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CAPÍTULO 2 – OS PRINCIPAIS ELEMENTOS QUE CONSTITUEM A TEORIA

2.2 PAPEL DA ESCOLA

O movimento encabeçado por John Dewey referente à educação escolar ficou conhecido como ―escola progressiva‖ ou ―escola nova‖56, isso porque sua

ideia educacional, como já narrado, aponta várias críticas à chamada escola tradicional, contrapondo-se totalmente aos métodos utilizados por essa teoria, procurando inovar completamente o ambiente e técnicas utilizadas por ela. Para ele, na escola tradicional, as carteiras, o quadro negro, o pátio e os livros seriam recursos suficientes para se ensinar. Em seu livro Experiência e Educação (1971, p. 7) Dewey expõe as oposições existentes entre a educação tradicional e a educação progressiva. Ele declara:

Se buscarmos formular a filosofia de educação implícita nas práticas da educação mais nova, podemos, creio, descobrir certos princípios comuns por entre a variedade de escolas progressivas ora existentes. À imposição de cima para baixo, opõe-se a expressão e cultivo da individualidade; à disciplina externa, opõe- se a atividade livre; a aprender por livros e professores, aprender por experiência; à aquisição por exercício e treino de habilidades e técnicas isoladas, a sua aquisição como meios para atingir fins que respondem a apelos diretos e vitais do aluno; à preparação para um futuro mais ou menos remoto opõe-se aproveitar-se ao máximo das oportunidades do presente; a fins de conhecimentos estáticos opõe-se a tomada de contato com um mundo em mudança.

É claro que muitos desses princípios geraram mal entendidos por parte de muitos educadores em alguns locais do mundo, inclusive o Brasil, diversos deles apropriaram-se indevidamente da teoria educacional deweyana sem fazer uma devida análise daquilo que o autor estava realmente querendo dizer. Mas estas incompreensões neste momento não são o foco dessa pesquisa, pretendemos neste texto explorar apenas algumas das ideias principais de Dewey referente ao papel da escola, aquela pensada por ele.

Já foi dito que a escola para Dewey não é o único local em que ocorre a

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No Brasil o movimento da ―Escola Nova‖ também sofreu influência do pensamento de Dewey. Suas ideias estiveram presentes em discussões no cenário educacional do país desde 1930, mas mesmo antes já influenciava importantes filósofos e educadores brasileiros. Sobre este assunto ver: CUNHA, Fátima. Filosofia da Escola Nova: do ato político ao ato pedagógico. Rio de Janeiro: EDUFF, 1986.

educação, mas em contrapartida, é um ambiente em que a educação ocorre de forma mais destacada. Cunha (1994, p. 43) afirma que a escola na visão de Dewey ―[...] é um local privilegiado para a educação, especialmente organizado e racionalmente planejado para oferecer aos educandos um meio social simplificado que retrate, de modo purificado e equilibrado, a ampla e complexa sociedade maior‖.

Ao falar sobre a escola Dewey diz que essa é ―[...] uma parte da obra da educação‖ (1970, p. 62), mas que educação em seu sentido mais amplo ―[...] inclui todas as influencias que contribuem para formar atitudes e disposições (de desejo tanto quanto de crença) que constituem hábitos dominantes da mente e do caráter‖57.

A escola progressiva deve sempre retratar a sociedade, não com os malefícios que essa apresenta, mas com tudo de bom que ela tem. Nesse sentido, a escola deve se configurar como uma minissociedade, onde os educandos possam adquirir experiências quanto ao modo de vida do local onde estão inseridos e possam também lidar com os conflitos a serem resolvidos na vida adulta e coletiva. Observemos a declaração dada pelo autor em Democracia

e Educação (1979b, p. 394) ―[...] a vida na escola deve ser como em uma

sociedade, com tudo o que isto subentende‖, isso ajuda o aluno a ter uma maior compreensão social, e ―[...] os interesses sociais só podem se desenvolver em um meio genuinamente social, onde exista o mútuo dar e receber, na construção de uma experiência comum‖58. Henning (2009a, p. 9) destaca que a escola

progressiva ―[...] não deve se constituir numa ilha ou abstração do mundo real. Ensinar seria estabelecer esses vínculos trazendo a vida para dentro da escola, disso resultando a verdadeira educação‖.

Para Moreira (2002, p. 89) ―[...] um dos objetivos da escola seria desenvolver a capacidade de interagir com outros, isto é, viver em sociedade [...]‖. Um dos grandes propósitos da educação escolar é o de contribuir para que os seres imaturos possam desenvolver-se como membros da sociedade, de uma forma ordenada e sistemática, sendo isso muito importante, devido ao fato de que

“[...] toda educación es, en sus formas y sus métodos, una consecuencia de las

57 Ibidem, p. 62.

necesidades de la sociedad en que existe”59 (DEWEY, 1960, p. 146).

É bom lembrar que a sociedade na qual Dewey pretende que sejam aplicados os elementos constitutivos de sua teoria, é a sociedade democrática. Toda e qualquer forma de educação necessita de um ponto de referência, algo que seja o pontapé inicial para o educando, e este ponto na teoria deweyana é a democracia. Em seu livro La Educación de Hoy (1960, p. 188), Dewey faz a seguinte declaração:

[...] queria decir que deberíamos tomar en serio, enérgica y vigorosamente el uso de […] los métodos democráticos en las escuelas; que deberíamos educar a los jóvenes del país en la libertad mediante la participación en una sociedad libre60.

