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Para alguns críticos, o futuro do computador não reside em au- xiliar o designer, mas em ocupar o lugar do designer – através de computadores capazes de pensar (inteligência artificial). Se um computador pode treinar pilotos, calcular todas as tensões de uma estrutura, jogar xadrez melhor que um grande mestre, ou diagnosticar pa- cientes melhor que um médico (…) porque não pode um dia projectar melhor que um arquitecto? (BRUEGMANN 1989: 147)20.

No entanto, o projecto joga com dados subjectivos e não com operações lógicas que caracterizam um jogo de xadrez, dados como a estética, o ambiente sócio-cultual, etc. “A máquina pode ser capaz de jogar xadrez como um grande mestre, mas esta capacidade revelou-se muito menos difícil de programar que um projecto de arquitectura” (BRUEGMANN 1989: 149)21.

Armados de um programa inteligente, o poder iria directamen- te para a mão dos utilizadores, que poderiam analisar as res- trições de produção, materiais e custos de trabalho e escolher a melhor alternativa de projecto. O arquitecto Yona Friedman considerava os arquitectos intermediários desnecessários, que projectavam os seus gostos pessoais ao invés das necessidades

18 T.L. do original: “After years

of indifference, we seem to have got over our suspicion of computers, thanks to the availability of software that is more and more malleable, powerful and, above all, con- ceived as the extension of the impulses of our own brains.”

19T.L. do original: “In the

1960s and early 1970s enthusiasts longed to see the computer terminal replace the pencil and yellow tracing paper”.

20 T.L. do original: “If a com-

puter could be made to train pilots, to calculate all the stresses in a large structure, to play chess better than a grand master, or to diagnose patients better than a physi- cian (…) why could it no tone day design better than an architect?”

21T.L. do original: “The

machine might be able to play chess as well as a grand master, but this skill turned out to be much less difficult to program than the making of architecture.”

dos clientes. Nicolas Negroponte, do MIT, criou um programa – Urban 5 – que através de informação inserida pelos utiliza- dores (como o número de habitantes, horas de luz, etc.) gerava um edifício, ao mesmo tempo que se comportava como um ami- go e mentor do utilizador. Negroponte via o computador como um meio de permitir ao utilizador comum o conhecimento da estrutura e das leis da construção e a habilidade do desenho que tradicionalmente pertencia aos arquitectos. “Tão confiante estava Negroponte da habilidade da máquina em se tornar hu- mana que dedicou o livro The Architecture Machine à ‘primeira máquina que possa apreciar o gesto.’” (idem: 147)22.

A adopção das novas tecnologias na actividade do design foi motivada por necessidades. Menos óbvia é a sua influência na área.

Em muitos casos, esta influência é incompreendida ou passa despercebida de todo. À medida que os designers abraçam a nova tecnologia para todos os seus benefícios, devem igualmente tornar-se mais conscientes dos seus impactos menos óbvios no seu trabalho e nos seus produtos (KALAY 2005: 377)23.

Segundo KALAY (2005: 367) as novas tecnologias acarretaram consigo a mesma visão obsoleta que os automóveis tiveram no início do século – eram vistos como uma carruagem sem cava- los. Outro dos problemas é a tentativa de substituir directa- mente as ferramentas analógicas pelas digitais – tentar “en- fiar uma cavilha quadrada num buraco redondo”.

Tornou-se claro que o computador, como qualquer ferramenta, muda inevita- velmente, para melhor ou para pior, os processos que estava destinado auxiliar (BUERGMANN 1989: 151)24.

3.3 Analógico versus digital

Há 30 anos, com a inserção de modo mais consequente do CAD no design de produto, ocorreram inúmeras alterações que nem sempre foram suficientemente aprofundadas. Nas primeiras décadas (e actualmente ainda nalguns casos) os sistemas CAD funcionavam apenas como modo de substituição, desempe- nhando as mesmas tarefas manuais mas tornando o proces- so mais rápido e produtivo. “Os computadores servem, basi- camente, para desenhar (passar a limpo) o que é projectado, primeiramente, sobre papel” (MALDONADO 1997: 85). Hoje 22T.L. do original: “So confi-

dent was Negroponte of the machine’s ability to become like humans that he dedica- ted The Architecture Machine to ‘the first machine that can appreciate the gesture’.”

23T.L. do original: “In many

cases, the influence is misun- derstood or goes undetected at all. As designers embrace the new technology for all its benefits, they must also become increasingly more cognizant of its less obvious impacts on their work and its products.”

24T.L. do original: “It has

become clear that the com- puter, like any tool, inevitably changes, for better or for wor- se, the processes that it was meant to aid.”

essas alterações estão a atingir patamares mais elevados que mexem com a mecânica do próprio processo de design, criando uma linguagem e lógica próprias.

Para percebermos o alcance dessa mudança, procuraremos comparar o processo de design efectuado através de métodos tradicionais versus métodos de sistemas CAD. Por métodos tradicionais definimos todos os métodos de representação que se processam sem o auxílio de qualquer equipamento infor- mático, nomeadamente o desenho manual, geométrico ou não – utilizando lápis, caneta, régua, esquadro e compasso – os protótipos e maquetas manuais, etc.

