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3. RECURSOS PEDAGÓGICOS, ESTIMULAÇÃO MULTISSENSORIAL E

3.1 Percepção e estimulação multissensorial da criança com cegueira

Neste fragmento expõem-se os fundamentais caminhos para a obtenção de informação por crianças com cegueira, bem como a relevância da multisensorialidade, em se tratando da seleção, adaptação ou confecção de recursos pedagógicos.

A princípio acentua-se a oposta posição que pais e educadores, videntes, desempenham nas situações de ensino à criança com cegueira, já que são imperiosos na mediação da apropriação de informações, pela linguagem, no entanto seu repertório conceitual raramente apoia-se nos mesmos sentidos que a criança com cegueira poderia pautar-se para experimentar o mundo (BRUNO, 1993, AMIRALIAN, 1997, BUENO, 2003). Portanto, a aprendizagem da criança com cegueira será mais eficaz e significativa na medida em que o ensino alia a exploração do objeto pelos sentidos que dispõe – mediada pela linguagem (CARAZAS, 1985), em particular porque eles somente serão refinados e úteis à

aprendizagem pelo seu uso (VYGOTSKY, 1929/1997; LOWENFELD, 1973, BUENO, 2003).

Com isso se discorrerá sobre os sentidos de distância – auditivo e olfativo, como também os de proximidade – gustativo, tátil e cinestésico, e por fim, no tocante à atuação conjunta dos mesmos.

O sentido da audição possibilita a recepção das informações sonoras do ambiente, seja dos sons diretos ou dos produzidos pela fala. A percepção auditiva tem início quando a criança associa os estímulos sonoros aos objetos que os originaram, podendo então apropriar-se se símbolos auditivos para formular concepções abstratas sobre eles (COBO; RODRÍGUEZ; BUENO, 2003). As informações auditivas empreendem especial relevância a criança com cegueira por informar como a visão, sobre o meio e colaborar com a orientação espacial, de tal sorte que promove subsídios para a sua atuação social independente (COBO; RODRÍGUEZ; BUENO, 2003).

Acentua-se então que as informações auditivas devem, a priori, ser inseridas em contextos significativos de ensino, já que pouco indicam quanto às características de um objeto real, tome-se como exemplo o canto de um pássaro (BARRAGA, 1973, LOWENFELD, 1973, SUTERKO, 1973, BRUNO, 1993, COBO; RODRÍGUES; BUENO, 2003). Ademais, especialmente a criança com cegueira deve ser ensinada a controlar os estímulos auditivos, logo que o meio é repleto de sons, dos quais, pela particularidade desse sentido, há pouco controle físico. Essa aprendizagem nomeada por Cobo, Rodríguez e Bueno (2003, grifo nosso) percepção seletiva desenvolve-se a princípio pela percepção dos sons

procedentes do ambiente; neste nível de aprendizagem a criança com cegueira pode sentir-se

desorientada, por ainda não ter controle para selecionar e eliminar sua atenção aos sons de seu interesse. Com o suporte verbal apropriado tende a dirigir a sua atenção e percepção a sons específicos, quando passa ao nível de aprendizagem percepção e resposta a sons concretos; momento em que tem indícios que os objetos produzem sons, direciona-se a eles, passa a manipulá-los para que os emitam. No nível seguinte, diferenciação e discriminação de sons a criança domina a fonte de produção dos sons, sendo propícia a mediação verbal dos adultos na nomeação dos mesmos. Por tal discriminação e atuação verbalmente mediada a criança com cegueira pode deter mais controle sobre suas próprias condutas no ambiente. No quarto nível de aprendizagem auditiva, reconhecimento de sons relacionados a palavras

específicas e conectadas à linguagem, a criança depreende que os objetos, os sons e suas

próprias ações são designados por uma palavra, circunstância crucial para: ―[...] falar-lhe acerca dos seus movimentos e ações, interpretar suas palavras, ajudá-la a entender o que

acontece quando responde a certos ―objetos que fazem ruído‖ e, progressivamente capacitá-la a diferenciar claramente os sons das palavras.‖ (COBO; RODRÍGUEZ; BUENO, 2003, p. 134). Na ocasião em que a criança com cegueira seleciona os sons de seu interesse e constitui sua própria linguagem tem-se a estrutura para o quinto nível de aprendizagem, o

reconhecimento de vozes e a compreensão de palavras e direções, e então a aprendizagem

da escuta de modo seletivo.

Os sentidos gustativo e olfativo, reagentes a qualidades químicas, incentivam a percepção um do outro, de forma que um cheiro interfere na apreciação do sabor de um alimento. Os odores, como os sons, em se tratando de sentidos de distância, colaboram com a orientação espacial, quando promovem a noção da localização de objetos e espaços, assim como alertam sobre situações de perigo. O sentido gustativo, por sua vez, promove a obtenção da qualidade, textura, tamanho e contorno, dos objetos, com os quais os seus receptores, papilas gustativas da língua, têm contato (BARRAGA, 1973, SUTERKO, 1973). Cobo, Rodríguez e Bueno (2003) lembraram que a percepção por tais sentidos, quando desconecta da visão ou do tato, pode provocar informações divergentes da realidade.

