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3. A escola hoje

3.1. O perfil do aluno

Neste capítulo referimo-nos a alunos entre os 14 e os 18 anos, idades dos alunos da amostra do estudo. O conhecimento de cada uma das etapas do desenvolvimento psicológico, intelectual e social em que o aluno se encontra assume uma importância relevante na acção do professor já que lhe permite compreender a razão das diferenças de atitudes e de comportamentos dos jovens. Compreensão essa que, naturalmente, facilitará a escolha dos métodos, das estratégias, das actividades e dos meios que melhor podem contribuir para o desenvolvimento e formação do aluno. Este item, por incidir em alunos com idades compreendidas entre os 14 e os 18 anos, incidirá sobre a adolescência. Esta fase assinala o início de um período de aceleração na velocidade de crescimento em que o corpo sofre profundas alterações. Distingue-se os estádios de pré-puberdade e de puberdade. Esta distinção atribui-se a todo o comportamento juvenil inerente às invariantes fásicas. Sem o conhecimento destas invariantes fásicas não é possível facultar uma orientação pedagógica eficiente. Isto significa para a pré-puberdade (primeiro período de maturação) uma tarefa de

empenho determinada pela vivência de valores. Na avaliação das actuações próprias e alheias o jovem é ainda dependente de exemplos e modelos concretos. Na puberdade, período de maturação posterior, o adolescente busca autonomamente valores que integra na sua vida de modo absoluto, como fundamento vital.

No âmbito da orientação pedagógica o problema da juventude apresenta-se de tal modo que a relação entre as invariantes fásicas psicológicas e as variantes sociológicas devem estar sujeitas a constante e renovada investigação. Os resultados e as teorias quer psicológicas quer sociológicas devem propor formas para a pedagogia. Se a educação é o processo que deve ajudar o indivíduo a alcançar a autonomia responsável no seio da sociedade, é fundamental que se considere os dados quer psíquicos quer sociais.

Qualquer tarefa deve respeitar sempre a capacidade intelectual do jovem e as diferentes fases de desenvolvimento em que este se encontra. Para tal, Piaget distingue cinco fases de desenvolvimento da formação lógica da criança. Estes estádios não se adaptam de uma forma rígida a uma faixa cronológica, mas são considerados universais e invariáveis. Em termos pedagógicos temos alunos na mesma turma, com a mesma idade, mas em diferentes fases de desenvolvimento pelo que é importante respeitar a individualidade de cada um o que não obsta a que todos os alunos vivenciem a autonomia pois só assim é possível interiorizá-la. As aprendizagens só fazem sentido se passarem a fazer parte do quotidiano dos alunos, se estes as integrarem noutros contextos como na família, no trabalho, no lazer etc, porque

“se não existir um contexto onde seja dado à criança oportunidade, recursos e encorajamento para exercitar e desenvolver as capacidades recentemente adquiridas, sem intervenção de outros mais competentes do que ela, o processo de desenvolvimento permanece incompleto” (Portugal, 1992: 121s).

Esta fase da vida do indivíduo é vivida entre dois estados de espírito: a esperança e os medos. A esperança dos adolescentes no futuro, na vida, no amor é, frequentemente, denominada pelos adultos como ‘utopia’. Uma das características dos adolescentes é a paixão com que se entregam à vida, a forma como se entregam a valores como a lealdade, a generosidade, a tolerância, a capacidade de aprender. Assiste-se ao grito pela autonomia e pela individualidade. E, apesar de à primeira vista parecer que os adolescentes não têm medos, a verdade é que vivem, com a mesma paixão os medos, que se traduzem em angústias, como por exemplo a pressão das boas notas sentida quer pelas expectativas dos pais e dos professores quer pela competição e pelas inevitáveis comparações entre colegas de turma; a pressão do corpo que é frequentemente motivo de preocupação, de vergonha, de sofrimento silencioso, o receio de ser rejeitado, de ser desajeitado, de não conseguir relacionar-se com o sexo oposto.

