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O livre arbítrio, essa consciente aceitação ou repúdio de artigos de fé e de orientação de vida - incomensurável riqueza da condição humana -, foi, à partida, negado a Virginia

Stephen/Woolf. Ela não pôde lutar com o anjo, como Jacob, pois o seu universo nunca teve anjos, nem alguém alguma vez lhe disse da sua existência. E uma imagem metafórica, esta, mas não deixa de ser bem demonstrativa do verdadeiro vazio espiritual em que a pequena Virginia cresceu e se tornou adulta. Esse vazio muitas vezes lhe foi pesado ao longo da vida, como aquando do funeral da sua amiga Jane Harrison, em que registou no Diário: "but as usual the obstacle of not believing dulled & bothered me" (D III 181). Não lhe foi dado escolher. E muitas das suas perturbações mentais e de inconformidade com a vida e com os golpes do destino não foram mais do que impreparação psicológica, desajuste de um ser pensante à realidade incompleta e insatisfatória que lhe é dado conhecer. Educada em casa, por um pai consciente e apostolicamente agnóstico e por uma mãe cuja elevação moral não ultrapassava o filantropismo, com livre acesso apenas a uma biblioteca marcada pelas convicções parentais, protegida ciosamente de influências externas ou da acção de alguma espécie de bem intencionado "anjo da guarda", nunca a extra-sensível jovem ou a ainda mais sensível mulher, em cujo espírito morava a poesia e o sentido do belo e da perfeição, pôde valer-se de mais potente auxílio do que a sua própria escrita ou as ligações mais ou menos passageiras a outros seres sensíveis em quem procurava complementos para a sua insatisfação e incompletude. Nestas ligações não se deve considerar o casamento, já que este não foi mais do que o assegurar da continuidade da lei dos deuses parentais, talvez melhor, do deus paternal, a única que lhe foi transmitida por herança.

As ligações familiares a que se apegou a pequena Virginia começaram, naturalmente, pela mãe, personagem que tem sido apreciada de formas muito diversas pelos biógrafos e pela crítica. Durante a sua vida, terminada prematuramente aos quarenta e nove anos, ela foi, geralmente, venerada por todos. Desde muito jovem, a sua extraordinária beleza e a sua doçura atraíam os pretendentes e os artistas; como lembraria mais tarde Leslie Stephen, "as she grew up she was admired by all who had eyes to see" (MB 28). O seu casamento com Herbert Duckworth foi curto e intensamente feliz; a tal ponto que o brusco desaparecimento do seu adorado marido, deixando-a "numbed and petrified by her grief (MB 47), a fez, literalmente, perder a felicidade deste mundo e do outro: Julia perdeu a fé para sempre. Como substituto da religião que renegou, atribuiu-se a obrigação do serviço dos necessitados, a eles passando a dedicar o melhor da sua atenção e cuidados. O segundo casamento, com o viúvo Leslie Stephen, abandonado de irmã e cunhada, com quem se incompatibilizara, tendo a cargo uma filhinha cuja saúde mental começava a inspirar dúvidas, enquadrou-se perfeitamente no seguimento dos seus planos filantrópicos. Se chegou a haver amor ou não, se tudo não passou de um requinte de negação do paraíso, de um empenhamento no altruísmo e no auto-sacrifício, isso nunca poderá ser determinado com presunção de total indefectibilidade.

O carácter de Julia Jackson, que veio a ser Julia Duckworth, e depois Julia Stephen, nunca foi fácil de catalogar com um ou dois adjectivos: Bela, sempre, como as santas e as madonnas, como a Virgem da Anunciação, imortalizada no quadro de Burne-Jones!119 Mas melancólica,

também, por vezes amarga e excessivamente séria, acusando nos últimos anos de vida o cansaço e o esgotamento de quem não dava tréguas a si própria: o cabelo já grisalho, a lassidão dos olhos, o queixo mais saliente, o curvado das costas, foram sendo notados por alguns, como o amigo e

