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4 RESULTADOS E DISCUSSÕES

4.3 PERCEPÇÃO DOS MEMBROS DOS POLOS AGRESTE-TRAIRI E

PELA SOLIMAR

A perspectiva do planejamento do turismo, bem como da elaboração de políticas públicas no contexto da terceirização realizada por empresas de consultoria, torna relevante averiguar a percepção de atores locais sobre os resultados derivados desses processos.

No caso do presente trabalho, refere-se a contratação da Solimar responsável por realizar planos que são utilizados como direcionamentos para o desenvolvimento do turismo no RN. Sendo assim, foi aplicada uma entrevista semiestruturada com membros previamente selecionados, e que fazem parte de duas instâncias de governança regional do interior do RN: Polos Agreste -Trairi e Seridó.

O objetivo da entrevista é de identificar se na percepção dos membros, os produtos entregues pela empresa de consultoria atingiram as necessidades das instâncias de governança e seus respectivos municípios e entidades participantes.

Questionados inicialmente como os entrevistados enxergavam o processo de elaboração de políticas públicas do turismo no RN de uma maneira geral, é possível destacar algumas falas abaixo:

[M3] vem de cima para baixo, do governo que cria a ideia da política pública, seja lá qual for o projeto e muitas vezes não tá adequadamente, é, não se aplica adequadamente a cada região [...] o estado que cria sua política pública na aplicação de seus polos e consequentemente nos municípios, então é uma política, é um projeto, uma lei ou o que seja, criada de uma forma mais genérica né, que é pra abranger todo o estado do RN, mas que esbarra muitas vezes na peculiaridade de cada cidade.

[M3] no meu ponto de vista poderia ter alguma brecha, algum mecanismo, alguma coisa, que cada cidade pudesse adaptar né, é, esses projetos voltados para a sua realidade, então o que eu enxergo de mais dificuldade é isso, faz um projeto, uma lei, um programa de uma forma mais genérica e cada cidade tem sua especificidade, então às vezes não se aplica da melhor forma possível para cada município, mas como a, o funcionamento.

[M4] Enxergo o Processo de Elaboração de Políticas Públicas do Turismo no Estado do RN, como geridos por programas e projetos estaduais que buscam caminhar juntamente com os Planos Nacionais de Turismo e o Programa de Regionalização do Turismo, buscando investimentos e fomento para o desenvolvimento do setor no estado. [M5] Primeiramente, o Estado do Rio Grande do Norte não possui política pública de turismo própria. O governo réplica e executa as ações emanadas pelo Ministério do Turismo, o que é uma fragilidade. O RN possui instituições de excelência de ensino e pesquisa no campo do turismo, e a SETUR possui corpo técnico capacitado para a elaboração de políticas de turismo.

As falas destacadas chamam atenção para a questão do planejamento e diretrizes em âmbitos federais não trazer flexibilidade de adaptação para as realidades regionais e locais, o que muitas vezes pode dificultar processos e impedir avanços pautados em peculiaridades de municípios, mesmo compreendendo que a política nacional busca oficializar e respeitar critérios a fim de contribuir para a gestão e desenvolvimento do turismo.

Na percepção do [M5] é possível analisar ainda que o estado possui sim, meios de elaborar a sua própria política de turismo, pois tem equipe técnica e capacitada para tal, além de possuir instituições de ensino e pesquisa de qualidade o que poderia contribuir nesses processos. O membro ainda afirmou que o estado já é bastante frágil no que se refere ao contexto analisado, e como consequência, abre “brecha” para a contratação dessas empresas de consultoria.

Outro questionamento foi sobre a percepção quanto aos governos utilizarem da contratação de empresas especializadas na realização de consultorias turísticas para construção de políticas, projetos e planos do turismo e o reflexo disso no seu polo. Destaca-se:

[M2] Só uma empresa especializada ou técnicos com formação na área conseguem realizar um trabalho de qualidade necessário para o desenvolvimento turístico nos polos e em qualquer área de interesse turístico.

