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26 Para VIANA (2000), des-envolver significa perder o envolvimento econômico,

cultural, social e ecológico com os ecossistemas e seus recursos naturais. “Junto com o envolvimento, perde-se a dignidade e a perspectiva de construção da cidadania (...) e o conhecimento dos sistemas tradicionais de manejo” (VIANA, op. cit, p.25).

Para o Caiçara de Paraty, a chegada da estrada Rio-Santos nos anos 70, significou o começo da era do des-envolvimento. Até então há alguns séculos atrás, as populações caiçaras tinham uma vida muito adaptada às características das florestas, rios e mares das suas regiões. Era uma vida intensamente envolvida com a natureza. (...) Com a chegada da Rio-Santos, chegou o des-envolvimento. O caiçara, assediado por turistas deslumbrados pela pureza e beleza de suas terras, não resistiu à tentação e trocou seus terrenos por um ‘monte de dinheiro’ (VIANA, 2000, p.24).

Para VIANA (2000), o envolvimento sustentável tem dois componentes básicos: 1) ações para fortalecer o envolvimento das relações das sociedades com os ecossistemas locais e 2) a busca da participação ativa das populações na gestão de seus ambientes.

Concordamos com SACHS (1986) quando sublinha que dar ênfase ao processo, à dinâmica, ao ‘conhecimento do conhecimento’, do ‘aprender a aprender’ e às relações construtivas humanas significa encarar o desenvolvimento como “um processo de aprendizagem da sociedade, orientado para a identificação e satisfação, em base sustentável, de necessidades humanas, materiais e não materiais, social e culturalmente determinadas” (SACHS, op. cit., p. 54).

Ao compreender que “as palavras são carregadas de significado” (JECUPÉ,1998, p.7) utilizamos ‘Sociedades Sustentáveis’ para salientar as idéias de autonomia política e identidade cultural de cada coletivo social (país, região, município, etc), tidas como necessárias à realização de uma “sustentabilidade complexa” (DIEGUES, 1995, p.22). Em nosso país, por sua vez, com uma cultura tão diversificada, sobresai ainda mais a necessidade de se considerar cada realidade, em seu contexto natural e cultural, quando se pensa em sustentabilidade.

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A heterogeneidade cultural de nossa sociedade contrapõe-se à forma homogeneizante de intervenção na natureza, expressando propostas de sustentabilidades plurais – múltiplas possibilidades de viver, que se refletem na diversificação do espaço e inspiram uma visão de sustentabilidade que deve necessariamente articular as dimensões da equidade, da igualdade, da distribuição, assim como da universalidade do direito de viver na singularidade. (ZHOURI et all, 2005, p. 19)

O conceito de Ecodesenvolvimento de IGNACY SACHS também surgiu destas considerações.

Em resumo, o ecodesenvolvimento é um estilo de desenvolvimento que, em cada ecorregião, insiste nas soluções específicas de seus problemas particulares, levando em conta os dados ecológicos da mesma forma que os culturais, as necessidades imediatas e também aquelas de longo prazo. Opera, portanto, com critérios de progresso relativizados a cada caso, aí desempenhando um papel importante a adaptação ao meio, postulada pelos antropólogos. (...) dá um voto de confiança à capacidade das sociedades humanas de identificar os seus problemas e de lhes dar soluções originais. Reagindo contra as transferências passivas e o espírito da imitação, põe em destaque a auto-confiança (SACHS, 1986, p. 18).

O ecodesenvolvimento pauta-se nos ensinamentos observados nos sistemas naturais e culturais locais. Segundo o autor acima citado, são necessárias três condições para tornar operacional o conceito:

1) o conhecimento das culturas e dos ecossistemas (incluindo os conhecimentos humanos acumulados pela relação cultura&natureza);

2) o diagnóstico das ecotécnicas;

3) a conformação de um sistema justo e eqüitativo de trocas e obtenção de recursos (locais e globais), todas as três condições permeadas por um sistema de participação popular, de diálogo interativo entre as esferas sociais.

O ecodesenvolvimento defende a simbiose do sistema humano com o natural, buscando fazer o melhor uso do fluxo de recursos naturais renováveis locais, reciclar e reaproveitar energia e matéria, reduzir o desgaste do estoque natural, dar ênfase às tecnologias de baixo desperdício e ao desenho de sistemas de produção com ciclos fechados.

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Os princípios do desenvolvimento de ecossistemas são significativos nas relações entre os seres humanos e a natureza, porque a tendência desenvolvimental, em sistemas naturais, de um aumento na estrutura e complexidade por unidade de fluxo energético (como se fosse uma estratégia de proteção máxima), contrasta com a meta humana de produção máxima. O reconhecimento da base ecológica deste conflito é um primeiro estágio no estabelecimento de políticas racionais para gerenciamento do ambiente (ODUM, 1983, p.131).

Nesta perspectiva, a sustentabilidade humana requer uma revisão nos padrões de consumo e produção estabelecidos até agora. Isso significa reconhecer que os recursos naturais possuem uma dinâmica de renovação própria para cada ecossistema, que é essencial para toda a vida no planeta. Significa reconhecer que as necessidades humanas, ao contrário do apregoado pela economia clássica, são limitadas e identificáveis, mesmo em culturas diferentes, pois ‘o que muda é apenas a forma de satisfazê-las” (MAX-NEEF & HOPENHAYN, 1993, p.93). Concordando com SACHS (1986), a forma sustentável de satisfação destas necessidades pode ser identificada a partir da valorização, estudo e pesquisa, da ecologia dos ecossistemas, das culturas tradicionais locais e das tecnologias ecologicamente corretas ou ecotécnicas

Para tecer uma Sociedade Sustentável em Ubatuba, é preciso identificar potenciais e limites do bioma em que a cidade está inserida, bem como a contribuição das comunidades caiçaras, quilombolas e indígenas presentes, além das populações que migraram para o município. Neste sentido, é fundamental reconhecer os processos até então ocorridos de uso e ocupação do espaço, ou seja, as políticas locais e regionais promovidas. Faz-se também necessário reconhecer as pesquisas e práticas tecnológicas bem sucedidas já desenvolvidas e incentivar novas iniciativas. É vital o envolvimento dos habitantes neste processo, para que seja possível traçar um caminho viável à sustentabilidade neste recanto onde a serra encontra o mar.

E o cuidado é um conceito fundamental para essa tessitura. Para BOFF (2000) o cuidado é a essência do ser humano, ‘um fenômeno ontológico-existencial básico’, ou seja, base que possibilita a existência humana.

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