O relacionamento com o pintor veio através dos Prinsep, como nos diz Leslie Stephen no Mausoleum Book, p.29: "The Princeps took Burne-Jones into their house, when he was very ill and as yet poor and unknown. Julia always said that they saved his life; and he had always shown becoming gratitude." O quadro em questão, de 1879, faz parte da colecção dos National Museums and Galleries on Merseyside. (cf. Gillespie & Steele, eds., p. 18).

hóspede do casal, o artista William Rothenstein, que disso deixou testemunho num retrato de 1890, para desagrado dos seus anfitriões.120 Boa, caritativa, doce, angélica! Epítetos que ocorriam aos lábios de amigos e conhecidos para a descreverem. Com justiça, pois não houve quem mais se dedicasse aos outros, quem mais se entregasse a obras de caridade, quem assim falasse sem nunca se exaltar e sempre com propriedade, quem fosse a mais completa encarnação do anjo do lar. Mas também severa e, com frequência, excessivamente exigente para com os filhos, sobretudo as filhas, sobretudo Stella, a quem considerava como que uma continuação de si própria.121 Dedicada, amorosa e amorável! Sim. Ninguém poderia questionar estas qualidades, e ninguém o fez, embora espíritos mais argutos e observadores, como o do escritor Henry James, pudessem detectar o gélido do mármore na estátua da santa.122 As crianças também tinham a mesma percepção pois, venerando-a embora como ao Deus dispensador de todos os bens de que tanto careciam, sentiam-na - como tantas vezes se sente Deus! - demasiado longe, demasiado inacessível para lhes valer eficazmente. O apego que lhe tinham era o apego que se tem àqueles entes queridos, sobretudo mãe e pai, que nunca chegam a ser verdadeiramente nossos, que, na infância, temos sempre o receio de ver fugir ao mais pequeno desagrado, ou, apenas por capricho, inexplicavelmente, desvanecer-se de súbito como o fumo, desaparecer inexoravelmente da nossa vida. Porque Julia, realmente, não aparecia muito e, quando o fazia, quase nunca era para louvar ou acariciar, muito menos escutar. Como Virginia recordará mais tarde para os seus amigos de Bloomsbury, "she was living on such an extended surface that she had not time, nor strength, to concentrate, except for a moment if one were ill or in some child's crisis . . . Can I remember ever being alone with her for more than a few minutes? Someone was always interrupting" (MOB 83).

120 Cf. Diane F. Gillespie & Elizabeth Steele, editors: Julia Duckworth Stephen, Stories for Children, Essays for

Adults, Syracuse, N.Y., Syracuse University Press, 1987, p. xv-xvi; reprodução p.24.

121 Como, por exemplo, Peter Dally comenta: "She was a strict disciplinarian with her daughters, particularly the

eldest, Stella, whom she treated with 'the severity with which she should have treated her own failings'"(21). A citação é de Leslie Stephen no Mausoleum Book.

122 Cf. Mitchell Leaska. Granite and Rainbow, p. 41: "Henry James acknowledged Julia's beautiful face and head,

but confessed that to the 'outside world' that was her 'main interest' {Henry James Letters, Vol. II [January 4, 1879], ed. Leon Edel, Cambridge, Mass., Harvard University Press, 1975, 209).

Por isso um simples olhar de aprovação da sua parte era mais apreciado pelos filhos do que cornocópia de ouro em terra de pobres. "How excited I used to be" diz ainda Virginia, "when the 'Hyde Park Gate News' was laid on her plate on Monday morning, and she liked something I had written!" Com que ansiedade, o espiar da reacção materna: um olhar de desagrado seria a condenação; mas o mero acolhimento e leitura era, por si só, o cúmulo da felicidade! O veredicto era recebido e aceite como se divino fosse.

