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PERCEPÇÃO DOS PROFESSORES DE ESTUDANTES COM PARALISIA CEREBRAL SOBRE A COMUNICAÇÃO NO CONTEXTO ESCOLAR Camila

Boarini dos Santos; Debora Hassuo; Aila Narene Dahwache Criado Rocha; Rita de

Cássia Tibério Araújo UNESP/Marília Introdução

Ocorrendo na infância, a Paralisia Cerebral (PC) pode ser definida como uma desordem cerebral durante o desenvolvimento fetal ou por conta de uma lesão cerebral perinatal ou pós-natal (EVARISTO; ALMEIDA, 2016). As limitações e incapacidades da criança com PC poderão ocasionar um atraso significativo em seu desenvolvimento motor, sensorial, perceptivo-cognitivo e na sua linguagem, interferindo no desempenho de atividades como marcha, escrita, brincar, além de poderem limitar a participação dessas crianças em diferentes ambientes, incluindo o escolar (EVARISTO; ALMEIDA, 2016).

Pelo menos cerca da metade das crianças com PC tem alguma alteração oromotora que traz prejuízos a fala, sendo que as alterações físicas de postura, respiração e fala, implicam na dificuldade da articulação das palavras (BALTOR; BORGES; DUPAS, 2014), portanto as barreiras para o processo de comunicação podem ser observadas quando o indivíduo não apresenta a possibilidade de utilizar a linguagem oral para manifestar seus desejos, sentimentos e necessidades, mesmo tendo a compreensão preservada (SAMESHIMA; DELIBERATO, 2009).

Além da comunicação, a PC pode resultar em dificuldades e limitações na realização de atividades e tarefas do cotidiano, como auto-cuidado, mobilidade e atividades de características sociais e cognitivas, que incluem a participação na escola (MANCINI et al., 2002).

A Tecnologia Assistiva (TA) é uma área do conhecimento, de característica interdisciplinar, que engloba produtos, recursos, metodologias, estratégias, práticas e serviços que objetivam promover a funcionalidade, relacionada à atividade e participação, de pessoas com deficiência, incapacidades ou mobilidade reduzida,

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visando sua autonomia, independência, qualidade de vida e inclusão social (BRASIL, 2006).

A Comunicação Suplementar e Alternativa (CSA) é um dos recursos de TA, sendo a comunicação alternativa qualquer meio de comunicação que suplemente ou substitua os modos habituais de fala e escrita, que estejam comprometidos, tendo como objetivo utilizar estratégias e técnicas para proporcionar independência ao indivíduo no contexto social que está inserido, como escola e trabalho por exemplo (ROCHA et al., 2015).

O uso da CSA possibilita não só a comunicação, mas também promove a iniciativa, a interação com diferentes interlocutores em diferentes contextos, possibilitando melhora da qualidade de vida, autonomia e meios para expressar-se.

A relevância deste estudo se justificativa pela necessidade de compreender a comunicação dos estudantes com PC no contexto escolar, facilitando aos que não apresentam a oralidade outros modos de se expressar e comunicar, sendo essa identificação necessária para facilitar as trocas comunicativas.

Objetivo

Este estudo teve como objetivo identificar os recursos de CSA utilizados no contexto escolar, com estudantes diagnosticados com PC que estão inseridos em uma rede municipal de ensino.

Material e método

Aspectos éticos

Está pesquisa faz parte de um projeto de pesquisa maior que foi submetido à avaliação pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Filosofia e Ciências da UNESP – Campus de Marília/SP, respeitando as prerrogativas da resolução 196/96 do CONEP que versa sobre ética em pesquisa com seres humanos, tendo recebido parecer favorável, sob o protocolo nº 0841/2013.

344 Participantes da pesquisa

Participaram deste trabalho 26 estudantes com diagnostico de PC inseridos em salas de aulas comuns de um município do interior do estado de São Paulo, bem como os seus professores. A coleta de dados foi realizada em escolas municipais de um município do interior de São Paulo.

Materiais e registro

Foram utilizados na pesquisa os seguintes materiais: gravador digital, caderno de registros e o protocolo de entrevista intitulado “Protocolo de Triagem para o trabalho colaborativo entre saúde e educação” (ROCHA; SANTOS; MARQUES, 2016). Para viabilizar os objetivos almejados foram utilizadas três formas de registro: gravação em áudio, registro de campo e anotações no “Protocolo de Triagem para o trabalho colaborativo entre saúde e educação”.

Procedimentos de coleta de dados

A coleta de dados ocorreu nos meses de abril, maio e junho de 2014. Foi elaborado um roteiro de entrevista intitulado “Protocolo de triagem para o trabalho colaborativo entre saúde e educação” a fim de caracterizar o estudante e o contexto escolar no qual está inserido. Para este estudo foram analisados os dados referentes a comunicação no contexto escolar. Em relação a comunicação o protocolo engloba três questões com os seguintes conteúdos: 1) como é a comunicação do seu aluno ?; 2) você acha que ele compreende?; e 3) você acha que ele consegue se expressar? Como?

