4.1 AS FASES DO LICENCIAMENTO AMBIENTAL DA MINERAÇÃO
4.1.1 Licença prévia
4.1.1.4 Licenciamento ambiental de atividade minerária em áreas protegidas
4.1.1.4.4 Participação do órgão gestor da Unidade de Conservação no licenciamento
O art. 36, § 3°, da Lei nº 9.985/2000, dispõe que “quando o empreendimento afetar
unidade de conservação específica ou sua zona de amortecimento, o licenciamento a que se
refere o caput deste artigo só poderá ser concedido mediante autorização do órgão
responsável por sua administração”. O licenciamento aludido é o de atividades de
significativo impacto ambiental, alvo da exigência de EIA/RIMA.
Em outras palavras, tratando-se de empreendimento de significativo impacto
ambiental localizado em UC ou zona de amortecimento, o licenciamento ambiental prévio
depende de “autorização” do respectivo órgão gestor.
O primeiro debate a ser travado é a respeito da natureza jurídica do termo
“autorização”, sobretudo se: (i) é obrigatória a participação do órgão gestor da UC; (ii) se o
conteúdo da resposta do órgão gestor possui caráter vinculante em relação ao órgão
licenciador.
Quanto ao primeiro questionamento, entende-se que a participação do órgão gestor da
UC é obrigatória, não podendo haver dispensa, pois a Lei determina que o licenciamento só
poderá ocorrer mediante autorização do responsável pela Administração da área protegida. A
expressão utilizada não implica em facultatividade.
Tanto é que a Resolução nº 428/2010, do CONAMA, que dispõe sobre a participação
do órgão gestor da UC no licenciamento ambiental, assim determina:
Art. 1º O licenciamento de empreendimentos de significativo impacto ambiental que possam afetar Unidade de Conservação (UC) específica ou sua Zona de Amortecimento (ZA), assim considerados pelo órgão ambiental licenciador, com
fundamento em Estudo de Impacto Ambiental e respectivo Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA), só poderá ser concedido após autorização do órgão responsável pela administração da UC ou, no caso das Reservas Particulares de Patrimônio Natural (RPPN), pelo órgão responsável pela sua criação. […]
Art. 2° A autorização de que trata esta Resolução deverá ser solicitada pelo órgão ambiental licenciador, antes da emissão da primeira licença prevista, ao órgão responsável pela administração da UC que se manifestará conclusivamente após avaliação dos estudos ambientais exigidos dentro do procedimento de licenciamento ambiental, no prazo de até 60 dias, a partir do recebimento da solicitação. [...] § 2º O órgão ambiental licenciador deverá, antes de emitir os termos de referência do EIA/RIMA, consultar formalmente o órgão responsável pela administração da UC quanto à necessidade e ao conteúdo exigido de estudos específicos relativos a impactos do empreendimento na UC e na respectiva ZA, o qual se manifestará no prazo máximo de 15 dias úteis, contados do recebimento da consulta.
Como se vê, os empreendimentos de significativo impacto que afetem UC ou sua zona
de amortecimento só poderão ser licenciados após autorização do órgão gestor do espaço
protegido. Tanto é que a autorização ocorre antes da emissão da primeira licença prevista (art.
2°, caput). A participação do órgão gestor ocorre em dois momentos: (i) antes da emissão do
termo de referência do EIA/RIMA, quando o licenciador deverá consultar formalmente o
gestor acerca da necessidade de conteúdo adicional a ser exigido no estudo; (ii) após a
realização do EIA/RIMA e em momento anterior à emissão da licença prévia, quando o órgão
gestor decidirá acerca da autorização do licenciamento da atividade. Observa-se que a
primeira participação é obrigatória, porém o conteúdo da manifestação do órgão gestor não é
de observância obrigatória – tanto é que o dispositivo utilizou o termo “consulta”.
Situação diversa ocorre na segunda participação, quando a Lei nº 9.985/2000 e a
Resolução nº 428/2010, do CONAMA, utilizaram o termo “autorização”. A decisão do órgão
gestor possui caráter vinculante em relação à emissão da licença. Vale dizer, se o gestor da UC
decidir no sentido de não autorizar, a licença prévia deverá ser denegada. Já se a decisão for
no sentido de autorizar, o órgão ambiental licenciador poderá ou não conceder a licença
prévia, de acordo com o preenchimento dos critérios legais e regulamentares.
Eduardo Fortunato Bim aponta que prevalece na Advocacia-Geral da União, na
jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 4ª Região e em parte da doutrina a corrente de
que a anuência prévia do órgão gestor possui caráter vinculante, embora o referido autor
discorde de tal posição, por entender que o responsável pela administração da UC não é um
órgão co-licenciador, tendo em vista que o art. 13, § 1°, da Lei Complementar nº 140/2011,
determina que os órgãos intervenientes no licenciamento ambiental atuam de modo não
vinculante.
368Ainda de acordo com o autor, quando a Lei Complementar nº 140/2011 desejou
trazer exceções ao sistema de intervenção de terceiros, o fez expressamente.
369Ou seja, a
vinculatividade é exceção.
Discorda-se da posição do referido Autor, pois o art. 13, § 1°, da Lei Complementar nº
140/2011 criou a regra geral de não vinculatividade da manifestação dos órgãos
intervenientes. Porém, o art. 36, § 3°, da Lei nº 9.985/2000 é norma especial e trata de forma
expressa acerca da necessidade de “autorização”, que impõe caráter vinculante de sua decisão.
Há hipóteses em que o órgão gestor da UC e o órgão licenciador são os mesmos. É o
que acontece no Estado da Paraíba, onde as UCs estaduais são geridas pela Superintendência
de Administração do Meio Ambiente (SUDEMA), que também é o órgão licenciador no
âmbito estadual. Nestes casos, caberá ao mesmo órgão decidir enquanto licenciador e gestor
da UC. Já no âmbito da União, o ente licenciador é o IBAMA e o ente gestor das UCs é o
Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).
Ressalta-se que a vinculatividade da autorização ocorre tanto nos casos em que os
órgãos pertencem ao mesmo ente federado (como é o caso do licenciamento do IBAMA e da
autorização do gestor de UC federal – ICMBio), quanto nas hipóteses em que o licenciamento
é realizado por um ente federado e a UC afetada pertence a outra (é o exemplo de um
licenciamento federal realizado pelo IBAMA em empreendimento que afeta UC estadual). A
única exceção ao caráter vinculante ocorre quando o gestor e o licenciador são o mesmo
órgão, até mesmo por preceito de caráter lógico.
Por fim, é importante ressaltar que toda a discussão acima se refere ao licenciamento
de atividades de significativo impacto ambiental, objeto da exigência de EIA/RIMA (art. 36, §
3°, da Lei nº 9.985/2000).
Nos casos em que o empreendimento não for considerada de significativo impacto
ambiental (Resolução nº 010/1990, do CONAMA – extração de minérios da extinta classe II)
e, por conseguinte, não forem alvo da exigência de EIA/RIMA, não haverá a exigência de
autorização prévia do órgão gestor da UC afetada. Em tal hipótese, o órgão ambiental
licenciador dará ciência ao órgão gestor, se a UC (ou a respectiva zona de amortecimento) for
afetada, de acordo com o art. 5°, caput, da Resolução nº 428/2010, do CONAMA.
368 BIM, Eduardo Fortunato. Licenciamento ambiental. 2. Ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2015, p. 95-98.