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5. Resultados & Discussão

5.2 Estudo Comparativo entre Isolados de Laticínios e Urocultura

5.2.2 Perfil de Sensibilidade a Antimicrobianos

Observou-se resistência a 7 dos 10 fármacos antimicrobianos analisados. Todos os 60 isolados mostraram-se sensíveis à ampicilina, teicoplanina e à vancomicina. Somente 3 (10%) Enterococcus faecalis isolados de laticínios mostraram-se livres de resistência, intermediária ou não, e nenhum isolado clínico revelou tal sensibilidade. Relativamente a E. faecalis de urina, metade mostrou multirresistência (entre 3 a 5 antimicrobianos) (Tabela 7) e o mesmo não foi observado em isolados de alimentos. Tal multirresistência deu-se aos antimicrobianos Tet, Eri, Gent, Strep, Clo, Nor e Rif. Diferentemente dos resultados observados neste trabalho, Gomes et al. (2008) detectaram resistência concomitante a Gen, Eri e Tet em isolados de E. faecalis oriundos de alimentos. Os resultados concernentes à resistência antimicrobiana estão mostrados na Figura 4 e Tabela 7.

Figura 4. Percentual de resistência antimicrobiana em E. faecalis isolados de alimentos e urina. I: Resistência intermediária; R: Resistência; Gent: Gentamicina; Strep: Estreptomicina;

Rif: Rifampicina; Clo: Cloranfenicol; Eri: Eritromicina; Nor: Norfloxacina; Tet: Tetraciclina. 0 20 40 60 80 100 I R I R I R I R I R I R I R

Gent Strep Rif Clo Eri Nor Tet

Isolado s (%) Antimicrobianos Laticínios Urocultura

Tabela 7. Perfis de resistência a antimicrobianos e fonte de isolamento de E. faecalis oriundos de urina e laticínios. Para tal, desconsiderou-se a resistência intermediária.

Perfil Resistência Origem Isolados

1 Nenhum

Urina H12, H28

Leite Cru E257, E261, E291, E302 Queijos Minas

Frescal E23, E24

2 Tet

Urina H10, H14, H22, H24, H30, H34 Leite Cru E51, E89, E176, E207, E271 Queijos Minas

Frescal E12, E13, E15, E19, E20, E21, E22

3 Eri Queijos Minas

Frescal E14, E17

4 Tet, Eri

Urina H3, H11, H17, H25, H31, H32 Leite Cru E61, E84, E127, E151, E161, E191,

E267, E312 Queijos Minas

Frescal E11, E18

5 Tet, Rif Urina H6

6 Tet, Eri, Gent Urina H15

7 Tet, Eri, Clo Urina H4, H35

8 Tet, Eri, Nor Urina H1, H16, H27

9 Eri, Nor, Clo Urina H20

10 Tet, Eri, Nor, Rif Urina H23

11 Tet, Eri, Strep, Clo Urina H18

12 Tet, Eri, Strep, Gent Urina H19

13 Tet, Eri, Strep, Gent,

Nor Urina H26

14 Tet, Eri, Strep, Clo,

Nor Urina H5

15 Tet, Eri, Gent, Clo,

Nor Urina H2, H7, H13

Antibióticos – Tet: Tetraciclina; Eri: Eritromicina; Strep: Estreptomicina; Gent: Gentamicina; Clo: Cloranfenicol; Nor: Norfloxacina; Rif: Rifampicina.

Entre os isolados de E. faecalis encontrados em alimentos, observou-se em 16,67% (5/30) resistência intermediária à eritromicina. Detectou-se em 12 isolados (40,00%) resistência à eritromicina e em 21 (70,00%), à tetraciclina. Observou-se a resistência simultânea aos últimos antimicrobianos citados em 9 E. faecalis (30,00%)

e 3 (10,00%) mostraram resistência intermediária à eritromicina associada à resistência à tetraciclina. Entre os isolados de urina, encontrou-se em 3 (10,00%) resistência intermediária à eritromicina, em 21 (70,00%) resistência ao mesmo antimicrobiano e em 27 (90,00%), à tetraciclina.

