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O maior erro que podemos cometer na vida é acharmos que estamos vivendo quando, na verdade, estamos dormindo na sala de espera da vida. Waking Life, Richard Linklater

Jameson (1997) compreende a pós-modernidade sob a perspectiva do conceito de periodização, no qual transformações substanciais de ordem econômica, tecnológica, na cultura e na ciência, a partir do final da década de 1950 e início da década de 1960, parecem indicar o fim da modernidade e o marco de um novo processo eminentemente cultural. O seu argumento principal é de que há uma importante mutação cultural no “capitalismo tardio” ou “capitalismo multinacional”, que abarcará intensas modificações na vida urbana social, mas também na

arquitetura, na arte, na literatura e em toda produção cultural, de modo geral.

Jean Baudrillard, por sua vez, talvez seja um dos maiores críticos da pós-modernidade, que, mesmo sem utilizar a denominação, reconhece tais transformações e desenvolve brilhantemente em Simulacros e Simulação (1991), uma crítica extremamente ácida ao peremptório estágio de simulação da realidade no qual fundamenta-se a sociedade pós- moderna.

Nessa perspectiva, pretende-se, neste tópico, discutir de maneira mais profunda: (1) quais características em comum podem ser observadas como modificações culturais significativas que funcionem como sinais distintivos do pós-modernismo; (2) de que maneira essas modificações estão entrelaçadas e se relacionam com a acumulação do capital nesse que pode ser apreendido como o terceiro estágio do capitalismo, ou da acumulação flexível.

Anteriormente, no tópico A Era Moderna, vimos como as construções do Segundo Império haussmannianas corroboraram na proliferação de grandes lojas de departamento em Paris, para atender a uma massa de consumidores, que passaram a comprar não apenas produtos, mas mercadorias dotadas pelas pessoas de idiossincrasias, personalidade, valores psíquicos. O mesmo ocorreu nos Estados Unidos, quando Ford instituiu a jornada de oito horas de trabalho a cinco dólares por dia, permitindo, com isso, que o novo tipo de trabalhador pudesse ser, também, um consumidor. Segundo Debord (2003, p. 36), é no universo da Revolução Industrial e da intensa divisão do trabalho que a mercadoria surge como fator crucial da vida social, pois ela rouba os espaços anteriormente vazios e os preenche dissimuladamente por meio do consumo: “o consumidor real torna-se um consumidor de ilusões. A mercadoria é esta ilusão efetivamente real, e o espetáculo a sua manifestação geral”.

Consensualmente, entre os “autores da pós-modernidade” o consumo possui lugar de destaque na relação entre produção cultural e o comportamento dos indivíduos nas cidades contemporâneas. “O consumo surge como modo ativo de relação (não só com os objetos mas ainda com a coletividade e o mundo), como modo de atividade sistemática e de resposta global, que serve de base a todo o nosso sistema cultural” (BAUDRILLARD, 2010, p. 9). Em

Sociedade do Consumo (2010), Baudrillard mostra como as grandes corporações, que se

multiplicam e ganham mais força na segunda metade do século XX, despertam novos desejos que estão intimamente relacionados a um campo do inconsciente de significação nos indivíduos e criam novas organizações sociais em contraste às antigas estruturas de classe: “A relação do homem aos objetos e a relação do homem a si mesmo se encontra falsificada, mistificada e manipulada- consumindo ao mesmo tempo o mito e os objetos” (BAUDRILLARD, 2010, p. 87).

Baudrillard vai além, o que ele chama de “era do consumo” se assemelha a uma alienação completa em numa sociedade em que a lógica da mercadoria invadiu outras áreas da vida, e a espetacularização transformou todos os signos em imagens. É nesse cenário, cujas condições modernas de produção ditam as normas da vida social, que a sociedade do espetáculo se anuncia, e é a partir disso que as imagens da vida perdem contato com a realidade e se metamorfoseiam em pura representação, criando o que Debord (2003) chama de “alienação recíproca” entre espetáculo e realidade, advinda do próprio crescimento econômico. Nesse processo, o papel da mercadoria como espetáculo é tão incisivo porque, como salienta Debord (2003), ela representa uma “categoria universal do ser social”, ela é a porta de entrada para essa

sociedade do espetáculo.

