• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO III – O DESENVOLVIMENTO ÉTICO-MORAL DOS ALUNOS E A

4. Para uma visão holística da formação ética no âmbito da cidadania

As abordagens de desenvolvimento moral e de formação ética têm uma relação directa com os valores a desenvolver nos jovens, ligados a nosso ver, a uma perspectiva abrangente de Educação para a Cidadania. A Educação para a Cidadania ganhou uma abrangência e uma relevância tais que, hoje, engloba a educação em valores, desde os valores éticos, sociais, interculturais, ambientais e de direitos humanos (Afonso & Feio, 2010). Inscrevendo-se num projecto de formação pessoal e social, a Educação para a Cidadania constitui uma preocupação presente nos mais diversos organismos, internacionais e nacionais, que têm entre os seus objectivos pensar a educação e as políticas educativas.

Uma tónica importante a ter em conta na Educação para a Cidadania diz respeito ao seu carácter prático (Bîrzéa, 2000), pelo que a educação para a cidadania não se concretiza através de um discurso ou retórica em torno de valores e/ou virtudes, mas sim através de experiências de vida. É mais uma prática que um discurso, é mais uma acção/reflexão que um conteúdo/informação. Assim, as preocupações com esta área de formação têm sido expressas em vários documentos, ao nível das organizações mundiais de educação.

No relatório para a UNESCO36, por exemplo, considera-se o “aprender a viver juntos”, como um dos quatro pilares do conhecimento onde se refere a “(...) compreensão do outro e a percepção das interdependências – realizar projectos comuns

36

Relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI (Delors, 1996)

113 e preparar-se para gerir conflitos – no respeito pelos valores do pluralismo, da compreensão mútua e da paz.” (Delors, 1996, p.31). Também o Conselho da Europa, que tem como objectivos fundamentais a democracia, os direitos humanos, a diversidade cultural e a luta contra todas as formas de discriminação, tem desenvolvido programas e planos de acção, no âmbito da educação para a cidadania (Oser, Althof & Higgins-D’Alessandro, 2008; Salema, 2010).

Em Portugal, a Lei de Bases do Sistema Educativo enunciava já em 1986, entre outras finalidades da educação: “o desenvolvimento global da personalidade, o progresso social e a democratização da sociedade” (art.1º, nº 2). Por outro lado, apelava ao “desenvolvimento pleno e harmonioso da personalidade dos indivíduos, incentivando a formação de cidadãos livres, responsáveis, autónomos e solidários" (art. 2º, nº 4); e ao “desenvolvimento do espírito democrático e pluralista, respeitador dos outros e das suas ideias, aberto ao diálogo e à livre troca de opiniões, formando cidadãos capazes de julgarem com espírito crítico” (art.2 nº5).

A educação assume um carácter social e individual, que supõe determinados valores preferíveis a outros e que obriga a opções éticas para a educação, nomeadamente promovendo no aluno: “o pleno desenvolvimento da personalidade, da formação do carácter e da cidadania, preparando-o para uma reflexão consciente sobre os valores espirituais, estéticos, morais e cívicos e proporcionando-lhe um equilibrado desenvolvimento físico” (art.3º, b). Assim, no sistema educativo português a preocupação com a formação ética e social dos jovens tem assumido diferentes designações e configurações ao longo dos tempos, sendo uma das mais marcantes das últimas décadas, a introdução da disciplina de Desenvolvimento Pessoal e Social no Ensino Básico37.

Por exemplo no Decreto-Lei 74/2004 do Ensino Secundário apela-se ao “desenvolvimento das competências vocacionais dos jovens, alicerçadas num conjunto de saberes humanistas, científicos e técnicos que lhe permitam uma inserção no mundo do trabalho e o exercício responsável de uma cidadania activa”(art.8, alínea a); e a uma “formação em torno de ferramentas de produtividade que sustentem as tecnologias específicas de cada curso e o exercício da cidadania” (art.8, alínea f).