Viabilizando a caracterização dos estudantes foram realizadas três diferentes classificações, sendo elas: o Sistema de Classificação da Função Motora Grossa (GMFCS), o Sistema de Classificação da Habilidade Manual (MACS) e o Sistema de Classificação da Função de Comunicação (CFCS).

Para a operacionalização da coleta de dados foi realizado contato com a secretária de educação após autorização da pesquisa foi fornecido uma lista com os dados das crianças com deficiência física matriculadas nas escolas municipais. A etapa seguinte consistiu na realização do contato com as escolas e agendado visitas para a

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coleta de dados respeitando o horário e disponibilidade dos profissionais. A coleta de dados foi realizada com os professores por meio de entrevista semiestruturada para o preenchimento do Protocolo de triagem para o trabalho colaborativo entre saúde e educação e também pela observação do estudante durante as atividades escolares. Foi realizado entre uma a três visitas nas escolas, conforme necessidade e disponibilidade dos profissionais e estudantes.

Análise dos dados

O procedimento de análise envolveu a organização dos dados coletados por meio do protocolo e observação do estudante registrado em registro de campo em tabelas do Microsoft Word e posteriormente Microsoft Excel. Após a organização dos dados foi realizada a análise descritiva de seu conteúdo.

Resultados e discussão

Os resultados do estudo serão apresentados seguindo a organização pelos seguintes temas: caracterização dos participantes; classificação no GMFCS, MACS e CFCS; tipos de comunicação e recursos de tecnologia assistiva oferecidos pelas escolas.

Caracterização dos participantes

Gráfico 1- Idade dos estudantes com deficiência física de escolas municipais

Os resultados apresentados no gráfico 1 demonstram que a maior parte das crianças matriculadas escolas regulares estão na faixa etária entre 2 a 7 anos, sendo um

0 1 2 3 4 5 6 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 IDADE

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indicativo positivo de que realmente os estudantes com PC estão sendo matriculados em escolas cada vez mais cedo, assim como dispões a legislação da área (ROCHA et al., 2015).

Dos 26 estudantes que participaram deste estudo, 15 são do sexo masculino e 11 do sexo feminino.

Em relação ao diagnóstico todos os estudantes que frequentam as escolas municipais apresentam o diagnóstico médico de PC.

As classificações identificaram que a 53,84% dos estudantes estão classificados entre os níveis III, IV e V do GMFCS, 70,58% no MACS e 57,69% no CFCS, o que identifica uma maior necessidade de uso de algum dispositivo que facilite o cotidiano, como apresentado no Gráfico 3.

Gráfico 3- Classificação GMFCS, MACS e CFCS

O Sistema de Classificação da Função Motora Grossa (GMFCS) para Paralisia Cerebral é baseado no movimento iniciado voluntariamente, como no sentar, na mobilidade e transferência. O GMFCS é dividido em cinco níveis de distinções e são baseados nas limitações funcionais, na necessidade de recursos de TA para se locomover, e em menor grau, na qualidade do movimento (PALISANO et al., 1997). Pode-se identificar neste estudo que 14 dos 26 estudantes estão classificados entre os

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Nível I Nível II Nível III Nível IV Nível V

GMFCS MACS CFCS

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níveis III, VI e V, o que sugere que necessitam de algum dispositivo manual para mobilidade.

O Sistema de Classificação da Habilidade Manual (MACS) também possui cinco níveis em sua classificação e é utilizado para descrever como crianças com PC utilizam suas mãos para manipular objetos relevantes e apropriados a sua idade em atividades diárias, como brincar, lazer, comer e vestir-se. O que difere de um nível ao outro é o modo de iniciar sozinha essa manipulação de objetos e a necessidade de assistência ou adaptação. É utilizado em crianças e adolescente na faixa etária de quatro a dezoito anos de idade, sendo organizadas as escalas de modo decrescente a funcionalidade e independência. No Nível I encontram-se as crianças com pequenas limitações, já no Nível III, IV e V a criança com limitações funcionais mais graves necessita de assistência continua ou total (ELIASSON et al., 2006). No estudo identificou-se que 12 estudantes foram classificados entre os níveis III, IV e V, ou seja, necessitam de assistência para a manipulação dos objetos durante as atividades realizadas no contexto escolar. É preciso lembrar que nesta classificação, apenas 17 participantes puderam ser classificados, pois o instrumento classifica apenas crianças a partir de 4 anos de idade.

