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5 – Introdução

Neste capítulo se examinará a primeira parte do objeto de pesquisa referente à atuação da OAB no período de implementação do Plano Collor I e sua crise (17 de março de 1990 a 03 de janeiro de 1991), a fim de responder o problema de pesquisa elaborado. Para tanto, este capítulo foi construído em torno de três argumentos principais que se articulam, os quais serão explicados adiante.

Em primeiro lugar, entende-se que a OAB, no período de denúncia de contestação do Plano Collor assumiu três comportamentos institucionais com as seguintes configurações:

Quadro n.º 06. Papéis da OAB contra o plano Collor I.

PAPÉIS DA OAB CONTRA O PLANO COLLOR I

PERÍODO PAPEL DESEMPENHADO

17 de março de 1990 a 25 de abril de 1990

Membro da sociedade civil com expertise jurídica: denúncia da inconstitucionalidade do uso excessivo de medidas provisórias pelo governo Collor a violar o artigo 62, parágrafo único, da Constituição Federal. 61

26 de abril de 1990 a 03 de janeiro de 1991

Instituição com poder de fiscalização: propositura de ações perante o Supremo Tribunal Federal para declaração de inconstitucionalidade de medidas do Plano Collor I por violação do artigo 62, parágrafo único, da Constituição Federal.

Membro da sociedade civil com expertise jurídica: articulação e liderança de movimento político composto por membros da sociedade contra o uso excessivo de medidas provisórias (denominado de “Frente Nacional pela Democracia e Contra a Recessão”).

Fonte: elaborado pelo autor.

Em segundo lugar, a finalidade do exercício de tais papéis institucional foi o resguardo da Constituição Federal e, em específico, a violação do artigo 62 da Constituição em função da reedição medidas provisórias em outras no caso do Plano Collor I a forçar a não apreciação pelo Congresso - sob tal aspecto o uso das medidas tornou-se regra, e não a exceção conforme os critérios de “urgência” e “relevância” da norma constitucional (artigo 62 da Constituição Federal de 1988).

Por fim, e em terceiro, o exercício desses papéis tiveram por base a escolha das lideranças da OAB em seguir a trajetória institucional estabilizada e construída desde o período ditadura/ redemocratização, o que ocorreu mediante a articulação de dois fatores causais. O primeiro se refere ao contexto político (fator exógeno) favorável ao plano econômico a gerar certo impedimento às ações concretas de contestação da OAB. E o segundo diz respeito à atuação do presidente da (fator institucional), Ophir Filgueiras Calvanti, pois, em função do regime presidencial, seguiu a trajetória institucional de seu antecessor, Márcio Thomaz Bastos.

Portanto, o presente capítulo gira em torno desses três principais argumentos que se articulam com outros com o intuito de se comprovar a hipótese de pesquisa, ou seja, que a OAB exerceu seu papel para preservar a ordem constitucional vigente a partir de 1988, o que se tratou de uma trajetória institucional dependente construída anteriormente e que serviu de parâmetro para a tomada de decisão sobre sua ação na crise instalada.

5.1 – Primeiro período: a OAB como ator político com expertise jurídica

Em 16 de março de 1990, Collor editou 22 medidas provisórias, que compunham o seu prometido plano econômico criado para debelar a inflação galopante presente desde o governo Sarney. Tais medidas provisórias foram convertidas em lei antes do decurso do prazo constitucional de 30 dias; 02 foram revogadas mediante a promulgação de novas medidas provisórias, por serem inconstitucionais; e, 01 foi reeditada e acabou perdendo sua eficácia ao final de sua segunda edição (FIGUEIREDO e LIMONGI, 2001).

Essa “aparente vitória” tem explicação em um aspecto institucional: trata-se de um instrumento de iniciativa e de criação legal de competência constitucional do Chefe do

Executivo a ser usado em momentos de “relevância” e “urgência”, os quais não permitam normatizar certa matéria pelo processo legislativo ordinário; e quando Collor manuseou as medidas provisórias alterou unilateralmente o status quo, assim, colocou os parlamentares diante de um fato consumado de difícil modificação. Por isto, em várias oportunidades, os congressistas entenderam que a rejeição do Plano Collor via medidas provisórias não surtiria efeito prático (FIGUEIREDO e LIMONGI, 2001). 62

Doutra parte, a criação desse plano econômico, apelidado de Plano Collor I, teve por motivo combater a remonetização rápida e descontrolada da economia no período do governo Sarney. 63 Por conseguinte, o Plano Collor I tinha por meta garantir uma remonetização gradual, ordenada e lenta, mantendo a inflação em baixa por meio da implementação de um pacote econômico que combinou ferramentas econômicas, tais como impostos, taxas de câmbio, crédito e taxas de juros (CARVALHO, 2008).

