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PESQUISA QUALITATIVA E ETNOGRÁFICA: MEU LUGAR

3. CAPÍTULO II – INTERDISCIPLINARIDADE E

3.2. PESQUISA QUALITATIVA E ETNOGRÁFICA: MEU LUGAR

Por tratar-se de um estudo que lida com diferentes campos de saberes, esta pesquisa qualitativa36 trabalha com uma metodologia que

procura possibilitar o trânsito entre as diferentes áreas, buscando elementos que possam contribuir para a construção de um quadro

36 Tratou-se de uma pesquisa qualitativa, uma vez que essa modalidade é capaz de “incorporar a questão do significado e da intencionalidade como inerentes aos atos, às relações, e às estruturas sociais [...] tanto no seu advento como na sua transformação” (MINAYO, 2006).

referencial teórico. Tendo em vista esta ótica interdisciplinar, procurou- se estruturar diferentes disciplinas e áreas do conhecimento na tentativa de problematizar o corpo no esporte. Como caminho metodológico para tal incursão, estabelecemos os pressupostos da etnografia, um método “emprestado” da antropologia.

A etnografia procura entender uma cultura estudada a partir de sua própria lógica, partindo das explicações do próprio meio pesquisado. Essa cultura é compreendida por Geertz (2008) como uma teia de significados construída pelos próprios sujeitos, possível de ser interpretada. Dada a complexidade da relação entre o sujeito e a cultura na qual ele está inserido, a interpretação dos sistemas simbólicos é um elemento central para a produção etnográfica. Mas, para compreender a organização social, os significados das práticas e representações, precisamos fazer a leitura a partir do ponto de vista dos sujeitos pesquisados. Para enxergar esse mundo a partir dessa perspectiva, pergunta-se constantemente sobre a relevância dos fatos, o que realmente está sendo transmitido, o que os sujeitos pensam e fazem em relação ao que se estuda. Essa tarefa envolve tanto a descoberta de estruturas conceituais que informam os atos e os discursos sociais dos sujeitos quanto a elaboração de um sistema de análise capaz de interpretar as informações obtidas (GEERTZ, 2008).

Analisar o corpo sob tal perspectiva é observar a vida social de um povo, salienta Novaes (2006). Segundo a autora, ao corpo cabe, além de ocupar um lugar em um espaço, “uma linguagem que se institui antes daquilo que denominamos ‘falar’, que exprime, evoca e suscita uma gama de marcas e falas implícitas” (NOVAES, 2006, p. 24, grifos da autora). Nessa direção, “o corpo responderá a uma soma de solicitações da vida social por meio de gestos, sensações, sentimentos” que o inserem em uma lógica específica (ibid, p. 45). A etnografia, então, apresentada como a interpretação dos discursos sociais e sua análise, auxilia na compreensão do corpo que pretendemos analisar na cultura da ginástica rítmica.

Para compreender esse corpo, partimos de uma experiência prolongada entre as nativas de uma equipe de ginástica rítmica. Analisamos o que elas faziam e diziam sobre suas práticas, escolhas, gostos, conceitos. Isso exigiu conviver entre as ginastas e treinadoras, compartilhar com elas seus hábitos e modos de vida, “una mirada desde adentro” (GARCÍA; CASADO, 2008, p. 47, grifos dos autores), preocupada em alcançar a compreensão dos significados atribuídos nesse contexto. Buscou-se, com isso, considerar o ambiente, a interação entre os sujeitos, a postura corporal, a linguagem verbal e não verbal, o

vocabulário próprio, os acontecimentos, os comportamentos e normas de conduta explícitas e implícitas; a multiplicidade de estruturas complexas presentes nesse subcampo.

Esse fazer etnográfico, como sugere Magnani (2002, p. 17), “é antes um modo de acercamento e apreensão do que um conjunto de procedimentos”. Para tanto, pode-se usar e servir-se de várias técnicas durante um período que se fizer necessário, conforme as circunstâncias de cada pesquisa e o que se pretende verificar. Assim, para realizarmos esse acercamento, utilizamos algumas técnicas, tais como: observações e anotações em um diário de campo, entrevistas (gravadas ou não), registros visuais (vídeos, fotografias), envio de questionários, análise de fontes escritas e audiovisuais. Praticar etnografia significa, assim, “estabelecer relações, selecionar informantes, transcrever textos, levantar genealogias, mapear campos, manter um diário e assim por diante” (GEERTZ, 2008, p. 4). Para esse autor, não são apenas essas coisas, as técnicas, os processos determinados, que definem essa metodologia, mas sim o tipo de esforço intelectual que ela representa: uma descrição densa.

