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4 PESQUISAS ANTERIORES SOBRE ATITUDES LINGUÍSTICAS

4.3 PESQUISAS BASEADAS NOS CORPORA DO PROJETO CRENÇAS E

LINGUÍSTICAS: UM ESTUDO DA RELAÇÃO DO PORTUGUÊS COM LÍNGUAS EM CONTATO

Por último, conforme anunciado no início desta seção, tecem-se algumas considerações sobre os primeiros resultados do projeto Crenças e atitudes linguísticas: um

estudo da relação do português com línguas em contato (AGUILERA, 2009), descritos em

pesquisas de Pós-Graduação Stricto Sensu.

Em 2010, Botassini apresentou o trabalho intitulado Crenças e atitudes linguísticas:

um estudo da relação do português com línguas de contato em Foz do Iguaçu, posteriormente

publicado nos anais do evento de que participou. A autora analisou dados de Foz do Iguaçu, município localizado no extremo oeste paranaense, na tríplice fronteira (Brasil-Paraguai- Argentina). Diferentemente das demais localidades abarcadas pelo projeto, em Foz do Iguaçu foram entrevistados 36 informantes, utilizando-se como instrumento de coleta de dados um questionário contendo 57 questões. O recorte utilizado por Botassini (2010) correspondia às perguntas em que os informantes avaliavam quem fala melhor ou pior e qual língua é a mais bonita ou mais feia, bem como às perguntas em que deveriam dizer se morariam em bairros onde predominassem determinados grupos étnicos ou se consultariam médico ou dentista dessas etnias. Entre os resultados, a autora constatou: a) lealdade linguística dos informantes à língua nativa; b) preconceito linguístico com relação, sobretudo, aos falantes de guarani, aos árabes e aos chineses; c) preferência pela língua espanhola, notadamente a falada pelos argentinos, por ser, segundo os informantes, de mais fácil compreensão; e d) associação do modo de falar do indivíduo com sua cultura, seu caráter, sua personalidade etc., permitindo inferências a respeito de um falante com base em sua linguagem.

Também em 2010, sob orientação da professora Vanderci de Andrade Aguilera, Silva- Poreli defendeu a dissertação intitulada Crenças e atitudes linguísticas na cidade de

Pranchita – PR: um estudo das relações do português com línguas em contato, analisando os

inquéritos de Pranchita, município vizinho a Santo Antônio do Sudoeste e igualmente na fronteira com a Argentina. A autora verificou que, de modo geral, os informantes não demonstraram atitudes estritamente negativas em relação aos diferentes falares de Pranchita, mas apenas algumas manifestações de crenças negativas relacionadas ao idioma alemão, julgado feio e/ou de difícil compreensão, bem como aos seus usuários, que se mostrariam bastante “reservados”. Para a autora, tais crenças negativas poderiam estar relacionadas à forma de organização da família teuto-brasileira, fundamentada nas tradições provenientes da

Alemanha, cujos membros se manteriam em colônias afastadas de outras etnias e, consequentemente, acabariam ficando mais reservados.

Quatro tipos de atitudes positivas foram identificados por Silva-Poreli (2010) em Pranchita: a) apreço à língua dos ancestrais, acompanhado de sentimento de pertencimento à etnia, mas sem manifestação de rejeição aos costumes brasileiros e à língua portuguesa; b) aceitação, sem maiores restrições, à língua e à cultura do Brasil; c) “tentativa” de manter os valores e as línguas dos antepassados; e d) atitudes muito positivas em relação ao país vizinho e ao seu idioma. A autora observou entre os pranchitenses uma aparente frustração pela não manutenção da cultura ancestral. Para compensar essa lacuna, Pranchita organiza festas típicas, com comidas, danças e músicas típicas, na tentativa de conservar os principais traços culturais, mesmo que a língua já tenha se perdido.

Ao contrário das expectativas iniciais de que brasileiros e argentinos possuiriam crenças negativas mútuas, Silva-Poreli (2010) não constatou nenhuma rivalidade entre os pranchitenses e seus vizinhos. As atitudes em relação aos argentinos foram, de fato, muito positivas, pois esse grupo foi avaliado como quem fala melhor entre os diversos grupos étnicos e como quem possui a língua mais bonita, depois do português. Aliás, as crenças foram extremamente positivas quanto à língua portuguesa falada no Brasil, tida como a mais bonita entre todas as citadas pelos informantes (italiano, alemão, espanhol, polonês). A autora atribui as boas relações entre Pranchita e a cidade vizinha de San Antonio (Argentina) à forma de colonização das cidades, em cujo processo o argentino participou ativamente, bem como às atuais relações comerciais entre as duas localidades.

