CULTURA DA PAZ Ações pacíficas pautadas
3.2. Perspectivas Metodológicas do Sistema Escolar
Braslavsky (2005) afirma que não há progresso sem educação, mas que somente a educação “não é garantia de progresso: depende de sua qualidade” (p.40).
Os Parâmetros Curriculares Nacionais (Brasil, 1997a) reafirmam que “a qualidade do ensino é condição necessária à formação moral de seus alunos” (p.79), visto que as opções didáticas, os métodos, bem como a organização das atividades, do tempo e do espaço que compõem a experiência educativa, ensinam valores, atitudes, conceitos e práticas sociais.
A qualidade abrange, dessa forma, as estratégias educativas adotadas no contexto escolar que podem favorecer, em maior ou menor medida, o desenvolvimento da autonomia e o aprendizado da cooperação e da participação social (Brasil, 1997a).
A valorização da ação em detrimento da palavra e da experiência em detrimento da explicação teórica é destacada por Freinet (1973), Galtung (1976), Albala-Bertrand (1999, 1999b), Jares (2002) e pelo documento Parâmetros Curriculares Nacionais (Brasil, 1997a), ressaltando-se a necessidade da coerência entre o discurso e a prática e da persuasão pela vivência de valores e atitudes coadunados aos propósitos pacíficos.
Segundo Galtung (1976), a abordagem da não-violência foca-se na idéia da internalização – e não coerção – constituindo-se sob a base de que a persuasão é mais eficaz se expressa em termos de ação, ao invés de palavras.
Nesse sentido, a 46ª Sessão da Conferência Internacional da Educação (UNESCO, 2003) destaca as seguintes orientações referentes ao aspecto metodológico:
o Favorecer o desenvolvimento completo e equilibrado da personalidade, a fim de preparar o indivíduo para a prática de uma cidadania ativa e aberta para o mundo. Albala-Bertrand (1999, 1999b) complementa essa perspectiva, afirmando que aprender na prática, em situações interativas, mostra-se especialmente eficiente como abordagem didática e pedagógica em situações complexas como as representadas pela construção da cidadania. Segundo o autor, a abordagem educacional construtivista oferece oportunidades para a socialização almejada no contexto educativo, compatíveis com as exigências da cidadania participativa. Tal abordagem, por posicionar o professor como mediador e por fortalecer o papel do aluno, respeita as concepções dos aprendizes, favorecendo a identificação de seu papel no mundo social e, em particular, em relação aos seus pares.
Considerando que problemas de socialização cívica e política não podem ser reduzidos a uma simples aquisição espontânea por intermédio da interação social, e que a educação tem um papel a desempenhar no desenvolvimento do caráter do indivíduo, Doise (1999) ainda propõe elementos para a didática sociogenética construtivista da cidadania.
Segundo Jares (2002), os princípios básicos sobre os quais deveria fundamentar-se a forma de Educar para a Paz são:
o a compatibilização da forma com a idéia da paz: implica a utilização de métodos dialógicos, experimentais e de pesquisa, mediante os quais não apenas se alcançarão os objetivos ligados ao conteúdo, mas ao próprio processo de aprender.
o a utilização preferencial dos enfoques positivos: a ênfase deve ser colocada no que une as pessoas, mais do que nas separa, mais na paz do que na guerra e nos desastres. o a relação entre o micro e macro meio: afirma que a microsituação é, em parte,
conseqüência da macrossituação, mas ao atuar sobre as realidades próximas, atua-se, simultaneamente, sobre o macromeio.
o a atividade: a Educação para a Paz apóia-se na e para a atividade.
o a justaposição forma de educar–forma de viver: segundo o autor, “educar para a paz exige um compromisso por parte do educador dentro e fora da classe” (p.217).
Jares (2002) propõe a utilização do método sócioafetivo, que questiona a forma tradicional de aprender baseada exclusivamente no acúmulo de informações sem a mediação de uma experiência pessoal ou de aproximação interpessoal. O método proposto fundamenta-se no desenvolvimento da empatia e no contraste analítico entre o que se vive e o que conhece do mundo circundante, por meio de “situações experimentais” que favorecem: a vivência de uma experiência; a descrição e análise das vivências; a afirmação e auto-conceito positivo; o desenvolvimento da auto-confiança e da comunicação; o reforço do sentimento grupal e de comunidade; o
desenvolvimento da capacidade de tomada de decisões em grupo e resolução de conflitos; o reforço da capacidade de análise e síntese; e o desenvolvimento de condutas pró-sociais. Tal método apresenta não apenas uma nova forma de conhecer, como também uma nova forma de relacionamento com o conhecimento. Nessa perspectiva, o autor sugere a adoção de técnicas cooperativas de gestão da sala de aula e da escola, pautadas nas concepções freinetianas de organização, por considerar coerente aos princípios democráticos, visto que sua pedagogia circula entre o individual e o coletivo (Elias, 2004). Inserem-se como propostas didáticas os planos de trabalho, a biblioteca em sala, a assembléia de classe, as aulas-passeio, os jogos de simulação, os estudos de caso, as análises de textos literários e outros exercícios que permitem potencializar a autonomia, a cooperação e a co-responsabilidade.
Rabbani (2003) ainda afirma que o método dialógico mostra-se o mais adequado para a Educação para a Paz, visto considerar as diferentes perspectivas e favorecer o diálogo entre elas, independentemente da disciplina ensinada. Conforme expõe, aquele que é educado dialogicamente “tem suas decisões na escola e fora dela” (p.89) por estar imbuído de questionamentos, razões e valores que o conduzem ao “bem comum”.
Verifica-se, dessa forma, que as diferentes propostas metodológicas contemplam os aspectos social, relacional e afetivo que permeiam o contexto escolar, primando pelo respeito às concepções de seus diferentes atores e pela coerência entre o discurso e a prática pedagógica. Por visar ao desenvolvimento individual e coletivo, as diferentes metodologias favorecem a abordagem e a vivência dos diferentes componentes da Educação para a Paz.