Nesses densos escritos etnográficos, está a maior parte do que precisamos para compreender um acontecimento particular, um ritual, um costume, uma ideia, ou o que quer que seja, e o seu significado dado por um grupo social. É a partir desses registros (feitos dentro de uma postura metodológica diferente de um simples visitante, turista) que (d)escrevemos a cultura ou a prática cultural estudada. Preocupamo-nos em apresentar a lógica que estrutura uma cultura em uma descrição em que os dados aparecem densamente entrelaçados (GEERTZ, 2008).

Assim, em um primeiro momento, coletamos, em forma de descrições, todos os detalhes observados e vivenciados no cotidiano do grupo estudado, observamos as regularidades na vida das ginastas, buscamos apreender a organização social e visão de mundo dos sujeitos, descrevemos as expressões nativas, os acontecimentos. Transcrevemos longos depoimentos, tomamos nota de tudo que pudesse nos ajudar a compreender nosso problema de pesquisa e também na ampliação desse mesmo problema. Todas essas minúcias foram registradas em um diário de campo, constituindo o material bruto a forma textual de uma descrição densa. Aqui, enfrentamos, de fato, uma multiplicidade de estruturas conceituais complexas que são simultaneamente irregulares, obscuras, que foram aos poucos apreendidas e depois apresentadas. A análise, portanto, foi feita a partir das estruturas de significações (códigos

estabelecidos) e determinada por sua base social e importância, como sugere Geertz (2008).

Para a construção desse trabalho, foi preciso, ainda, ir ao campo com um projeto aberto, disposto a reconfigurar as questões originais e colocar outras, ou seja, (re)construí-lo a partir do próprio campo analisado. O método etnográfico recusa uma orientação definida e fechada previamente; ao contrário, aprimora-se pelo constante confronto com dados novos, novas experiências de campo, resultando em uma variável infinita de especulações, como sugere Peirano (2014). É este contraste, essas surpresas ao explorar um determinado grupo, o colocar- se em perspectiva, a negação de demarcação de fronteiras intelectuais e o deixar-se “seduzir”, que enriquecem o trabalho etnográfico. Essa “postura etnográfica” nos permite falar sobre a experiência de campo, informar sobre os problemas (teóricos e existenciais) que enfrentamos, refletir o que vivenciamos para confrontarmos com o que foi construído por nós a partir do outro.

Não significa, contudo, que a teoria tenha apenas que se ajustar às realidades passadas ou a gerar interpretações convincentes; ela tem que sobreviver – intelectualmente – no confronto com as realidades que estão por vir (GEERTZ, 2008). O arcabouço teórico deve ser capaz de continuar a render interpretações à medida que surgem novos fenômenos sociais. Como defende Peirano (2008, p. 3), a etnografia não é apenas uma metodologia ou uma prática de pesquisa, “mas a própria teoria vivida [...]. No fazer etnográfico, a teoria está, assim, de maneira óbvia, em ação, emaranhada nas evidências empíricas e nos nossos dados.”. O fazer etnográfico é perpassado pela teoria e a prática e é ali continuamente construído por meio da comparação entre os estudos realizados e a realidade dos dados empíricos. Vamos a campo munidos de teorias e voltamos retroalimentando-as, transformando-as.

Nesse trabalho, “a personalidade do investigador e sua experiência pessoal não podem ser eliminadas do trabalho etnográfico. Na verdade, elas estão engastadas, plantadas nos fatos etnográficos que são selecionados e interpretados.” (ibid, p. 3-4). As novas informações adquiridas devem ser “mergulhadas”, interligadas à nossa experiência e à do outro, como explica Geertz (2008, p. 21):

Olhar as dimensões simbólicas da ação social – arte, religião, ideologia, ciência, lei, moralidade, senso comum – não é afastar-se dos dilemas existenciais da vida em favor de um domínio

empírico de formas não emocionalizadas; é mergulhar no meio delas. A vocação essencial da antropologia interpretativa não é responder às nossas questões mais profundas, mas colocar à nossa disposição as respostas que outros deram [...] e assim incluí-las no registro de consultas sobre o que o homem falou.