Em 2011, Pastorelli defendeu dissertação intitulada Crenças e atitudes linguísticas na

cidade de Capanema: um estudo da relação do português com línguas em contato, orientada

por Aguilera, em que analisou dados da localidade de Capanema, também localizada no Sudoeste do Paraná e na fronteira com a Argentina, onde o português convive com as seguintes línguas: italiano, alemão e espanhol (nas variedades argentina e paraguaia).

No que concerne aos falantes do espanhol, Pastorelli (2011) constatou que a maior parte dos capanemenses manifestava atitude altamente positiva com relação aos argentinos, mas os paraguaios eram vistos de maneira desprestigiada e, por vezes, estereotipada por alguns informantes, que alegaram diferenças linguísticas, culturais ou étnicas (origem indígena) desse grupo, além da condição desfavorável do Paraguai (baixa tecnologia e ensino deficiente), como justificativas para o baixo prestígio a eles atribuído. Já entre os grupos de eurodescendentes, os alemães foram julgados pelos informantes como um povo sério, organizado e que não demonstrava muito as emoções, ao passo que os italianos gozavam de

bastante prestígio, especialmente no tocante ao estabelecimento de relações de vizinhança, amizade e vínculo amoroso, sendo caracterizados como alegres e espontâneos.

Quanto às atitudes em relação às línguas em contato em Capanema, Pastorelli (2011) encontrou os seguintes resultados: a) na comparação das variedades faladas na localidade e na opinião sobre quem fala melhor, a língua portuguesa obteve mais da metade das respostas positivas, seguida da italiana e da espanhola, línguas julgadas mais fáceis de entender, por serem mais próximas do português; b) o idioma espanhol foi eleito o mais bonito entre os demais, enquanto a língua alemã foi considerada feia, difícil ou esquisita, mas as justificativas mostraram que a motivação para essa resposta estava vinculada à dificuldade de compreensão do idioma; e c) todos, sem exceção, defenderam a inclusão de outras línguas na grade do ensino regular, especialmente o espanhol, que teve o maior número de indicações em virtude da proximidade de Capanema com a fronteira e também em razão da beleza da língua, segundo a crença manifestada pelos informantes.

Em março de 2012, Santana, sob orientação de Aparecida Feola Sella, defendeu a dissertação intitulada Crenças e atitudes de falantes de Foz do Iguaçu, em que buscou verificar como os falantes construíam suas crenças e como agiam diante do falante de outra língua que não a portuguesa. Para atingir seu objetivo, a autora analisou dezessete questões do inquérito feito com os 36 informantes de Foz do Iguaçu. Tais questões foram selecionadas por apresentarem conteúdos que possibilitavam a visualização das crenças produzidas pelos informantes quanto a falantes e línguas que estão em contato na região da tríplice fronteira. Como procedimento de análise, a autora localizou e classificou os vocábulos mais recorrentes na caracterização feita pelos informantes a respeito de outros falantes, tomando esses vocábulos, portanto, como orientadores de atitude negativa ou positiva.

Entre os principais resultados, Santana (2012) verificou que os falantes identificam as línguas a partir do seu convívio com elas e as avaliam a partir da construção de sua identidade. O posicionamento dos informantes quanto a essas línguas e, consequentemente, aos seus usuários estava sempre ligado à(s) língua(s) com a(s) qual(is) esteve em contato desde a infância; ou seja, por serem falantes nativos de português, os informantes partiam sempre dessa língua para fazer juízos de valor. É por esse motivo que há muitas referências, por um lado, ao espanhol como a língua mais bonita e mais fácil de entender ou aprender, e, por outro, ao árabe, ao chinês ou ao japonês como línguas difíceis de aprender, complicadas, feias ou desinteressantes. A autora concluiu que o uso desses e de outros vocábulos que remetiam a tal condição estava vinculado à comparação que o informante fazia sempre entre a sua língua materna e a língua sob avaliação.