114 A introdução das áreas curriculares não disciplinares, como a Área de Projecto e a Formação Cívica38 é outro marco importante no desenvolvimento da formação em cidadania. Depois do Decreto-Lei 139/2012 de 5 de Julho, estas duas áreas curriculares foram suprimidas, mantendo-se, no entanto, a Educação para a Cidadania como intenção educativa em todas as áreas curriculares, mas não como disciplina obrigatória isolada. As escolas podem oferecer componentes curriculares flexíveis como a Educação Cívica, Educação para a Saúde, Educação Financeira, Rodoviária, Educação para o Empreendedorismo, entre outras, de acordo com o seu Projecto Educativo. A Educação para a Cidadania tem-se preocupado, em suma, com a educação de costumes, atitudes, posturas e relações com os outros e com o mundo (Martins & Mogarro, 2010), numa perspectiva holística, que se apoia em aspectos de diferentes correntes e abordagens. Segundo Barbosa (2010):

A educação holística não se reduz a um método educativo ou a uma teoria da educação. É a base para ensinar e aprender que se baseia em princípios da consciência humana e a relação entre os seres humanos e o universo que habitam. A educação holística, mais do que uma das tantas actividades humanas, constitui uma experiência integral de desenvolvimento pessoal, social e comunitário, que vai além da acumulação de informação, do desenvolvimento de habilidades cognitivas, o controle da disciplina e da conduta. (p. 8)

No contexto da Educação para a Cidadania, Audigier (2000) apela a um esforço na busca de uma identificação de pontos comuns a um nível conceptual em termos de cidadania e de competências chave a serem desenvolvidas em contexto educativo.

O autor propõe três tipos de competências fundamentais no desenvolvimento da educação para a cidadania e do seu exercício pleno: competências cognitivas, competências sociais e competências éticas e de escolha de valores, definidas de seguida.

Competências Cognitivas

38

115 - Competências de ordem jurídica e política, da ordem do conhecimento de regras de vida colectiva e democrática. Permitem a defesa dos direitos do cidadão e a contestação ao abuso e poder.

- Competências de conhecimento sobre o mundo actual, com uma dimensão histórica e cultural e ainda competências de análise crítica consciente face à realidade actual.

- Competências do tipo instrumental, como a capacidade de análise e de síntese, a capacidade de argumentar, de debater, de reflectir à luz dos direitos humanos, dos limites de acção ou do conflito de interesses e de valores.

Competências Sociais

Representam conhecimentos, atitudes e valores com sentido na relação com o outro e consigo, como a capacidade de resolver conflitos, de cooperar, de ter responsabilidade, de intervir num debate e argumentar, entre outras.

Competências Éticas e de Escolha de Valores

Este tipo de competência exige um trabalho de construção e reflexão na adesão aos valores da cidadania (valores de liberdade, igualdade ou solidariedade), nas dimensões pessoal, afectiva e emocional. Isto implica o reconhecimento e o respeito por si e pelos outros, a capacidade de ouvir, a promoção de atitudes de não-violência e de aceitação e tolerância.

Desenvolver competências éticas passa pela criação de atitudes fundamentais de pesquisa e diálogo, de crítica e criatividade, de autonomia e de envolvimento (Bégin, 1997), dando a devida atenção ao pensamento crítico, à criação e aplicação do conhecimento, ao diálogo e ao trabalho com e para valores como a paz, a democracia ou os direitos humanos, numa perspectiva de intervenção na turma, na escola e na comunidade.

Se desenvolver competências éticas tem por base essencialmente a relação com o outro, esta perspectiva avança com ideias claras sobre conteúdos e estratégias a utilizar com os alunos em sala de aula e na escola, espaços privilegiados neste domínio. No que respeita aos conteúdos a tratar, Martins e Mogarro (2010) propõem oito grandes temáticas a considerar actualmente e no futuro numa educação para a cidadania,

116 desde o estudo do Estado e nação, às religiões, à relação do Homem com a natureza e o ambiente, à multiculturalidade e inclusão social, à família, à saúde e qualidade de vida, à convivência social e civilidade e, por fim, à utilização útil, eficaz e ética das novas tecnologias. Outros autores têm centrado o seu interesse na pedagogia da convivência e na educação para a paz e não violência (Jares, 2001, 2007; LePage et al, 2005), com base numa educação para a cidadania e para os direitos humanos. Jares, por exemplo, agrupa os conteúdos que se podem trabalhar no âmbito de uma pedagogia de convivência em três grandes categorias:

- Conteúdos de natureza humana: o direito à vida e a paixão de viver, a dignidade, a felicidade, a esperança.

- Conteúdos de relação: a ternura, o respeito, a não-violência, a aceitação da diversidade e a negação de qualquer forma discriminação, a solidariedade, a igualdade.

