio, de uma forma geral, como aquilo que mais gosta no Centro. A Praça do Ferreira na opinião de Dantas (2009) passa a ser o símbolo do Centro quando a expressão da tendência dessa transformação do bairro em lócus de concentração de bens e serviços a serem consumidos reflete-se na superação do Passeio Público pela Praça do Ferreira como denotação da vitória do negócio sobre o ócio.

Em segundo lugar – bem atrás da Praça do Ferreira – a Praça José de Alencar com 9% das escolhas representa hoje – mais que nunca – um logradouro fundamentalmente associado às atividades e manifestações ligadas aos setores mais populares da cidade. Mesmo entre os sujeitos residentes do Entrono 3, a partir do qual esta praça é bem mais próxima, encontramos uma supremacia representacional da Praça do Ferreira sobre aquela. Importante considerarmos que o espaço tomado entre as duas praças (formado pelas quadras situadas entre a Rua Liberato Barroso e Rua Guilherme Rocha) forma o corredor de comércio informal

mais antigo do Centro, praticamente desde a época em que as duas ruas supracitadas foram transformadas em via para pedestres na década de 80.

Os outros pontos emblemáticos do Centro foram escolhidos em função da proximidade relativa de seus entornos. Foi o caso de lugares como o Parque Cidade das Crianças, eleito apenas pelos residentes de seus entornos mais imediatos, no caso o Entorno 1 (03) e Entorno 2 (01), 4% no total. Lugares tradicionais no Centro da cidade como o Passeio Público (2%), a Praça e Igreja do Carmo (1%) e Estação João Felipe (1%) enquadram-se, também, como ícones ou marcos bem localizados e vinculados aos seus entornos. Quando pedimos aos sujeitos investigados que expressassem os fatores que os agradavam no Centro as respostas foram quase unânimes em apontar os atrativos do comércio de uma forma geral.

Gráfico 10 – O que o sujeito gosta no Centro

Fonte: Arquivo da pesquisa (2012).

Por essa pequena amostra, fica patente na expressão de Dantas (2009), o conceito de Centro como lócus do consumo. A Praça do Ferreira, pelo seu apelo evidentemente comercial, só não foi incluída no grupo motivo das facilidades e comodidades de morar perto do comércio, porque alguns sujeitos que a citaram o fizeram ressaltando outros aspectos como agradabilidade, bate-papo, amizade, etc.

0 10 20 30 40 50 60 fr e q u ê n ci a fatores Série1

No grupo aspectos urbanos e culturais foram incluídos todos aqueles que gostam do Centro pelo potencial patrimonial que o mesmo representa em termos urbanos e culturais. Juntamente com o grupo movimento e fluxo de pessoas ocupam o terceiro lugar na preferência dos moradores. Em quarto e quinto lugares estão respectivamente os motivos ligados à

vizinhança e as praças, aqui apontadas de uma forma genérica.

O restante dos motivos assinalados está mais ligado aos aspectos de ordem estritamente pessoal dos sujeitos (ver Gráfico 10)

A lista das coisas que desagradam aos sujeitos parece ser bem mais extensa e equilibrada.

Gráfico 11 – O que o sujeito não gosta no Centro

Fonte: E Arquivo da pesquisa (2012).

De qualquer forma, o grupo insegurança50 domina disparado sobre os demais

fatores.

O lixo e a sujeira ocupa o segundo posto dentre as causas que mais desagradam os moradores do Centro. Em terceiro lugar vem os problemas com o trânsito (incluído aí o trânsito de pedestres pelas calçadas obsoletas do Centro, os estacionamentos inadequados, o

50Alguns dos indicadores do Gráfico 11 foram construídos a partir da associação de qualidades referidas ao

Centro. No caso do indicador insegurança todos as qualidades associadas à aspectos negativos como assalto, drogas, violência, insegurança noturna, falta de policiamento e etc., foram agrupadas no indicador insegurança.

