• Nenhum resultado encontrado

A Geografia Cultural instituída por Carl Ortwin Sauer18, de acordo com Myanaki (2003) será responsável pela retomada do conceito de paisagem dentro da ciência geográfica com uma abordagem humanística. Ele traz para a Geografia uma nova conceituação para a paisagem, sendo, ela então paisagem natural e paisagem cultural e∕ou artificial. Seria no entrecruzamento das formas naturais e das formas humanizadas que teríamos, como resultado dessa conexão seria, a paisagem cultural.

Dentro do contexto cultural, a paisagem assume as características daqueles que ali vivem e a transformam. Corrêa (1995) apud Tonini (2006, p. 74) mostra que “na paisagem estão impressas as marcas culturais, por meio de uma linguagem cujos significados pertencem a uma determinada cultura”. Ainda no mesmo pensamento, para Claval (1999, p. 14) “a paisagem traz a marca da atividade produtiva dos homens e seus esforços para habitar o mundo”. Dessa forma, a Geografia Cultural serve de subsídio para o nosso estudo a partir do momento em que esta nos respalda no estudo de uma paisagem secular em que está inserido o IBC, tendo como grande foco a interação dos alunos com essa paisagem e sendo esta construída com bases em uma cultura para alunos com deficiência visual desde a sua origem.

Segundo Claval (1999, p. 318) “o estudo das paisagens constitui um dos capítulos fundamentais da Geografia Cultural”, pois ela é o resultado da vida das pessoas, palco dos acontecimentos, dos processos produtivos e da transformação da natureza. É nela, na paisagem, que encontramos as marcas das culturas. Podemos até nos atrever a pensar que a paisagem do IBC apresenta marcas próprias que estão consolidadas na sua edificação, muito emblemática na zona sul do Rio de Janeiro. Berque (1998) aponta que:

A paisagem é uma marca, pois expressa uma civilização, mas também é uma matriz porque participa dos esquemas de percepção e de ação – ou seja, da cultura – que canalizam, em um certo sentido, a relação de uma sociedade com o espaço e com a natureza e, portanto, a paisagem do seu ecúmeno (BERQUE, 1998, p. 84-85).

Assim, ela também pode, de certo modo, ser caracterizada como matriz, a partir do momento em que seu público se relaciona culturalmente com essa paisagem no seu dia a dia,

18Segundo Vargas (2006, p. 160),Carl Ortwin Sauer (1889 – 1975), geógrafo norte-americano, considerado o

criador da chamada Escola de Berkeley em 1925. Sauer definiu a paisagem geográfica como o resultado da ação da cultura, ao longo do tempo, sobre a paisagem natural. Sauer é autor do clássico estudo “A morfologia da paisagem”, publicado em 1925.

onde as diferentes paisagens existentes ali criam culturas que constituem em um todo a paisagem do IBC. Nessa troca, acabam também criando paisagens que não podem ser experienciadas por todos – como, por exemplo, os dormitórios dos alunos19.

Mas ainda na concepção da paisagem humana e cultural, na paisagem aqui estudada, podemos observar que estamos diante de uma simbologia intrigante relacionada ao ensino de alunos com deficiência visual, pois ela está impregnada dos valores culturais ali construídos. Podemos constatar isso não somente na suntuosidade da sua construção (figuras 26 e 27), como também no ritual do aniversário do IBC, onde essa celebração toma uma grande importância. Sobre esta paisagem, Cosgrove (1998) sinaliza que:

Tais paisagens simbólicas não são apenas afirmações estáticas, formais. Os valores culturais que elas celebram precisam ser ativamente reproduzidas para continuar a ter significado. Em grande parte isto é realizado na vida diária pelo simples reconhecimento dos edifícios, nomes dos lugares, etc. Mas frequentemente os valores inscritos na paisagem são reforçados por ritual público durante cerimônias maiores ou menores (COSGROVE, 1998, p.115).

Podemos constatar que no IBC “a geografia está em toda a parte” (COSGROVE, 1998, p. 121), todos que estão ali vivenciam as diferentes paisagens no seu cotidiano e participam dela. Esses diferentes significados nos remetem no que Cosgrove (1998) relata:

As paisagens tomadas como verdadeiras de nossas vidas cotidianas estão cheias de significados (...). Porque a geografia está em toda parte, reproduzida diariamente por cada um de nós. A recuperação do significado em nossas paisagens comuns nos diz muito sobre nós mesmos (COSGROVE, 1998, p. 121).

Figuras 26 e 27 – a fachada do IBC, e maquete

Fonte: ARRUDA, L. M. S, 2008.

Dentro da Geografia Humanista a abordagem fenomenológica é a que melhor caracteriza essa pesquisa, pois nos respalda no que concerne à percepção, foco da nossa pesquisa. Criada por Edmund Husserl (1859-1938), em linhas gerais é entendida como a busca da compreensão da essência dos fenômenos a partir daquilo que se vê. Pode-se dizer, desse modo, que se trata de uma ciência que visa compreender o sentido das coisas.

Ela será o aporte teórico para valorizar as experiências vividas nessa pesquisa, procurando o melhor caminho para trabalhar o conceito de paisagem com alunos cegos do 6º ano por meio de materiais didáticos sensoriais.

A relação dos alunos cegos com essa paisagem, com esse espaço vivido, rico de simbolismo e também dinâmico, com sua própria geograficidade, é criada a partir das relações dos que ali estão. A paisagem tem uma materialidade e esta mantém uma relação dialógica do ser no mundo em uma conjunção de momentos vividos, fundamenta a vida cotidiana do ser humano. Neste sentido, concordamos com Dardel (2011, p. 30) quando este analisa que “a paisagem é um conjunto, uma convergência, um momento vivido, uma ligação interna, uma “impressão”, que une todos os elementos”.

Seguimos, nessa perspectiva fenomenológica, apropriando da percepção da paisagem por meio da utilização dos sentidos (a visão, o olfato, o paladar, o tato e a audição). Ela seria o espanto que a natureza causa, e a condição afetiva da paisagem é um ponto importante na fenomenologia buscando dessa forma paisagens que auxiliam na pesquisa.

Para Claval (2001, p. 61-62) “a experiência do espaço é feita por meio dos sentidos humanos; as geografias vividas dependem da visão, da audição, do olfato, do gosto e do sentido do tocar” [...]. Já para Erwin Straus (1935) apud Besse (2006, p. 79) “a geografia está do lado da percepção e a paisagem do lado do sentir”.

Em Santos (2012, p. 67-68), “esta pode ser definida como o domínio do visível, aquilo que a vista abarca. É formada não apenas de volumes, mas também de cores, movimentos, odores, sons etc”. Santos (2012, p. 68) também afirma que “a dimensão da paisagem é a dimensão da percepção, o que chega aos sentidos”.

Ainda assim, a partir dessas leituras faz-se necessário uma reflexão sobre as seguintes dualidades: paisagem e percepção, paisagem e identidade, paisagem e lugar, paisagem e ensino que permeiam a pesquisa, pois essas dualidades fazem parte das características desse estudo.