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SUL 574.649 90.994 15,8 NORDESTE 1.924.206 258.679 13,4 CENTRO-OESTE 478.257 72.986 15,3 NORTE 597.274 79.937 13,4 TOTAL 5.703.003 860.000 15,1

Fonte: Elaborado pelo autor a partir de dados: IPEA (2013) e CAIXA (2014).

Cardoso e Aragão (2013, p. 36) explicam que “Os recursos do PMCMV foram distribuídos pelas diversas unidades da federação de forma proporcional à estimativa do déficit habitacional dos estados, a partir dos estudos desenvolvidos pela Fundação João Pinheiro”.

De fato, isso se comprova nos números da tabela acima.

Conforme exposto no início deste tópico, Araújo (1999), comentando sobre o então “Programa Brasil em Ação” e em relação ao direcionamento de recursos do Governo Federal ao segmento industrial, mostrava que tal programa direcionava recursos para áreas já competitivas, ampliando “bolsões” de pobreza no país.

De forma similar, há na literatura críticas ao PMCMV nesse sentido. Apesar dos esforços em direcionar os recursos de forma equânime, dada à própria posição privilegiada do mercado no PMCMV, os investimentos parecem mostrar-se atraídos por cidades onde a dinâmica imobiliária é mais intensa.

[...] pode-se assumir como hipótese, que o programa tende a ser mais efetivo nos municípios que contarem com uma dinâmica imobiliária mais consolidada, contando portanto com um setor imobiliário local com capacidade de propor empreendimentos no âmbito do programa. Essa relação de dependência do programa para com a dinâmica imobiliária, fruto da hegemonia conferida ao setor privado, pode gerar problemas distributivos, já que os governos estaduais e municipais não controlam diretamente os meios necessários para garantir que os recursos estabelecidos na cota sejam efetivamente transformados em contratos. É possível que algumas administrações locais, com maior

experiência em política habitacional, possam atuar como “facilitadoras” das iniciativas privadas, como parece ter acontecido em alguns casos, mas mesmo essa “competência” específica traz como consequência uma acentuação da desigualdade. Ou seja, aqueles municípios ou estados que já têm recursos (financeiros ou administrativos) atrairão mais recursos enquanto aqueles mais pobres e com baixa qualificação não conseguirão atingir as suas cotas. (CARDOSO e ARAGÃO, 2013, p. 60)

Logo, mesmo diante de uma aparente distribuição de recursos realizada conforme os déficits habitacionais; localmente, podem ocorrer diferenças de captação dos recursos pelas razões expostas.

Fica reforçada aqui a importância do capital humano e também social enquanto condições favoráveis ao equacionamento da questão habitacional no país.

3.5. Discussão dos resultados do PMCMV

Passados pouco mais de cinco anos da existência do PMCMV, são possíveis colher, com base em números e na literatura existente, alguns dos seus resultados.

Almeida e Amato (2011, p. 1) afirmam que “[...] o Governo Federal destinou 14 bilhões de Reais em subsídios a fim de adequar a estrutura financeira do comprador [...]”, tendo em vista que o próprio segmento empresarial, até então, não se interessava pelo segmento de baixa renda, seja pela baixa poupança, seja pela baixa capacidade deste para com o pagamento das parcelas.

Os números de unidades contempladas no PMCMV são realmente impressionantes e este tem, de fato, contribuído de alguma maneira para a redução do déficit habitacional na medida em que tem acelerado o processo de aquisição e acesso de muitas pessoas ao primeiro imóvel. Mas a que custo? Ou seria preço?

A respeito da aceleração dos preços no mercado imobiliário, Lima Jr. (2014) mostra que o país não vive uma bolha imobiliária, mas afirma que o preço do imóvel está caro e que o crescimento da renda do brasileiro nos últimos anos ficou muito aquém da alta dos preços dos imóveis.

O reflexo da elevação nos preços aparece no Gráfico abaixo, que apresenta a evolução do Índice de Valores de Garantias de Imóveis Residenciais Financiados (IVG-R)18, calculado pelo Banco Central do Brasil.

Gráfico 3. Índice de valores e garantias de imóveis residenciais financiados (IVG-R) entre março de 2001 a janeiro de 2015 (março de 2001 = 100).