Ou seja, determinou:

I. O confisco dos ativos de contas correntes e aplicações financeiras e limitou os saques a Cr$ 50.000,00 e Cr$ 25.000,00 respectivamente e o saldo restante seria confiscado pelo Banco Central e devolvido após 18 meses em 12 parcelas mensais; 64

II. A reforma monetária, com a substituição do Cruzado Novo pelo Cruzeiro, sem qualquer corte de dígitos, o reajuste das diversas tarifas púbicas, seguido da proibição de reajustes de preços e salários além do índice inflacionário, o aumento da alíquota do IOF (Imposta sobre Operações

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No entanto, o sucesso das medidas provisórias não tem o seu valor em per si somente; a ela se deve acrescentar o uso das prerrogativas regimentais garantidas pelos líderes partidários sobre o controle da discussão e da votação das matérias em pauta a neutralizar em parte a participação de parlamentares individualmente falando, em função do controle da agenda dos trabalhos a definir quais emendas, quando e por qual método (simbólico ou nominal) se votaria, protegendo, por conseguinte, a unidade e o interesse geral do partido contra as tentações dos parlamentares de garantir ganhos eleitorais de curto prazo (FIGUEIREDO e LIMONGI, 2001).

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Explica-se essa situação econômica: quando uma economia se aproxima da hiperinflação a sua moeda deixa de funcionar como meio de troca, isto é, a moeda deixa de ser utilizada nas transações econômicas. Em tal situação, ocorre uma redução na demanda por moeda a ser substituída por outra mais estável. Entretanto, com a interrupção do processo inflacionário, a moeda recupera as suas funções e determina uma elevação da demanda por moeda, ou seja, ocorre um processo de remonetização da economia (MODENESI, 2005).

Por conseguinte, o Plano Collor I tinha por meta garantir uma remonetização gradual, ordenada e lenta a manter a inflação em baixa por meio da implementação de um pacote econômico que combinou ferramentas econômicas, tais como impostos, taxas de câmbio, crédito e taxas de juros (CARVALHO, 2008).

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Tal medida atingiu principalmente os pequenos correntistas e poupadores, pois as grandes empresas e grandes aplicadores lograram liberar a maior parte de seus ativos por meio de diversos mecanismos como os leilões de remonetização, a pressão política, a fraude contábil ou a compra de dívidas (NEVES e FAGUNDES, 1996; CARVALHO, 2008)”.

Financeiras), a definição da taxa de cambio pelos critérios de mercado e a liberação das importações;

III. A privatização das empresas estatais com a aplicação do Programa Nacional de Desestatização; e, 6566

IV. Uma ampla reforma administrativa (NEVES e FAGUNDES, 1996; CARVALHO, 2008).

No entanto, de todas as medidas adotadas o confisco de 80% dos ativos de contas correntes e aplicações financeiras foi a mais grave (CARVALHO, 2008). 67

A OAB, diante do novo plano econômico, opôs-se e atuou no âmbito político e se diferenciou dos demais atores políticos por ser detentor da expertise jurídica.

Essa diferenciação se sedimenta no fato da OAB ser uma organização de advogados que atingiu a coesão vencendo tensões criadas por concorrentes externos e internos ao campo jurídico (BONELLI, 2002), logo, composta por trabalhadores especializados, detentores de um conhecimento abstrato, o conhecimento jurídico, o qual lhes permite controlar seu âmbito de trabalho e, mais importante, criar e aplicar o próprio discurso especializado aos assuntos humanos (FREIDSON, 1995).

Nesse sentido, busca-se afirmar que, diante de problemas políticos, a OAB se posiciona e aplica expertise jurídica que suas lideranças são detentoras, assim, pode apoiar ou se opor a situações políticas e, para tanto, dá razões jurídicas.