Todavia, é necessário que as escolas saibam da responsabilidade no uso e na elaboração de alguns conceitos como: espírito público, boa cidadania e boas relações na vida, devendo entendê-los claramente e saber o que significam. A escola progressiva deve ser fundamentada no princípio de igualdade de oportunidades para todos, independentemente de raça, cor, credo, nascimento ou situação econômica. Ela não pode sozinha efetivar e garantir essa ideia, mas pode e deve ajudar as crianças e jovens a compreendê-la e a lutar em favor dela.

Outro papel importante a ser desempenhado pela escola é o de que esta tem que cuidar tanto do desenvolvimento intelectual, quanto da formação do caráter e da educação moral dos alunos, o que não é uma tarefa fácil. O próprio Dewey reconhece que os princípios morais não podem ser transmitidos a partir de um ensino teórico e propõe, por esse motivo, a criação de um ambiente dentro da escola que represente a sociedade. Mas como isso é possível? Dewey (1979b, p. 21), esclarece que a função da escola é:

[...] proporcionar um ambiente simplificado. Selecionando os aspectos mais fundamentais, e que sejam capazes de despertar reações da parte dos jovens, estabelece a escola, em seguida, uma progressão, utilizando-se dos elementos adquiridos em primeiro lugar como meio de conduzi-los ao sentido e compreensão real das coisas mais complexas. Em segundo lugar

59 ―[...] toda educação é, em suas formas e em seus métodos uma conseqüência das

necessidades da sociedade em que existe‖ (tradução nossa).

60 Queria dizer que deveríamos levar a sério, enérgica e vigorosamente o uso [...] dos métodos

democráticos nas escolas; que deveríamos educar os jovens do país na liberdade mediante a participação em uma sociedade livre (tradução nossa).

é tarefa do meio escolar eliminar o mais possível os aspectos desvantajosos do ambiente comum, que exercem influência sobre os hábitos mentais. Cria um ambiente purificado para a ação. [...] Em terceiro lugar, compete ao meio escolar contrabalançar os vários elementos do ambiente social e ter em vista dar a cada indivíduo oportunidade para fugir às limitações do grupo social em que nasceu, entrando em contato vital, com um ambiente mais amplo.

É claro que proporcionar esse ambiente não se constitui algo tranquilo a ser realizado, no entanto Dewey acredita na capacidade dos educadores em fazê- lo.

Outro ponto importante em relação ao papel da escola é o fato de que no meio escolar podemos encontrar indivíduos de diversas culturas, de credos diferentes, ou mesmo de estruturas familiares distintas. A escola deve estar preparada para receber esses indivíduos e adaptar da melhor maneira possível a convivência entre eles, além de contribuir para que cada um perceba as diferentes formas de pensar existentes dentro de uma mesma sociedade, devendo ainda descortinar horizontes mais amplos para seus alunos, ―[...] a escola tem igualmente a função de coordenar, na vida mental de cada indivíduo, as diversas influências dos vários meios sociais em que ele vive (DEWEY, 1979b, p. 23)‖.

É significativo que a escola forneça condições para que o ser imaturo desenvolva e coloque em ação as aptidões individuais que cada um traz consigo. Ela deve também progressivamente trabalhar com as possibilidades presentes em cada educando, proporcionando a troca entre as diversas aptidões existentes em um mesmo grupo escolar.

Para Teixeira, a chamada educação nova tem de ―[...] preparar o homem para indagar e resolver por si os seus problemas, [...] para um futuro rigorosamente imprevisível (2000, p. 29)‖. Nesse sentido, o homem almejado pela escola nova é aquele que consegue agir independentemente, com responsabilidade perante os outros, que seja consciente e informado.

Ainda para Teixeira, as responsabilidades da escola nova, inspirada em Dewey, são enormes, pois a ela cabe:

Preparar para um futuro incerto e desconhecido em vez de transmitir um passado fixo e claro; ensinar a viver com mais

inteligência, com mais tolerância, mais friamente, mais nobremente e com maior felicidade, em vez de simplesmente ensinar dois ou três instrumentos de cultura e alguns manuaizinhos escolares [...] (2000, p. 42).

A escola deve habilitar cada ser a continuar sua própria educação, mesmo quando não estiver mais frequentando o ambiente escolar. Nesse sentido, deve preparar os estudantes para as frequentes mudanças que ocorrem dentro da sociedade e precisa estar sempre atenta a tais mudanças.

É também papel da escola analisar as relações existentes entre o homem e a natureza, suas conexões e interdependência, sendo a ciência um ponto-chave para se compreender tal relação. A ciência não pode ser separada dos estudos humanísticos, aqueles que tendem a ―[...] aumentar o interesse pelos valores da vida‖ e acarretam ―[...] maior sensibilidade em relação ao bem estar social e maior aptidão para promover esse bem estar‖61. A escola também tem uma parcela

significativa no estabelecimento e desenvolvimento da ordem social. Henning (2009b, p. 9) diz:

Dewey aposta numa escola que invista no modelo de sociedade descrita acima, ou seja, aquela permeada por estreitos laços humanos, harmoniosa e amável, em que se valorize os fatores mais ativos de auto-direção. Segundo ele, assim a escola seria ela mesma um lugar em que uma vida comunitária embriônica estaria sendo gestada em vista de uma garantia para o desenvolvimento de toda a sociedade.

Mas de que forma os indivíduos envolvidos com a educação escolar (professores, alunos, diretores, famílias, etc.) podem alcançar tais objetivos? De que forma a escola poderá cumprir com o seu papel? Isto é o que pretendemos explanar a seguir.