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Estrutura da dissertação

1. Arquitetura e tecnologia

1.2. A influência das Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs)

1.2.2. Paisagem e virtualidade

Pensar a produção do espaço citadino na contemporaneidade requer entender o espaço imaterial que constitui a paisagem urbana influenciada pelas ferramentas digitais; Allen (1995) salienta essa tendência e a define como “paisagem de informação”, lugar da intersecção de múltiplos fluxos de informação, retroalimentação e adaptação ao longo do tempo. Picon (2004), por sua vez, enfatiza uma transformação decorrente da introdução das ferramentas digitais, em uma das dimensões essenciais da arquitetura - a materialidade.

A questão da materialidade na arquitetura foi amplamente discutida por autores como Frampton, no livro Estudies in tectonic culture11 (1995). Ao analisar a obra de arquitetos como

Perret, Wright, Kahn e Mies van der Rohe, Frampton defende o caráter material e a arquitetura como uma arte da construção. Em Anti Tectonics: The Poetics of virtuality12 (1998), Mitchell,

defende a réplica sobre a questão da materialidade na arquitetura ao propor a ideia de "antitectônico”, ampliando limites do processo de projeto convencional e da produção arquitetônica para a era digital. Diante desse debate, Picon (2004) aponta a arquitetura digital como um fenômeno recente e a necessidade de cautela para ponderar questões provisórias, tais como virtualidade e materialidade, emergentes nesse contexto. Se, por um lado, Frampton assume um posicionamento permanente tomando essas características como definitivas e agravantes à produção arquitetônica, colocam-se os seguintes questionamentos:

O que a arquitetura digital sugere, inclusive em seu estado atual de desenvolvimento incompleto, sobre as mudanças de categorias da experiência física? Se a materialidade não está em perigo, como é que a sua definição, no entanto, evolui? (PICON, 2004, p. 68) 13

A relação entre real e virtual na arquitetura remete-se, quase sempre, a uma desmaterialização referente à produção por meio das mídias digitais; no entanto, Picon (2004) defende certa indeterminação inerente ao processo de projeto arquitetônico, quando define, por exemplo, o desenho arquitetônico como um objeto virtual que antecipa a materialização de uma construção. Assim, o desenho arquitetônico define-se como um potencial que espera sua plena realização, no que tange à realidade virtual e material na arquitetura.

Até o momento, uma das funções da realidade virtual era ancorar a produção arquitetônica a algum tipo de necessidade. O desenho era sinônimo de pesquisa para fornecer o necessário. A ordem e proporção, a estrutura e, especialmente, o espaço, deveriam ser essenciais e, portanto, seriam determinados por uma necessidade interna. Uma das características mais intrigantes da realidade virtual é que parece ser acompanhada por um elevado grau de incerteza, em outras palavras, nenhum projetista pode garantir que seu projeto é o resultado da melhor escolha possível (PICON, 2003, p. 135-136).14

12

Texto publicado em The virtual dimension: architecture, representation and crash culture, editado por John Beckmann, Princeton Architectural Press, New York, 1998.

13

No original: “¿Qué sugiere la arquitectura digital, incluso em su estado actual de desarrollo incompleto, sobre las categorías cambiantes de la experiencia física? Si la materialidad no está em peligro, ¿cómo es que su definición, sin embargo, evoluciona?”

14

No original: “Hasta ahora, una de las funciones de la realidad virtual era anclar la producción arquitectónica a algún tipo de necesidad. El diseño era sinónimo de la búsqueda de la forma necesaria. El orden y la proporción, la estructura y, sobre todo, el espacio, se suponía que eran esenciales y, por tanto, venían determinados por uma necesidad interna. Uno de los rasgos más desconcertantes de la realidad virtual es que parece ir acompañada de un mayor grado de

Para Allen (1995), a assimilação das tecnologias da informação na arquitetura implica abortar a ideia do computador em termos utópicos, adotando-o em termos mais pragmáticos e articulando, assim, um jogo mais complexo entre o real e o virtual. Como resultado da importância concedida à dimensão virtual na disciplina e no desenvolvimento das ferramentas digitais, Picon (2003) defende uma crescente preeminência de imagens e metáforas procedente da matemática, da física e da biologia molecular na arquitetura, referindo-se ao uso dos campos de conhecimento advindos de outras áreas como a topologia, os fractais e a teoria do caos à prática arquitetônica.

Kolarevic (2004), por sua vez, em Architecture in the digital age, expõe abordagens contemporâneas aplicadas ao processo de projeto arquitetônico influenciadas pelos escritos dos filósofos Leibniz e Deleuze, cujos conceitos de dobra, platôs – demonstrando que a realidade e os eventos ocorrem de uma maneira não-linear - espaço estriado e multiplicidade são introduzidos por meio das ferramentas digitais na arquitetura. Greg Lynn demonstra no ensaio Architectural

Curvilinearity (1993), exemplos de novas abordagens projetuais que consideram uma “lógica de

conectividade mais fluida” manifesta através da dobra deleuziana – uma estratégia de projeto em substituição à representação cartesiana de espaço, empregando uma concepção topológica de formas e geometrias de curvas contínuas.

Para Kolarevic (2004), o surgimento de arquiteturas digitais contemporâneas – embora pareça rejeitar qualquer noção de tipologia urbana e estrutural, continuidade, morfologia e estilo histórico – sugere uma maneira inteiramente nova de pensar e produzir arquitetura. Assim, são muitos os fatores atribuídos às transformações decorrentes da influência das TICs na arquitetura, em um primeiro momento enquanto expressão formal e conceitual, para definir-se como uma “expressão digital” (SZALAPAJ, 2005) a partir da introdução das ferramentas digitais no processo de projeto. Para Szalapaj (2005), a aplicação das tecnologias informacionais na prática de projeto ocorrem em três instâncias:

1. Expressão digital de formas da construção;

2. Integração digital de informação especializada de projeto;

3. Organização digital de prática de escritório.

A primeira concerne ao modo como diferentes métodos de expressão convencionais podem ser transferidos para ambientes digitais; a segunda preocupa-se com a análise da estrutura e do ambiente digital para suportar e integrar a informação digitalmente, investigando como ela se integra dentro do processo de fabricação e construção, e a terceira define questões referentes à apresentação e à comunicação de informação entre vários parceiros de projeto e clientes por meio de diferentes fases do processo de projeto.

Q. a forma segue a função no ambiente digital?

A. a forma segue os meios, os meios seguem as ferramentas, as ferramentas cedem aos desejos, e o desejo é tudo (RASHID, 2002) 15.

Contrariando a máxima modernista de que “a forma segue a função”, Rashid (2002) exprime as possibilidades alcançadas por meio das mudanças ocorridas no processo de projeto digital e na produção arquitetônica contemporânea. Nesse contexto, a utilização das tecnologias digitais permite maior exploração e experimentação de formas mais complexas e transforma radicalmente a relação entre projeto e construção (KOLAREVIC, 2004, p. 4). Segundo Szalapaj (2005), a inovação proposta a partir da introdução das ferramentas digitais na arquitetura reside na maneira como elas suportam as conexões entre o projeto de formas esculturais complexas e os métodos racionais de fabricação e construção, que são necessários para realizá-los.