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TUMOLO (2002) ressalta que, apesar do caráter heterodoxo do plano, o conteúdo econômico apresentava caracteres neoliberais evidenciados pelo controle da inflação, pela redução drástica da liquidez, pela liberalização da taxa de câmbio e das importações e, por fim, pelo amplo projeto de reforma patrimonial e administrativa do Estado. Neste sentido, o Plano representou um ambicioso plano neoliberal a redefinir o padrão de acumulação capitalista e a fazer ofensiva contra os direitos sociais e trabalhistas (TUMOLO, 2002).

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O Plano Nacional de Desestatização (PND) foi o ponto de partida aos processos de privatização, os quais além de selarem o destino de outros milhões de trabalhadores do serviço de todas as categorias, aumentaram a onda de desemprego que a ofensiva neoliberal desencadeou, à semelhança do que já vinha fazendo em outros países em que esta ideologia estava consolidada (ALMEIDA, 2010).

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As origens do plano devem ser buscadas na reflexão brasileira sobre as dificuldades colocadas pela inflação elevada e crônica, no contexto das restrições macroeconômicas da década de 1980. E são muito dispersas e fragmentadas as informações sobre a gênese do Plano Collor, ou seja, sobre como e quando a equipe de Collor se decidiu pelo bloqueio. Não foram divulgados documentos. Vieram a público apenas textos curtos e declarações esparsas. Com base no que está disponível, pode-se afirmar que só no início de janeiro de 1990, a dois meses e meio da posse, a proposta foi adotada pelos economistas reunidos em torno de Zélia Cardoso de Mello, futura ministra da Economia, e levada ao Presidente eleito. O desenho das medidas deve ter sido muito influenciado por uma proposta discutida na assessoria do candidato do PMDB, Ulysses Guimarães, durante o primeiro turno das eleições presidenciais de 1989. Quando ficou claro o esvaziamento da campanha de Ulysses, a proposta foi levada para a candidatura de Luís Inácio Lula da Silva, do PT, obteve grande apoio por parte de sua assessoria econômica e chegou à equipe de Zélia depois do segundo turno, realizado em 17 de dezembro (CARVALHO, 2008).

Isso ocorreu em 08 de abril de 1990, momento no qual o Conselho Federal se reuniu e começou a se posicionar pela inconstitucionalidade do Plano Collor I. Em tal momento, o membro José Cavalcante Neves solicitou a constituição de uma comissão de juristas para avaliação da constitucionalidade do plano econômico e a possível proposição de uma ação direta de inconstitucionalidade: 68

“José Cavalcante Neves, Membro Nato, que, com a palavra, propôs que o Conselho Federal designasse uma comissão de juristas para opinar, sob o prisma da constitucionalidade, a respeito dos diplomas legais editados pelos Poderes Executivo e Legislativo para regulamentar o Plano Económico do governo, devendo tal parecer, se aprovado pelo plenário, servir de fundamento jurídico a eventual propositura, perante o Supremo Tribunal Federal, de ação direta de inconstitucionalidade dessas leis ou de parte delas. Ao justificar sua proposição o ex-presidente José Cavalcanti Neves relembrou antigos e reiterados pronunciamentos da OAB no sentido de que "não há legitimidade no desenvolvimento económico que não esteja, pautado pelas linhas de um Estado de Direito Democrático, este condicionado, por sua vez, pelo resguardo dos direitos fundamentais do homem”. 69

Após o início dos debates na sessão referida, o posicionamento efetivo da OAB se daria na realização da sessão de 10 de abril de 1990, quando o secretário do Conselho Federal, Marcelo Lavenère, apresentou a nota de posicionamento institucional elaborado pela comissão de juristas, conforme requerido na sessão anterior.

A nota formulada e apresentada foi:

“(...) Dr. Marcelo Lavenère, levou ao plenário a nota sobre as medidas Provisórias que havida sido aprovada na sessão anterior, redigida pela comissão:" O Conselho Federal da ordem dos Advogados do Brasil, reunido em sessão ordinária de 09.04.90, em face do último plano econômico governamental, considerando seus reiterados pronunciamentos no sentido de que não há legitimidade no desenvolvimento econômico que não esteja condicionado aos princípios de um Estado de Direito Democrático, em especial pelo resguardo permanente dos direitos e garantias individuais e coletivos, pautados na Constituição; considerando, ainda, caber-lhe ‘defender a ordem jurídica e a Constituição da República’ e bem assim ‘contribuir para o aperfeiçoamento das instituições jurídicas (art. 18, I, da Lei 4.215/63), resolveu: 1.Reafirmar sua reprovação à prática abusiva de medidas provisórias pelo Poder Executivo, que avassala o processo legislativo e cerceia a atuação do Congresso Nacional, em matérias de discutível ou de nenhuma relevância e urgência que poderiam ser melhor reguladas em leis ordinárias. A conversão dessas medidas provisórias em lei pelo Congresso Nacional, não afasta seu vicio de origem (...). 70

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Nota-se que a partir dai a ideia de proposição de ações diretas de inconstitucionalidade foram gestadas.

