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lim a evolução mais significante da implementação do Direito Internacional Penai dar-se-á após cinco séculos dos julgamentos medievais tendo acontecido com o fim da Primeira Guerra Mundial (1914-1918)309, estabelecendo-se com o Primeiro Tratado de Versalhes, assinado em 28 de junho de 1919 entre as potências vencedoras a Tríplice Entente sob liderança da França, e as potências vencidas, a Tríplice Aliança, liderada pela Alemanha.

Sob um pesado embargo naval, a Alemanha viu-se obrigada a ratificar o Tratado de Versalhes que, entre outras cláusulas, continha pesadas indenizações de guerra em seu artigo 231310 e a necessidade de julgamento do Kaiser Wilhelm

li, “(...) por haver ofendido de forma suprema a moralidade internacional e a

santidade dos tratados”311, através do artigo 227 do mesmo Tratado, e para tanto seria criado um tribunal internacional especial.

O Kaiser Wilhelm von Hohenzollern, fugiu para a Holanda, país neutro que negou sua extradição, sob a alegação deste Estado, que as acusações consistiam em retroatividade da lei penal, ferindo o princípio de que a lei penal não retroage no tempo — nullum crimen, nulla poena sine praevia lege312 — em conseqüência, viveu neste exílio sob o pedido de afastar-se da política, acatado até seu falecimento em 1941, quando, ironicamente, a Holanda foi invadida e tomada pelas tropas alemãs313.

309 É estimado que a Primeira Guerra Mundial tenha provocado nove milhões de mortes, vinte milhões de feridos. Cfe. SUNGA, L S. Op. cit., p. 279.

310 “The Allied and associated governments declare, and Germany accepts the responsability for,

all the loss and damage suffered by the Allied and associated governments as a consequence of the war imposed upon them by the aggression of Germany and heralRes?. Cfe. Idem, p. 280.

311 “(...) for a supreme offence against international morafíty and the sanctity of treaties”. Idem, ibidem.

312 Nenhum crime, nenhuma pena sem uma prévia lei que prescreva. Nas palavras de Gilberto Caldas, citando Aníbal Bruno, “esse princípio, tradicionalmente expresso na regra nullum

crimen, nulla poena sine lege é geralmente consagrado nos dispositivos de abertura dos

Códigos Penais modernos, tem raízes na Magna Carta da Inglaterra e na Petitions of Rights, norte-americana.” In: CALDAS, G. Como traduzir e empregar o latim forense, p. 180. Interessante observar que este brocardo está inserido no Código penal brasileiro, em seu artigo primeiro: ‘Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal.” O mesmo ocorrendo no artigo 5°, XXXIX da Constituição Federal, que determina “não haverá crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”.

A iniciativa de julgar o ex-imperador alemão, simbolizou a possibilidade de um chefe de Estado vir a ser individualmente responsabilizado pelo Direito Internacional por iniciar uma guerra de agressão, significando que os delegados da conferência que redigiram o Tratado de Versalhes, levantando a idéia de que a imunidade estatal do soberano — sovereign State immuríity — é rejeitada aos líderes políticos acusados de responsáveis por agressão bélica314.

Outro ponto interessante foi a possibilidade de se julgar indivíduos acusados de atos criminais durante a Primeira Guerra Mundial e serem julgadas por tribunais militares das potências vencedoras, conforme o disposto no artigo 229 do Tratado de Versalhes de 1919: “(...) pessoas acusadas de atos criminais contra nacionais de um dos Aliados ou Potências Associadas, deverão ser levados perante aos tribunais militares desta Potência. Pessoas acusadas de atos criminais contra nacionais de mais de um dos Aliados e Potências Associadas, deverão ser levados perante aos tribunais militares destas Potências (.,.)”315.

Durante realização da Conferência de Paz em Paris, realizada em fevereiro de 1920, os aliados demandaram junto à Alemanha, a extradição de oitocentos e noventa e seis cidadãos alemães acusados de violarem o Direito da Guerra, deste total, a Inglaterra forneceu noventa e sete nomes, a França e a Bélgica, trezentos e quarenta e quatro nomes cada uma, a Itália, vinte e nove nomes, a Polônia, quarenta e sete nomes, a Romênia, trinta e um nomes, e a Sérvia, quatro nomes316

O chefe da delegação alemã presente nesta conferência de paz, Kurt von Lersner, negou-se a receber a lista e retirou-se para Berlim. Em contrapartida, a Alemanha ofereceu-se a julgar um número seleto de suspeitos, através de sua Câmara Criminal da Corte Imperial de Justiça — Suprema Corte do Reich em Leipzig317— fato aceito por sugestão do Reino Unido, pelos Aliados318.

SUNGA, L. S. Op. d t, p. 280.

315 “Persons guilty of criminal acts against the nationals of one of the Allied and Associated Powers

will be brought before the military tribunals of that Power. Persons guilty of criminal acts against the nationals of more than one of the Allied and Associated Powers will be bought before military tribunals composed of members of the military tribunals of the Powers concemed(...).” In:

SUNGA, L. S. Op. dt., p. 281. 316 PAUST, J. J. Op. dt., p. 709.

317 Supreme Court of the Reich at Leipzig. In: SUNGA, L. S. Op. d t , p. 281. 318 Idem, ibidem.

Foram selecionados quarenta e cinco nomes, dos quais somente doze foram julgados319 em delitos de guerra em relação ao tratamento conferido aos náufragos de ataques submarinos e prisioneiros de guerra, resultando em seis condenações que variaram de seis meses a quatro anos e outros seis inocentados320. Os não condenados receberam este veredicto mais pela não aceitação da Corte de certas evidências321.

As acusações mais especificamente assim variavam: maus tratos e assassinatos a prisioneiros de guerra; afundamento do navio-hospital Dover

Castle] tiros dados aos sobreviventes do naufrágio do navio-hospital Uandovery Castle; maus tratamentos a uma criança belga e ordem de matar prisioneiros de

guerra .

Interessante observar, que dos militares julgados, três tinham a patente de general — Hans von Schock, Benno Kruska e Karl Stenger323, todos inocentados. Este julgamento foi desapontador aos países aliados mas não para a opinião pública e imprensa alemãs, pois foram extremamente hostis ao procedimento, chegando ao ponto dos observadores britânicos serem retirados do local sob escolta policial324.

Deduz-se assim, que o inédito julgamento de Leipzig mostrou que em certos casos, em especial nos momentos de violação às normas de conflitos armados contidas no Direito Internacional, também os nacionais não deverão ser julgados pelos seus próprios tribunais oficiais325.

319

Deste total, seis acusados pelo Reino Unido, cinco pela França e um pela Bélgica, após muita insistência. In: PAUST, J. J., p. 709.

320 Idem, ibidem.. 321 Idem, ibidem. 322 Idem, p. 709-710. 323 Idem, p. 710. 324 Idem, ibidem. 325 SUNGA, L. S. Op. d t, p. 281.

Seção III. Tribunais Pós-Segunda Guerra Mundial: Nurembergue e