- Conteúdos de cidadania: a justiça social e o desenvolvimento, o laicismo, o Estado de direito e os direitos humanos.

No que respeita a estratégias, Jares (2007) aponta, a partir de um estudo efectuado em Espanha, para um conjunto de estratégias utilizadas pelos professores, que foi bastante valorizado pelos alunos, na promoção da ética e da cidadania: assembleias de turma sobre conflito e convivência; debates na aula sobre conflitos e convivência; dinâmicas de grupo (jogo de representação e de simulação, estudo de casos, etc.); jogos cooperativos; exercícios de resolução de conflitos; leitura de textos sobre conflitos e convivência; visionamento de diapositivos e/ou filmes, entre outras. O estudo da própria História, nomeadamente episódios como o Holocausto e outros episódios de violência colectiva, fazendo a ligação essencial entre a história e as escolhas morais com que os alunos se confrontam no seu dia-a-dia, têm sido valorizadas neste domínio.

Um dos relatórios do Conselho da Europa de 2007 aponta um conjunto de conhecimentos e competências que devem ser postas em uso num contexto de formação para a cidadania democrática, encorajadas nas escolas e pelos professores. Sumariamo- las no quadro seguinte (Quadro 6):

117

Quadro 6

Atitudes e valores para uma cidadania democrática (Conselho da Europa, 2007)

Atitudes e disposições para a cidadania democrática Valores para uma cidadania democrática Abertura

Respeito pela diferença cultural e social Verdade e honestidade

Comprometimento com a verdade Respeito por si e pelo outro Tolerância

Liderança democrática

Trabalho em equipa e cooperação

Direitos Humanos Igualdade Liberdade Justiça Paz Interdependência Pluralismo Desenvolvimento sustentável

Fonseca (2009) sintetiza temas, conteúdos e competências, a partir de diversos autores, que evocam várias dimensões da educação para a cidadania (Quadro 7):

Quadro 7

Temas, conteúdos e competências de Educação para a Cidadania (adaptado de Fonseca, 2009, p. 91)

Domínios Indicadores Temas Democracia Direitos do Homem Mundo globalizado Identidade Multiculturalidade Cultura de Paz Participação social Ambiente Cooperação Social Economia

Tecnologias da Informação e da Comunicação

Conteúdos Valores: Liberdade, Justiça, Igualdade, Tolerância, Pluralismo, Solidariedade, Responsabilidade, Cooperação.

Princípios e processos democráticos Direitos e responsabilidades Direito Competências Argumentação Pensamento crítico Pensamento criativo Pensamento autónomo Resolução de problemas Tomada de decisões Exercício de juízos

Dentro do contexto português, nos resultados do já referido estudo coordenado por Maria Teresa Estrela, os professores que colaboraram em projectos neste domínio, demonstram um entendimento real face ao seu papel enquanto educadores morais e, em geral, não têm dúvidas em afirmar-se como um exemplo para os seus alunos39. No estudo referido, a análise das entrevistas e questionários realizados indicam que os professores:

39

A este propósito Oser (1986) escreve que se perguntarmos acerca da educação moral, qualquer educador não terá dúvidas em concordar que toda a gente deve ser formada moralmente.

118 Referem utilizar como estratégias de formação ética do aluno, o uso do lúdico (jogos, histórias, …), o trabalho em grupo e o diálogo. A metodologia de trabalho de projecto e a construção participada de regras são apontadas, também, como estratégias de formação ética em geral pelos educadores e pelos professores do 2.º ciclo e do ensino secundário. Os entrevistados referem-se ainda a estratégias como: partir de conhecimentos dos alunos, role-playing, abordagem de conteúdos específicos das disciplinas, formação teórico-prática, apelo à afectividade, promoção de compromissos, entre outras. (Afonso & Feio, 2010, p. 72)

Destacam como valores fundamentais no desenvolvimento e formação ética dos seus alunos, a responsabilidade, o respeito, a justiça e o bem do aluno, pelo que a maior parte das estratégias utilizadas pelos professores promovem o desenvolvimento destes valores. O esquema seguinte procura sintetizar as estratégias utilizadas pelos professores na formação ética dos seus alunos, de acordo com o referido estudo (Figura 10):

Figura 10 - Estratégias utilizadas pelos professores para a formação ético-moral dos alunos (retirado de

