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Padrões de incidência da mortalidade conhecida

Resumo

O conhecimento das taxas, causas e padrões de incidência da mortalidade constitui um dos primeiros passos a serem tomados para a gestão e conservação de populações de lobo ameaçadas e, em particular, as expostas a uma acentuada actividade humana. O conhecimento e monitorização da mortalidade reveste-se de todo o interesse em Portugal, uma vez que apesar de o lobo estar classificado com estatuto de ameaça e protegido por legislação específica, continua a ser alvo de uma acentuada perseguição ilegal. O presente estudo teve como objectivo efectuar uma comparação da incidência da mortalidade conhecida no lobo no Noroeste de Portugal entre o período de 1996 a 2005 e ao longo do século XX, analisando as possíveis implicações demogr{ficas. Especificamente, pretendeu-se responder |s seguintes questões: (1) Quais as causas de morte conhecidas na população de lobo no Noroeste de Portugal, ao longo do último século? (2) Qual o padrão de incidência das causas de morte conhecidas tendo em conta o grau de fiabilidade da informação recolhida? (3) Qual a variação sazonal e anual na incidência das causas de morte? e (4) Qual a variação espacial das causas de morte tendo em conta a existência de {reas protegidas?. A an{lise actual (entre 1996 e 2005) e histórica (ao longo do século XX) da incidência da mortalidade conhecida foi efectuada através de um esforço constante e direccionado para a recolha de registos de lobos mortos e sua classificação com base em critérios de fiabilidade da informação recolhida. No período entre 1996 e 2005 teve-se conhecimento de um total de 121 lobos mortos na {rea de estudo, dos quais 33% foi possível confirmar através da recolha do cad{ver. A quase totalidade das causas de morte identificadas resultou, directa ou indirectamente, da acção humana. O tiro (31%) e o veneno (18%) constituíram as causas mais frequentes, e somente o tiro apresentou variação sazonal na sua incidência, detectando-se maioritariamente durante o Inverno e Outono. Verificou-se um acentuado decréscimo no número total de lobos mortos registados entre o quinquénio 1996-2000 (média de 17.4 lobos mortos/ano) e o quinquénio 2001-2005 (média de 6.8 lobos mortos/ano). Detectou-se um recente decréscimo na incidência do tiro e veneno como causas de morte, reflectindo por isso, uma aparente diminuição na intensidade de perseguição ilegal direccionada ao lobo. No que respeita | abordagem metodológica utilizada, detectaram-se diferenças na incidência de determinadas causas de morte dependendo do grau de fiabilidade do registo, nomeadamente, no tiro e no veneno, que tiveram maior incidência nos registos prov{veis, e no atropelamento, que teve maior incidência nos registos confirmados. A incidência das v{rias causas de mortalidade revelou-se como sendo independente da existência de {reas protegidas. Ao longo das últimas décadas, detectou-se uma acentuada variação na proporção da incidência das v{rias causas de mortalidade conhecidas. Além disso, para cada causa de morte identificada ao longo do século XX, verificou-se um impacto diferencial tendo em conta o número de lobos mortos por unidade de esforço, o que apresenta importantes implicações na din}mica e tendência populacional do lobo.

Palavras-chave: An{lise histórica, causas de mortalidade, critérios de fiabilidade, envenenamento,

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4.1 - Introdução

A mortalidade é um dos par}metros b{sicos no estudo da din}mica populacional do lobo (Mech, 1970; Fuller et al., 2003). O conhecimento das taxas, causas e padrões de incidência da mortalidade constitui um dos primeiros passos a serem tomados para a gestão e conservação de populações lupinas ameaçadas e, em particular, as expostas a uma acentuada actividade humana (Fuller et al., 2003; Person & Russell, 2008). A an{lise das causas de mortalidade constitui um indicador do nível de impacto de origem humana a que as populações de lobo se encontram sujeitas, permitindo, por exemplo, avaliar a efic{cia da protecção legal ou da existência de {reas protegidas, na redução da incidência de mortalidade por causas humanas (Frković et al., 1992; Mech et al., 1998; Person & Russell, 2008). A monitorização da mortalidade ao longo de um período alargado de tempo e o conhecimento da sua magnitude em épocas históricas, apesar de se encontrarem deficientemente investigados, revelam-se também de grande interesse uma vez que permitem caracterizar a incidência de causas de morte no passado e inferir tendências populacionais (Grau et al., 1990; Jędrzejewska et al., 1996; Fern{ndez & Ruiz de Azua, 2009). Porém, o conhecimento da mortalidade em populações selvagens de lobo é difícil e o rigor depende da metodologia utilizada, facto que frequentemente condiciona a utilização da mortalidade como um par}metro demogr{fico v{lido.

