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Percepção espacial

No documento Estudo biomecânico do ouvido médio (páginas 104-109)

Psicoacústica

3.3 Percepção espacial

O ouvido humano tem a capacidade de ouvir sons complexos de dois modos: analítico, ouvindo as componentes frequenciais isoladamente, e global, sem se aperceber dessas componentes. Na percepção da fala pode acontecer um fenómeno, denominado “efeito cocktail party”, o qual consiste na capacidade de focalizar a audição num comunicador, enquanto decorrem conversações simultâneas, do mesmo nível sonoro, num ambiente reverberante.

O “efeito cocktail party” é extensível a outro tipo de sons e resulta de características inerentes à audição bilateral: diferenças de intensidade e temporais ao nível dos dois ouvidos.

3.3.1 Efeito de máscara

Na audição de dois ou mais sons, simultaneamente, pode acontecer que um deles mascare os outros, fenómeno que se designa por efeito de máscara. Este efeito é a resultante de uma subida do limiar de audibilidade do som que é mascarado. Pode concluir-se que os sons puros, de frequências próximas, mascaram-se mais facilmente do que sons de frequências afastadas; um som puro mascara mais eficazmente sons de alta frequência do que sons de baixa frequência; quanto maior for a intensidade de um som, maior é a gama de frequências que pode mascarar; uma banda estreita de ruído tem uma capacidade de mascarar, idêntica à dos sons puros; quando o som mascarador é um ruído branco, verifica-se uma relação linear entre o nível de intensidade do ruído e o efeito de máscara produzido. O efeito de máscara será reduzido se o tipo de oscilação da membrana basilar, provocado por um som, ficar fora da banda crítica de outros sons em presença [7].

3.3.2 Localização do som

O ouvido humano capta sons vindos de todas as direcções. No entanto, a intensidade com que se ouve não é a mesma em qualquer incidência. Por exemplo, um som vindo do lado direito terá que contornar a cabeça para atingir o ouvido esquerdo. A cabeça é a principal responsável pelas características direccionais do ouvido, por constituir um “obstáculo” à captação do som. Quando se diz que o ouvido tem características direccionais significa que a sua sensibilidade varia com a direcção de incidência do som. Para frequências inferiores a 300 Hz, a sensação de intensidade

não depende da direcção do som. Para frequências mais agudas, todas as direcções em que as ondas têm de contornar a cabeça, provocam uma sensação de intensidade inferior. Para determinar a localização de uma fonte sonora é necessário conhecer a sua direcção, isto é, o seu azimute, a altura e a distância a que se encontra (profundidade) (Figura 3.8).

Figura 3.8: Diagrama com os três parâmetros que permitem a localização de uma fonte sonora.

3.3.3 Binauralidade

Ao processamento do som pelos dois ouvidos chama-se binauralidade. Esta determina a forma como as informações codificadas por um ouvido interagem com as informações codificadas pelo outro ouvido. Se o som incidir rigorosamente na direcção do eixo frontal da cabeça, as ondas sonoras atingirão os dois ouvidos exactamente ao mesmo tempo.

O sistema nervoso humano tem a capacidade de detectar a direcção de incidência do som, através da diferença de percurso das ondas até aos dois ouvidos. Um lapso de tempo de 0,03 ms é suficiente para se detectar uma mudança de direcção do som; este valor corresponde a uma diferença de percurso de 1 cm para cada ouvido, isto é, o ouvido humano consegue reconhecer um desvio de 3º do eixo de incidência frontal [15]. A amplitude deste ângulo pode aumentar, aproximadamente, até 7,5º para outras direcções de incidência.

A percepção da direcção do som deve-se às diferenças detectadas ao nível dos dois ouvidos: diferenças de tempo, de intensidade e de timbre. A conjugação destes três parâmetros permite ao ouvido humano detectar, com certo rigor, diferenças de 3º para ângulos de +/- 45º, relativamente ao eixo frontal e diferenças de 4,5º para ângulos de 45º a 90º [15], [16].

