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Ouvir/Falar (Pág 20)

No documento a2be40b168da6b2fdf5f5823bb4678a79c3dbb19 (páginas 92-94)

O PEIXE

Sob a superfície das águas da terra existe outro mundo mais vasto do que o nosso: é o mundo dos peixes - senhores de três quartos do planeta, com mais espécies do que todas as aves, répteis, anfíbios e mamíferos juntos. Tem no seu signo, Peixes, o símbolo do renascimento e regeneração.

Peixes… o último signo do zodíaco; o signo que traz às constelações o ciclo completo, talvez devido ao ciclo da vida deste peixe: o salmão, o rei dos peixes. Incomparável em agilidade, em agudeza de sen- tidos, em memória, em vigor e inteligência, o salmão é a maravilha das profundezas. A sua vida é uma via- gem épica. Nascido em águas correntes pouco profundas, o salmão vê mais do mundo do que muitos de nós. Durante a sua vida, ele nada milhares de quilómetros, rio abaixo até à foz e, depois, no vasto oceano, através de muitas águas e habitats para, finalmente, voltar ao exato lugar do seu nascimento. Onde quer que o salmão vá, o Homem segue-o. Durante mais de oito mil anos, este peixe providenciou a principal fonte de alimentação para 50 mil nativos tribais, vivendo ao longo dos rios no nordeste da costa ameri- cana. Eles constroem as suas vidas à volta do salmão e da sua viagem, e os seus descendentes ainda se intitulam hoje “o povo salmão”.

O oceano Atlântico contém mais de um milhão de milhões de arenques – 500 vezes todos os seres humanos do planeta. Se os habitantes das águas planeassem tomar o mundo amanhã e invadissem a terra, esta ficaria completamente coberta e empilhada, muitas vezes à altura de um homem, com peixe.

Apesar da sua variedade, a maioria dos peixes tem a mesma estrutura básica: um esqueleto espinhoso suportado por uma coluna vertebral; para flutuar, uma bexiga-natatória; um saco parcialmente cheio de ar, para que não boiem nem se afundem; barbatanas, para se movimentarem e manobrarem; e para res- pirar, o peixe usa guelras, que se enchem de água e a passam para uma superfície com pregas aperta- das, rica em vasos sanguíneos, dez vezes maior do que toda a área de pele do peixe.

O peixe possui também a proteção subaquática perfeita: escamas - pequenas placas transparentes constituídas de osso duro, para resistência, e sobrepondo-se, para flexibilidade e movimento. Copiadas por alguns para proteção e por outros para estilo, ajudam o peixe a deslizar através da água.

A maioria dos peixes nada em movimentos escoliantes em ‘S’. Começa por uma ligeira torção de cabeça para os lados, que aumenta ao longo do corpo, deslocando a água para os lados e para trás. Assim, o peixe tem que se deslocar para a frente, com uma forma tão suave que tem sido imitada sempre que a aerodinâmica é essencial.

Não existe cor conhecida que não seja encontrada no corpo de um peixe, algures. Nenhum outro grupo de animais tem um aumento de tamanho tão grande desde que saem dos ovos até atingirem a maturidade como os peixes ou tamanha diferença em volumes (do góbio pigmeu anão, do tamanho de uma tacha, à baleia-tubarão, que poderia bloquear completamente uma autoestrada com seis vias) ou em velocidade (do cavalo-marinho com uma fraca barbatana dorsal, que se move a uns meros 16 metros por hora, ao veleiro).

Mas existe uma enorme fronteira que divide todos os peixes em dois grupos totalmente diferentes: a barreira entre o rio e o mar. Entre a água doce e a água salgada. Mas existem alguns peixes que conse- guem atravessar essa barreira, e o salmão é um deles, transformando a química do seu corpo de peixe de rio para outra completamente adaptada à água salgada do mar.

Agora com um ano de idade e pesando menos de meio quilo, o jovem salmão entra no vasto domínio do oceano.