[M4] Penso que a sociedade paga pelos serviços duas vezes, pois os organismos públicos de turismo possuem corpo técnico suficiente e competente, ou pelo menos deveria possuir. A contratação de consultorias deveria acontecer para o atendimento de demandas específicas, muito especializadas, ou seja, excepcionalmente, e, não como atividade rotineira, que acontece há décadas no Brasil.

As falas acima retratam a opinião dos entrevistados, onde M2 cita que é importante ter empresas ou equipes técnicas capacitadas para realizar tal trabalho, no entanto, também é abordada a questão de possuir um órgão público com corpo técnico responsável pelo planejamento e gestão do desenvolvimento turístico no RN, mas mesmo assim as consultorias deixam de ser apenas um apoio ou um complemento na atividade pública e torna-se algo rotineiro.

Nesse contexto, Di Pietro (2009) chama atenção para essa terceirização que vem socorrendo administração pública, mas que constituiu como uma das formas de privatização no sentido amplo, justamente pelo fato de se tornar comum e constante essas contratações.

Quando perguntados sobre o processo de elaboração dos produtos, todos os membros afirmaram que foi por meio de oficinas coletivas com todos os conselheiros atuantes, cada um em seu respectivo polo, além de profissionais da SETUR e da empresa Solimar.

[M1] Sim. As discussões eram trazidas para as reuniões do Polo Agreste Trairi.

[M5] Participei das oficinas e consolidação dos produtos elaborados. O processo foi participativo, democrático e integrado, conforme está delineado nas próprias premissas do MTur e do edital publicado. Contudo, sabe-se que muitas ações e decisões foram tomadas no gabinete, desconsiderando de certa forma as decisões colegiadas.

De acordo com a fala acima, o processo foi participativo com a presença de colaboração dos membros dos polos, porém é relevante destacar que, na percepção de alguns membros, principalmente o [M5], existiram ações delimitadas com processo de tomada de decisões centralizadas nos responsáveis por elaboração de tais produtos, o que pode de alguma forma influenciar nos resultados.

No que se refere a entrega dos planos e documentos de planejamento e gestão do turismo feitos pela Solimar ao RN, os entrevistados ressaltaram aspectos positivos e também elementos pertinentes que deveriam ter sido considerados, como pode ser visto abaixo.

[M2] Talvez não tenha sido a melhor escolha na visão de muitos, porém o trabalho que foi desenvolvido foi muito importante para o fortalecimento e embasamento das ações do turismo para os próximos anos.

[M3] Pois bem, eu avalio de bom, um material bom né, ficou com algumas deficiências, mas eu acho que ele foi conduzido da forma correta. [...] ficou a desejar um pouco a questão do Seridó no, pelo menos o que foi apresentado pra gente, passa muito rapidamente e principalmente naquele vídeo promocional né de divulgação, é, eu vi um ênfase mais nas praias e tal do que no polo Seridó.

[M4] Em parte sim, na análise final dos produtos observou-se que alguns dados não condiziam com a realidade, alguns desatualizados principalmente no que diz respeito aos serviços e equipamentos, bem como não contempla alguns eventos considerado importante para a região.

[M5] No meu entendimento, o órgão contratante de tais serviços deveria ter realizado tais estudos por meio de parcerias institucionais (IES, Entidades de Classe, Trade Turístico, Sistema S, prefeituras municipais... etc.). Não havia necessidade de se contratar empresas de consultoria, uma vez que existe capital humano especializado no território potiguar.

[M6] Não refletiu integralmente a realidade do Polo Seridó, mas o contemplou, o que foi um avanço no cenário regional, pois por muitos anos o Seridó não era priorizado nas ações estatais no campo do turismo. O Plano de MKT Turístico foi um ponto de partida para a promoção do turismo regional, apesar das fragilidades encontradas. [M7] Esses produtos hoje estão servindo de base para as ações do Governo do Estado, por meio da Secretaria de turismo e Emprotur, apesar de ter sido feito por uma empresa americana, durante toda a construção das etapas e módulos, houve o acompanhamento de pelo menos um técnico do estado ligado à área de turismo.