Seiça, Oliveira & Mourinha, 2010)

Segundo Salema (2010), os professores que desenvolvem ou procuram desenvolver as competências-chave da Educação para a Cidadania demonstram que:

119 - Fundamentam as suas práticas nos valores democráticos (justiça, equidade, compaixão), extrapolando linhas de actuação no modo como se relacionam com os alunos e organizam as suas aulas;

- Têm consciência da comunicação que usam em aula e estão preparados para modelar os seus próprios processos mentais, como a reflexão crítica, a avaliação, a partilha de experiências e saberes com os outros;

- Têm consciência e modelam uma comunicação democrática, dando oportunidades para a expressão livre de opiniões de ordem política e social;

- Apresentam diferentes pontos de vista e perspectivas sobre a mesma questão, dando o exemplo do desacordo respeitador e da crítica construtiva;

- Estabelecem regras do discurso democrático, pondo em questão ideias e preconceitos sobre os outros;

- Têm consciência das relações de poder dentro da sala de aula, tendo consciência do seu efeito sobre os alunos e dos actos, escutando atentamente os seus alunos;

- Criam momentos de reflexão nos quais os alunos exprimem as suas preocupações, comportamentos e valores;

- Identificam estilos diferentes de aprendizagem e de formas de pensar dos alunos;

- Fomentam estratégias que desenvolvem o pensamento nos alunos e a reflexão. Dentro de uma abordagem holística de formação ético-social dos mais jovens, as possibilidades estratégicas são variadas bem como os conteúdos, podendo inspirar-se em diferentes correntes/abordagens de formação neste domínio. No nosso trabalho de campo procurámos promover a discussão e a reflexão em torno desta variedade junto dos participantes, ao mesmo tempo que, de forma informada e contextualizada, se procurou que se tomassem decisões de actuação neste domínio com os alunos. Simultaneamente foram explicitadas e discutidas formas de actuação do domínio da formação ética dos alunos que permitiram explorar o pensamento e acção dos professores nesta matéria.

120

Síntese da parte I

Trabalharmos a ética no contexto educativo, quer com professores, quer com alunos é participarmos do desenvolvimento da pessoa e da sociedade. Ambos, professores e alunos,

(…) necessitam de actividades e situações experienciais que suscitem a reflexão sobre si, os outros e as comunidades, de forma a verem como à luz dos Direitos Humanos e do bem comum são impelidos para uma acção ética e responsável na sociedade. (Salema, 2010, p. 31)

Como vimos, os processos de aprendizagem ou de formação são processos de construção da pessoa humana, que envolvem valores (direitos humanos, liberdade, justiça, igualdade, de escolha e de reflexão), disposições (abertura à mudança e ao outro, à partilha e à tolerância) e que envolvem aspectos afectivos e volitivos. Ora, à semelhança de Baptista (2011) que reforça que as capacidades e disposições éticas não nascem connosco, nem surgem por acaso, antes precisam de aperfeiçoamento, cremos que a formação pode e deve actuar nesse sentido.

No contexto da nossa sociedade, formar em termos éticos, é formar tendo por base uma ética dos direitos do ser humano e é formar na consciência e na conscientização:

- Da dignidade, liberdade, igualdade, diversidade, reciprocidade, e solidariedade entre todos os seres humanos;

- Da não discriminação, da tolerância, da democracia, do desenvolvimento e da paz; - Da relação entre a vida humana e o meio ambiente;

- Da responsabilidade das gerações presentes para com as gerações futuras, que implica a proteção do património genético, natural e cultural (material e imaterial) da Humanidade. (Reis Monteiro, 2005, p.32)

Trabalharmos na formação ética dos professores não é levá-los apenas a reflectir. Continuamos a referir Reis Monteiro (2005) porque queremos, como ele, afirmar que não basta reflectir sobre a prática para tomar decisões adequadas, pressupõe-se uma visão mais ampla e uma maior implicação no acto pedagógico. Uma

121 responsabilidade maior, à qual fomos fazendo referência ao longo da primeira parte deste trabalho. Na senda desta ideia, destacamos as palavras de Formosinho (2009) que nos dizem que a aposta nesta era é a de uma “ética dialogada da responsabilidade, que, no respeito pelo indivíduo, se afirme sensível ao bem colectivo e, como tal, não prescrevendo a erradicação dos interesses e prazeres pessoais, imponha a sua necessária moderação” (p. 180).