Como alcançar o difícil equilíbrio de lhes ministrar medo na ‘dose certa’? Esta difícil tarefa cabe aos adultos que têm que encarar a fase da adolescência como natural. Existe uma tendência social para imaginar os adolescentes como irresponsáveis, despreocupados com o futuro, inconscientes dos perigos que correm, no entanto não se deve exagerar nas generalizações. Sabe-se que alguns riscos são inevitáveis e até necessários durante a adolescência: eles têm de descobrir por si próprios os seus limites, precisam de responder a certos desafios, de experimentar aquilo que ‘já sabem’ na teoria.

Como educadores não podemos controlar as suas vidas, esta postura fomenta a mentira e um ostracismo por parte dos adolescentes que se sentem ‘invadidos’ no seu território. É fundamental delegar responsabilidades, permitindo a sua gradual autonomia e criando um clima de confiança recíproco. Outra atitude que o educador deve aprender a dominar é o medo de estabelecer limites e de os fazer cumprir. O receio do confronto, da iminência de uma discussão faz com que, por vezes, os educadores afrouxem as suas convicções, finjam não

se aperceber do que se está a passar. O diálogo é fundamental no relacionamento com os adolescentes. Não são apenas os adolescentes que receiam partilhar as suas dúvidas, as suas angústias, os seus medos. Frequentemente os educadores escusam-se a falar abertamente sobre o que os preocupa, a comentar os seus receios.

Nesta relação Adolescente/Educador devemos ter sempre presente que os adolescentes acreditam no futuro enquanto os adultos em quem acreditam, acreditarem neles.

A escolaridade presencial tem um papel muito importante na socialização e na educação destas classes de idades. Só através de um bom ambiente inter-relacional o aluno pode atingir a autonomia o que, de uma forma sintetizada, significa estabelecer, ele próprio o seu ritmo de trabalho e cumprir com os objectivos, também por ele, delineados.

O esquema que segue vai ao encontro de psicólogos defensores da perspectiva sócio-construtivista, nomeadamente Vigotsky (1979) e Bruner (1983), por perspectivar o conhecimento como sendo pessoal, construído através do significado e da experiência. Daí a necessidade da implicação do próprio aluno em todo o processo de aprendizagem. Para optimizar a sua aprendizagem o aluno tem de reconhecer a importância da educação para a sua vida, deve-lhe ser transmitida informação útil, por exemplo para a família: explicar que se souberem ler, escrever e contar estão em melhores condições para ajudar a família, por exemplo, no preenchimento de formulários, podem tratar pessoalmente de assuntos em Instituições como a Segurança Social ou o Centro de Saúde, ser eles próprios a gerir as contas com o comércio local. No caso do conhecimento de línguas estrangeiras o aluno deve ter a noção real que este conhecimento lhe permite saber orientar-se numa cidade desconhecida.

Ainda de acordo com estes mesmos autores, é essencial apelar à auto- estima do aluno. A auto-estima, uma atitude básica que determina o comportamento e o rendimento escolar do aluno, nasce de duas causas:

o da observação de si mesmo com base numa série de sucessivas auto-avaliações referidas aos níveis atingidos em relação aos propostos previamente,

o da assimilação e da interiorização da imagem e da opinião que os outros têm de nós e projectam em nós. De um modo particular, as pessoas são tão importantes para nós como os pais e os professores. A interacção social é o primeiro lugar privilegiado para a sua génese.

Ao centrar este trabalho no aluno apresentamos um modelo que proporciona, em sala de aula, a construção do percurso para a autonomia, entendendo por aluno autónomo aquele que, segundo Holec

“is willing and able to assume responsibility for his learning process by making choices about short- and long-term goals, materials, methods and learning tasks, by organizing and executing these tasks, and by using appropriate criteria in evaluating learning results and the learning process” (Holec

in Lang, 2003: 16).