Os antimicrobianos tetraciclina e eritromicina mostraram a mais baixa eficiência em erradicar os isolados de E. faecalis oriundos de ambas as fontes de isolamento. Concernente à resistência dos isolados de alimentos, os resultados descritos acima associam-se ao uso dos mesmos em fazendas ou, ainda, à resistência cruzada com outros antimicrobianos (ANDREOTTI & NICODEMO, 2004; ZOU et al., 2011).

O mecanismo de resistência à tetraciclina dá-se através de bombas de efluxo (tetK e tetL) e síntese de RPPs (Ribosome Protection Proteins) incumbidas de inativar o fármaco em seu sítio de funcionamento (tetM, tetO, tetS, tetT e tetW) (ROBERTS, 2012; CHOI & WOO, 2015). Relativamente aos macrolídeos, a resistência dá-se através de bombas de efluxo (mefA, mefE e msr) ou decréscimo de afinidade com ribossomos em decorrência da síntese de metilases, que alteram o alvo (erm) (ZOU et al., 2011; KRISTICH, RICE & ARIAS, 2014).

Choi & Woo (2015) observaram com êxito a transmissão de tetK, tetL, tetM,

tetO, tetS, tetT e/ou tetW de E. faecalis Agg+ (prgB, asa1 e asa373) isolados de alimentos a E. faecalis JH2-2 (plasmid-free). Ademais, Haubert et al. (2018) relataram a transmissão de tetM de um isolado de Listeria monocytogenes encontrado em alimentos a E. faecalis JH2-2, evidenciando a difusão de resistência antimicrobiana através de EGM inclusive em diferentes bactérias Gram (+). Tal mecanismo foi inicialmente mostrado in vitro, mas os autores também o demonstraram em queijos Minas frescal durante o seu intervalo de validade (21 dias).

Como é comum a ocorrência de E. faecalis resistentes à tetraciclina e eritromicina, raramente utiliza-se um ou o outro em tratamentos de moléstias enterocócicas severas (HOLLENBECK & RICE, 2012). Entretanto, não é excluída a relevância dos achados em virtude de tal resistência ter se mostrado reiteradamente em E. faecalis oriundos de alimentos. Ademais, destaca-se a viabilidade de sua transmissão a outras bactérias através de EGM mesmo in situ.

Observou-se entre os isolados de urina a resistência a altas concentrações de aminoglicosídeos. Detectou-se a resistência aos antimicrobianos estreptomicina e gentamicina em 4 (13,33%) e em 6 (20%) isolados, respectivamente. Destes, 2

mostraram resistência simultânea a ambos os antimicrobianos. Todos os isolados de alimentos foram sensíveis aos aminoglicosídeos avaliados.

Tanto E. faecalis como E. faecium são naturalmente resistentes a doses clinicamente administráveis de aminoglicosídeos em decorrência destes não adentrarem a célula bacteriana. Contudo, a causa de resistência a doses mais elevadas dos mesmos fármacos é dada pela assimilação de EGM (WERNER et al., 2012; HOLLENBECK & RICE, 2012). Genes como aac(6′)-Ie-aph(2′′)-Ia, ant(6′)-Ia,

ant(3″)-Ia e outros codificam a síntese de AMEs (Aminoglycoside Modifying Enzymes),

enzimas incumbidas de inativar o fármaco ao alterarem sua estrutura (RAMIREZ & TOLMASKY, 2010; OSUKA et al., 2016).

O tratamento de moléstias enterocócicas utilizando aminoglicosídeos é comumente associado a um fármaco β-lactâmico ou, em última instância, associado à vancomicina (KRISTICH, RICE & ARIAS, 2014). Além de dificultar o tratamento dos indivíduos com a infecção urinária, os resultados encontrados evidenciaram o alastramento da resistência enterocócica a antimicrobianos de 1ª escolha.

Observou-se em 1 isolado (3,33%) de E. faecalis obtido de queijo Minas frescal a resistência intermediária à rifampicina. Relativamente aos isolados de urina, detectou-se a resistência intermediária ao mesmo fármaco em 5 (16,67%) e resistência em 2 (6,67%). Mesmo não sendo extensivamente administrado em infecções enterocócicas, a resistência a tal antimicrobiano é comumente observada em decorrência de seu uso em tratamentos de outras moléstias em indivíduos ou animais (KRISTICH, RICE & ARIAS, 2014).