Fonte: Banco Central do Brasil, consulta em abril de 2015.

Através dele pode ser observado que a curva passa a ter uma inclinação maior a partir de 2007, quando ela assume um formato de crescimento exponencial. Porém, desde 2012 percebe-se que esta inclinação se reduz para uma tendência mais linear, o que significa que, passada a euforia, a inflação no setor pode estar diminuindo. Destaque-se o período compreendido entre os anos de 2007, 2008 e 2009, quando a curva atinge a sua maior inclinação.

Não se pode atribuir ao PMCMV, isoladamente, a responsabilidade por essa elevação exponencial nos valores dos imóveis, uma vez que não se tem aqui ferramentas e dados suficientes para essa afirmação. Importante lembrar ainda que o Programa foi concebido apenas em 2009, quando já havia sido iniciada a escalada de preços. Ademais, o IVG-R está atrelado aos valores

18 “O IVG-R mensura a tendência de longo prazo dos valores de imóveis residenciais no Brasil utilizando informações do Sistema de Informações de Crédito (SCR) do Banco Central do Brasil. Utiliza-se para cálculo do índice os valores de avaliação dos imóveis vinculados a financiamentos imobiliários a pessoas físicas com garantia de hipoteca residencial ou alienação fiduciária de imóvel nas 11 regiões metropolitanas utilizadas para o cálculo do IPCA pelo IBGE (Belém, Belo Horizonte, Brasília, Curitiba, Fortaleza, Goiânia, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro, Salvador e São Paulo)”. A metodologia completa do IVG-R pode ser consultada no site do Banco Central: http://www.bcb.gov.br/?RELESTAB201303. Consulta em abril de 2015.

0 100 200 300 400 500 600 m a r/ 0 1 o u t/ 0 1 m a i/ 0 2 d e z/ 0 2 ju l/ 0 3 fe v /0 4 se t/ 0 4 a b r/ 0 5 n o v/ 0 5 ju n /0 6 ja n /0 7 a g o /0 7 m a r/ 0 8 o u t/ 0 8 m a i/ 0 9 d e z/ 0 9 ju l/ 1 0 fe v /1 1 se t/ 1 1 a b r/ 1 2 n o v/ 1 2 ju n /1 3 ja n /1 4 a g o /1 4

de hipotecas/alienação fiduciária de imóveis em geral, ao passo que o PMCMV atende a pessoas com renda até 10 salários-mínimos.

De qualquer maneira, é explícito pela análise do Gráfico 2 de que há alguma euforia no mercado de imóveis. É de se supor ou especular também que pode haver alguma relação disso com o volume de crédito concedido no período e com os subsídios oferecidos pelo Governo Federal, ambos contribuindo consequentemente para o acirramento da especulação imobiliária.

Aqui é possível estabelecer a relação entre a proposta do trabalho com o mercado: dados os estímulos creditícios do Estado ao setor da construção civil, em específico em relação aos subsídios concedidos pelo PMCMV, estariam as organizações envolvidas com o mercado imobiliário respondendo a esses estímulos de que maneira?

Para Shimbo (2010, p. 63), sobre o contexto:

[..] houve um deslocamento entre o que foi proposto inicialmente e aquilo operacionalizado na prática, a partir do momento em que o mercado foi se aproveitando das liminaridades deixadas pela própria política até alcançar a posição de seu ator central – no Programa “Minha Casa, Minha Vida”, lançado em 2009.

Nesta crítica, pode-se supor que, dadas às condições de mercado (demanda aquecida pelo crédito e por subsídios) e à condição de centralidade garantida ao setor privado pelo PMCMV, as distorções destacadas anteriormente entre o que fora proposto pela SNHIS e o PMCMV estariam criando uma assimetria de poder a favor dos agentes de mercado, sejam imobiliárias, construtoras e proprietários de terras, que permitem a eles se apropriarem, dentro da lógica do mercado, dos subsídios oriundos de recursos públicos (OGU) e semi-públicos (FGTS e SFH) que deveriam ser direcionados prioritariamente para pessoas de baixa renda.