A adolescência deverá garantir a autonomia pelo que existem competências sem as quais o aluno não poderá ser considerado verdadeiramente autónomo. Dessas qualidades destaco:

Ilustr. 1 - Figura 1: Qualidades do aluno autónomo

activo crítico- reflexivo responsável experimentador organizado negociador envolvido na cidadania motivado aluno autónomo persistente auto- estima

O aluno que desenvolveu estas competências está em condições de construir o seu próprio conhecimento e gerir o processo de construção desse conhecimento o que não significa que apenas o aluno autónomo as possui. Na realidade, elas complementam-se e assumem importâncias diferentes em função do grau de autonomia e das características do indivíduo. No que respeita à autonomia podemos reflectir acerca do papel de cada uma destas competências: se são ou não indispensáveis para o aluno autónomo. O critério seleccionado para promover esta reflexão consistiu em isolar cada uma destas competências e avaliar se, num determinado momento, é possível ao aluno ser autónomo apesar de não possuir a competência em questão. Dessa reflexão podemos concluir que o aluno autónomo tem necessariamente de ser crítico-reflexivo, responsável, experimentador, persistente e possuir auto-estima. Para ser autónomo o aluno deve ainda ser motivado, activo, organizado, negociador e estar envolvido na cidadania. Todas estas competências são o resultado de um trabalho de todos os intervenientes do sistema educativo, e quando o indivíduo chega à adolescência, fase em que se encontram os jovens alvo deste estudo, deve já encontrar-se num estado avançado de autonomia. Trata- se de esperar que o aluno, no final da educação básica, seja capaz de:

“(1) Mobilizar saberes culturais, científicos e tecnológicos para compreender a realidade e para abordar situações e problemas do quotidiano;

(2) Usar adequadamente linguagens das diferentes áreas do saber cultural, científico e tecnológico para se expressar;

(3) Usar correctamente a língua portuguesa para comunicar de forma adequada e para estruturar pensamento próprio;

(4) Usar línguas estrangeiras para comunicar adequadamente em situações do quotidiano e para apropriação de informação;

(5) Adoptar metodologias personalizadas de trabalho e de aprendizagem adequadas a objectivos visados;

(6) Pesquisar, seleccionar e organizar informação para a transformar em conhecimento mobilizável;

(7) Adoptar estratégias adequadas à resolução de problemas e à tomada de decisões;

(8) Realizar actividades de forma autónoma, responsável e criativa;

(9) Cooperar com outros em tarefas e projectos comuns;

(10) Relacionar harmoniosamente o corpo com o espaço, numa perspectiva pessoal e interpessoal promotora da saúde e da qualidade de vida” (DEB, 2001: 43s).

A autonomia constrói-se na interacção continuada desde os primeiros anos de vida, por isso é decisivo que os pais, na infância, estimulem os comportamentos de independência do filho, de acordo com as possibilidades da idade. Se até à adolescência o jovem não cultivou a sua individualidade, a partir deste momento já não é possível fazer esse trabalho por se encontrar num estádio em que necessita e actua em função do grupo. Esse individualismo poderá integrar factores como o aluno ter consciência do período do dia mais rentável para a sua aprendizagem, ter consciência do local que lhe oferece as condições necessárias para a concentração e a atenção (luz, calor, móveis,...), ter consciência do que realmente sabe, desenvolver uma visão global do que quer e definir objectivos em função disso, estabelecer prioridades nas actividades a que se propõe, antever prazos e possíveis quebras e planear as actividades de forma a cumpri-las, evitar as perdas de tempo e interrupções, escolher ocupações extra-curriculares saudáveis que promovam o convívio e o contacto com o mundo do trabalho. Saber gerir o seu processo de aprendizagem é fundamental numa época eminentemente tecnológica. A sociedade de hoje, sociedade de informação, veio contribuir para a alteração do perfil do aluno. Se a universalização das tecnologias permite aumentar o acesso a bens culturais, informativos, recreativos e ao conhecimento, também permite o acesso à sabedoria “imediata”, aquela que não necessita de experiência

