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3 REVISÃO DA LITERATURA: PANORAMA DOS ESTUDOS

5.2 PERFIL SOCIAL DOS PROFESSORES

Nesta subseção, apresentamos a descrição do perfil dos professores de Língua Portuguesa das turmas selecionadas, buscando relacioná-lo com nossas hipóteses acerca das condições sociais dos docentes – formação e condições de trabalho - e com a concordância verbal de P4 na escrita dos alunos. Para respeitar o sigilo dos participantes, o nome dos professores não foi divulgado nesta pesquisa, sendo referenciados como professor 1 e professor 2 (da escola 1) e professor 3 e professor 4 (da escola 2).

Os dois professores da escola 1 apresentam algumas características semelhantes entre si no que diz respeito às condições do trabalho. As diferenças tornam-se mais evidentes quanto ao tempo de formação e ao tempo de carreira, e também pelo fato de um ser contratado em caráter temporário e outro ser efetivo da Rede Municipal de ensino. Delineando um perfil geral, o professor 1 concluiu sua graduação completa em 1999, tem especialização e é professor efetivo na rede municipal de ensino há vinte anos. Já o professor 2, formou-se mais recentemente, no ano de 2013, não apresenta nenhuma especialização em seu currículo e é contratado pela rede municipal de ensino em caráter temporário; sua experiência é de seis anos na Rede Pública de ensino e menos de um ano na rede privada.

Tocante às condições de trabalho, ambos os professores da escola 1 lecionam para mais de cinco turmas, com trinta e cinco alunos em média, e cumprem carga horária maior que quarenta horas semanais, sendo dez horas destinadas ao planejamento das aulas. Ambos não possuem acompanhamento sistemático de orientação pedagógica sobre sua prática docente; contudo, realizam formação continuada periodicamente. Esses professores contam com recursos didáticos fornecidos pela escola, tais como sala de informática, biblioteca e livros didáticos. Os dois fundamentam suas aulas a partir do livro didático e dividem sua carga horária entre duas instituições.

A respeito dos professores da escola 2, observamos bastante semelhança tocante à formação acadêmica, às condições de trabalho e às concepções pedagógicas. O professor 3 tem mestrado em Linguística e

trinta e cinco anos de experiência docente, dos quais vinte anos na Rede Pública de ensino. O professor 4 concluiu sua graduação em 1989, tem especialização e mestrado em Linguística; possui mais de dez anos de experiência na Rede Pública e privada de ensino. As condições de trabalho dos professores da escola se mostraram favoráveis em termos de condições ideais para a prática docente, cumprindo contrato de dedicação exclusiva com a escola que lecionam, cumprindo carga horária de quarenta horas semanais, das quais mais de dez horas são destinadas ao planejamento das aulas. Os dois professores trabalham com menos de cinco turmas com média de vinte e cinco alunos em cada. A escola oferece diversos recursos didáticos, como materiais artísticos, papeis variados, computadores, Datashow, salas ambiente, laboratório de linguagem, outros laboratórios, biblioteca, horta, pomar, brinquedoteca e outros, além de participarem periodicamente de reuniões de estudo, formação continuada e, apesar de terem acesso ao livro didático, não o tem como condicionador de suas aulas.

Realizando um comparativo entre os professores da escola 1 e da escola 2, percebemos que as realidades sociais dos profissionais de cada unidade escolar são distintas quanto à formação acadêmica e às condições de trabalho. Os professores da escola 2 possuem pós- graduação com nível de mestrado, enquanto que os professores da escola têm graduação completa com especialização. As condições de trabalho dos professores da escola 2 se mostraram mais favoráveis do que as condições dos professores da escola 1 por terem dedicação exclusiva, poucas turmas e com menor número de alunos, com acesso a diversos recursos didáticos e reuniões de estudo e planejamento sistemáticos.

Concernente às concepções pedagógicas, os quatro professores das turmas disseram que já haviam estudado sociolinguística em sua formação acadêmica e foi unânime a resposta de que há presença de variação linguística em sala de aula e que há a necessidade de discutir sobre ela. É interessante observar que todos os professores afirmaram não existir “erro” linguístico, mas tratar-se de uma questão de falta de conhecimento por parte do aluno, adequação quanto às diferentes modalidades ou estilos, variações quanto aos usos sociais da língua ou por algum problema que afetasse sua cognição. Todos os professores entrevistados acreditam, em certa medida, que a língua falada influencia na escrita dos alunos e que é preciso tentar minimizar o preconceito linguístico. Embora haja muitos pontos convergentes nas respostas dos professores das duas escolas, é importante destacar que certas

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concepções teóricas, como conceito de gramática(s), ensino – aprendizagem da leitura e escrita e uso do livro didático se distinguem e influenciam na prática pedagógica e na consolidação dos pressupostos sociolinguísticos nas aulas de língua portuguesa.

De acordo com nossa hipótese iii, acreditávamos que as condições de trabalho e a formação do professor de língua portuguesa influenciariam no uso da concordância verbal de P4: os alunos dos professores com condições de trabalho mais favoráveis, pós-graduados e que apresentassem conhecimentos de sociolinguística em sua formação, apresentariam mais a forma a gente em contextos informais, neste caso, em trechos mais informais da produção textual do gênero relato de experiência pessoal produzida pelos alunos. No entanto, esses professores pós-graduados e com condições melhores de trabalho não deixariam de apresentar rigor na avaliação do texto quanto ao uso da concordância considerada não padrão com os sujeitos de P4.

Conforme descrição do perfil dos professores acima, percebemos que os professores da escola 1 apresentaram condições de trabalho menos favoráveis, tendo em vista a maior carga horária, o trabalho em mais de uma instituição de ensino, quantidade maior de turmas e com maior número de alunos e, em geral, menos recursos físicos e pedagógicos do que os professores da escola 2. Assim, conforme a hipótese de nosso trabalho, os alunos da escola 2 deveriam apresentar mais o sujeito pronominal a gente do que os alunos da escola 1, em contextos informais da modalidade escrita, ainda que os professores de ambas as escolas mostrassem certo rigor na correção gramatical do texto do aluno. Nossos resultados nos mostraram que mesmo que o uso de a gente tenha sido menor do que o uso de nós, principalmente, e de SN + eu na posição de sujeito nas duas escolas selecionadas, o uso de sujeito pronominal a gente foi maior na escola 1, com 73 dados (76,8%) contra 22 dados (23,2%) na escola 2, não atestando nossa hipótese, uma vez que a proposta de produção textual era baseada em contextos menos formais da língua. Creditamos esse resultado também ao fato de os alunos das duas escolas não utilizarem discurso direto em seus textos, evitando o uso mais corriqueiro de a gente na marca de fala de personagens.