Observa-se que este contato direto com o outro é um processo complexo porque o pesquisador está, em princípio, em meio a uma rotina específica, em que não se estranha apenas o nativo, mas também o próprio eu. Sobre essa relação entre o/a pesquisador/a e seu trabalho de campo, Goldman (2008, p. 7) informa que:

Os discursos e práticas nativos devem servir, fundamentalmente, para desestabilizar nosso pensamento (e, eventualmente, também nossos sentimentos). Desestabilização que incide sobre nossas formas dominantes de pensar, permitindo, ao mesmo tempo, novas conexões com as forças minoritárias que pululam em nós mesmos. O que caracterizaria esse trabalho é essa formação para “ser afetado” por outras experiências, como nos sugere o autor. Esse debate sobre a vivência de um/a pesquisador/a com uma situação social dinâmica e que é, ao mesmo tempo, afetado por ela, se tornou uma contribuição altamente significativa para o pensamento etnográfico, explica Firth (1997). Assim, apesar de os dados serem a interpretação a partir do olhar do outro, percebe-se que a experiência etnográfica procura conhecer o grupo pesquisado de um ponto de vista elevado e afastado, ao mesmo tempo, submerso e afetado.

Dado que as pesquisas etnográficas são construídas a partir da experiência de campo, o lugar que o/a pesquisador/a ocupa em um determinado espaço social se faz importante compreender. Essa construção é feita com base em visões e experiências tomadas a partir de um ponto de vista, isto é, a partir de uma determinada posição no campo, em que os sujeitos-objetos interagem (BOURDIEU; CHAMBOREDON; PASSERON, 1999). Esse enfoque, nas relações dos sujeitos-objetos, é determinante para mais bem entender a posição e o olhar do/a pesquisador/a, pois, dependendo dessa relação, os discursos e as práticas podem possibilitar singularidades no interior do campo.

No caso desse estudo, trabalhamos com uma equipe de ginástica rítmica, na qual participei, em anos anteriores, como atleta e auxiliar técnica. Apesar de observar o próprio campo, porém agora de outro lugar, como pesquisadora e não mais como atleta e auxiliar técnica, foi-me concebido um espaço nos bastidores. Assim, essa condição de “sujeito do campo” me proporcionou diversas posições e aproximações durante o trabalho. Isso foi observado, por exemplo, nos rituais de chegada no ginásio de treinamento, em que todas as ginastas se levantavam para me cumprimentar, mesma atitude que faziam com as treinadoras. Percebe-se que não só a minha posição foi afetada por minha experiência de ex-atleta, auxiliar técnica e pesquisadora, mas também a dos próprios sujeitos investigados. Dessa forma, as ginastas tinham condutas diferentes devido à minha inserção anterior naquele grupo e, por conta disso, proporcionaram-me um lugar singular dentro do grupo.

Essas questões sobre a experiência etnográfica, vista ao mesmo tempo como produção e recepção da realidade, permitem perceber que o componente subjetivo é um aspecto relevante na pesquisa qualitativa – e também quantitativa37 –, pois, apesar de todos os controles

metodológicos, as subjetividades são inevitavelmente expressão dos interesses e das formações social e cultural dos envolvidos. Segundo Demo (2004), apesar de o método científico preferir trabalhar com aquilo que é mais fácil de mensurar, desprezando o subjetivo, o inesperado, acreditando que nas regularidades é que estão contidas as verdades, “o mundo que nos tem como sujeitos é um mundo reconstruído também subjetivamente” (p. 24). Fazer pesquisa, portanto, implica realizar opções epistemológicas e metodológicas e estas nunca são neutras nem a- históricas.