vivida. Como resultado temos informação de um lado e sabedoria do outro. É imperioso que o aluno saiba fazer a triagem do excesso de informação a que tem acesso sendo o sucesso dessa tarefa partilhada com os educadores. Aos educadores cabe o papel de ensinarem o jovem a aceder à informação mas também o papel de o obrigar a fazer prova dos resultados, o que obteve em ganhos de informação e de conhecimento (o que obriga ao diálogo entre pais e filhos, pais e professores, alunos e professores), para assim se proceder a um efectivo controlo das fontes. Na realidade, o que se recomenda são formas de comunicação em sociedade que deveriam ser incentivadas e cultivadas, quer nas famílias, quer nas escolas, quer nas diversas instituições que o aluno frequenta. Em psicologia chama-se aprender por Modelagem, por ver fazer e querer também tentar. Este é o grande segredo das aprendizagens ao longo da vida; vemos e fazemos igual. Daí a importância dos outros na vida do aluno, na sua própria construção pessoal de escalas de atitudes e de valores. O aluno está atento, não tanto ao que ouve dizer que está correcto, mas àquilo que vê fazer e que avalia como sendo o comportamento correcto. Ao desenvolver características que conduzem o aluno à autonomia, este é capaz de estar atento, copiar e desenvolver o que vê fazer, o que ouve e até é capaz de adivinhar o que os outros pensam. Os tradicionais “bons exemplos” que era preciso dar, as “boas companhias” que era preciso fomentar são valores que modelam o jovem. Se o sentido de justiça se desenvolve desde cedo, é fácil começar de pequeno a perceber que há injustiças e que é preciso lutar contra elas. A relação do aluno com o meio está assinalada nas funções da educação através do número 5 art. 2º que diz:

“a educação promove o desenvolvimento do espírito democrático e pluralista […] formando cidadãos capazes de julgarem com espírito crítico e criativo o meio social em que se integram e de se empenharem na sua transformação progressiva”. (LBSE)

Conhecer o perfil de cada estudante é determinante para conceber para ele a melhor estratégia de aprendizagem porque

“[a] limitação principal do que os alunos conseguem fazer é o que eles pensam que não conseguem fazer. Todos têm a capacidade de serem criadores […]. Por vezes, professores e pais limitam, não intencionalmente, o que os alunos conseguem fazer” (Sternberg, 2002:14s)

Se o aluno é tolerante consigo mesmo costuma negar toda a responsabilidade remetendo-se para o papel de vítima do sistema ou exibe uma confiança desmedida, por isso um estímulo extra (atribuir responsabilidades às quais não pode fugir, criar o hábito de começar a trabalhar) obriga-o a estudar com responsabilidade. Se o aluno nega o seu potencial e está sempre a dizer mal de si próprio, nomeadamente que não é capaz e que não vai conseguir, o mais certo é acabar por acreditar naquilo que diz. A falta de autocrítica é extremamente perigosa mas em excesso impede-o de avançar com o mínimo de confiança necessária. É que este tipo de estudante, ou o estudante que esteja nesta fase, tende a esquecer os seus próprios êxitos, recordando-se apenas dos insucessos que servem para alimentar os seus medos. Convém criar para estes alunos estratégias que diminuam a ansiedade e reforcem a auto-estima porque a tendência é o aluno só acreditar no que ouve se o que lhe é dito corresponder àquilo em que realmente pensa sobre ele próprio e sobre o mundo. Daí que a melhor forma de o ajudar seja mostrar-lhe que há alternativas perfeitamente viáveis e aceitáveis e que as suas opções terão o apoio dos outros. Em termos práticos a estratégia de estudo deve passar por dividir as matérias e começar sempre pelo de média dificuldade, passando ao fácil, e em seguida ao mais difícil, de forma a que ao chegar à última etapa a auto-estima já esteja num estado desenvolvido. Se o aluno é perfeccionista, a tarefa de o ajudar a aprender também tem características específicas. Geralmente este aluno descobre logo as falhas no professor ou nos livros. O que se recomenda é que se lhe explique que a sua atitude se torna inflexível o

que pode prejudicar o seu processo de aprendizagem/ensino. É aconselhável sugerir ao aluno que não seja demasiado rigoroso e perfeito nas notas e nos apontamentos que toma quando está a estudar. Este estudo apresenta uma proposta que incide em aspectos que afectam o sucesso escolar do aluno e que, por ser passível de ser implementada em qualquer nível de ensino, possibilita um trabalho continuado de forma a que o aluno a interiorize, a cultive e a desenvolva ao longo da sua formação enquanto aluno e enquanto cidadão.

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