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O papel das normas: fluidez e logística

No documento PR Michele Serpe Fernandes (páginas 95-98)

CAPÍTULO 2 ESPAÇO: PRODUÇÃO E CIRCULAÇÃO

3.3 O papel das normas: fluidez e logística

Quando falamos em fluidez, em circulação, em infraestrutura de transportes, não pode esquecer-se do papel das normas, pois elas também são importantes instrumentos geradores de fluidez no território. Segundo Silva Junior (2009, p. 40) "a circulação pelo território, no atual período histórico, não é realizada apenas por meio de técnicas que viabilizam a movimentação de mercadorias e informações, mas por normas e instituições

82 que regulam, organizam e potencializam esses fluxos". Conforme Barat (2007, p. 71), com a globalização, o estabelecimento dos blocos econômicos e o crescimento do comércio mundial, as nações desenvolvidas estabeleceram legislação internacional baseada em convenções que tinham por objetivo propiciar às infraestruturas existentes "a formação de sistemas intermodais, principalmente por meio da utilização de contêineres e métodos de unificação de carga geral (pallets e big bags)".

Algumas das convenções internacionais a respeito do transporte inter e multimodal são: a TIR Convention - International Road Union (IRU) e a Customs Convention on Conteiners (IMO) trataram de facilitar o despacho aduaneiro entre países, a Hamburg Rules (UNCTAD) introduziu mudanças na responsabilidade do transporte marítimo sobre as cargas transportadas, dando ao dono das mercadorias melhores condições para sua proteção. A Convention on International Multimodal Transport of Goods visou proporcionar a estrutura institucional e jurídica para prática da multimodalidade (BARAT, 2007). Pelo texto dessa convenção o transporte multimodal:

É o transporte de bens por, pelo menos, dois modais diferentes de transporte, cobertos por um contrato de transporte multimodal, desde sua origem em um determinado país, onde as mercadorias são postas sob a responsabilidade de um Operador de Transporte Multimodal (OTM), até o lugar designado para sua entrega, em outro país (BARAT, 2007, p. 72).

Isso nos mostra que as normas são essenciais para a movimentação de mercadorias em níveis nacional e internacional e como as nações agem em favor de uma melhor circulação que beneficie os detentores dos meios de produção e a competitividade dos países. "No caso do Brasil o Plano Plurianual 1996-1999 do Governo Federal manifesta a aplicação de sistemas intermodais, por intermédio do funcionamento eficiente dos diferentes modais" (CAIXETA-FILHO, 2001, p. 80).

Nesse sentido, não basta apenas o investimento em infraestrutura de transportes, pois é necessário que o Estado também estabeleça normas que possibilitem mais mobilidade aos agentes hegemônicos para transportar suas mercadorias. Nesse sentido, foram criadas, no Brasil, normas institucionais para transporte multimodal que aumente sua capacidade de competir no comércio internacional(SILVA JUNIOR, 2009).

A primeira norma constitui-se em "1995 (Decreto 1.563 de 19/07/1995) e dispõem sobre a execução do acordo de alcance parcial para a facilitação do transporte multimodal de mercadorias, entre Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai" (SILVA JUNIOR, 2009). E, no segundo mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso houve

83 a criação de várias agências reguladoras, sendo uma delas a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), em 2001 e, sob sua tutela, em 2004, houve a habilitação do Operador de Transporte Multimodal. Alguns destes já atuavam no Brasil desde 1990, ano da expansão do uso da logística, que foi favorecida pelo estabelecimento de políticas neoliberais e abertura comercial (SILVA JUNIOR, 2009).

Ademais, para imposição de infraestruturas e normas que propiciem uma logística mais eficiente das empresas, e melhor inserção do país no mercado internacional de uma forma mais competitiva, outras normas tiveram importância, como a Lei n.8.630/93, que propiciou a privatização das operações portuárias, conhecida como a Lei de Modernização dos Portos, através da qual se iniciou o processo de reestruturação do sistema portuário brasileiro (BARAT, 2007). A criação das EADIs também denominadas de Portos Secos, com objetivo de minimizar os entraves aduaneiros, "portos secos são recintos alfandegados de uso público, situados em zona secundária, nos quais são executadas operações de movimentação, armazenagem e despacho aduaneiro de mercadorias e de bagagem, sob o controle aduaneiro" (RECEITA FEDERAL, 2011).

Neste contexto, a logística se apresenta como forma de circulação hegemônica, sendo uma "ação política (no sentido da política territorial adotada), mas é primeiramente (mas não principalmente) uma ação econômica, por ser o exercício de uma atividade muito bem delimitada, que visa redução dos custos de circulação de mercadorias" (SILVA JUNIOR, 2009, p. 142).

Na logística, a velocidade é vendida como mercadoria ‘tempo’, visando à realização do valor. Nesse caso, a compreensão da logística deve se vincular à noção de “produção” sirito sensu. A proeminência de cada caso não significa a indissociabilidade das ações, pois sendo elemento da circulação, a logística empreende normas que fazem desta atividade, uma atividade utilizada principalmente por agentes hegemônicos (SILVA JUNIOR, 2009, p. 142).

E, conforme Santos (2008a):

Desse modo, as infraestruturas presentes em cada lugar não dependem exclusivamente do tipo de volume da produção: depende também do seu destino, o que obriga a levar em conta os processos de circulação. Em outras palavras, as infraestruturas presentes em cada lugar encontram, em grande parte, explicação e justificativa fora do lugar. Da mesma maneira, uma vez que o consumo local depende de uma produção distante, e cuja lei se submete, a distribuição dos produtos termina por influir no tipo, na quantidade, na forma e na disposição de infraestruturas correspondentes, cuja existência, desse modo, torna-se, ali, igualmente autônoma em relação às condições próprias do lugar. As diversas ecologias locais não

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se explicam unicamente por fatores exclusivamente locais (SANTOS 2008a, p. 61).

Nesse sentido é que podemos falar de logística territorial, como veremos no item seguinte. Segundo Silva Junior, (2009), o território usado43 tem se tornado cada vez mais elementar como um recurso para os agentes corporativos, cuja atuação se dá em consonância com o Estado, e essa relação se expressa na logística territorial. Esta consiste na "materialização dessa relação e do conhecimento das empresas a respeito do território, com todas as suas normas, seus limites, seus trunfos etc. Toda a estratégia logística se dá no território, mas nem toda a elaboração de estratégia logística parte do território" (SILVA JUNIOR, 2009, p. 26).

No documento PR Michele Serpe Fernandes (páginas 95-98)