Assim, mesmo sendo a realidade algo independente de nós, de maneira determinante o/a pesquisador/a deixa transparecer, em sua análise, seu quadro de referências, sua postura teórica, seus valores e, portanto, sua subjetividade. Não apenas aquilo que contamos, mas o que nos levou a escolher um determinado tema, como nos sentimos face às escolhas que temos de fazer e, sobretudo, como as fizemos: essa parcialidade esteve presente na escolha do nosso campo de estudo. Adotar como objeto de investigação as ginastas e suas relações com o mundo em que estão inseridas foi, sem dúvida, uma opção pessoal que esteve

37 Sobre a questão que se refere ao controle intersubjetivo e à busca de objetividade, consultar o texto de Cupani (1989) “A objetividade científica como problema filosófico”.

permeada por significações, apreensões e esforço investigativo38.

Portanto, ao refletir sobre algumas questões que envolveram o nosso trabalho, as visões e as experiências pessoais foram consideradas, pois, como explica Jenkins (2007), “ninguém, não importando quão imerso esteja no passado, consegue despojar-se de seu conhecimento e de suas pressuposições” (p. 33).

Se a tarefa do/a pesquisador/a consiste na aproximação ao significado ou à compreensão dos/as participantes, pertencer ao mesmo meio, conhecer a regulamentação e os termos técnicos podem ajudar na aquisição desses conhecimentos e proporcionar uma leitura mais específica e aprofundada. Contudo, um problema que está presente nessa dinâmica é a interpretação dos atores culturais cair em um subjetivismo, em que se passa a ter impressões estritamente pessoais, na medida em que é necessário certo distanciamento.

Uma das formas de lidar com esta questão é o estranhamento, um esforço sistemático de análise de uma situação familiar como se fosse estranha, para evitar que se torne um espelho da própria cultura estudada (VELHO, 1978). Como ensina Gilberto Velho, uma das mais tradicionais premissas das ciências sociais é a necessidade de uma distância mínima que garanta ao investigador condições de objetividade em seu trabalho. O autor afirma ser preciso ver com olhos imparciais a realidade, evitando envolvimentos que possam obscurecer ou deformar seus julgamentos e conclusões. Assim, mesmo sendo parte do campo investigado, é preciso reconhecer as treinadoras e as ginastas como “nativas” engajadas em rituais, interpretações, representações, ocupando papéis, envolvidas em classificações sociais, culturais, educacionais, políticas que estão marcadas em suas corporeidades. Deve-se, assim, deixar em segundo plano a intuição e procurar trabalhar com a análise de dados de maneira profunda e distante.

Trata-se de um problema complexo, pois envolve as questões de distância, transformando o “exótico em familiar” e o “familiar em exótico”, salienta Roberto DaMatta (1978). Sobre isso o autor sugere que o que sempre vemos e encontramos pode ser familiar, mas não é necessariamente conhecido, e o que não vemos e encontramos pode ser exótico, mas, até certo ponto, conhecido. Assim, a “realidade” (familiar ou exótica) sempre é percebida de maneira diferenciada. O processo de

38 “O interesse ligado ao fato de se pertencer a um campo está associado a uma forma de conhecimento prático, interessada, que aquele que não faz parte do campo não possui”, coloca Bourdieu (2004b, p. 110).

descoberta e análise do que é familiar pode, sem dúvida, envolver dificuldades diferentes do que aquilo que é exótico.

O fato de estarmos envolvidos com a área de análise pode tornar mais difícil o reconhecimento de certas crenças e incorporações, mas é por meio de uma prática reflexiva e de certo distanciamento que podemos desenvolver uma perspectiva crítica sobre as próprias práticas e as práticas dos outros. Como ensina Christine Hine ao ser entrevistada por Adriana Braga (2012), essa tarefa exige explorar o fenômeno sob todos os ângulos, tentando entender o que ele é, para quem existe e como é vivenciado para compreender os espaços complexos e adquirir nossa própria experiência autêntica desses fenômenos como etnógrafos inseridos, incorporados, e refletindo constantemente sobre o que sabemos e como o sabemos. Para a autora, esse refletir a respeito de como sabemos e o que sabemos sobre uma situação refere-se à reflexibilidade, a parte mais significativa da etnografia. É importante, portanto, “refletir continuamente sobre a maneira como nosso entendimento é plasmado por determinadas abordagens metodológicas, pelo subconjunto de participantes com quem acontece de estarmos interagindo e pelos meios que escolhemos para essas interações” (BRAGA, 2012, p. 4). Esse aspecto deve fazer parte da abordagem etnográfica e não tratar simplesmente como um modo de obter informações sobre uma realidade pré-existente.