90º 60º Altura 30º 90º 0º Profundidade 75º 15º 60º 45º 30º Azimute

3.3.4 Limiares auditivos

Audibilidade é o estudo de como o ouvido recebe e interpreta as variações da pressão sonora, associadas a variações de frequência. Para que um som se ouça tem de ter uma determinada intensidade mínima, a que se chama limiar de audibilidade. Este limiar é definido, segundo

American National Standards Institute (ANSI), como “O nível mínimo de pressão sonora de um

sinal acústico, que produz sensação auditiva numa percentagem específica de testagem” [11]. Utilizando um gerador de sons sinusoidais, facilmente se verifica que o limiar de audibilidade não é o mesmo para todas as frequências (Figura 3.9). Observando a curva dos limiares verifica- se que se ouve menos bem nas regiões grave e sobreaguda, onde os valores dos limiares de audibilidade são altos; a máxima sensibilidade auditiva situa-se na zona 1kHz-5kHz [17].

-10 0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 110 120 130 140 10 100 1000 10000 100000 Frequência(Hz) Ní ve l pr es sã o s onor a ( dB) Limiar de dor Campo auditivo Música Palavra Limiar de audibilidade

Figura 3.9: Zonas do campo auditivo.

Se a intensidade de um som for aumentada, atinge-se um ponto de intolerância auditiva. Ultrapassado esse limite, o som pode causar dor. Esse valor, que separa o tolerável do intolerável, denomina-se limiar de dor; não é mais do que a intensidade máxima que o ouvido pode tolerar. Tal como o limiar de audibilidade, também o limiar de dor depende da frequência, ainda que em menor grau.

A avaliação auditiva de um indivíduo pode ser feita por métodos subjectivos e objectivos.

O método subjectivo necessita da cooperação do indivíduo a ser testado e é, normalmente, feito através de um audiograma, que é um gráfico que representa a resposta do ouvido humano em função de uma gama de frequências (normalmente entre 128 Hz e 8 kHz) revelando, assim, o nível mínimo de audibilidade de cada ouvido (Figura 3.12, Figura 3.13).

O método objectivo baseia-se nos registos da actividade eléctrica ao longo de toda a via auditiva, desde a cóclea até ao córtex cerebral, sendo de realçar os potenciais evocados auditivos precoces do tronco cerebral - BER - (Figura 3.10-a)) e a electrococleografia – ECOG - (Figura 3.10-b)). O BER permite avaliar a integridade nervosa e a sua sincronia até ao corpo do gânglio geniculado, sendo utilizado, clinicamente, para determinar limiares electrofisiológicos auditivos (por ex. em crianças pequenas que ainda não colaboram na audiometria convencional ou em casos de simuladores) e para despiste de tumores (ex. schwanoma do acústico).

A ECOG regista o potencial de somação (SP) das células ciliadas da cóclea e o potencial de acção (AP) do nervo auditivo, permitindo diagnosticar a hidropisia endolabiríntica (aumento da endolinfa no ouvido interno), nomeadamente a doença de Ménière. Em casos patológicos a relação PS/PA é superior a 37%.

Figura 3.10: Traçados: BER, com evidência das ondas I, III e V, revelando um limiar electrofisiológico de 40 dB (a); Electrococleografia normal, com a indicação de SP e AP.

V III I 100 dB 90 dB 80 dB 60 dB 40 dB 20 dB Latência (ms) 1 6 b) a)

A linguagem é uma actividade adquirida e o estudo do seu desenvolvimento na criança demonstra que essa aquisição se faz progressivamente. A comunicação oral implica a existência de um sistema de produção da fala, mecanismo de propagação do som emitido e sistema de percepção. A máxima sensibilidade do ouvido situa-se na gama de 400 Hz a 4kHz, que corresponde também à gama das principais frequências em que se definem os sons da fala [18]. Em audiologia existem testes de audiometria vocal (Figura 3.11) que avaliam a habilidade de discriminação da palavra, com o objectivo de se determinarem os níveis de intensidade a partir dos quais a fala é ouvida e compreendida.

(%)

(Simbologia: ouvido direito ( o); ouvido esquerdo ( x)).

0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 110 120(dB)

Figura 3.11: Traçados de curvas de inteligibilidade dos dois ouvidos, que permitem verificar a percentagem de palavras ditas correctamente, para determinados níveis de intensidade.

No documento Estudo biomecânico do ouvido médio (páginas 104-109)

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