Fig. 9. Em cima: paradigma analógico (torneira Panda); em baixo: paradigma digital (garrafa de gás CoMet), de Carlos Aguiar (designdeen- genho.blogspot.com).

A grande inovação dos métodos de representação digital é a grande variedade de escolhas e capacidade de rápida alteração da qualidade gráfica, ponto de vista, iluminação, cor e textu- ra. Com os métodos tradicionais essas escolhas eram muito mais morosas e nalguns casos impraticáveis. A qualidade dos ficheiros entregues melhorou de modo significativo. Estudos demonstram que o projecto de design se tornou bastante mais rápido e eficaz com a utilização de sistemas CAD. Hoje em dia o tempo de lançamento dos produtos é muito mais rápido, e o projecto acompanhou essa mudança. Todo o processo de design se tornou mais produtivo, nomeadamente as fases de engenha-

ria e produção. O armazenamento de informação infinito per- mitido pelo computador permitiu uma redução de espaço de ar- quivo. Estas e outras mudanças traduzem de modo irrefutável os benefícios dos sistemas CAD.

Com os métodos tradicionais a comunicação da imagem do pro- duto acabado era transmitida através de esboços e maquetas, e tinham de existir deslocações. “O processo era lento e a par- ticipação dos consumidores ou utilizadores não existia” (MAL- DONADO 1997: 84). Com a digitalização o cliente passa a ter um peso muito maior no processo de design, marcando presen- ça em todas as fases do processo. Todos os intervenientes no processo de concepção, produção e consumo podem trabalhar sobre uma mesma plataforma em locais diferentes, anulando as distâncias geográficas e os tempos perdidos em deslocações. A passagem do análogo para o digital não se limita a uma tecnologia e sim a uma verdadeira revolução cultural (BÜRDEK 2006: 403).

Concepção

No processo de design manual, designers humanos geram po- tenciais soluções, de modo complexo e muitas vezes imprevi- sível. No caso de soluções geradas pelo computador, essa ope- ração é feita lógica e matematicamente. (MITCHELL 1975: 147). O processo analógico assenta numa dedução (geral para o particular) – afunilar as soluções para os problemas (proces- so heurístico) – e o digital sobre uma indução (particular para o geral) – gerar e analisar diversas soluções até chegar a uma oportunidade.

Discute-se se os computadores matam ou não o processo criativo. Muitos dizem que sim. Para outros trata-se de uma preocupação sem sentido porque os com- putadores continuam a ser estúpidos (MALDONADO 1997: 86).

Representação

A representação do projecto reside em grande parte no uso de modelos icónicos, como vistas, cortes, perspectivas, e modelos ou protótipos. Com o desenvolvimento dos métodos computa- cionais, a quantidade e a manipulação de informação é feita muito mais rápida e eficazmente (MITCHELL 1975: 147). O suporte com que representamos uma ideia alterou-se do papel

e lápis para o teclado, rato e mesas digitalizadoras. A diferen- ça é que as imagens no computador podem ser mais dinâmicas do que no papel.

Fig. 10. Mesa digitalizadora (www.howtoweb.com/pho- tography).

Enquanto que com os métodos tradicionais a correcção era sempre bastante custosa, muitas vezes existindo a necessida- de de repetir todo um trabalho realizado, com os sistemas CAD as alterações podem fazer-se numa questão de segundos. Estas alterações podem alcançar proporções significativas no baixar de custos e preços quando se trata de um modelo tridimensio- nal que poderá avançar para a produção sem a necessidade de construir tantos protótipos, isto porque alguns erros são corri- gidos virtualmente. A cópia dos desenhos técnicos manuais era extremamente difícil; com a informação digitalizada podemos obter o número de cópias que desejamos em segundos. O ou- tput pode tomar a forma de um desenho tradicional, mostran- do o princípio clássico de vistas ortogonais (superior, inferior, lateral), acompanhado por uma vista tridimensional. Com os sistemas CAD é possível elaborar os desenhos técnicos a partir do modelo 3D ou apresentar um projecto através de uma ani- mação do modelo.

Uma alteração que se produziu com a introdução das tecnolo- gias CAD foi a questão das diferenças entre o desenho 2D para o desenho 3D. No método analógico, a maior parte das vezes efectuavam-se desenhos técnicos em 2D e depois passava-se para o 3D, e assim continuou com a introdução dos novos mé- todos CAD. No entanto, começamos a assistir ao fenómeno in- verso, isto é, a passagem do modelo 3D para os desenhos 2D.

Aliás, podemos ainda prescindir totalmente do desenho bidi- mensional, se o suporte 3D entre o modelo conceptual e o mo- delo para prototipagem rápida e/ou produção for semelhante.

Análise

No processo de design manual, a análise é normalmente efec- tuada nos primeiros estágios do projecto, através de repre- sentações gráficas e numa fase mais desenvolvida do projecto através de análises numéricas, nomeadamente de desempenho estrutural, térmico, etc. Podem ser também utilizados mode- los ou protótipos. Todas essas análises foram, ou podem ser, transferidas para o computador, que se baseia em informação armazenada na sua memória. Com a construção de protóti- pos digitais é possível a realização de inúmeros testes, embora actualmente ainda seja necessária a realização de protótipos físicos.