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3.8. Uma preocupação a ser considerada: a perenidade da política.

A Constituição Federal de 1988, buscando corrigir inúmeros erros do passado em termos de promoção de desigualdade social pelo próprio Estado passou a estender a todos os brasileiros uma série de direitos sociais, a exemplo do Art 6º. “São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”. Em 2010, a Emenda Constitucional nº 64 incluiu também a “alimentação” neste rol de direitos sociais.

Para Mendes (2014), a Constituição de 1988 herdou os conflitos do período autoritário anterior e, para equilibrar, sustentar e garantir uma nova ordem democrática e manter a estabilidade política, a Carta Maior passou a atender tanto os interesses dos mais pobres, representado pelas grandes massas de votos, ávidos por políticas de redistribuição de renda e redução da pobreza, quanto os interesses dos grupos de alta renda, na manutenção de privilégios obtidos e extraídos do Estado desde sempre.

Assim, um conjunto de forças passou a atuar sobre os políticos: de um lado, os mais pobres, com poder de voto e vitimados pelo autoritarismo de décadas anteriores e por séculos de extrema desigualdade com poucos precedentes no mundo e, de outro, uma classe dominante que usa do poderio econômico para manter e ampliar privilégios. (MENDES, 2014)

Dentro desse conflito de forças, Castro (2014, p. 22) expõe que ganha relevância o populismo, “[...] quando a emoção se sobrepõe à razão para criar um ilusionismo coletivo [...]” de que o governante produz benefícios à sociedade sem qualquer custo. Cria-se, então, o que o autor denomina de “O Mito do Governo Grátis”, definido por ele como “aquele que distribui vantagens a todos sem nenhum custo para a sociedade”, e afirma, “está na raiz do declínio da produtividade e na atual estagnação do declínio produtivo brasileiro”.

O governo passou a funcionar como uma central de distribuição de rendas e de regulação protetora para diversos grupos sociais. A despesa pública disparou. O orçamento público e a regulação da economia tornaram-se as principais ferramentas de distribuição de renda e patrimônio a favor dos pobres (políticas sociais), dos ricos (políticas industriais) e de grupos intermediários (emprego público, previdência pública privilegiada, etc). (MENDES, 2014, p. 22).

É nesse contexto que Mendes (2014) defende a ideia de que no Brasil não existe um consenso social no intuito de levar a sociedade à redução de desigualdade e que tampouco a elite econômica vem perdendo poder de influenciar as decisões do Estado.

Para ele, o que existe, de fato, é um conjunto de atores que buscam extrair cada vez mais recursos do Estado através das mais diferentes formas, ou seja, vivemos em um permanente estado de rent-seeking: “ [...] nesse clima de desacordo social, diversas políticas que favorecem alguns grupos, mas prejudicam a coletividade, têm sido postas em prática, travando a eficiência e o crescimento econômico [...] ” (MENDES, 2014, p. 4).

Os dois autores (MENDES, 2014 e CASTRO, 2014) concordam que o que se tem visto no Brasil desde a promulgação da Carta Maior, em 1988, é uma crescente elevação nos gastos públicos para atender às mais distintas demandas, de tal forma que são extraídos tanto recursos do Estado a ponto de que ele próprio acabe por atrapalhar ao invés de catalisar o processo de desenvolvimento.

A manutenção de elevados gastos públicos em benefícios e subsídios para as mais diferentes classes sociais, bem como o crescente aparelhamento do Estado é apontado por eles como o fator responsável pelo baixo desempenho em termos de crescimento econômico desde a Constituição de 1988.

Diante de um quadro de extrema desigualdade e da “necessidade” de manutenção de privilégios para o alcance da estabilidade política, as demandas sociais cada vez maiores demandam um Estado cada vez maior, com mais tributação, regulação e todos os demais ônus associados ao peso do leviatã.

Como o Estado passa a ser um peso ao processo produtivo para retroalimentar o sistema distributivo, fica comprometido o crescimento de renda nacional (crescimento econômico).

O exposto parece remeter ao conceito de exterioridade aparente, quando as atividades de Estado são exteriores à sociedade na aparência, mas

não na essência. De acordo com esse conceito, o Estado capitalista mostra-se competente ao acobertar, das classes dominadas, situações que favorecem a um conjunto de interesses (geralmente os do próprio Estado e das classes dominantes).

Para o PMCMV, Bonduki (2009, p. 1) considera:

A crise econômica e a disposição do governo em dinamizar a construção civil atropelaram o Plano Nacional de Habitação, pactuado como uma estratégia de longo prazo para atacar um problema crônico. O programa anunciado não resolve o déficit de 7 milhões de unidades, mas as críticas pessimistas não levam em consideração que o patamar de recursos foi elevado, exigência antiga dos movimentos de moradia

O autor admite que as novas estratégias “atropelam” o Plano Nacional de Habitação, mas enxerga como aspecto positivo o elevado “patamar de recursos” no atendimento a uma antiga exigência de movimentos de moradia.

De fato, os recursos alocados ao segmento vieram ao encontro das antigas reivindicações, conforme expões o autor, mas as circunstâncias posteriores mostraram que não foi possível atingir necessariamente àqueles que mais necessitavam desses recursos.

Assim, é possível suscitar a reflexão de que, por um lado, enquanto parte da população sente-se mais satisfeita por ter adquirido o primeiro imóvel contemplado com subsídio do Governo, ainda que isso possa ter implicado na promoção da especulação e a priori sem ganho efetivo de capital ao adquirente; parte da população que realmente o necessitava ficou desprovida desse recurso e outra parcela de brasileiros suportou e suporta o ônus de uma pesada carga tributária que prejudica o crescimento econômico do país. Mas, por outro lado, o programa também estimulou a cadeia da construção, gerando empregos, renda e arrecadação para o Estado25, bem como tem elevado potencial para gerar efeito multiplicador sobre a economia como um todo.

Essa discussão, porém, foge ao propósito deste trabalho e deve ser complementada por uma pesquisa mais profunda sobre os efeitos do programa na economia como um todo para a sua perenidade.

De outra maneira, estudo da FGV (2007) expõe um aspecto importante e que é um problema inerente ao SFH: ele concede financiamentos a longo-prazos e capta recursos a curto e médio-prazos. Quando o cenário é de

25 Gonçalves Junior et al. (2014), através de análises pelo método/modelo insumo-produto, mostram que a despeito do enorme valor de subsídios concedidos no financiamento do programa, 16% dos valores financiados retornam aos cofres públicos como impostos.

crescimento econômico, o sistema se sustenta, pois os ganhos de renda refletem em elevação dos saldos em poupança. No entanto, em situações de recessão e instabilidade, há mais retiradas em poupança do que depósitos, o que compromete a continuidade do sistema.

Ou seja, o atual cenário de baixo crescimento da economia pode vir a comprometer a capacidade de poupança popular e, consequentemente, interromper a manutenção dos volumes de créditos concedidos ao setor nos patamares dos últimos anos. Mantendo-se a atual situação, parece razoável, portanto, esperar que ajustes venham a reduzir as possibilidades de financiamentos para a habitação.

3.9. Algumas soluções para a questão habitacional apontadas pela