Não se ficava pelas crianças a corte de adoração: para o marido, Leslie, ela foi, desde sempre, a santa única e trina de sua reverência: santa veneranda no inacessível empório celeste, santa no plano terreno e social, santa no carinho do lar. Assim a considerou desde as cartas de namoro, quando lhe dizia: "You see, I have not got any Saints and you must not be angry if I put you in the place where my Saints ought to be"123, até aos momentos chorosos da viuvez, em que registou no Mausoleum Book, depois de citar, precisamente, a carta em que lhe chamara santa: "She was for very sound reasons a better saint for me than the blessed Virgin" (MB 53). O reverso da medalha, porém, é que, como pensa Ellen Bayuk Rosenman, "[t]he iconic quality of the mother is precisely what distances her from her daughter" e " the specific conditions of Julia's sainthood involved neglecting her daughter Virginia in favor of other claims".124 O que Leslie era para Julia, para além de um objecto de veneração (embora, neste caso, mais de escravatura do que de adoração), não é muito fácil garantir. A primeira atracção parece ter sido a nível intelectual: com efeito, na sua zanga com Deus, após ter-se juntado às fileiras de Lúcifer aparentemente sem outro motivo senão o seu coração ferido, foi grato a Julia constatar que alguém do seu círculo de conhecidos, para mais uma figura conceituada intelectualmente como Leslie Stephen, expressava as suas ideias de agnóstico de uma forma tão em consonância com o seu próprio pensar. Como frisa Mitchell Leaska, "it was perhaps Leslie's agnosticism that made him now seem

123 Carta a Mia Duckworth, 8 de Agosto de 1877, citada em M. Leaska Granite and Rainbow, p.38. 124 The Invisible Presence, p. 103.

approachable" (ML 28). Esta circunstância era-lhe tanto mais cara quanto os seus próprios pais insistiam em tentar reaproximá-la da religião. Segundo informa Diane Gillespie, "Julia's parents, especially her mother, seem to have tried [to confort her], in part by giving her books expressing conventional sentiments about woman's role and religion."125 Por outro lado, a situação de viúvo desamparado, vivendo a dois passos da sua casa, convidava a exercer a sua inclinação para o altruisme Além destas razões, Leaska que, na realidade, não parece apreciar sobremaneira a mãe de Virginia, considera que, a quantos atractivos pudesse ter para Julia a ideia de um casamento com Leslie, uma das mais importantes foi certamente a vontade do poder, do domínio que isso implicaria: "- the beautiful young widow with her great old bearded intellectual under her wing. What a colossal sacrifice, people would say! Was there anyone more charitable, more suited to the task? All this, of course, meant control. It meant power. And Julia loved both" (ML 39). A verdade é que a própria filha, embora ainda mal saída da infância quando Julia morreu, abriu as portas para esta interpretação com o retrato que fez da mãe em To the Lighthouse. Até o conto que Mrs. Ramsay lê ao filho, "O Pescador e a sua Mulher", fala de uma mulher que manda na família, que tem o poder de dar ordens e o exerce.

Foi esta figura maternal, demasiado boa para os outros para ser boa para os filhos, que exerceu as primeiras - sempre as mais perduráveis - influências no espírito da pequena Virginia. A tal ponto que ela sentiu o mundo ruir debaixo dos pés quando a mãe morreu, e teria querido segui-la no túmulo. Ajudaram-na, nessa altura, as duas mães de substituição caseiras, que já suplementavam Julia nos cuidados com as crianças: Stella Duckworth, a meia-irmã, que haveria de falecer poucos anos mais tarde, em plena lua de mel; e Vanessa, a querida irmã mais velha, muito possivelmente a pessoa que Virginia mais persistentemente amou durante toda a sua vida. Nigel Nicolson diz, na introdução ao segundo volume de cartas de Virginia Woolf (Stephen):

125 "The Elusive Mia Stephen". Julia Duckworth Stephen, Stories for Children, Essays for Adults, Syracuse,

"She [Vanessa] was more than a sister. She was a mother too. There are scattered phrases in Virginia's letters to her which would fascinate a psychologist: 'Why did you bring me into the world?' (1169); and elsewhere (1000) she describes herself as Vanessa's 'first-born'" (LII xxi)126