Mas, enquanto Baudrillard (2010) acredita que no modo do consumo contemporâneo já não existem oportunidades criativas e de transcendência, em que reina apenas a imanência à ordem dos signos, autores como Lipovetsky (2007) e Canclini (2008) compreendem o consumo de forma menos pessimista e determinista, identificam a partir dele novas possibilidades de experimentações e apresentam outras perspectivas diversas.

Lipovetsky (2007) afirma que as sociedades atuais viveram três fases do consumo, a primeira fase se inicia por volta de 1880, e chega ao fim com a Segunda Guerra Mundial; a segunda fase estabeleceu-se em torno de 1950, mediada pela economia fordista; e a terceira fase, chamada de hiperconsumo, tem início em meados da década de 1970. O autor defende a ideia de que a felicidade é equivalente ao hiperconsumo nas sociedades contemporâneas e volta sua discussão para a relação entre consumo e felicidade, mostrando as contradições e paradoxos presentes nessa associação: “Com o capitalismo de consumo, o hedonismo se impôs como um valor supremo e as satisfações mercantis, como o caminho privilegiado da felicidade” (LIPOVETSKY, 2007, p. 367). Isto é, o consumo inserido na finalidade de proporcionar bem- estar, converteu-se no que Lipovetsky (2007) chama de “paradigma hedonista versus o antidionisíaco”, gerando a criação do chamado super-homem, indivíduo preocupado com o próprio desempenho, mas também com os prazeres existenciais. Tal situação levaria a questões complexas, como ver-se diante da pressão de se superar como profissional, mas, ao mesmo tempo, considerar a qualidade de vida e o bem-estar. Para o autor, esses últimos são alcançados mediante o consumo. Ou seja, o hiperconsumo modifica o consumo em algo muito diferente do que apenas “comprar” e “ter”, e sim consumir a experiência, pelo lazer, pelas sensações e emoções proporcionadas. Isso pode ser observado em diversas áreas da vida, na preocupação com a saúde, utilizando novos serviços oferecidos pelo mercado, ou nutrindo-se com alimentos saudáveis, orgânicos, mas que ainda devem ser saborosos; com os tratamentos de corpo e mente,

por meio de novos tipos de massagens, ioga e acupuntura; nos cuidados com a pele, que se transformaram em um ritual que proporciona satisfação e relaxamento:

Progredimos no caminho da felicidade? Afirmá-lo seria confundir indevidamente bem-estar material e vida feliz. Em todo caso, o hiperconsumidor pode ter acesso a prazeres sempre mais numerosos e frequentes, provar os gozos incontáveis dos lazeres, das evasões e da mudança. Se esses consumos não são sinônimos de felicidade, não deixam de ser, muitas vezes, fontes de reais satisfações (LIPOVETSKY, 2007, p. 17). Desse modo, embora o sistema hedonista predomine na sociedade, Lipovetsky (2007) não acredita que ele é exclusivo. Outros valores como criar, construir, empreender e transcender também são possíveis:

Se novas maneiras de avaliar os gozos materiais e os prazeres imediatos vierem à luz, se uma outra maneira de pensar a educação se impuser, a sociedade de hiperconsumo dará lugar outro tipo de cultura […] um novo pluralismo de valores, uma nova apreciação da vida devorada pela ordem do consumo volúvel (LIPOVETSKY, 2007, p. 267-368).

O autor assenta a possibilidade de uma nova multiplicidade de valores a partir de dois argumentos essenciais. O primeiro é a investida na ciência. Esta representa a força geradora que não permitirá que a cultura seja sucumbida pelo consumo como espetáculo. O segundo argumento é que, uma vez que sociedades mais abertas (mais democráticas) necessitam de elementos de inovação e criação, é improvável que os indivíduos busquem unicamente o que o autor chama de gozos do bem-estar: “A exigência do futuro está na invenção de novos modos de educação e de trabalho que permitam que os indivíduos encontrem uma identidade e satisfações em outra parte que não nos paraísos fugazes do consumo” (LIPOVETSKY, 2007, p. 367).

