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P ROCESSO PARA A A PLICAÇÃO DO R EGIME RA

Os princípios implícitos na aplicação do regime RA são o de ―poluidor-pagador‖ e o da compensação de danos, isto é, o operador em virtude do exercício de uma qualquer actividade enumerada no anexo III da Directiva RA, independentemente do seu carácter público ou privado, lucrativo ou não, denominada pela Directiva RA de ―actividade ocupacional‖, cause ou ameace de forma iminente causar um dano ambiental, é tido como responsável financeiramente. O regime RA faz com que cada operador seja responsável por garantir que os danos causados à água, solo e espécies e habitats protegidos sejam, quer prevenidos, através de medidas de prevenção adequadas em caso de ameaça iminente, quer efectivamente reparados, através da restituição do estado inicial existente antes do dano ambiental ocorrer.

O regime RA diferencia a responsabilidade em dois níveis distintos, responsabilidade objectiva e responsabilidade subjectiva. A primeira, responsabilidade objectiva, é definida pela Directiva RA como a responsabilidade que é imputada aos operadores, no exercício de uma qualquer actividade listada no anexo III da Directiva RA, que cause dano ambiental ou ameaça iminente desses danos, não sendo necessário a existência de qualquer dolo ou incúria por parte do operador da actividade que a desencadeie. A responsabilidade subjectiva aplica-se a todas as actividades ocupacionais, distintas das enumeradas no anexo III da Directiva RA, que por

negligência ou dolo, cause um dano ambiental, sendo por isso obrigado a adoptar medidas de prevenção e reparação. Este tipo de responsabilidade é aplicável apenas aos danos causados a espécies e habitats, e não à água e solo, como o anterior modelo de responsabilidade.

Na aplicação do regime RA é necessário ter em consideração que nem toda a afectação de um recurso natural é susceptível de ser abrangida por tal regime. Apenas os danos considerados como alterações adversas mensuráveis de um recurso ou a deterioração mensurável de um serviço prestado por estes e que provoquem efeitos significativos na água, solo e espécies e habitats, são considerados. A Directiva RA define assim os danos causados aos descritores ambientais:

Danos causados a espécies e habitats naturais protegidos – ―Quaisquer danos com efeitos significativos adversos para a consecução ou a manutenção do estado de conservação favorável desses habitats ou espécies, cuja avaliação tem que ter por base o estado inicial, nos termos dos critérios constantes no anexo IV da Directiva RA, com excepção dos efeitos adversos previamente identificados que resultem de um acto de um operador expressamente autorizado pelas autoridades competentes, nos termos da legislação aplicável.‖

Danos causados à água – ―Quaisquer danos que afectem adversa e significativamente, nos termos da legislação aplicável, o estado ecológico ou o estado químico das águas de superfície, o potencial ecológico ou o estado químico das massas de água artificias ou fortemente modificadas, ou o estado quantitativo ou o estado químico das águas subterrâneas.‖

Danos causados ao solo – ―Qualquer contaminação do solo que crie um risco significativo para a saúde humana devido à introdução, directa ou indirecta, no solo ou à sua superfície, de substâncias, preparações, organismos ou microrganismos.‖

Também se encontram abrangidos pelo regime RA as ameaças de dano ambiental, sendo definidas pela Directiva RA como a ―probabilidade suficiente de ocorrência de um dano ambiental, num futuro próximo.‖

Um aspecto a ter em conta na aplicação do regime RA, é a sua aplicação temporal. Isto é, o regime RA não se aplica a danos causados por emissões, acontecimentos ou incidentes ocorridos antes da data de entrada em vigor, 1 de Agosto de 2008. Não se aplica, também, a danos causados por emissões, acontecimentos ou incidentes ocorridos após a entrada em vigor na legislação nacional, mas que tenham resultado de uma actividade realizada e concluída antes da referida data. E por fim, o regime RA não se aplica a danos ambientais prescritos, isto é, que ocorram 30 anos ou mais após a emissão, acontecimento ou incidente que esteja na sua origem.

A transposição da Directiva RA é bastante flexível na implementação dos seus requisitos, permitindo condições de excepção que revogam a responsabilidade dos operadores sobre um possível dano ambiental, cuja actividade esteja incluída ou não no anexo III da Directiva RA. Assim, encontram-se excluídos do regime RA os danos ambientais ou ameaças iminentes de dano ambiental que sejam causados por:

 Actos de conflito armado, hostilidades, guerra civil ou insurreição.