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Cf. Ata da sessão da OAB, 08 de abril de 1990.

O posicionamento institucional da OAB se centrou no questionamento constitucional do plano econômico a se denotar a falta de preenchimento dos quesitos de “relevância” e “urgência” das matérias reguladas, as quais poderiam ser normatizadas em leis ordinárias a perpassar pelo Congresso Nacional. Como não o foram, o Executivo estaria a perturbar o equilíbrio dos Poderes.

Mas por qual motivo a OAB efetivou esse papel de ator político com expertise jurídica a combater o Plano Collor I?

A análise do discurso de Ophir Filgueiras Cavalcanti, então presidente da OAB, na abertura da XIII Conferência Nacional dos Advogados, realizada em 23 de setembro de 1990, permite a obtenção de alguns elementos explicativos, que são: a OAB era um ator complexo, fator institucional este resultante de um processo histórico e que serviria de referência para atuação contra o Plano Collor I.

No início de seu discurso, Ophir Filgueiras Cacalcanti salientou a honra de presidir a OAB, uma instituição “ambígua”, conforme denominou, que transita do corporativismo para a sociedade civil:

“A história e a generosidade dos colegas advogados reservaram-me a ventura de dirigir o Conselho Federal da OAB e esta XII Conferência Nacional, honra máxima que um de nós pode almejar na sua vida de militância pelo direito e pela justiça. A Ordem dos Advogados do Brasil, sonhada desde o século passado, completa 60 anos do decreto do governo provisório que a instituiu logo depois da Revolução de 1930. Esta forma de ser organizada marcaria o seu duplo papel, contraditório para alguns, de forma organizativa autônoma dos advogados, ente típico do que hoje se chama sociedade civil, e de instituição legalmente prevista e regulada, portanto, órgão da esfera do Estado e de suas relações jurídico-políticas.

A ambiguidade não desejada, mas, real, fortaleceu em alguns momentos o papel da Ordem, obstruiu sua ação efetiva, noutros “(CAVALCANTI, 1993, p. 79).

Ao mais, ressaltou também que essa “ambiguidade” se deu em função de uma construção histórica gestada no período de aproximação com o Estado nos idos de 1940-1950 e 1963-1970, e de afastamento, autonomia e apoio à sociedade civil a partir de 1970:

“Sinal da modernidade desenhada em Trinta, carimbada com o forte corporativismo da época, e ainda remanescente na nossa sociedade, a OAB soube desatrelar-se politicamente do Estado nos momentos mais cruciais da vida brasileira, quando resistir foi imprescindível.

Filha atos estatais — decretos, decretos-leis e leis - a OAB optou pela função de instrumento da sociedade civil e teve papel de liderança na defesa das liberdades públicas e individuais, do estado de direito, da justiça e da democracia.

O silêncio que atingiu nossa sociedade em dramáticas experiências autoritárias, não feriu nossa entidade. Congressos deixaram de ser realizados pela falta de garantia, advogados foram presos, exilados ou desapareceram, nossas funções sofreram limitações graves. Mas, resistimos. E quando foi possível levantar a opinião pública pela reconstitucionalização, lá estava a OAB exercendo o papel

histórico de vanguarda na defesa da democracia. O terrorismo paramilitar reacionário feriu-nos tão profundamente, roubando a vida dedicada de dona Lida na própria sede do Conselho Federal”(CAVALCANTI, 1993, p. 79).

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Ophir Cavalcanti denotou, ainda, que o resultado final, a OAB como membro da sociedade civil, tratou-se de uma função que se estabilizou no período de redemocratização:

“Estivemos na campanha das diretas. Temos presença marcante na defesa dos direitos humanos. Lutamos pela Constituinte. Não nos resignamos ao autoritarismo. Ultrapassamos a visão individual do direito, pugnando por direitos coletivos. E preocupamo-nos com a soberania nacional e o colonialismo moderno da dívida externa. Os problemas económicos e sociais frequentam nossas pautas de luta, ao lado do campo institucional e jurídico.