Em uma perspectiva mais voltada para o México e países sul-americanos, Canclini (2008) também apresenta novas percepções acerca do consumo, que vão de encontro às noções mais generalizantes. O autor estuda como as alterações nas formas de consumir, e como a capacidade de apropriação de bens de consumo possuem ressonância nas possibilidades de se exercer cidadania. Isto é, a descrença nas instituições políticas ao longos dos últimos anos tem sido compensada por novas formas de participação. Demandas relacionadas à cidadania têm se dado, frequentemente, mais pelo consumo privado de bens e pelos meios de comunicação de massa, ou ainda pela participação coletiva em espaços públicos, do que por mecanismos políticos institucionais, que se mostram, muitas vezes, abstratos, embora sejam ainda os meios

mais eficazes.

Segundo Canclini (2008), o mercado desacreditou a política, submetendo-a às regras econômicas, da publicidade e do espetáculo. Assim, o desenvolvimento das tecnologias audiovisuais de comunicação estabeleceu novas formas de se informar, de constituir vínculos sociais de pertencimento, e de compreender os próprios direitos, estimulando a prática da cidadania:

A aparição dos meios de comunicação não só praticamente substitui velhos mecanismos, como partidos, sindicatos, etc, como reestruturam as articulações entre público e privado… portanto, as transformações suscitadas pelas industrias comerciais são precedidas pela remodelação do consumo da vida cotidiana nas grandes cidades (CANCLINI, 2008, p. 39).

Não obstante, o consumo, e por consequência, a cidadania, é acessado de maneira desigual pela população. Assim como ocorre na Modernidade com o projeto iluminista, cujos ideais de acesso aos direitos fundamentais (trabalho, saúde, educação e moradia) não atingem a todos igualmente, na pós-modernidade, com a globalização, há uma seletividade que também restringe e exclui boa parte da população, por meio da imposição da concepção neoliberal, que reafirma desigualdades. Nesse sentido, “as novidades modernas aparecem para muitos apenas como objetos de consumo e para outros como espetáculo. O direito de ser cidadão se restringe, mais uma vez, as elites” (CANCLINI, 2008, p. 42).

Em que pese, ainda há a incapacidade do Estado de pensar políticas que filtrem o que ocorre em sociedade e que compreendam melhor o seu funcionamento. Sabendo-se que os mecanismos eletrônicos de informação são um dos principais disseminadores do pensamento coletivo, as instituições culturais do Estado se mantêm presas ao passado, não dão a devida importância às culturas urbanas contemporâneas e, com isso, deixam de compreender a formação de novos espaços públicos, que fogem dos recortes tradicionais há muito estabelecidos: [...] o espaço público não reduz seus meios à imagem e à palavra espetaculares: compõem-no também elementos do discurso, do comentário, da discussão, com os fins mais “racionais” de elucidação. Mas o que importa destacar aqui é, sobretudo, que especialmente o “espaço público social” não obedece em absoluta às fronteiras nacionais de cada sociedade civil (CANCLINI, 2008, p. 221).

De acordo com esse caráter contingente do espaço público, também está o pensamento de Leite (2007, p. 120), para quem as cidades planejadas não seguem fielmente planos e modelos: “As cidades são organismos vivos, não se pode prever cada evolução do seu

desenvolvimento. Principalmente como produto cultural, a cidade é sempre o resultado convergente de distintas influências formais e cotidianas”. Nesse sentido, o autor trabalhar com a ideia de contra-usos do espaço como forma de ressignificação dos lugares, pois esses usos podem alterar a paisagem e dar novos sentidos aos lugares da cidade e suas tradições (LEITE, 2007). “Essas significações, ou contra-sentidos, que diferem daqueles esperados pelas políticas urbanas, contribuem para uma diversificação dos atuais sentidos dos lugares” (LEITE, 2007, p. 121).

Nesse sentido, Lipovetsky (2007), Canclini (2008) e Leite (2007) acreditam que o consumo é um componente fundamental para compreender como se comportam os indivíduos social, cultural e politicamente na sociedade contemporânea. Canclini (2008, p. 224) afirma que, embora o consumismo pareça um sistema individualista, o que não deixa de ser verdade, ele também permite gerar “novas associações de consumidores e lutas sociais, ainda que em grupos marginais, melhor informados sobre as condições nacionais e internacionais”.

