Capítulo 3 – A luta por Representação das Mulheres no Brasil de 1975-1985
3. As Eleições de 1986
3.2 Perfil das Deputadas da 48º Legislatura
Para uma melhor percepção da importância da ação deste grupo de pressão dentro do Parlamento, vale destacar que, ao longo de seus 195 anos de independência, o Brasil já elaborou oito Constituições, sendo quatro impostas pelos governantes e quatro votadas por assembléias constituintes; no entanto, até 1986, apenas uma mulher havia sido eleita deputada constituinte: a médica paulista Carlota Pereira de Queiroz que em 1934, atuou no parlamento nacional.
Em contraponto, a nossa Constituição Cidadã, em vigor até hoje, teve em sua promulgação um marco jurídico e legislativo no tocante aos direitos das mulheres e à ampliação de sua cidadania. Esta conquista, todavia, não deve ser creditada – como insistem alguns – aos bons ventos democráticos que pairavam pelo Parlamento brasileiro e que o levou a outorgar à parcela feminina da população alguns direitos fundamentais; mas ao contrário, deve ser atribuída à articulação política das próprias
mulheres no seio da Constituinte, que, através das 2924 deputadas eleitas e sobretudo, da
pressão exercida pelo movimento feminista e de mulheres.
Vale destacar, que esta luta, notadamente a que se dá no âmbito do Parlamento, envolve pressões, articulações, negociações e às vezes, alguns recuos, além de algumas denúncias contra atores políticos resistentes às mudanças sociais.
No caso em estudo, a participação das mulheres na construção de seus direitos constitucionais exigiu muita argúcia, muita habilidade política, muita compreensão da conjuntura política e do próprio funcionamento Parlamentar por parte das feministas, notadamente aquelas com participação nas estruturas do Estado, através do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher.
Uma vez que ficou patente a importância da norma constitucional para o avanço da cidadania feminina, para uma melhor compreensão de tais questões destacam-se neste capítulo as atuações das parlamentares e ativistas durante o desenrolar da Constituinte e seus respectivos caminhos que as levaram até o Congresso Nacional
Dentre as mulheres atuantes na ANC, algumas pesquisadoras25 já enfatizaram a ação das deputadas constituintes da bancada feminina. Esta era formada por mulheres eleitas dos mais variados partidos, advindas das mais diversas regiões do país e pertencentes às mais diferentes profissões. Tais características serão esmiuçadas na seção que se segue, de modo a se atingir um panorama do perfil legislativo que compôs essa bancada feminina.
Distribuição por região geográfica
Nesta seção faz-se uma análise dos estados brasileiros em que estas mulheres foram eleitas e suas filiações partidárias como mostra a tabela 1.
Para melhor ler os dados da tabela, os condensei no Gráfico 2, que contém exatamente as mesmas informações, apenas de maneira mais figurativa. O que se pode analisar nesse aspecto é, primeiramente, que a maioria das deputadas é advinda da
24Bete Mendes (PMDB) licenciou-se do mandato de Deputado Federal Constituinte na legislatura 1987-
1991, para exercer o cargo de Secretária da Cultura do Estado de São Paulo, de 15 de março de 1987 a 21 de dezembro de 1988; Lurdinha Savignon (PT) tomou posse como suplente em 4 de janeiro de 1989, na vaga do Dep. Vítor Buaiz; Wilma Maia (PDT) Licenciou-se do mandato de Deputada Federal na
legislatura 1987-1991 para tratar de interesses particulares por 120 dias a partir de 18 de outubro de 1988 e acabou por renunciar o cargo para assumir a Prefeitura de Natal, em 1º de janeiro de 1989.
região Sudeste, com 9 representantes de estados dessa região, o que já era de certa forma esperado, dada a concentração populacional e importância política da mesma.
A segunda região com mais representantes eleitas é a região Norte, seguida pela região Nordeste com 8 e 6 deputadas respectivamente. Esse bom desempenho regional de locais que usualmente não tem alta representatividade no Parlamento pode ser interpretado enquanto novidade e é destacado em discurso pelas próprias constituintes:
Quadro 4 – Representação Feminina na Câmara Federal por Estado da 48ª Legislatura, Brasil - 1986
Fonte: Câmara dos deputados – site: https://www2.camara.leg.br/deputados/pesquisa
Deputada Partido Estado de Origem Região
Abigail Feitosa PSB Bahia Nordeste
Anna Maria Rattes PSDB Rio de Janeiro Sudeste
Benedita da Silva PT Rio de Janeiro Sudeste
Bete Mende PMDB São Paulo Sudeste
Beth Azize PDT Amazonas Norte
Cristina Tavares PDT Pernambuco Nordeste
Dirce Tutu Quadros PSDB São Paulo Sudeste
Eunice Michiles PFL Amazonas Norte
Eurides Brito PFL Distrito Federal Centro-Oeste
Irma Passoni PT São Paulo Sudeste
Lídice da Mata PcdoB Bahia Nordeste
Lúcia Braga PDT Paraíba Nordeste
Lúcia Vânia PMDB Goiás Centro-Oeste
Lurdinha Savignon PT Espírito Santo Sudeste
Marcia Sibilis Viana PDT Rio de Janeiro Sudeste
Marcia Kubistschek PMDB Distrito Federal Centro-Oeste
Maria de Lourdes Abadia PSDB Distrito Federal Centro-Oeste
Maria Lúcia Melo de Araújo PMDB Acre Norte
Marluce Pinto PTB Roraima Norte
Moema São Thiago PSDB Ceará Nordeste
Myriam Portella PSDB Piauí Nordeste
Raquel Cândido PDT Rondônia Norte
Raquel Capiberibe PSB Amapá Norte
Rita Camata PMDB Espírito Santo Sudeste
Rita Furtado PFL Rondônia Norte
Rose de Freitas PSDB Espírito Santo Sudeste
Sadie Hauache PFL Amazonas Norte
Sandra Cavalcanti PFL Rio de Janeiro Sudeste
Wilma Maia PDT Rio Grande do Norte Norte
Gráfico 2 – Representação Feminina na Câmara Federal segundo Grandes Regiões na 48ª Legislatura, Brasil - 1986
Fonte: Câmara dos deputados– site: https://www2.camara.leg.br/deputados/pesquisa
O Gráfico 2 indica que 35% do total de representantes é da região sudeste, 31% da região norte, 23% da região nordeste e 12% da centro-oeste.
