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PR-39 é um peptídeo da família das catelicidinas rico nos aminoácidos prolina e arginina (49% e 24%, respectivamente - RRRPRPPYLPRPRPPPFFPPRLPPRIPPGFPPRF PPRFP), tendo sido originalmente isolado do intestino de suínos por exibirem propriedades antimicrobianas (Agerberth et al., 1991; 1996). O PR-39 e homólogos são secretados por macrófagos, sendo encontrados em fluidos de feridas de muitos animais e em lesões de infarto agudo do miocárdio (Gallo et al., 1994). Assim como os demais compostos da família das catelicidinas, este peptídeo catiônico é sintetizado como um precursor inativo e estocado em grânulos celulares como um pró-peptídeo. Sob ativação celular e degranulação, o PR-39 maduro é liberado por uma rápida clivagem do peptídeo sinal N-terminal (Gudmundsson et

al., 1995; Lehrer et al., 2002). Este peptídeo é capaz de atravessar rapidamente as membranas celulares (Chan and Gallo, 1998).

O mecanismo de inibição do PR-39 sobre o proteassoma é alostérico, através da interação reversível com as subunidades α7. Dado que este peptídeo é positivamente carregado (pI – ponto isoelétrico – teórico = 12.60), ligações iônicas entre os resíduos de arginina do PR-39 e a porção ácida C-terminal das subunidades α7 (pI teórico = 3.45) são propostas como as responsáveis pelo mecanismo de ação (Gao et al., 2000; Gaczynska et al., 2003). Estudos utilizando microscopia de força atômica demonstraram que a ligação do PR- 39 ao proteassoma 20S altera sua forma cilíndrica. Além disso, em decorrência da semelhança

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estrutural do PR-39 com uma porção do regulador 19S, a sua ligação inibe a montagem do proteassoma 26S. Esses efeitos do PR-39 foram observados tanto em proteassomas de leveduras quanto humanos (Gaczynska et al., 2003).

A maior parte dos inibidores do proteassoma em estudo são competitivos, os quais bloqueiam diretamente os sítios catalíticos, impedindo a clivagem de uma grande quantidade de substratos destinados à degradação pelo proteassoma e desencadeando a apoptose celular. Ao contrário destes, inibidores alostéricos oferecem um potencial de uso mais preciso, visto que a atividade sobre o proteassoma se manifesta de modo regulatório, não influenciando de forma significativa as taxas de proteólise por este complexo (Gaczynska et al., 2003).

Nos últimos anos, diferentes pesquisadores têm demonstrado os efeitos e as bases moleculares da inibição do PR-39 sobre o proteassoma, exibindo como principais atividades a diminuição de danos inflamatórios e a indução da angiogênese. Estes processos são parcialmente explicados pela inibição da degradação seletiva pelo proteassoma dos fatores IκB e HIF-1α (Hypoxia Inducible Factor -1α), respectivamente (Gao et al., 2000; Li et al., 2000; Bao et al., 2001)

O fator de transcrição NFκB é o regulador de uma série de genes que codificam citocinas, quimiocinas, fatores de crescimento, moléculas de adesão celular e receptores de superfície (Pando and Verma, 2000; Frankland-Searby and Bhaumik, 2011). Em células não estimuladas, o NFκB está disperso no citoplasma como um complexo formado pelas suas subunidades p50 e p65 ligados ao seu inibidor IκB. Quando as células são estimuladas (por citocinas ou stress), a enzima IκB quinase é ativada, fosforilando duplamente o fator IκB. Uma vez fosforilado, o IκB é reconhecido por uma E3 ligase, levando à ubiquitinação. O IκB é então degradado pela via proteassomal, liberando o NFκB que transloca-se para o núcleo e desencadeia a transcrição de diferentes genes (figura 6) (Wu, 2002). A inibição da degradação proteassomal do IκB pelo PR-39 diminui a expressão de moléculas dependentes do fator de transcrição NFκB, como as moléculas de adesão celular VCAM-1 (Vascular Cell Adhesion

Molecule-1) e ICAM-1 (Intercellular Adhesion Molecule-1). Portanto, o PR-39 reduz a lesão em estados inflamatórios por diminuir a adesão de leucócitos no endotélio e, consequentemente, o fluxo destas para os tecidos (Gao et al., 2000; Bao et al., 2001).

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Figura 6: Regulação proteassomal do fator de transcrição NFκB. Após a fosforilação do IκB e sua degradação pelo proteassoma 26S, o NFκB, formado pelas subunidades p50 e p65, é liberado para o núcleo e ativa a expressão gênica (VCAM: Vascular Cell Adhesion Molecule; ICAM: Intercellular Adhesion Molecule). Fonte: adaptado Jung et al., 2009.

O PR-39 também é capaz de estimular a angiogênese, tanto in vitro quanto in vivo. Estudos demonstraram que a expressão transgênica do PR-39 em cardiomiócitos resultou no aumento do número de vasos, redução da resistência coronariana e hipertrofia miocárdica (Li

et al., 2000; Tirziu et al., 2007). Estes efeitos são explicados pela inibição da degradação via ubiquitina-proteassoma da proteína HIF-1α, a qual regula a expressão de muitos genes relacionados à angiogênese, incluindo o VEGF (Vascular Endothelial Growth Factor) e o seu receptor FLT1 (Chan and Gallo, 1998). Além disso, o PR-39 aumenta a expressão de receptores do fator FGF (Fibroblast Growth Factor), como o receptor FGFR-1, sugerindo a atividade angiogênica do peptídeo através desta via (Li et al., 1997; Volk et al., 1999).

Para definir a região do PR-39 envolvida diretamente na interação com o proteassoma 20S, Gaczynska et al., 2003, produziram variantes do peptídeo com progressivas deleções de aminoácidos a partir de sua extremidade C-terminal. Estes pesquisadores demonstraram que o peptídeo contendo os 11 primeiros aminoácidos da região N-terminal conservados da

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sequência do PR-39 (PR-11 – RRRPRPPYLPR) inibe eficientemente o proteassoma in vitro de maneira dose-dependente. Estes resultados observados in vitro estão de acordo com os dados in vivo, uma vez que a indução da angiogênese pelo PR-11 foi similar à observada pelo PR-39.

A partir de estruturas análogas de peptídeos sintéticos e estudos espectroscópicos de ressonância magnética nuclear (RMN), Anbanandam et al., 2008, identificaram alguns requisitos estruturais essenciais do PR-11 para a inibição do proteassoma 20S de humanos. Ao menos dois dos três resíduos da porção N-terminal carregados positivamente (arginina ou lisina) e resíduos hidrofóbicos na região C-terminal são imprescindíveis para a atividade inibitória. As propriedades requeridas pelo PR-11 para a inibição do proteassoma 20S in vitro também alteram a expressão de fatores da via do NFκB, mantendo-se, assim, os efeitos anti- inflamatórios verificados in vitro. Além disso, Anbanandam et al., 2008, verificaram que alguns análogos ao PR-11 demonstraram ação inibitória superior sobre o proteassoma 20S, encorajando a busca por moléculas mais ativas. Dessa forma, modificações estruturais sutis envolvendo substituições por aminoácidos semelhantes e sínteses de peptídeos cíclicos poderiam gerar melhores inibidores e compostos com potenciais terapêuticos.