Comer e não ser comido. Ataque e defesa. Muitos peixes comem nada de mais excitante do que plânc- ton. A imagem de ser engolido levou às histórias dos marinheiros como Jonas a ser engolido por criatu- ras das profundezas.

A mais comum forma de defesa e de ataque e, sem dúvida, a mais surpreendente é a camuflagem: dos surpreendentes peixes-facas, entre as plantas, a muitos peixes de águas expostas que têm dupla camu- flagem, tomando os tons do seu meio ambiente, por cima e por baixo. Disfarce e discrição foram essen- ciais aos primeiros cristãos para fugirem às perseguições e à morte: eles usavam códigos e símbolos para se reconhecerem mutuamente, e o seu símbolo principal era o peixe. Escolheram este símbolo, porque, em grego, as iniciais da frase Jesus Cristo filho de Deus, o Salvador escrevia a palavra peixe.

O cardume, como a colmeia na terra, é a comunidade suprema subaquática. O cardume leva os indi- víduos para águas ricas em alimento, enquanto alguns encontram parceiros dentro do cardume - a segu- rança de casar com o rapaz da porta ao lado. Mas, acima de tudo, o cardume oferece, talvez, a derradeira defesa: a segurança dos números. Um denso cardume movendo-se como um só pode parecer uma única criatura muito maior, com cada peixe usando as suas linhas laterais para sentir o movimento do cardume e responder instantaneamente.

Como é que um peixe funciona nesta perfeita harmonia? São os seus sentidos apurados?

Muitos peixes têm uma surpreendente boa visão, distinguindo diferentes listas, pintas ou reflexos da sua própria espécie. Alguns têm olhos que podem ver tanto para baixo como para cima da água. O peixe possui outros sentidos: o seu ouvido interno sente a pressão das ondas, da mesma forma que os nossos ouvidos sentem o que se passa à nossa volta em três dimensões. É isto que permite ao peixe orientar-se.

O dorso-tonto que se alimenta do que está sob o recife não quer saber se está virado ao contrário. É para ser mais fácil encontrar a comida. Mais estranhas são as enguias, que navegam usando eletrici- dade. Usam 6 mil células elétricas no seu corpo para emitir pequenas ondas por choque e sentir o que as rodeia ou aumentar o poder para matar as suas presas, com uma súbita descarga de 500 volts.

Mas o mais intrigante de tudo: Será que os peixes falam? A resposta é sim - muitos, em alta frequên- cia e inaudível para nós, mas falam. Os peixes fazem ruídos quase o tempo todo: para se reproduzirem, navegarem, ameaçarem e cooperarem.

O scorpaena, com dois metros de comprimento, é o anfitrião de pequenos bodiões limpadores, mesmo na sua boca. O scorpaena fica com os dentes limpos e os bodiões ganham uma refeição pela qual não tive- ram que lutar. Mas uma das mais estranhas relações de todas é a do góbio com o camarão. O camarão alfeí- deo é um escavador prodigioso, mas tem uma visão muito má. Não consegue ver o perigo ou encontrar o seu caminho de volta a casa quando sai em busca de alimento. O góbio, que também gosta de viver em túneis, não os consegue escavar; no entanto, tem uma visão muito apurada. Por isso, os dois vivem jun- tos. O góbio fica de guarda à entrada do túnel, alerta para qualquer perigo, enquanto o camarão recolhe comida e conserva o túnel limpo. A maior parte do tempo mantém contacto com o góbio através da sua longa antena. E se o camarão se afasta muito da entrada do túnel, o góbio vai à sua procura. Estabelece contacto e acompanha-o a casa. Empreendimento e perfeita cooperação.

Para o homem, o principal valor do peixe tem sido sempre como fonte de alimento. O esturjão fornece o alimento mais caro do mundo: o caviar beluga. Esta iguaria de ovas de peixe é tão valiosa que já foram escritas canções sobre um esturjão que continha 150 quilos de caviar.