A obtenção de taxas e causas de mortalidade que possam reflectir a sua real incidência numa população tem vindo a ser conseguida maioritariamente na América do Norte, através do seguimento por telemetria de um número elevado de lobos (Peterson et al., 1984; Ballard et al., 1987; Fuller, 1989; Mech et al., 1998; Fuller et al., 2003; Blanco & Cortés, 2007; Mills et al., 2008; Person & Russell, 2008). Devido principalmente a constrangimentos económicos e logísticos associados ao uso intensivo da telemetria, o conhecimento da mortalidade na

maioria da {rea de distribuição do lobo e, em particular, no Sul da Europa é reduzido e tem vindo a ser obtido maioritariamente através da recolha oportunista de cad{veres e/ou de testemunhos indirectos de registos de mortalidade (ver revisão em [lvares et al., 2010). Além disso, a maioria dos estudos com este tipo de amostragem não refere os critérios de recolha da informação respeitante a cad{veres, nem a abrangência e exaustão das an{lises post-mortem, podendo subestimar ou levar | diagnose incorrecta de determinadas causas de morte, principalmente das naturais. Consequentemente, esta abordagem pode não reflectir a representatividade real das v{rias causas de morte e a estrutura e din}mica das populações (Ciucci et al., 2007; Álvares et al., 2010). Por esta razão, os estudos de mortalidade do lobo na Europa baseados em amostragens oportunistas (Frković et al., 1992; Francisci & Guberti, 1993; Huber et al., 2002; Lovari et al., 2007) são frequentemente question{veis e alvo de críticas e discussão por parte da comunidade científica (ver p.e. polémica entre Francisci & Guberti, 1993 e Boitani & Ciucci, 1993, e entre Lovari et al. 2007 e Ciucci et al. 2007).

A nível ibérico, a recolha de cad{veres e/ou de informações relativas a lobos mortos tem vindo a permitir detectar maioritariamente uma mortalidade por causas humanas, pelo que se supõe que o desconhecimento da magnitude das causas naturais é uma forte limitação na interpretação e utilização destes dados de mortalidade como um índice demogr{fico (Álvares et al., 2010). Contudo, em regiões humanizadas onde o lobo se encontra sujeito a um elevado risco de atropelamento e | perseguição legal ou ilegal, como é o caso da Península Ibérica, a morte por causas naturais constitui provavelmente uma fracção mínima da mortalidade total (ver revisão em Fuller et al., 2003 e Álvares et al., 2010). Com efeito, um estudo ibérico com recurso ao seguimento de 14 lobos por telemetria encontrou causas de mortalidade devidas unicamente a actividades humanas, como a caça ilegal e o atropelamento (Blanco & Cortés, 2007). Desta forma, em regiões

68 fortemente humanizadas, a utilização de uma amostragem centrada na recolha de registos de lobos mortos poder{ contribuir para a gestão e conservação desta espécie. No entanto, o recurso a este tipo de amostragem para potenciar o conhecimento da mortalidade implica a realização de censos coincidentes no espaço e no tempo para estimar efectivos populacionais e, principalmente, a utilização de critérios uni- formes e objectivos na recolha de informação (Álvares et al., 2010). Em particular, a aplicação desta abordagem metodológica para o conhecimento e monitorização da mortalidade reveste-se de todo o interesse em Portugal, uma vez que apesar de o lobo se encontrar classificado “Em perigo de Extinção” e estar protegido por legislação específica desde 1988, continua a ser alvo de uma acentuada perseguição ilegal (Pimenta et al., 2005).

O presente estudo teve como objectivo efectuar uma comparação da incidência da mortalidade conhecida no lobo no Noroeste de Portugal entre o período de 1996 a 2005 e ao longo do século XX, analisando as possíveis implicações demogr{ficas. Para tal foi efectuado um esforço constante e direccionado para a recolha de registos de lobos mortos e sua classificação com base em critérios de fiabilidade da informação recolhida. Em particular, pretendeu-se responder |s seguintes questões: (1) Quais as causas de morte conhecidas na população de lobo no Noroeste de Portugal, ao longo do último século? (2) Qual o padrão de incidência das causas de morte conhecidas tendo em conta o grau de fiabilidade da informação recolhida? (3) Qual a variação sazonal e anual na incidência das causas de morte? e (4) Qual a variação espacial das causas de morte tendo em conta a existência de {reas protegidas?.

4.2 - Metodologia