Apesar da contribuição dos produtos para o desenvolvimento do turismo no estado, pode-se notar que alguns pontos são destacados, como a falta de mais informações das regiões, citando que as prioridades foram mais para as áreas praianas e o litoral do estado. Esse é um ponto delicado no RN, pois as mídias e os investimentos estão centralizados no litoral, fazendo com que as regiões interioranas não ganhem tanta visibilidade, fato esse, que pode ser visto que a partir dos produtos entregues continua existindo, mesmo com abordagens específicas dentro dos polos, a percepção dos membros entrevistados é que o elevado destaque ao turismo de sol e praia se sobressai em relação às propostas de interiorização do turismo no RN.

Além disso, outro ponto que merece destaque nesse resultado, é a fala do M5, em que o membro acredita que no território potiguar, existem parcerias e instituições que poderiam ter atuado junto ao governo do turismo estadual, não sendo visto como necessária a contratação de uma empresa de consultoria para tais elaborações. Isso vai ao encontro do que já descrito no presente trabalho, em que foi percebida no primeiro resultado que as equipes técnicas responsáveis pelo processo de coleta, tabulação e elaboração de relatórios foram profissionais, docentes e discentes de instituições do próprio estado.

No último questionamento da pesquisa, o tema abordado é sobre o processo de terceirização da produção da política de turismo e sua fase de implementação, causava algum impacto no reordenamento do território potiguar, e destaca-se alguns pontos relevantes, como mostram as falas abaixo:

[M4] Os impactos de terceirização da política de turismo são tanto positivos como negativos. Como por exemplo podemos citar como negativo a contratação de uma empresa estrangeira, que ainda não tem apropriação do conhecimento do território, ao qual leva mais tempo para estudo de análise, planejamento e execução, bem como os recursos investidos neste projeto não ficam no Estado e como impacto positivo, é uma empresa conceituada e consolidada com experiência em planos estratégicos de desenvolvimento e de marketing no turismo, que tem norteado e irá contribuir para o planejamento a pequeno, longo e médio prazo do turismo no RN. [M5] São inúmeros impactos. Mas destaco três, a saber: a. Possibilidade de não aprofundamento das questões territoriais e regionais; b. Não aproveitamento do capital humano especializado existente regionalmente; e c. Aumento dos custos financeiros das políticas voltadas ao turismo.

Pode-se perceber que o mais abordado pelos membros é a questão da empresa contratada não conhecer a realidade do estado e de seus respectivos polos, pois não é da região e tão pouco do país, mesmo a equipe técnica sendo do estado, sabe-se que instrumentos de coleta, elaboração de estratégias, e produtos finais foram feitos pela própria Solimar International, o que de fato pode influenciar diretamente na elaboração e na análise desse conteúdo.

De forma geral, percebe-se que os representantes dos polos apresentam em suas falas elementos que possibilitam a compreensão de que mesmo a consultoria tendo apresentado bons resultados para gestão e desenvolvimento do turismo no RN, pode ter em seus produtos critérios que merecem atenção, sendo os principais: a) a

abordagem e persistência de foco no turismo de sol e praia; b) a existência no RN de profissionais e instituições qualificadas para realização de trabalhos voltados para o turismo, não sendo necessária tal contratação estrangeira; c) possibilidade de resultados distantes e não aprofundados com base na realidade local.

Sendo pertinente destacar que o envolvimento de empresas privadas no processo de consultorias para o setor público para Todesco (2013) pode de alguma forma buscar privilegiando o mercado e não agindo com neutralidade, e para Vidigal & Suguihiro (2012) os recursos públicos são escoados para o setores privados em prol de serviços que seriam de responsabilidade pública.

No caso da presente pesquisa, nota-se a partir da percepção dos membros dos polos Agreste-Trairí e Seridó existe uma maior ênfase no litoral e no turismo de sol e praia, deixando assim, a perspectiva de desenvolvimento do turismo no interior do Estado em um foco reduzido, tendo que adaptar-se a um planejamento mais genérico.

Além disso, destaca-se que mesmo existindo instituições e profissionais capacitados no próprio RN, a empresa contratada é estrangeira, o que mesmo sendo reconhecida por alguns entrevistados como qualificada, outros ressaltam que não seria necessário buscar essa qualidade fora do estado, o que transmite os recursos públicos para o setor privado estrangeiro.

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