Mais tarde, uma outra figura maternal de grande influência surgiu na vida de Virginia: Violet Dickinson, que fora amiga de Stella, deu à jovem algum do carinho de que ela tanto necessitava, e uma amizade muito especial foi crescendo entre as duas. Na época tão difícil anterior ao falecimento de Leslie Stephen, a correspondência aturada com esta mãe adoptiva foi um amparo e um lenitivo. E, quando a morte do pai reavivou os demónios da loucura que a queriam perder, foi ela que a protegeu e ajudou a recuperar a saúde. Durante o tempo de mais intimidade com Violet, a figura de Deus e a ideia de Deus passaram a não ser tão longínquas, tão risíveis e tão absurdas como o silêncio e o ostracismo parentais as tinham mantido até aí. É de salientar que, no lar dos Stephen, os filhos foram criados como pequenos pagãos de uma época anterior a qualquer tipo de evangelização, o que originava, por vezes, situações embaraçosas, como a que nos conta Quentin Bell: "the music mistress, Miss Mills, a well-known practitioner of the tonic sol-fa system, was intensely religious; in answer to a question about the meaning of Christmas, Virginia replied that it was to celebrate the Crucifixion, and then exploded in such peals of laughter that she had to be removed from the room" (QB I 27). Vanessa recorda, também, uma anedota dos tempos de aprendizagem, uma das poucas circunstâncias em que as duas crianças do sexo feminino foram dotadas de uma professora.127 É evidente que o convívio

com outras crianças, geralmente educadas na religião oficial inglesa ou qualquer outra denominação cristã, haveria de proporcionar muitas situações de conflito a nível religioso e, de consequências mais profundas ainda, muita questionação da parte das pequenas ateias. O

126 The Question of Things Happening:The Letters of Virginia Woolf Volume II: 1912-1922, edited by Nigel

Nicolson, assistant editor Joanne Trautmann, London, The Hogarth Press, 1976.

127 Cf. Vanessa Bell "Notes on Virginia's Childhood", A Bloomsbury Group Reader, ed. S.P. Rosenbaum, p. 334.

Vanessa conta que, quando uma professora perguntou o significado de "Good Friday", "Virginia began to giggle. Of course we hadn't the slightest idea, being little heathens."

problema foi antecipado e prevenido pela leccionação em casa, que os progenitores ministravam: o pai ensinava a matemática, e a mãe encarregava-se do latim, da história e do francês. Também neste particular, as recordações do convívio (obrigatório) com os pais, sobretudo com a mãe, não deixaram boas recordações.

Depois do casamento, o principal, quase exclusivo, anjo tutelar de Virginia foi o marido, que desempenhou o compósito e complicado papel de pai, mãe, irmão, enfermeiro, guardião e, em certa medida, amante também. Este campo é um daqueles em que mais difícil se torna perspectivar a realidade, sobretudo porque os indícios exteriores não são muitos e, mesmo esses, são extraordinariamente contraditórios. Assim, as opiniões que os biógrafos da escritora têm manifestado a este respeito variam imenso e são muitas vezes totalmente opostas entre si: Leonard Woolf passa facilmente de mártir e salvador de Virginia para seu carrasco e de influência nociva. A vida externa ficou registada em diários e cartas (e ambos foram muito prolíficos a esse respeito), mas o que ia no íntimo do coração não pode ser adivinhado. Pois se cada qual não consegue conhecer-se a si próprio, nem, muitas vezes, as motivações das suas acções e atitudes, fútil seria ter a presunção de trespassar as palavras, as velhas e mortas palavras escritas, para chegar às suas raízes e desvendar os seus segredos escondidos.

As pesquisas continuarão, as leituras sob os mais diversos ângulos, escolas e métodos apresentarão interpretações mais ou menos possíveis, mais ou menos verosímeis, certamente algumas curiosas ou sensacionais, mas a verdade indiscutível manter-se-á inatingível. Tudo não passará de hipóteses, e o mérito maior será para quem puder tornar a sua hipótese mais defensável, dentro das interrogações e condicionalismos do material existente para estudo. Não se pode, sequer, exigir a hipótese mais verosímil, pois essa não seria, certamente, a mais verdadeira. Aliás, a própria época histórica em que viveu Virginia Woolf, a sociedade em que se moveu, as

pessoas que conheceu e com quem se relacionou e, particularmente, o seu grupo de amigos mais chegados, e, entre esses, os mais íntimos, todos estavam longe de serem verosímeis.

