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4. Perfil e trajetória política das deputadas no pós-Constituinte

4.2. Quem são as deputadas do pós-Constituinte

4.2.1. Perfil das deputadas por tipo de capital político

Após a apresentação da tipologia que orientará todo o trabalho aqui desenvolvido, é importante verificar a importância que cada uma dessas trajetórias tem para as deputadas eleitas entre 1987 e 2002. De fato, essas trajetórias não devem ser compreendidas isoladamente, de maneira estanque, uma vez que “representam formas de acumulação de recursos, saberes, legitimidades, constituidores de redes sociais nas quais transitam as agentes políticas.” 273 Assim, a classificação de uma deputada em qualquer das categorias não significa que seu capital político seja puro, formado por apenas um dos quatro tipos aqui apresentados. Ao contrário, é, na maior parte das vezes, composto por porções de “peso” diferente de cada um deles.

272 São exemplos dessa trajetória o cantor Agnaldo Timóteo, o ex-presidente do Vasco da Gama, Eurico Miranda, e as deputadas Marta Suplicy – apresentadora de televisão – e Bete Mendes, atriz de telenovelas. 273 COSTA, 2004, p. 15.

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Como já se apontou, a proporção de mulheres que entram na Câmara em função de uma bem-sucedida carreira em outros campos, como o artístico ou intelectual, é baixa; apenas 10,5% do total. As demais dividem-se entre aquelas que têm sua origem no próprio campo político, por uma trajetória própria, e aquelas que entram em função, principalmente, de prestígio e popularidade de suas famílias. As primeiras correspondem a quase 49%, o que aponta para a importância do treinamento prévio que inicia a construção de um habitus político essencial para sua atuação no campo. Na divisão interna, o maior peso é para aquelas oriundas dos movimentos sociais (30,3%), que são espaços privilegiados de participação políticas das mulheres, tal como se discutiu no capítulo 1, o que lhes permite construir uma trajetória política a partir dessa militância e, por sua própria força nesses espaços, conquistar posições e prestígio no interior dos partidos. Outras 41%, por fim, vêm de famílias políticas, particularmente por meio de seus pais ou maridos. Logo, se essa é considerada uma forma tradicional e muitas vezes desprestigiosa de entrar na política, para muitas mulheres constitui-se na principal porta de acesso (ver tabela 4).

Tabela 4

Distribuição das deputadas, por tipo de capital político. Brasil, 1987 a 2002

Tipo de Capital Político No Absoluto Porcentagem Delegado do campo político 37 48,7

Movimento 23 30,3

Ocupação de cargos 14 18,4

Delegado das famílias 31 40,8

Convertido de outros campos 8 10,5

Total 76 100

Fonte: Pinheiro, Luana. Vozes femininas na política: uma análise sobre mulheres parlamentares no pós-Constituinte. 237 p. Dissertação (Mestrado em Sociologia) – Departamento de Sociologia, Universidade de Brasília, Brasília, 2006.

De fato, essa importância vem crescendo ao longo dos anos aqui analisados. Se em 1987 38% das deputadas eram dotadas de capital político familiar, essa proporção sobe para 46,4% na legislatura de 1999. Segundo matéria jornalística divulgada a respeito das eleições de 2006, a próxima legislatura (2007-2010) contará com uma bancada que terá

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metade de suas integrantes na condição de companheiras ou ex-companheiras, filhas ou viúvas de políticos274 (ver tabela 5).

Tabela 5

Distribuição das deputadas*, por tipo de capital político e legislatura. Brasil, 1987 a 2002 1987 1991 1995 1999 Tipo de Capital Político No Absoluto (%) N o Absoluto (%) N o Absoluto (%) N o Absoluto (%) Delegado do campo político 13 50,0 16 55,2 14 48,3 14 50,0 Movimento 8 26,9 10 34,5 7 24,1 9 32,1 Ocupação de cargos 5 19,2 6 20,7 7 24,1 5 17,9 Delegado das famílias 10 38,5 11 37,9 12 41,4 13 46,4 Convertido de outros campos 3 11,5 2 6,9 3 10,3 1 3,6 Total 26 100,0 29 100,0 29 100,0 28 100,0

Fonte: Pinheiro, Luana. Vozes Femininas na Política. Brasília, 2006.

Nota: * O conjunto das deputadas não soma 76, pois, na análise que considera a legislatura, estão contadas repetidamente aquelas que foram reeleitas para o cargo. Assim, a soma, nesse caso, é igual a 112, o que significa que as 76 deputadas estudadas ocuparam 112 mandatos na Câmara.

A participação em movimentos sociais também aumenta no período, mas em menor proporção que o crescimento verificado para as deputadas de origem familiar. Isso certamente está relacionado ao crescimento desse terreno após o processo de redemocratização e ao maior espaço encontrado pelas mulheres para atuarem na política informal. Em sentido oposto, verifica-se uma queda significativa na proporção de deputadas cuja entrada na Casa é fruto de um capital de outros campos que não o político. Pode-se pensar que isso se dá em função de um Parlamento que é cada vez mais produto de uma política profissional, de campanhas caras e bem estruturadas, que seleciona aqueles que já têm alguma experiência prévia para atuarem em seu interior. No entanto, este é um terreno para o qual não são possíveis explicações simplistas. Cada vez mais se verifica o poder da mídia em influenciar o processo eleitoral275 e, se a política se profissionaliza também ainda é possível presenciar a eleição de indivíduos sem qualquer trajetória anterior, que batem recordes de votos em função de um capital artístico ou econômico (que lhes permite fazer campanhas vultosas que os tornam conhecidos do grande público).

274 FERRARI e COBBOS, 2006.

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Os perfis políticos e sociais das deputadas não nos permitem, portanto, falar em “mulher” no Parlamento. De fato, as mulheres são múltiplas, com identidades diversas e trajetórias distintas, o que contribui para a formação de uma Câmara dos Deputados que, espera-se, reflita a diversidade existente na sociedade brasileira. Passa-se, agora, à análise do perfil destas 76 mulheres que alcançaram postos mais elevados na hierarquia política. Todas as informações apresentadas serão desagregadas também por tipo de capital político; dessa maneira, procura-se contribuir para o melhor entendimento de quem são as deputadas eleitas no pós-Constituinte.