Um aspecto que deve ser destacado é a não eleição de nenhuma representante da região Sul e analisando as legislaturas anteriores o único estado que havia elegido uma mulher anteriormente fora Santa Catarina, na 47ª legislatura (1967-1971), ao eleger a senhora Ligia Doutel de Andrade pelo MDB. Possivelmente pelo caráter tradicionalista apresentado pelo região, que tem na sua sociedade costumes patriarcais mais arraigados.
Distribuição por partidos políticos
As 26 mulheres eleitas para a Assembléia Nacional Constituinte exerceram seus mandatos através de 8 partidos diferentes: (5) PMDB, (6), PSDB, (4) PFL, (5) PDT, PT e PSB (2 cada), PTB, e PC do B, uma deputada cada um. Isto é para dar um panorama da diversidade que caracterizava a bancada feminina, cada uma com sua respectiva filiação. Essa diversidade precisa ser ressaltada, pois a expressão ‘bancada feminina’ pode dar a impressão de uníssono, o que não é o caso.
Aqui é importante ressaltar também o fenômeno de transição partidária, que se deu com algumas parlamentares, em especial no caso do PSDB que foi criado durante os trabalhos constitucionais, puxando muitos dos deputados que estavam vinculados ao antigo MDB que representava toda a oposição partidária e se apresentava altamente
fragmentada. Para demonstrar esse fenômeno são colocados os gráficos 3.1 e 3.2 abaixo:
Gráfico 3.1 - Distribuição por Partido Político das Deputadas Eleitas na Data da Posse 1987 – Brasil
Fonte: Mulheres na Política – eleições de 2016 (MELO, DWECK, MORANDI)
Gráfico 3.2- Distribuição por Partido Político das Deputadas Eleitas na Promulgação da Constituinte de 1988– Brasil
Fonte: Câmara dos deputados– site: https://www2.camara.leg.br/deputados/pesquisa
O gráfico 3.1 representa a distribuição partidária das parlamentares mulheres logo após as eleições. O gráfico 3.2 é feito com dados partidários do momento da promulgação da constituinte, alguns meses após as eleições e a posse dos mandatos. Nesse período, além dos debates parlamentares, e da formulação de uma nova Carta Constitucional, foram criados novos partidos e se apresenta uma movimentação, como bem lembra Lídice da Mata, deputada constituinte que viveu essas transformações e compartilha a lembrança
ao lembrar que “ Foi uma experiência singular, porque tivemos um grande número de mulheres nesse processo constituinte que mudaram de partido, saindo dos mais conservadores para os mais progressistas” (Entrevista concedida em 28/02/2019).
Formação AcadêmicaQuadro 5 – Representação Feminina para 48º Legislatura por Profissão– Brasil -1986
Fonte: Câmara dos deputados– site: https://www2.camara.leg.br/deputados/pesquisae SHUMAHER e CEVA (2015)
Para fechar a análise sobre as deputadas eleitas se coloca a tabela 2, com todas as parlamentares, seus respectivos partidos e profissões declaradas em biografia da Câmara dos Deputados. Desta se coloca uma maioria de mulheres com ensino superior que ingressam o Congresso Nacional, fazendo assim um recorte de representatividade com um maior grau de instrução.
Deputada Partido Profissão
Abigail Feitosa PSB Médica
Anna Maria Rattes PSDB Advogada Benedita da Silva PT Assistente Social
Bete Mende PMDB Atriz
Beth Azize PDT Advogada
Cristina Tavares PDT Jornalista Dirce Tutu Quadros PSDB Biologa
Eunice Michiles PFL Servidora Pública
Eurides Brito PFL Professora
Irma Passoni PT Pedagoga
Lídice da Mata PcdoB Economista Lúcia Braga PDT Assistente Social
Lúcia Vânia PMDB Jornalista
Lurdinha Savignon PT Secretária Marcia Sibilis Viana PDT Economista
Marcia Kubistschek PMDB Jornalista Maria de Lourdes Abadia PSDB Assistente Social Maria Lúcia Melo de Araújo PMDB Professora
Marluce Pinto PTB Professora
Moema São Thiago PSDB Advogada
Myriam Portella PSDB Advogada
Raquel Cândido PDT Profissional técnica Raquel Capiberibe PSB Pedagoga
Rita Camata PMDB Jornalista
Rita Furtado PFL Professora
Rose de Freitas PSDB Jornalista
Sadie Hauache PFL Jornalista
Sandra Cavalcanti PFL Professora
Wilma Maia PDT Professora