Isso é possível porque os agentes de mercado irão receber todos os recursos com a entrega das chaves e terão liquidez para usá-los em outras aplicações rentáveis, ao passo que o adquirente do imóvel não usufruirá de qualquer liquidez19; primeiro porque por restrições do próprio MCMV, ele deverá permanecer com o imóvel para não perder o subsídio (que em tese ficou, de fato, com especuladores de mercado, que inflou o preço - a inflação também tratará de corroer a diferença ao longo do tempo e reajustar o preço quando da

19 Liquidez é entendida como a capacidade imediata de transformar um ativo em dinheiro. Para Groppelli e Nikbakht (2009, p. 53) “[...] liquidez refere-se ao grau de facilidade com que os ativos podem ser convertidos em caixa”.

queda da demanda) e, segundo, trata-se do primeiro imóvel e ele vê vantagem em ter a propriedade ao invés de pagar aluguel - dado que vivemos em um país com histórico de instabilidade monetária e insegurança jurídica, ter uma propriedade é vista como uma forma segura de poupança.

[...] A alternativa da casa própria encontra fundamentos na cultura brasileira de uma sociedade que conviveu por longos períodos inflacionários, fazendo dela um patrimônio e uma estabilidade em situações de crise. Corrobora essa acepção a aceitação tácita do direito inviolável da propriedade privada. (CARVALHO, 2010, p. 149)

Sob esta ótica, as normas do PMCMV acertadamente (afinal, são recursos públicos) blindam a possibilidade do adquirente do primeiro imóvel de especular no mercado, mas não consegue impedir que imobiliárias, construtoras ou proprietários de terra façam o mesmo, uma vez que as avaliações da Caixa sofrem forte tendência ou necessidade de acompanhar os mercados para se adequarem às condições locais. (CARDOSO e ARAGÃO, 2011)

Shimbo (2010), ao analisar em um estudo de caso a estrutura de custos e condições de uma grande construtora atuante na Região Metropolitana de São Paulo chega à conclusão de que a estratégia pode ser altamente lucrativa às empresas que tiverem o know-how do mercado.

Cria-se dentro desta ótica, portanto, uma lógica perversa e travestida pelas regras do mercado, pois a própria especulação trata de consumir os recursos que seriam direcionados para a aquisição de novos imóveis para as pessoas mais carentes.

Tal lógica vai ao encontro do entendimento de Vainer (2001, p. 148) sobre a questão da urbanização:

A cidade é também, nela mesma, um poderoso mecanismo de geração e apropriação de riqueza, que não está inscrito nem totalmente determinado na estrutura social. Que alguns poucos promotores imobiliários capturem imensos valores – mais valias imobiliárias – graças a investimentos públicos que poderiam estar sendo consagrados à redução das desigualdades estritamente urbanas, eis algo que não é imposto por nenhuma lei do mercado; ao contrário, é pura e simples apropriação privada de recursos públicos. Esta lei dos mais fortes que se institucionaliza – ao mesmo tempo em que se traveste de lei do mercado – manifesta, de maneira plena, a estreita solidariedade entre o poder econômico e o poder político que configura, simultânea e combinadamente, a economia e a política urbanas.

Essa perspectiva reforça a proposição de que os recursos direcionados para o PMCMV podem estar sendo apropriados pela especulação;

ao contrário do seu destino que seria o de assegurar o acesso às pessoas de baixa renda para a redução do déficit habitacional.

Tendo esse conjunto de informações em mente, parece que o PMCMV efetivamente foi criado com o intuito de superar as adversidades externas e voltado para atingir crescimento econômico, sendo a redução do déficit habitacional um mero produto desta política, visão esta compartilhada por diversos autores apontados neste mesmo capítulo.

Esteja reforçado que não se defende aqui que o PMCMV foi o responsável isolado por essa elevação exponencial nos preços, mas veremos adiante que existem indícios de que ele contribui de para essa escalada, principalmente para os imóveis direcionados para os extratos mais populares.

Outros aspectos positivos e negativos sobre o PMCMV em sua análise geral podem ser extraídos da literatura acadêmica. De forma a facilitar e agilizar o entendimento de alguns desses principais aspectos, foi elaborada a Figura 3, que apontam os itens mais indicados pelos autores aqui pesquisados e podem subsidiar as conclusões da pesquisa.

Figura 5. Alguns aspectos positivos e negativos do PMCMV.