Há, ainda, que mencionar um relacionamento privilegiado de Woolf, quando ela já perdera o verdor da juventude mas conservava ainda a virginal capacidade do encantamento: depois dos quarenta anos, para continuar "the pattern of romantic, maternal figures to whom Virginia turned for affection in her youth",128 a primavera surgiu com Vita Sackville-West, a. protectora de larga

e ardente experiência, quinze anos mais nova!129 Foi uma época feliz, para Virginia, em que

certamente experimentou sensações até então desconhecidas, e pôde resolver satisfatoriamente problemas que a perturbavam desde a adolescência, desligando-se de fantasmas que desde sempre a acompanhavam e, volta e meia, ameaçavam desestabilizar a sua integridade mental. Com Vita, havia uma religiosidade natural, que não era propriamente a filiação numa qualquer igreja, mas antes uma comunhão com os valores ancestrais da terra, a que sempre foi fiel. Para a situação a- religiosa de Virginia, esta religiosidade era já muito, e não deixou de ter nela uma influência favorável.

No campo das amizades femininas poder-se-á ainda falar de várias outras "inclinações", apenas "penchants" passageiros, sem consequência de maior: é o caso de Madge Vaughan (Symonds), que serviu de modelo para Sally Seton, em Mrs. Dalloway (assim como Kitty Maxse serviu de modelo para Clarissa)130 ; ou de Ka (Katherine) Cox, que ajudou a tratar de Virginia

durante a severa e prolongada crise de 1913. Também Ethel Smythe, compositora, escritora e

128 Joanne Trautmann Banks expõe esta opinião na introdução a Congenial Spirits: The Selected Letters of

Virginia Woolf, San Diego, Harcourt Brace Jovanovich, 1989, xii.

129 Virginia e Vita encontraram-se pela primeira vez num jantar em casa de Clive Bell, a 14 de Dezembro de

1922. A sua ligação mais íntima foi acontecendo no decorrer de 1923, mas, mesmo depois de a atracção física ir esmorecendo, a amizade perdurou durante toda a vida.

130 A respeito de Madge lembra Virginia Woolf em 1921 : "And this was the woman I adored! I see myself now

standing in the might nursery at Hyde Park Gate, washing my hands, and saying to myself 'At this moment she is actually under this roof." (DII122). A escritora aproveitaria esta experiência para a introduzir em Mrs. Dalloway, quando Clarissa recorda o amor que consagrou a Sally Seton. (p. 39). Sobre Kitty Maxse, filha da maior amiga de Julia Stephen, diz John W. Bicknell que ela : "was to some extent the model for Virginia Woolf s Mrs. Dalloway"; mas, também, que "Kitty and Leo [o marido] were the models for Paul Rayley and Minta Doyle in To the

Lighthouse (Selected Letters of Leslie Stephen, Volume 2, p. 346n e p. 476n)

feminista já na casa dos setenta na década de 1930, merece um lugar de destaque entre as amigas de Woolf, não só pelo amor que lhe dedicou como, sobretudo, pelas cartas de que foi destinatária, onde se encontra muito de desabafo autobiográfico. Por exemplo, pela carta de 27 de Fevereiro de 1930, escrita quando Virginia se encontrava de cama, percebe-se como ela compreendia quanto de hereditário havia na fragilidade da sua saúde em geral e do seu sistema nervoso em particular:

this influenza has a special poison for what is called the nervous system; and mine being a second hand one, used by my father and his father to dictate dispatches and write books with - how I wish they had hunted and fished instead! . . . To think that my father's philosophy and the Dictionary of National Biography cost me this! I never see those 68 black books without cursing them for all the jaunts they've lost me. (CS 262)

Mas, se existem confidências, recordações, afirmação de opiniões, políticas e não só, à mistura com as habituais bisbilhotices sociais de todas as cartas entre amigas, não se encontra nestas qualquer referência amistosa ou saudosista a uma entidade transcendente e poderosa, cujos favores se solicitam, como nos velhos tempos da correspondência com Violet Dickinson.

A única figura amiga que poderia ter tido razoável influência junto de Virginia a favor da sua integração numa religião institucionalizada e, mais, muito próxima da religião tradicional da família, teria sido a tia paterna, Caroline Emilia Stephen, uma Quaker convicta e apostólica, de