O Sistema de Classificação da Função de Comunicação (CFCS) também é dividido em cinco níveis e tem como objetivo classificar a comunicação diária de indivíduos com PC. A CFCS inclui todas as formas de comunicação, como: olhar fixo, gestos, comportamentos, uso de CAA, expressões faciais, fala, sendo a distinção de um nível ou outro, baseados no desempenho de funções como emissor e receptor, no ritmo da comunicação e no tipo de parceiro na conversação (HIDECKER, 2011). Pode-se identificar nesta classificação, que 15 estudantes se encontram entre o nível III, IV e V, ou seja, apresentam necessidades complexas de comunicação e dificuldades em desempenhar seu papel de emissor e receptor, necessitando de comunicação suplementar e alternativa para que seja eficaz. O gráfico 4 identifica o tipo de comunicação utilizada pelos estudantes segundo os professores.

348 Gráfico 4- Tipos de Comunicação

É possível identificar no gráfico 4 que apenas 11 estudantes dos 26 deste estudo se comunicam por meio da fala e que apenas 1 estudante utiliza prancha de CSA. Este dado juntamente com a classificação CFCS, sinaliza que apesar do estudante com PC estar inserido na sala de aula de ensino comum, o ambiente não se encontra acessível para que o mesmo se comunique e expresse seus desejos, opiniões e sentimentos, restringindo seus parceiros de comunicação, sua interação no ambiente escolar e consequentemente limitando sua autonomia.

Através da fala podemos manifestar várias sensações, sentimentos, troca de informações, porém a comunicação entre as pessoas não se restringe somente a ela, sendo que pode ser bem mais abrangente e utilizando também recursos não-verbais na interação pessoal, que permitem compreender e ser compreendido e que se misturam e se completam, como uso de expressões faciais e gestos (BRASIL, 2006).

Em relação ao uso de recursos de Tecnologia Assistiva para a comunicação, apenas 1 estudante utiliza a prancha de comunicação alternativa, o que nos remete a pensar se os profissionais que estão atuando com estes estudantes não falantes, tem conhecimentos sobre a existência e uso dos recursos de CSA e como os mesmo tem feito para entender seus estudantes e deixar que se expressem.

As escolas muitas vezes carecem de recursos e materiais para uso e a falta de capacitação para os profissionais que atuam com o estudante com PC, acaba

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Tipos de Comunicação

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dificultando a confecção e a implementação da CSA na rotina escolar. Em uma escola inclusiva o estudante com PC deve participar das atividades propostas aos demais estudantes e os professores devem realizar desafios diários para que os mesmos possam vivenciar, experimentar e aprender, não ficando marginalizados e excluídos das atividades escolares. Não se deve esquecer que esse estudante deve ser respeitado em relação a várias questões, como tempo de resposta, gostos, desejos, limitações e necessidades. O ambiente e os recursos utilizados para aprendizagem devem ser adequados e adaptados para contemplar e beneficiar o maior número de indivíduos que estes fazem parte. Lembrando que estes indivíduos fazem parte de uma sociedade e devem participar sobre os acontecimentos que nela ocorre. O convívio social é de extrema importância para o entendimento e aprendizado de conceitos de qualquer criança.

Portanto, o trabalho colaborativo entre saúde e educação, permite que o Terapeuta Ocupacional atue no contexto escolar, sendo seu papel de fundamental importância, para que se seja traçado estratégias através da observação dos profissionais do ambiente escolar sobre as potencialidades e as limitações desses estudantes com PC, visando potencializar a sua participação nas atividades escolares através da CSA, proporcionando autonomia, interação social e melhora na qualidade de vida, visto que a partir dela, o estudante conseguirá expressar-se com diversos parceiros comunicativos, sendo o principal objetivo, a inserção e participação deste estudante nas atividades.

Conclusões

Pode-se concluir que o uso dos recursos de CSA podem facilitar a autonomia, independência e a qualidade de vida de estudantes com PC inseridos no contexto escolar, porém nota-se a carência devido às limitações apresentadas na rotina e a falta de profissionais capacitados para auxiliar e promover o uso.

Nota-se ainda que o uso de outros modos de comunicação, como o uso de gestos, por exemplo, aparece em maior número que o da fala, o que demonstra as diversas maneiras que um estudante com PC utiliza para se comunicar e expressar pensamentos, com seus professores, colegas de sala, outros profissionais envolvidos no

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contexto escolar, seus familiares e na comunidade, porém, este meio de comunicação, não garante que todos os parceiros comunicativos conhecidos ou desconhecidos deste estudante consigam compreender o que está sendo transmitido, tornando-o um emissor pouco eficaz.

Portanto sugere-se com este estudo que se invista em cursos de capacitação para os profissionais envolvidos com o estudante com PC, visto que irá proporcionar a facilitação da identificação de outros modos de comunicação, além da fala e a necessidade especifica de cada estudante para uso de recursos de CSA, possibilitando a ampliação da comunicação e tornando as trocas comunicativas mais eficazes.

Referências

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PRIMEIRAS TENTATIVAS DE COMUNICAÇÃO COM UM SUJEITO COM

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