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2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 CORRUPÇÃO: CONCEITOS, ABORDAGENS, CLASSIFICAÇÃO E MENSURAÇÃO

2.1.4 Percepção e Formas de Mensuração da Corrupção

Além da dificuldade em definir corrupção, outro problema inerente ao seu estudo concerne às dificuldades de sua medição, uma vez que os envolvidos não

registram ou divulgam os valores de suborno, de desvios e de outros tipos dessa atividade ilícita. Rose-Ackerman (2002, p. 60) afirma que “não há forma de se medir a gravidade da corrupção. Não existem dados confiáveis sobre a amplitude da corrupção nos países, além de, provavelmente, eles não poderem em princípio existir”. No entanto, ressalta a autora que os empresários são capazes de apontar países nos quais determinadas órgãos de governo são mais sensíveis a corrupção que outros.

A gravidade da corrupção é diretamente influenciada pela integridade dos agentes públicos e dos agentes privados envolvidos no ato de corrupção. No entanto, abstraindo-se desses fatores, a dimensão da corrupção é determinada pelo nível geral de benefícios disponíveis pelos poderes discricionários das autoridades, pelo risco da prática dos atos de corrupção e pelo poder de negociação entre corruptor e corrompido. (ROSE-ACKERMAN, 2002, p. 70).

De acordo com Campos, apesar dos riscos de utilização política ao se usar números relativos a corrupção, existem formas objetivas e subjetivas de se medir corrupção. Aponta o autor que “os instrumentos mais frequentes de medição e avaliação da corrupção são: pesquisas de percepção com aplicação de questionário (medida subjetiva), e os índices construídos com base em rastreamento do gasto público (medida objetiva)” (CAMPOS, 2012, p. 33).

Uma das propostas atuais de mensuração subjetiva da corrupção é a pesquisa de percepção sobre ela, que teve origem nas agências especializadas em analisar os riscos dos investimentos, entre elas: International Country Risk Guide

(ICRG), Economist Intelligence Unit (EIU), Standard and Poors (S&P), Political Risk Service (PRS). Com base nos levantamentos dessas agências, a organização de

combate à corrupção Transparência Internacional elaborou o Índice de Percepção de Corrupção (IPC), que ordena os países do mundo de acordo com o grau em que a corrupção é percebida pelos entrevistados (CAMPOS, 2012, p. 34).

O IPC é um guia de risco dos países, elaborado por empresas de consultoria que analisam os riscos políticos e econômicos por meio de pesquisa junto aos investidores internacionais. O índice seleciona a percepção de corrupção em uma escala de 0 a 10. Quanto maior o índice menor a corrupção, o que vem sendo divulgado, anualmente, pela Transparência Internacional, desde 1995. (CAMPOS, 2012, p. 64).

Apesar de bastante difundido, o IPC da Transparência Internacional tem seus problemas e está sujeito a crítica de especialistas. Nesse sentido, Abramo (2005, p. 34-35) apresenta suas objeções ao índice. A primeira objeção se refere ao fato de que não há garantia de que as opiniões colhidas sejam independentes entre si, o que possibilita até mesmo inclinações ideológicas. A segunda objeção está no fato de haver uma imprecisão estatística dada por uma escala de 0 a 10 com intervalos de confiança que podem chegar a 2, o que gera imprecisão na leitura dos dados. Em terceiro lugar está a ideia de percepção, o fato de os dados de cada país serem escalonados em um ranking. A rigor, se um país melhora na escala, isso pode causar a descida de outro, mesmo havendo a hipótese de a corrupção nesse país não ter sido modificada, apesar de ele descer na escala. A quarta objeção é que a montagem de uma escala não traz uma compreensão mais ampla a respeito dos sistemas de integridade dos diferentes países, muito menos da evolução de um determinado país no tempo. Isso não permite uma comparação entre eles, nem mesmo de boas experiências de controle da corrupção. O autor formula uma última objeção, subsidiária, que estaria na possibilidade de uso inadequado do ranking, como por exemplo para subsidiar a decisão de investir em determinado país.

Avritzer (2012, p. 426-427) também aponta alguns problemas inerentes ao IPC, tais como: a falta de diferenciação entre países que tem instituições democráticas e liberdade de imprensa e aqueles que não possuem; a falta de sensibilidade do índice quanto à influência do combate à corrupção, que a torna mais conhecida; e a falta de variáveis políticas para analisar o fenômeno, dado que o índice expressa uma visão economicista da administração pública.

Silva (2001, p. 124) aponta que o tamanho de um país, medido pela sua população e por suas dimensões geográficas, possui relação com um maior ou menor grau de percepção da corrupção, medido pelos índices. Para ele, quanto maior o país, maior tende a ser a percepção da corrupção. O autor cita cinco grandes países: Estados Unidos, Rússia, Brasil, Índia e China. Destes, apenas os Estados Unidos encontra-se bem posicionado no IPC. No ranking de 2016, os Estados Unidos ocupa o 16º lugar, enquanto Brasil, China e Índia compartilham o 79º e a Rússia figura no 131º lugar.

Como ilustração do IPC, apresenta-se a seguir uma série histórica do IPC, na qual foram selecionados os três países mais bem colocados em cada uma das

cinco regiões do mundo, de acordo com o índice, e mais o Brasil. Trata-se, portanto, dos dados de 16 países, dentre os 176 que compõem a relação completa. De acordo com a tabela 1, observa-se que há uma certa tendência à manutenção da nota no decorrer do tempo.

Tabela 1 – Índice de Percepção de Corrupção da Transparência Internacional

Posição 2016 País Nota 2016 Nota 2015 Nota 2014 Nota 2013 Nota 2012 Região

1 Nova Zelândia 90 88 91 91 90 Ásia Pacífico

1 Dinamarca 90 91 92 91 90 Europa e Ásia Central 3 Finlândia 89 90 89 89 90 Europa e Ásia Central 4 Suécia 88 89 87 89 88 Europa e Ásia Central 7 Cingapura 84 85 84 86 87 Ásia Pacífico

9 Canadá 82 83 81 81 84 Américas

13 Austrália 79 79 80 81 85 Ásia Pacífico 18 Estados Unidos 74 76 74 73 73 Américas 21 Uruguai 71 74 73 73 72 Américas

24 Emirados Árabes 66 70 70 69 68 Oriente Médio e Norte da África 28 Israel 64 61 60 61 60 Oriente Médio e Norte da África 31 Catar 61 71 69 68 68 Oriente Médio e Norte da África 35 Botswana 60 63 63 64 65 África Subsaariana

38 Cabo Verde 59 55 57 58 60 África Subsaariana 50 Mauricio 54 53 54 52 57 África Subsaariana

79 Brasil 40 38 43 42 43 Américas

Fonte: elaborado pelo autor com dados da Transparência Internacional.

Apesar das críticas a respeito do IPC, Speck (2000, p. 23) aponta que o índice foi bem-sucedido na função de chamar a atenção para o tema na agenda política internacional. Para ele, “a ampla divulgação do índice fez dele um instrumento para estimular o debate sobre a corrupção, torná-la um problema e suscitar a busca por medidas para diminuir o seu grau e a sua incidência”. É possível observar que, a cada divulgação anual do IPC, o debate é reaberto na imprensa acerca da posição que o Brasil ocupa.