0 5 10 15 20 25 30 35 40 fr e q u ê n ci a fatores Série1

congestionamento, fumaça dos carros, etc.). Em quarto lugar na lista, vem o grupo descuido

com patrimônio (incluído todos aqueles que de uma forma ou de outra lamentam pela situação

de deterioro patrimonial do Centro, edifícios, praças, inclusive ruas). Os camelôs só vão ocupar o quinto lugar entre os indicadores negativos dos moradores do Centro. Logo atrás dos camelôs, os mendigos e o burburinho (associado este à movimentação de pessoas e máquinas, muita gente, etc.) respectivamente. A poluição, por exemplo, (sonora, ambiental dos cursos d’água e visual) só vem a ocupar o oitavo lugar entre os desafetos dos moradores.

Em nosso questionário sobre a estrutura urbana, pedimos aos sujeitos que marcassem o tipo de poluição que mais os incomodavam no Centro, podendo os mesmos, inclusive, marcarem mais de uma opção. O resultado bate com a relevância dada ao problema da sujeira por mim separada da poluição no Gráfico 11. Individualmente ou associado a outros tipos de poluição, o lixo é, para o morador do Centro, o pior tipo de poluição, entretanto todos foram unânimes (no referido questionário) em objetivar que a coleta municipal de lixo passava regularmente em suas vias duas, às vezes três vezes por semana (ver Tabela 4 abaixo).

Diante desse fato, o que determina uma votação tão expressiva da sujeira (ver Gráfico 11) como algo que desagrada no Centro? Seria a produção diária da atividade informal? A má conservação do patrimônio público? Os gases expelidos pelos veículos? Provavelmente o somatório de tudo isso e muito mais.

Tabela 4 – Frequência dos tipos de poluição (n=100)

Tipo de poluição f %* Sonora 10 10,2 Visual 4 4,1 Residual 19 19,4 Sonora e Visual 3 3,1 Sonora e Residual 23 23,5 Visual e Residual 6 6,1

Sonora, Visual e Residual 15 15,3

Nenhum 18 18,4

Fonte: Arquivo da pesquisa (2012).

Os fatores que determinam o grau de atratividade pelo Centro – segundo os resultados encontrados – me parecem um tanto quanto óbvios, inclusive pela disparidade encontrada entre o grupo das facilidades e comodidades oferecidas e a Praça do Ferreira (ver Gráfico 10). Ambas até que se complementam e poderiam formar um grupo só de tanto que a Praça do Ferreira está associada à atividade comercial. O que nos surpreende, entretanto, é a

frequência encontrada na sequência da “lista negra” do Centro. Nela até mesmo o grupo

descuido com o patrimônio supera o grupo camelôs. O caos gerado pelo uso indevido do

espaço público é notório nos Centros das grandes cidades brasileiras e tem merecido infindáveis trabalhos acadêmicos em todas as áreas das Ciências Humanas. É também considerado o nó górdio para as administrações públicas em suas soluções para minimizar tal problema especificamente nas regiões centrais das metrópoles.

O fato de os moradores do Centro elegerem o comércio informal como problema – supostamente – de 5ª ordem, não implica o desconhecimento (por parte deles) da gravidade da questão, uma vez que os mesmos não a percebem de forma sistêmica, mas sim, local e fenomenicamente. Contudo, muitos dos outros fatores apontados por eles tais como o lixo, deterioração do patrimônio público, o burburinho e os problemas com o trânsito, possuem relações causais diretas e indiretas com o comércio informal.

A percepção de forma estanque do problema não é um apanágio dos moradores do Centro, mas do leigo de uma forma geral e no âmbito da percepção cognitiva qualquer outro indivíduo de qualquer outro bairro, verá no camelô apenas o lado conturbado de sua atividade no meio urbano. Não perceberá as implicações econômicas, geográficas, sociais e urbanas dessa atividade como os expertises das respectivas áreas.

Dessa forma, a percepção dos moradores do Centro pode, sim, ajudar a “desconstruir” algumas imagens preconcebidas sobre a região Central por parte de indivíduos de outros bairros, principalmente daqueles considerados mais “nobres”.