 Fenómenos naturais de caracter totalmente excepcional, imprevisível ou que, mesmo previstos, sejam inevitáveis.

 Actividades cujo único objectivo reside na defesa nacional ou na segurança internacional.

 Actividades cujo único objectivo reside na protecção contra catástrofes naturais.

Não se aplica ainda a danos ou ameaça iminente de tais danos, que resultem de incidentes cuja responsabilidade seja abrangida no âmbito de aplicação de algumas convenções internacionais, tais como:

 Convenção, de 10 de Outubro de 1989, sobre a Responsabilidade Civil pelos danos causados durante o transporte de mercadorias perigosas por via rodoviária, ferroviária e por vias navegáveis.

 Convenção Internacional, de 27 de Novembro de 1992, sobre a Responsabilidade Civil pelos prejuízos devidos à poluição por hidrocarbonetos e para constituição de um fundo internacional para compensar financeiramente, os prejuízos, também, devidos à poluição por hidrocarbonetos.

 Convenção Internacional, de 3 de Maio de 1996, sobre a responsabilidade e a indemnização por danos ligados ao transporte por via marítima de substâncias nocivas e potencialmente perigosas.

 Convenção Internacional, de 23 de Março de 2001, sobre a Responsabilidade Civil pelos prejuízos devidos à poluição por hidrocarbonetos contidos em tanques de combustível. Também se encontram excluídos os danos ou ameaça iminente de tais danos, na sequência de riscos nucleares ou de actividades abrangidas pelo Tratado que institui a Comunidade Europeia da Energia Atómica, ou por incidentes ou actividades cuja responsabilidade seja abrangida no âmbito de alguns instrumentos internacionais, tais como:

 Convenção de Paris, de 29 de Julho de 1960, sobre responsabilidade Civil no domínio da energia nuclear, e Convenção Complementar de Bruxelas, de 31de Janeiro de 1963.

 Convenção de Viena, de 21 de Maio de 1963, relativa à Responsabilidade Civil em matéria de danos nucleares.

 Convenção de Bruxelas, de 17 de Dezembro de 1971, relativa à Responsabilidade Civil no domínio do transporte marítimo de material nuclear.

 Protocolo Conjunto, de 21 de Setembro de 1988, relativo à aplicação da Convenção de Viena e da Convenção de Paris.

 Convenção de 12 de Setembro de 1997, relativa à indemnização complementar por danos nucleares.

Para além das exclusões supracitadas, o regime RA permite ainda aos operadores recorrer da obrigação de actuação e suporte dos custos de prevenção e reparação, e caso se aplique, à recuperação dos custos incorridos. Assim, o operador não é obrigado a suportar os custos das medidas de prevenção e/ou reparação, se conseguir provar, cumulativamente que não houve dolo ou negligência da sua parte e que o dano ambiental tenha sido causado por:

 Uma emissão ou acontecimento expressamente permitido e que respeite na íntegra a autorização emitida nos termos das disposições legais.

 Uma emissão ou actividade que utilize uma(s) substância(s) que o operador prove não ser(em) considera(s) susceptível(eis) de causar dano ambiental de acordo com o conhecimento técnico/científico no momento da emissão ou da realização da actividade. Não é ainda exigido ao operador, os custos resultantes das medidas de prevenção e/ou reparação, se provar que o dano ambiental ou ameaça iminente de tais danos:

 Foi causada por terceiros, e ocorreu apesar de terem sido tomadas as medidas de segurança adequadas.

 Resultou do cumprimento de uma ordem ou instrução emitida por uma autoridade pública que não seja uma ordem ou instrução resultante de uma emissão ou incidente causado pela actividade do operador.

No caso anterior, a autoridade competente deve tomar as medidas necessárias para permitir ao operador recuperar os custos incorridos.

As exigências da Directiva RA são mínimas, pois os estados membros, caso pretendam, podem ir além dos seus requisitos, no que diz respeito, por exemplo, à introdução da garantia financeira obrigatória e ao alargamento dos receptores ambientais.

Posto isto, e para melhor compreensão sobre a aplicação do regime RA é apresentado um esquema que permite apoiar na decisão de enquadramento neste regime.

Figura 1 – Fluxograma de apoio à decisão para o enquadramento no regime RA. (Adaptado de ―Guia para a

Avaliação de Ameaça Iminente e Dano Ambiental‖, APA 2011.)