O desenvolvimento desta ética dialogada e dialógica da responsabilidade que deve, segundo a mesma autora, figurar nos horizontes da orientação pedagógica, promove a democratização das nossas sociedades. Neste sentido deverá a escola ser espaço de diálogo, promovendo capacidades de juízo moral, não descurando, continua a autora, o reconhecimento de um sistema de valores e normas, que configuram uma ética mínima que figura nas diferentes formas de organização social. Essa ética, a da responsabilidade (Jonas, 1990, 1998) é a do professor que visa tornar o aluno num sujeito autónomo, capaz de decidir sobre a sua liberdade, ao mesmo tempo que se coloca no lugar do aluno real, procurando compreendê-lo, no seu conhecimento e reflexão acerca da relação pedagógica. É também uma ética que se centra no professor e na relação que este estabelece com os vários actores, os alunos, os pais, a comunidade.

Concomitantemente, alguns resultados do já referido estudo Pensamento e

Formação Ético-Deontológicos de Professores, mostram que as finalidades éticas do

ensino aparecem como um ponto de encontro no pensamento dos professores, “visando a preparação para a vida social e a formação e realização da pessoa, embora a ordem desses fins possa não ser a mesma” (Estrela & Caetano, 2010, p.107). Mais, através da análise dos dados deste estudo foi possível encontrar dois tipos de pensamento ético dos professores. O primeiro, em minoria face ao segundo, diz respeito “à lei enquanto princípio universalizável de conduta, revelando princípios éticos ligados à moral ou princípios ético-políticos” (p.109). O segundo tipo liga-se a uma ética contextualizada que é mais baseada num carácter emocional ou intuitivo ligado à ética do cuidado, da compaixão e da solicitude.

Como considerarmos uma formação ética de professores sem nos debruçarmos sobre as relações humanas que se estabelecem na escola, muito em particular na sala de aula? Como considerarmos uma formação ética de professores sem considerar o seu pensamento, os seus princípios e valores face, em particular, aos seus alunos (a razão de

122 existir da sua profissão)? O que consideram os professores ser o seu papel na formação ética dos alunos? Que entendimento existe entre as várias pessoas que constituem uma relação pedagógica, ao nível de valores tão importantes como o respeito, a justiça, o bem? Como trabalham os professores estas questões, principalmente em épocas tão extraordinariamente conturbadas, como a que vivemos hoje na escola? Que problemas enfrentam e que soluções encontram os corpos docentes para os solucionar?

Como afirma Silva (1999), a educação para os valores e para a cidadania:

Depende muito mais das metodologias usadas e da relação pedagógica constituída dentro de um certo clima de aprendizagem, do que dos conteúdos curriculares das respectivas disciplinas. Só através de métodos activos é possível incentivar e desenvolver formas de participação crítica e envolver os alunos em mudanças de comportamentos e atitudes. (p. 30)

Procurámos sustentar questões como estas, em que o diálogo entre pessoas e a colaboração, a reflexão aprofundada por parte dos professores, baseadas em situações reais, a investigação de situações problemáticas e a busca de possíveis respostas, a deliberação informada fossem marcantes na nossa intervenção/formação. Aliamos ainda questões relacionadas com a responsabilidade (e responsabilização) dos professores na formação global das crianças e dos jovens, a urgente criação de escolas mais justas e mais democráticas, onde os valores dos direitos humanos e a autonomia sejam trabalhados.

Partimos de bases teóricas quer ao nível da formação ética de professores e dos alunos, quer ao nível metodológico de formação contínua pela investigação-acção, pelas potencialidades formativas que lhe estão associadas e, de acordo com alguns princípios- chave, como o do professor enquanto investigador e enquanto prático reflexivo, fazendo da prática o cerne das próprias investigações.

Por outro lado, partimos do próprio pensamento ético dos professores e da forma como entendem a sua própria formação e as suas necessidades de formação (cf. estudo já referido, Pensamento e Formação Ético-Deontológicos de Professores). Procurámos pesquisar empiricamente os processos e os efeitos de uma formação ética de professores pela investigação-acção, ao nível das práticas e do pensamento dos professores em formação e os efeitos que esta formação pode ter na formação ético-moral dos alunos

123 com quem trabalharam. Essa pesquisa será apresentada de seguida, na segunda parte desta tese.

125