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A perspectivação do conhecimento em função das relações sintagmáticas estabelecidas em contexto frásico e da ‘voz’

4.1 As orações participiais em contexto frásico

As orações participiais assumem um papel de destaque no âmbito do estudo empírico deste trabalho, uma vez que a sua identidade depende daquele que é o objecto de estudo desta investigação, mais concretamente, as formas em –ed. Relativamente a estas foram já feitas considerações sobre a respectiva natureza, características e

realizações morfo-sintácticas, ao longo do capítulo 2, reservado à reflexão sobre as formas em –ed e o seu desempenho em contexto frásico. Interessa agora alargar o foco de análise às orações participiais, as quais acabam por ser o meio em que as formas em -ed habitualmente interagem e a partir do qual dão o seu contributo, em contexto frásico.

Em termos de designação há que destacar a versão portuguesa, “orações participiais”, exemplificada em Mateus et al. (2003: 727) e a versão inglesa, “-ed clauses”, utilizada, entre outros, por Biber et al. (1999: 200).

Mateus et al. (2003) definem orações participiais do seguinte modo:

“As orações participiais exprimem a anterioridade relativamente ao intervalo de tempo do estado de coisas da oração subordinante.”

Mateus et al. (2003: 727) A expressão de “anterioridade” é, na perspectiva dos autores, um traço central deste tipo de orações, pelo que apresentam algumas frases de exemplo, numa tentativa de clarificação da mesma. Destacam-se as seguintes: “Estacionado à pressa, o carro começou a andar sozinho” e “Lidos os textos, a professora conversou com os alunos” (Ibid.). Em ambos os exemplos, a acção expressa pela oração participial decorre anteriormente àquela expressa na oração principal da frase. Essa é uma razão, apontada por Mateus et al. (2003), como provável para o facto de, em português, a localização das orações participiais em pós-posição ser considerada agramatical. Os autores referem, contudo, que apesar de a ordem “particípio + sintagma nominal” ser aquela que, efectivamente, se impõe, há uma possibilidade de se verificar o inverso, ou seja, “sintagma nominal + particípio”, quando a oração participial é introduzida pela expressão “uma vez” (Ibid.), como exemplifica com a frase: “Uma vez a casa construída, o João mudou-se” (2003: 728).

Relativamente à valência dos verbos que ocorrem neste tipo de orações, os autores indicam os verbos transitivos e os verbos inacusativos (2003: 728). No caso das orações participiais com verbos transitivos, referem que a explicitação do respectivo sintagma nominal é opcional, pelo que, caso seja omitido, acaba por ser interpretado como objecto directo da oração principal. As frases previamente apresentadas comprovam-no, já que, na primeira se verifica a omissão do sintagma nominal, “o carro”, na oração participial e, na segunda, comprova-se a referência ao mesmo, ainda na oração participial, através de “os textos”.

No que diz respeito à caracterização das relações sintácticas entre orações, Mateus et al. (2003) tecem o seguinte comentário, referindo-se às orações participiais:

“Apesar da variedade e da complexidade dos vários tipos de subordinação adverbial, mostrou- se que as orações subordinadas adverbiais não são argumentos do predicado da oração matriz, ocupando uma posição de adjunto: adjuntos à esquerda em relação à oração matriz, ou adjuntos a SV ou à oração matriz.”

Mateus et al. (2003: 728)

Mateus et al. (2003: 728) caracterizam as orações participiais como orações subordinadas de tipo adverbial. É nessa qualidade que estabelecem com a oração principal, também designada “subordinante”84, uma relação de dependência. São consideradas pelos autores como “adjuntos”, já que não fazem parte do núcleo da oração principal, estabelecendo com esta uma relação de adjunção ou complementação. É de referir ainda que os exemplos apresentados por Mateus et al. (2003: 727) em, “Estacionado à pressa, o carro começou a andar sozinho”, e “Lidos os textos, a professora conversou com os alunos”, retratam “orações subordinadas reduzidas”, cuja designação é usada por Cintra et al. (1984: 605), em contraponto à de “orações subordinadas desenvolvidas”. Por “orações subordinadas reduzidas” os autores entendem o seguinte:

“ (...) outro tipo de oração subordinada – a reduzida – isto é, a oração dependente que não se inicia por relativo nem por conjunção subordinativa, e que tem o verbo numa das formas nominais – o infinitivo, o gerúndio, ou o particípio.”