Apesar de atribuírem diferentes especificações, o que nenhum desses autores nega, são as mutações culturais geradas pela sociedade do consumo, capazes de transformar a realidade em imagens espetaculares. Nesse sentido, Baudrillard (1991, p. 33) afirma que a simulação já não possui referência nem mesmo na realidade, e sim na hiper-realidade, perdendo a ligação com os fatos em si:

o capital se alimentou no decurso de sua história da desestruturação de todo o referencial, rompeu as distinções ideais do verdadeiro e do falso, do bem e do mal, para estabelecer uma lei radical de equivalências e de trocas […] foi ele que primeiro liquidou o valor de uso de toda a equivalência.

A supressão do real desencadeia uma diversidade de comportamentos como forma de resgatar uma realidade que já não pode ser recuperada. Nesse processo, para Baudrillard (1991), o sujeito não só reproduz, mas produz informação, ele é o próprio modelo que difunde uma hiper-realidade. Ao discutir esse argumento, o autor descreve o exemplo de um reality show americano, cujo objetivo é transmitir o cotidiano familiar, como se pudesse ser observado através de uma lupa, sua rotina, suas relações intrafamiliares e seus trejeitos íntimos. Tão logo o programa terminou, a família se desfez. Nesse interim, a mídia e a televisão assumem também uma função diferenciada: é por meio do surgimento das novas tecnologias e canais de comunicação que se promove cada vez mais informação e menos sentido. Para Baudrillard (1991), essa forma de informação doutrinada pela mídia é a grande vilã da destruição do significado e da comunicação real, galgando até a implosão do social.

Assim, a produção cultural é tomada pela falta de profundidade: o conteúdo foi assimilado e neutralizado pela linguagem da mídia e da informática, constituindo o “triunfo da superficialidade”. Para Debord (2003), a informação, a publicidade e o consumo são algumas das principais formas de espetacularização da realidade que prevalecem como retrato da vida social. Deleuze (1992) diz que o rádio e a televisão tornaram as conversas cheias de palavras inúteis, de modo que o problema não está em fazer com que as pessoas possam se expressar, mas em arranjar-lhes “vacúolos de solidão” para que tenham algo de interessante a dizer. Nesse ciclo contínuo, o senso crítico do indivíduo é prejudicado em um processo retroalimentado pela produção cultural de linguagem tecnológica que tampouco oferece condições de reflexividade para o sujeito.

Nesse terreno de dissolução do sentido e do conteúdo, a antiga distinção entre a “alta arte” da modernidade e as formas comerciais também se esfacela concomitantemente ao surgimento de novos tipos de produções culturais populares. Mas esse processo não se dá sozinho. Jameson (1997 p. 74) descreve um amplo alcance da cultura para outros campos da vida social:

Uma prodigiosa expansão da cultura por todo o domínio do social, até o ponto em que tudo da nossa vida social, do valor econômico e do poder do Estado, às práticas e à própria estrutura da psique, pode ser considerado cultura, em um sentido que não foi, até agora, teorizado. Essa proposição, no entanto, é totalmente consistente com o diagnóstico anterior de uma sociedade de imagem ou do simulacro, e da transformação do real em uma série de pseudoeventos.

A perda de profundidade das produções culturais pós-modernas pode ser assimilada nesse exemplo de Jameson. Ele compara Um par de botas, de Van Gogh, à obra Diamond shoes, de Andy Warhol. Warhol foi artista plástico e um dos principais nomes do famoso movimento que surgiu na Inglaterra e teve seu ápice ao chegar nos Estados Unidos na década de 1960, conhecido como Pop art. A Pop Art foi um movimento caracterizado por utilizar imagens publicitárias do universo de consumo e da cultura de massa como obras de arte, todavia, utilizava-as também como forma de criticar a influência do consumo no cotidiano das pessoas. Warhol ganhou grande destaque nesse período e trabalhou como ilustrador de revistas como a

Vogue e The New Yorker, mas também elaborou material publicitário para lojas e chegou a

produzir filmes. Suas obras mais conhecidas já foram expostas no MOMA – Museu de Arte Moderna, em Nova York.

segundo Jameson (1997), só o de Van Gogh tem realmente algo a dizer. O quadro de Van Gogh requer do observador um exercício mental de reconstituição do passado no qual está inserido, remete ao campo agrícola, à pobreza, ao exaurido trabalhador rural depois de um dia opressivo de trabalho, mas pode acometer a muitos significados mais, tudo isso realizado com um uso espetacular de cores, que também possui uma função metódica na obra; o quadro de Warhol a nada se relaciona a não ser, talvez, ao fetichismo da mercadoria e ao mercantilismo com o qual sua própria vida se entrelaça, como salienta Jameson (1997). Toda a produção artística de Warhol é sintomática de uma sociedade que se confunde com sua própria imagem. Warhol disse certa vez que “[…] é para isso que serve o show business: para provar que o que conta não é o que você é, e sim o que eles pensam que você é” (WARHOL apud FONTENELLE, 2002, p. 175, grifo do autor).