O sentido tátil proporciona informações tais como: forma, textura, elasticidade, temperatura e o peso do objeto explorado. Por localizar-se nas mãos, e ainda, ser distribuído na superfície da pele, fornece pressão e vibração (COBO; RODRÍGUES; BUENO, 2003). O sentido cinestésico, entendido como a sensibilidade dos músculos e articulações (SUTERKO, 1973), permite a identificação de inclinações e desníveis nas superfícies. Entretanto, estes sentidos de proximidade, por dependerem da ação sobre os objetos e espaços, serão pouco relevantes à apreensão de certos elementos, a saber: o sol e a lua, grandezas: montanhas e edifícios, objetos muito pequenos ou frágeis, como a neve e em movimento ou em chamas (LOWENFELD, 1973; COBO; RODRÍGUEZ; BUENO, 2003). Ortega (2003, p. 94) acrescentou que ―[...] existem conceitos como cor, perspectiva, espaço tridimensional, que não podem ser aprendidos por meio do tato, audição, olfato e paladar. Também as coisas que estão muito distantes (as estrelas), as demasiado pequenas ou grandes demais, nem o que se movimenta (um pássaro em vôo).‖

O sentido tátil quando intencionalmente direcionado à obtenção de características físicas, de objetos ou ambientes é definido como tato ativo ou sistema háptico (OCHAITA; ROSA, 1995). Luria (1979), sobre a distinção entre tato ativo e passivo, reforçou que por meio do tato ativo são apreendidos os objetos integralmente, e não apenas seus traços isolados. Visando explicar o que representa o tato para a pessoa com cegueira na formação da imagem dos objetos, os autores Ochaita e Rosa (1995, p. 185) comparam-no ao sentido da

visão: ―As mãos, como os olhos, embora de forma mais lenta e sucessiva, movem-se de forma intencional para buscar a peculiaridades da forma e poder, assim, obter uma imagem dela.‖ (OCHAITA; ROSA, 1995, p. 185).

Os sentidos tátil e cinestésico, tal qual o auditivo, desenvolvem-se em níveis, segundo Cobo, Rodríguez e Bueno (2003), conforme as habilidades cognitivas da criança, nas etapas: conhecimento e atenção, conhecimento das estruturas e formas, relação das

partes com o todo, representação de objetos de duas dimensões de forma e discriminação e reconhecimento de símbolos. Devido à habilidade de conhecimento e atenção, a criança, após experiências na manipulação de diversos objetos, começa a

diferenciá-los e conhecer as qualidades que possuem: tamanho, peso, dureza, temperatura, consistência entre outras; ainda concebe que alguns objetos emitem estímulos e são modificáveis. Na habilidade de aprendizagem destes sentidos conhecimento das estruturas e

formas a criança com cegueira, ao manipular os objetos apropria-se das suas particularidades

quanto a contorno, tamanho e peso, sobretudo daqueles que componham seu cotidiano. Nesta ocasião faz-se apropriado a nomeação dos objetos manipulados pelo mediador. Na aprendizagem seguinte, da relação das partes com o todo é aconselhado que a criança com cegueira explore objetos em 3D, que possam ser montados, realize agrupamentos por textura, pois afinando a habilidade de reconhecer e discriminar, desenvolverá estratégias táteis ao encaixe das partes e reconhecimento do todo. Na etapa representação de objetos de duas

dimensões de forma gráfica torna-se relevante que a criança com cegueira manipule

tatilmente objetos que possam ser representados em dimensões distintas, tais como formas geométricas. Também pode ser direcionada a produzir representações gráficas em relevo, pelo uso de punção em papel vegetal ou alumínio, de tal sorte que ao produzir e explorar tais representações a criança com cegueira pode ser motivada a examinar outros recursos. No nível seguinte, o mais elevado de desenvolvimento tátil e cinestésico a criança com cegueira torna-se hábil na discriminação e reconhecimento de símbolos, como o braille.

Na mesma direção Batista (2005) destacou que a percepção tátil não pode ser menosprezada por seu caráter sequencial, porque muitas informações, mesmo visuais – por exemplo, peça teatral – são sequenciais e nem por isso geram perdas e dificuldades para serem compreendidas em sua totalidade.

Em relação ao já versado relativo a cada sistema sensorial viu-se o quanto uma exploração pode forjar-se em mais de uma via sensorial, o que impõe a necessidade de elas serem integradas, pelas particulares e ricas informações que irão, deste modo fornecer, em situações de ensino destinadas a estudantes com cegueira (OCHAITA; ROSA, 1995).

A integração das sensações pode influenciar-se mutuamente ou trabalhar em conjunto. Quanto à influência mutua, recorda-se que alguns cheiros interferem no aumento ou diminuição da sensibilidade sonora, auditiva e gustativa (BARRAGA, 1973, SUTERKO, 1973, LURIA, 1979), daí a importância e a necessidade de se explorar o uso dos sentidos remanescentes da criança com cegueira, pela multisensorialidade, em razão do conhecimento acontecer a partir da integração de todos os sentidos e devido ao mundo, objetos e lugares, não serem compostos por estímulos isolados.

3.2 Seleção, adaptação e/ou confecção de recursos pedagógicos, pelo princípio da