O mecanismo de resistência à rifampicina é dado através de rpoB mutante, ocasionando a síntese aberrante de β-subunidade da RNA Polimerase, inabilitando o fármaco em reconhecer o seu alvo (MILLER, MUNITA & ARIAS, 2014). Esta enzima alterada acarreta simultaneamente o aumento de resistência a cefalosporinas sem, contudo, afetar outras classes de antimicrobianos cujo alvo é a parede celular (KRISTICH & LITTLE, 2012).

Quinolonas são comumente utilizadas em tratamentos de infecções urinárias (WAGENLEHNER, WEIDNER & NABER, 2009). Neste âmbito, observou-se em 3,33% (1/30) dos isolados de E. faecalis encontrados em uroculturas a resistência intermediária à norfloxacina e em 33,33% (10/30) a resistência ao mesmo fármaco. Plausivelmente, os dois fatos estão associados. Todos os isolados de alimentos mostraram-se sensíveis a este antimicrobiano.

É comum a ocorrência de resistência ao cloranfenicol em Enterococcus spp. e seu uso em infecções enterocócicas é raro (HOLLENBECK & RICE, 2012). Entre os isolados de urina, detectou-se resistência intermediária ao cloranfenicol em 3,33% (1/30) e resistência ao mesmo em 23,67% (8/30). Nenhuma cultura de E. faecalis de laticínios mostrou resistência a tal fármaco e associa-se isto ao banimento em 2003 do uso de cloranfenicol em fazendas brasileiras (BRASIL, 2003).

Todos os 60 isolados de E. faecalis não contiveram vanA e nem vanB e mostraram-se sensíveis à vancomicina. Rengaraj et al. (2016) encontraram resistência a tal antimicrobiano em 12,90% (16/124) dos isolados de E. faecalis analisados. Entretanto, em 6 não houve concordância entre a ocorrência de vanA e/ou

vanB com a resistência mostrada in vitro. Isto é devido a outros mecanismos de não-

sensibilidade à vancomicina incumbidos de modificar com D-Lac o terminal D-Ala (vanD e vanM, assim como vanA e vanB) ou com D-Ser o mesmo terminal (vanC,

vanE, vanG, vanL e vanN) (CHEN & XU, 2015). É dedutível, então, a ausência de

outros mecanismos de resistência entre os isolados de E. faecalis cá avaliados ou, ainda, uma conduta silenciosa destes genes devido à não-expressão dos mesmos.

Os resultados descritos neste trabalho corroboraram com a literatura ao indicarem maior sensibilidade aos antimicrobianos em enterococos isolados de alimentos em comparação aos clínicos (EATON & GASSON, 2001; ABRIOUEL et al., 2008, ANDERSON et al., 2016). Entretanto, não se deve desconsiderar o alastramento de resistência a antimicrobianos em E. faecalis encontrados em diferentes matrizes alimentares, como evidenciam outros estudos.

Em um estudo brasileiro, Gomes et al. (2008) avaliaram a sensibilidade antimicrobiana de 80 E. faecalis isolados de variados alimentos e, entre eles, laticínios. Os autores observaram resistência aos fármacos eritromicina (10%), gentamicina (22,5%) e tetraciclina (31%). Todos mostraram-se sensíveis à ampicilina e à vancomicina. Em outro estudo brasileiro, Riboldi et al. (2009) isolaram 27 E.

faecalis, sobretudo de carnes e laticínios, mas não de leite termicamente tratado. Os

autores observaram resistência aos antimicrobianos tetraciclina (33,33%), gentamicina (22,2%), estreptomicina (18,5%), eritromicina (11,1%), ampicilina (11,1%), cloranfenicol (7,4%) e vancomicina (3,7%).

Chajęcka-Wierzchowska, Zadernowska & Łaniewska-Trokenheim (2016) isolaram 22 E. faecalis de amostras de camarões comercializados em mercados. O ensaio de sensibilidade antimicrobiana revelou resistência aos fármacos tetraciclina

(59,1%), teicoplanina (40,91%), eritromicina (31,82%), norfloxacina (22,73%), cloranfenicol (9,1%) e rifampicina (4,55%). Soma-se aos resultados acima a capacidade de 10 isolados formarem biofilmes fracos ou moderados in vitro, aumentando a relevância dos achados. Neste mesmo estudo, não foi detectada a resistência à vancomicina e nem à linezolida.

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