Cintra et al. (1984: 605)

A noção de ‘redução’ prende-se aqui com o facto de, por um lado, a oração não ser introduzida por um pronome ou uma conjunção subordinativa, como seria habitual numa “oração subordinada desenvolvida” e, por outro, o verbo não ser flexionado, assumindo, no caso das orações participiais, a forma de particípio. Relativamente ao grupo das “orações subordinadas reduzidas de particípio”, Cintra et al. (1984: 611) referem ainda que, do ponto de vista da caracterização, podem ser adjectivas ou adverbiais.

Apesar de menos frequente, é possível que as orações participiais se concretizem enquanto ‘orações subordinadas desenvolvidas’, acabando, nesses casos, por revelar características consonantes com a conjunção subordinativa ou o pronome relativo que as

introduz. Vilela (1995: 291) apresenta a seguinte subclassificação para as referidas orações subordinadas:

“As palavras introdutoras da subordinada dão origem à seguinte subclassificação: - frase conjuncional, se a palavra introdutora da subordinada for uma conjunção; - frase relativa, se o elemento introdutor for um pronome ou advérbio relativo;

- frase interrogativa, se o elemento introdutor for um pronome ou um advérbio interrogativo.” Vilela (1995: 291)

Cintra et al. (1984) recorrem a outra forma de apresentação dos vários tipos de orações subordinadas, apesar de ser possível estabelecer um paralelo com as conclusões de Vilela (1995: 291). Assim, no âmbito da chamada “frase conjuncional”, Cintra et al. (1984) propõem as “subordinadas substantivais” (1984: 596) e as “subordinadas adverbiais” (1984: 601). No contexto da “frase relativa”, os autores (1984) sugerem as “subordinadas adjectivais” (1984: 598), restritivas e explicativas (1984: 600).

A classificação das orações subordinadas apresentada por Cintra et al. (1984) encontra referência nas considerações de Biber et al. (1999), relativamente à componente estrutural de frases dependentes, designadas por estes como “finite”85 ou “non-finite”86, respectivamente, ‘finitas’ e não finitas’, e cujas características foram já explanadas, no capítulo 1.3.

No contexto da língua inglesa Biber et al. (1999: 198) realçam os mesmos aspectos, já evidenciados pelos autores portugueses. Por um lado, inserem as “ed- clauses” no conjunto das orações completivas não finitas. O enquadramento neste grupo deve-se ao facto de se tratarem de orações dependentes, cuja função é a de complementar o sintagma verbal da oração principal (1999: 658). Por outro lado, os autores (1999: 630) consideram as orações participiais como uma das formas de realização de situações de pós-modificação através de construções não finitas, o que, no contexto dos exemplos analisados no âmbito do estudo empírico, se verifica com grande representatividade. Biber et al. (1999: 201) incluem, ainda, as “ed-clauses” no grupo das “suplementive clauses”87. Segundo os autores, este tipo de orações apresenta um baixo nível de integração na oração principal, indiciado pela separação com vírgula, e pode ocupar diferentes posições na frase, nomeadamente, a inicial, como forma de introduzir

85 Vide Biber et al. (1999: 193). 86 Vide Biber et al. (1999: 198).

87 Designadas por Cintra et al. (1984: 611) como “orações subordinadas reduzidas de particípio” e classificadas pelos mesmos autores como podendo ser adverbiais ou adjectivas. Mateus et al. (2003: 728) referem que este tipo de orações não se constitui como predicado da oração matriz, constituindo-se antes como adjuntos desta ou do sintagma verbal.

informação prévia, medial, sobretudo quando são inseridos parênteses, e final, como forma de introduzir informação suplementar.

A caracterização das orações participiais como orações não finitas resulta do facto de não incluírem, habitualmente, o respectivo sujeito, nem serem introduzidas por uma conjunção subordinante, e por apresentarem um verbo não flexionado, o qual, no caso das orações participiais, adquire a forma de particípio (1999: 198). Biber et al. (1999: 200) acrescentam, ainda, que as “ed-clauses” são, de todas as orações não finitas, as menos versáteis, atribuindo-lhes as seguintes funções sintácticas:

“Ed-clauses are less versatile than the other types of non-finite clauses. They can have the following roles:

A. Direct Object – Two-year-old Constantin will have his cleft palate repaired.

B. Adverbial – Taken in the order shown they provide propulsive jets increasing mass flow and increasing jet velocity.