Assim, os aspectos objetivos e subjetivos da experiência devem ser confrontados, relativizando assim esta última, ao mesmo tempo em que busca ampliar, em vez de estreitar e limitar, o diálogo (BAUMAN, 2015). Para o autor, a relativização visa ambos os lados do encontro entre experiência (objetivo) e vivência (subjetivo)39: “é a dialética de sua

interação que poderia ser chamada de objetivo último do diálogo” (ibid, p. 21). Essa interação entre a objetividade e a subjetividade no diálogo teórico e prático fez parte de nossa pesquisa.

39 Segundo Bauman (2015), experiências e vivências são dois diferentes fenômenos gerados na interface pessoa e mundo. Para o autor, experiência é o que acontece comigo ao interagir com o mundo e pode almejar o status objetividade, enquanto a vivência é o que eu vivencio no curso desse encontro e é explicitamente subjetiva. “A primeira pode ser apresentada como um relato proveniente do mundo externo ao ator. A segunda, como algo indo “de dentro” do ator e concernente a pensamentos, impressões e emoções privados, só é disponível na forma de relato feito por ele.” (p. 19).

Demo (2004) acrescenta, ainda, que é preciso saber buscar aquilo que não se enxerga com tanta facilidade, aquilo que teima por se esconder, por se dissimular nos discursos. Para tal fim, é fundamental criticar o que se está pensando, vendo e o que o outro está falando, fazendo esse exercício conscientemente. Perguntas importantes fazem parte desse processo: “O que os fatos revelam?”; “O que os fatos dizem para mim?”. Pierre Bourdieu, Chamboredon e Passeron (1999) compartilham desse “jogo metodológico” ao mostrar que é preciso desnaturalizar e desestruturar as crenças incorporadas pelo/a próprio/a pesquisador/a, professor/a, aluno/a. É preciso, ao nosso ver, elaborar uma “autoanálise” das categorias sociais inconscientes, especialmente relacionadas a aspectos subjetivos sobre o corpo (feio, bonito, feminino, masculino, gordo, magro) que são produto da mesma dominação sobre o/a pesquisador/a. Perceber isso pode permitir que se refaçam ou desestabilizem as categorias incorporadas, tomando consciência dos efeitos da violência simbólica sobre si próprio. Esse exercício leva a repensar algumas simplificações feitas nos campos pesquisados e a problematizar os significados atribuídos pelos sujeitos.

Há, portanto, lugar para uma objetivação participante e tudo o que esta implica, isto é, um domínio consciente dos interesses ligados ao fato de se pertencer ou não ao campo (BOURDIEU, 2004b). É com a condição de saber que se pertence ao campo de estudo que se pode controlar os efeitos dessa inserção e retirar daí as experiências e informações necessárias para produzir uma objetivação não redutora, capaz de superar a alternativa do interior e do exterior, da vinculação cega e da lucidez parcial. A facilidade de “ser do campo”, portanto, contribui com a aproximação da ginástica e, por ser pesquisadora, em trazer perguntas que são de “fora do campo”, questionamentos que o próprio meio não perguntaria, talvez pelo fato de que as práticas referentes ao corpo [educado] tornaram-se naturalizadas pelos sujeitos.

Essa relação entre sujeitos-objetos é essencial para pensar o meu lugar no interior do campo e como produzir um conhecimento válido e objetivo, apesar de toda subjetividade intrínseca presente no estudo. Temáticas como essas se encontram, muitas vezes, nas zonas de sombra, sendo responsabilidade do/a pesquisador/a trazê-las à luz, descobrir espaços, atribuir-lhes significados. É por meio dessas questões, inquietações, impressões, sentimentos, esboços teóricos, discursos, práticas e observações do espaço social que se pode alcançar a complexidade de um determinado campo, encará-lo como problema e não

naturalizar as descrições semelhantes e divergentes. Questões de desconstrução e desnaturalização fazem parte das reflexões desse trabalho permanentemente – reflexões essas que só são possíveis por meio de um “diálogo com a experiência humana” (BAUMAN, 2015, p. 18).

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