Conquistada a possibilidade da Assembleia Constituinte, lutamos pela sua soberania e para que fosse legítima e originária, livre e exclusiva.

Ao longo dos trabalhos da elaboração constitucional defendemos o estado de direito, o papel do advogado, a justiça e nos debruçamos sobre a qualidade da democracia a ser constitucionalmente desenhada” (CAVALCANTI, 1993, p. 80).

Portanto, o ex-presidente Ophir Filgueiras Cavalcanti tinha total clareza da trajetória institucional da OAB no passado a apoiar o Estado, afastar-se e se aproximar da sociedade civil, bem como que esta trajetória iniciada se estabilizaria no período de redemocratização.

Doutra parte, essa trajetória institucional seria efetivada no período pós- constituinte de 1998 a ser replicada no período do governo Sarney e, mais importante, no governo Collor:

“Promulgada a Constituição, coincidindo com nossa XII Conferência, realizada em Porto Alegre, passamos à sua defesa, à luta pela plenitude de sua vigência. Fomos ao Supremo Tribunal Federal com ações diretas de inconstitucionalidade de medidas provisórias e outros atos que atingiram nosso ordenamento fundamental. Instamos seguidamente os Poderes Legislativo e Judiciário: o primeiro para a necessária regulamentação da Constituição, tarefa que ainda não se completou; o segundo, para que assumisse o novo papel do controle constitucional e não tardasse a responder à atribuição destas consequências.

Mais recentemente insurgirmo-nos contra aqueles que transformam a economia numa nova segurança nacional, em cujo nome, ou sob alegação de seu risco, cometem-se atropelos à ordem jurídica, aos direitos dos cidadãos e aos princípios constitucionais.

Há indivíduos que ainda pretendem governar as leis, ao invés de a elas se submeterem. Substituindo o poder absoluto do rei, o direito originário das revoluções ou a doutrina da segurança nacional, temos hoje a economia, com suas crises ou interesses, sendo apontada como algo acima da Constituição, da lei, da ética e da sociedade. Um novo Leviatã ao qual todos deveriam sucumbir e inatingível pelo regramento jurídico-social necessário à vida democrática. Como ontem o direito resistiu ao absolutismo, à visão totalitária e à preconizada intocabilidade da segurança nacional, haverá agora de resistir à doutrina da supremacia económica e da insubmissão do fato económico à ordem jurídica. Não é sacrificando a liberdade individual e o direito coletivo que havemos de superar crises e realizar transformações justas” (CAVALCANTI, 1993, p. 80).

Esse discurso caracterizou a complexidade da OAB que foi engendrada e estabilizada nos contextos de crise política brasileira, e a luta contra o Plano Collor I representou a continuação dessa trajetória.

Por tal motivo, é que Ophir Calvanti efetivou a trajetória da OAB e, ainda, enfatizou o papel expressivo da instituição como legitimada a propor ações diretas de inconstitucionalidade:

“Não podemos nos omitir a pensar sobre o papel atual da OAB e do advogado, constitucionalizado em nosso País. A OAB como uma das instituições capazes de acionar até mesmo o Supremo Tribunal Federal na mais importante das ações, a da inconstitucionalidade direta. O advogado, considerado essencial à administração da justiça, como representante e como parte inafastável do contraditório.

Reafirmamos, outrossim, a convicção de que a violência e a insegurança atuais na realidade brasileira, necessitam de um combate pelo aprimoramento das instituições policiais e judicias, pela superação das causas sociais e culturais tão presentes” (CAVALCANTI, 1993, p. 82 e 83).

Trata-se, portanto, de uma trajetória institucional estabilizada, a qual, diga-se mais uma vez, é possível pela causação do fator institucional ligado ao exercício da atividade por Ophir Calvanti, que é o regime presidencialista no qual está inserido a ser disciplinado pela Lei n.º 4.215/ 1963, que ainda surtia seus efeitos e centrava todo o procedimento de decisão institucional nas mãos do presidente. 71

Ademais, aliado a esse ponto as decisões que os presidentes anteriores tomaram criaram uma trajetória institucional, no sentido da OAB atuar como membro da sociedade. Como Ophir Calvanti sucedeu Marcio Thomaz Bastos, assumiu essa herança institucional e a replicou.

Porém, o fenômeno da atuação da OAB no início no início do governo não é explicável somente por esse aspecto institucional. Outro aspecto que se articulou para a

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