O homem criou muitas superstições à volta dos peixes: o primeiro salmão pescado dá má sorte e deve ser devolvido ao mar; a tenca aplicada nos pés cura a icterícia; cerveja na qual foi mergulhado peixe faz bem à tosse convulsa, embora faça mal ao peixe. Mas tradicionalmente, é ao salmão que atribuem as boas notí- cias. No País de Gales diz-se que um salmão atrevido saltava da água e piscava o olho a mulheres casadas.

Depois de dois a seis anos nos mares, o salmão sente a necessidade de regressar a casa, ao rio onde nasceu. Usando unicamente a sua memória e um surpreendente olfato, consegue-o, atravessando centenas

Com Textos 11 | Livro do Professor

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de quilómetros no oceano, e encontra aquele mesmo rio. Na foz do rio, o corpo do salmão tem que se rea- daptar à água doce e ele espera calmamente que esta última transformação se complete. Não parando uma única vez para se alimentar, o salmão vai perdendo forças conforme nada rio acima. Nesta tentativa, todos os seus companheiros enfraquecem e muitos morrem. Consoante a necessidade de reprodução aumenta, o peixe luta para ultrapassar qualquer obstáculo, para saltar qualquer barreira. O salmão completou a sua viagem e agora procriará. A fêmea escava um buraco onde os dois viajantes ficarão juntos. Dos três a cinco mil ovos, só um ou dois salmões completarão este ciclo. Agora, muitos destes adultos exaustos dei- xar-se-ão levar pela corrente para morrer. A tarefa está cumprida.

Os ovos eclodirão e um novo ciclo de vida iniciar-se-á. Como peixe, o renascimento; o peixe ecoando o nosso próprio nascimento; o nosso primeiro antepassado vivo, sobrando de um mundo mais vasto do que o nosso e, no entanto, ainda tão fora do nosso alcance.

(Em sessão parlamentar de 9 de outubro de 1837) (excertos)

Três são as diversas posições em que pode colocar-se o homem público, o homem chamado a pro- nunciar sobre questões de gravidade e importância da que hoje tratamos.

A primeira e a mais fácil é seguramente a daquele que nem por si a toma; que levado da torrente das opiniões, e cuidando dirigir as turbas, quando não é senão empurrado por elas, imaginando-se forte só porque se pôs do lado da força, vai com o poder que reina, está pela potência que impera.

Esta posição é, como disse, a mais fácil, e para certos olhos (ainda bem que não para os meus!) a mais brilhante: os aplausos estão em roda dela, as recompensas lhe chovem em cima; e coroado há de ser decerto quem a ocupa; que seja das folhas de carvalho do repúblico tribuno, ou das pérolas feudais do barão aristocrático, a diferença está na forma, a coroa é a mesma, vale e significa poder, ganhou-se e deu-se pelo mesmo modo.

Quase tão fácil é a segunda posição, (fácil de tomar, entendo) aparentemente mais nobre, nem sem- pre mais desinteressada; mas sem dúvida mais lisonjeira para o amor próprio de quem a escolheu por sua, é a daqueles que aparentando (Deus sabe às vezes com que ânimo) integridades de Catão, parecem plei- tear justiça com os céus, praz-lhes a causa vencida, só porque o é, defendem quando está debaixo, só por- que o está; e justa ou injusta, é sua sempre a parte dos que se dizem oprimidos. Não é tão independente como talvez parece esta posição, nem lhe faltam vantagens. Nela se formam muitas vezes reputações que aliás fora impossível adquirir: também lhe sobejam aplausos; e lá está, mais longe sim mas não mais incerta, a perspetiva da recompensa, a querida esperança do galardão!

A história de todas as revoluções nos apresenta, sempre e pelo mesmo modo, forte e numerosa- mente ocupadas estas duas posições. Ambas são as da ambição; para elas vai, para elas forçosamente há de ir a máxima parte dos homens.

Terceira posição há – difícil, desgraçada e árdua, de poucos seguida, de poucos entendida, caluniada dos muitos; pode-se quase dizer que desprezada de todos. Raros a ocupam, raros deixaram ainda de morrer

Sequência 2

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