Não obstante, é a prática do pastiche que melhor simboliza, para Jameson (2006), a falta de profundidade cultural pós-moderna. A busca pelo pastiche ocorre quando não há mais a possibilidade de se afirmar um estilo pessoal, em uma discussão que sucede a da morte do estilo e a do sujeito. Assim, o pastiche surge como uma espécie de nostalgia melancólica de outros tempos, seja por meio do cinema, da literatura, por certos tipos de textos os quais a Escola de Frankfurt criticou veemente, seja pela pop art. Jameson (2006) definiu o pastiche como algo similar à paródia, uma imitação em função da ausência de novos estilos individuais, que, obrigatoriamente, estará relegada a se reproduzir num solo adubado com sementes do passado.

No cinema, o pastiche se revela com filmes que também remontam ao passado, todavia, não a um passado realista, mas a um passado desconexo da realidade, estereotipado, hiper-real. Jameson (1997) cita alguns filmes que poderiam ser considerados pastiches:

Chinatown, do controverso Roman Polanski, O conformista (1970), do não menos polêmico

diretor italiano Bernardo Bertolucci, mas muitos outros filmes poderiam ser mencionados, como os vários grandes filmes sobre a máfia italiana, toda a trilogia de Francis Coppola, O

Poderoso Chefão (1972), ou Os bons companheiros (1990), de Martin Scorsese, ou ainda a

fascinante obra Novecento (1976), que acompanha as duas grandes guerras na Itália, também de Bertolucci. O que essas obras têm em comum é, sobretudo, a reconstrução de enredo e cenário históricos baseada em imagens, em um passado nostálgico que, por mais que tentemos, não conseguiremos alcançar.

Muito embora o pastiche no cinema seja constituído por criações de filmes nostálgicos, notam-se prenúncios de um cenário generalizado de produção da indústria cinematográfica, que frustrada com um presente no qual as condições históricas reais não são mais oferecidas, se

aferrolha ao passado histórico de guerras, revoluções e ameaças nucleares iminentes:

Parece-me sintomático encontrar precisamente o estilo do cinema nostálgico invadindo e colonizando até mesmo aqueles filmes atuais que se passam em cenários contemporâneos, como se, por algum motivo, não pudéssemos mais, hoje, focar o nosso próprio presente, como se nos tivéssemos tornado incapazes de alcançar representações estéticas de nossa própria experiência atual. Mas, se assim é, então estamos diante de uma imposição do próprio capitalismo de consumo- ou, ao menos, de um sintoma alarmante e patológico de uma sociedade que se tornou incapaz de lidar com o tempo e a história (JAMESON, 2006, p. 29).

O motivo a que se refere Jameson (2006) é, justamente, esse presente vazio de conteúdo, que não produz estilo algum, tampouco história, uma absoluta “crise da historicidade”, que encontra seu campo fértil nos simulacros imagéticos tão incrivelmente bem reproduzidos, cujas produções superam o real, criando o hiper-real.

Em síntese, embora admita-se que a produção cultural pós-moderna tenha sofrido mutações de ordem econômica, transformando não apenas seu conteúdo, mas a própria vida social, pesquisas acadêmicas têm mostrado que novas percepções e possibilidades são possíveis, e que não se trata, ao certo, de condenar e generalizar, mas de analisar e compreender. Afinal, “[…] o consumo serve para pensar, mas não somente na direção apontada pela racionalidade moderna” (CANCLINI, 2008, p. 224).

Nessa perspectiva, tentou-se descrever, em primeiro lugar, as transformações do capitalismo do século XX, como geradoras de novas relações de tempo e espaço, de maneira a acelerar o processo de acumulação do capital, não importando as consequências sociais, urbanas e políticas para as grandes cidades contemporâneas. Em segundo lugar, buscou-se delinear as

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